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As “revoluções logísticas” de Ake Anderson (A logística na longa

PARTE 3 – REDES E LOGÍSTICA: BASES TEÓRICAS

5. Logística

5.3. As “revoluções logísticas” de Ake Anderson (A logística na longa

Este item mostra a logística como um dos fatores responsáveis pelas mudanças ocorridas nas relações de trocas e no modo de circulação das mercadorias ao longo do tempo, procurando ressaltar, para uma leitura estrutural sobre o processo atual de

internacionalização do capital, as escalas espaciais e temporais107. Na longa duração, as

mudanças decorrentes de incorporações técnicas e tecnológicas aos processos produtivos e de circulação, bem como as decisões de ordem político-econômicas nacionais e internacionais (diminuição dos custos de transação) proporcionam integrações territoriais e regionais, trazendo na sua ‘esteira’, diferentes e contraditórios arranjos espaciais. São as “revoluções logísticas”. Já do ponto de vista da ‘curta duração’, temos uma progressiva e constante diminuição dos tempos de circulação em busca de maiores lucros revelados hoje na logística de organização e métodos, proporcionados pelo uso cada vez mais racionais dos transportes e das TIC (tecnologias da informação e comunicações).

Em seu clássico artigo sobre as “revoluções logísticas” (1986), Anderson propõe expandir as análises de Henri Pirenne (1936) e Alistair Mees (1975) com a hipótese geral de que:

a seqüência de mudanças revolucionárias no mundo econômico durante o ultimo milênio pode ser explicada pelas mudanças na estrutura de sistemas logísticos de maneira geral. Em outras palavras: As grandes

mudanças estruturais de produção, locação, comércio, cultura e instituições são desencadeadas pelas lentas mas constantes mudanças nas redes de logística.

Redes de logística, segundo o autor “são aqueles sistemas que podem ser usados para o movimento de mercadorias, informação, dinheiro e pessoas, associados com a produção ou consumo de mercadorias. Dever ser destacado que mercadorias inclui bens e serviços”.

Sposito (1999, p.105) analisando o artigo de Anderson afirma que as “revoluções logísticas”

são decorrentes de: incorporação das tecnologias aos transportes; necessidade de se aumentar a velocidade nos fluxos de capitais e na circulação das informações, principalmente aquelas ligadas às novas idéias, que podem gerar maiores lucros; criação de novas necessidades associadas ao consumo de bens não produzidos no circuito produtivo...

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Para uma discussão sistematizada sobre “Escalas espaço-temporais”, ver Haesbaert (2002, pp.101-115). Para uma discussão mais detalhada sobre a “longa duração” mais detalhada, ver Braudel (1978, pp.41-77) “História e Ciências Sociais. A Longa Duração”.

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Na longa duração, a logística se caracteriza pelo seu desenvolvimento e evolução, a ponto de ocorrerem rupturas e transformações no processo de constituição do aparato logístico.

Segundo Anderson (1986), “o desenvolvimento de relações econômicas entre regiões no mundo desde os anos 1000 a.C. até 2000 a.C. podem ser divididas em quatro revoluções logísticas”:

A Primeira Revolução Logística começa na Itália no século XI e termina nos países

do norte europeu no século XVI;

De modo resumido, as conseqüências da Primeira Revolução Logística foram um aumento significante do comércio entre lugares distantes e da divisão do trabalho na Europa, com o surgimento de regiões com grande capacidade comercial (expansão da riqueza dos comerciantes desses centros de comércio - emergência como classe social com aspirações políticas) e de centros de produção com populações que atingiam a casa dos 100.000 habitantes. Formação de uma rede de centros urbanos no litoral e ao longo dos rios da Europa “com uma ideologia de rede” (Ex: Liga Hanseática).

A Segunda Revolução Logística começa na Itália no século XVI e termina nos

países norte europeus no século XIX;

Anderson (1986) resume as conseqüências da segunda revolução logística do seguinte modo:

Aumento da produção especializada na Europa e o surgimento de um sistema de produção apoiado pelo Estado e próximo aos centros de atividade econômica e política; Surgimento de metrópoles onde o poder político e econômico era integrado (o tamanho dessas metrópoles era considerável; Paris, por exemplo, tinha mais de meio milhão de habitantes antes de 1600); Expansão da riqueza dos que estavam no controle das novas transações econômicas e do sistema de controle econômico, sejam eles comerciantes ou monarcas; Domínio total do novo estado absoluto nas mãos da nova classe; Expansão criativa de idéias na ciência e nas artes em certos centros como Amsterdã, Paris e Inglaterra (nomes importantes associados com as tendências criativas eram Newton, Huygens e Descartes); Surgimento de um novo modelo de redes de comércio internacionais, sendo Londres, Paris e Amsterdã os centros mais importantes. Deve ser observado que as melhorias no sistema de transações ocorreu junto com sucessivas melhorias no sistema de transporte. Houve uma lenta melhora através dos séculos nas técnicas de navegação, construção de navios, na segurança do transporte e na qualidade das estradas, melhorias estas que proporcionaram novas possibilidades de comércio. O lento, porém constante, aperfeiçoamento do sistema de transações foi o fator mais

importante 109.

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A Terceira Revolução Logística começa na Inglaterra no século XVIII e termina nos países desenvolvidos, provavelmente no século XXI;

Segundo Anderson (1986), a causa da terceira revolução logística foi o “aumento da consciência de que a divisão coordenada do trabalho entre regiões diferentes do sistema econômico global poderia ser muito lucrativo”, especialmente se as novas tecnologias pudessem ser difundidas para núcleos diferentes de uma “rede de fábricas integradas verticalmente”. Para o autor, algumas das conseqüências foram:

Aumento espetacular do comércio entre lugares distantes, especialmente atravessando o Oceano Atlântico; Crescimento espetacular de cidades industriais especialmente nas proximidades de centros produtores de matéria-prima, de junções de rede e perto de aglomerações de mercado; Expansão de riqueza nas mãos dos novos industriais; Surgimento de uma nova rede internacional e interregional de centros industriais com uma orientação principal com direção ao Atlântico Norte.

A Quarta Revolução Logística começa no Japão, nos Estados Unidos, na Suíça,

Suécia e Alemanha Ocidental no fim do século XX.

Anderson (1986) afirma que o aumento do processamento de informações e da capacidade de comunicação que ocorre atualmente anda junto com um aperfeiçoamento do sistema de transportes, sobretudo na “estrutura e operação da rede de transporte aéreo”. O autor aponta como conseqüências da quarta revolução logística os seguintes fatores:

A primeira e mais óbvia conseqüência da quarta revolução logística seria a integração global de complexos de indústria com fluxo de mercadorias, de pessoas e de informação que seja rápido, bem coordenado em termos de espaço e tempo, porém imprevisível. Esses complexos industriais seriam baseados primariamente em amplas perspectivas de demandas , não em base de recurso. Num primeiro estágio, a integração continental seria favorável por causa das vantagens de custo, rapidez e da confiabilidade do sistema de transporte com caminhões; Uma segunda conseqüência seria um aumento ainda mais dramático no comércio entre indústrias do tipo já observado nos modelos de comércio internacional naquela região; Uma terceira conseqüência seria uma nova direção da escolha do modo de transporte; A quarta conseqüência é o surgimento de uma nova hierarquia de cidade, com uma importância cada vez menor das velhas cidades industriais na costa do Oceano Atlântico, como Liverpool, Manchester, Antuérpia e Filadélfia. Os centros de educação superior e suas regiões vizinhas tornam-se as regiões favorecidas, e as regiões C (C de competência, cultura, comunicação e criatividade) formam uma nova rede. Estas regiões C tendem a ser localizações de unidades direcionadas a P&D dentro das novas corporações com projetos voltados à arquitetura de sistema.

De forma análoga, temos a explanação de Milton Santos (1996, p.140) sobre os

dado momento, mantêm-se como hegemônicos durante um certo período (...), até que outro sistema de técnicas tome o lugar (...)”. Através dos sistemas técnicos, pode-se obter o entendimento sobre os arranjos logísticos.

Santos (1996, p.137-150) em sua pesquisa sobre os sistemas técnicos, constatou que muitos autores estudaram as técnicas através de períodos (períodos técnicos) e seus impactos na organização da sociedade em geral. O autor constatou ainda, que alguns pesquisadores periodizaram o avanço das técnicas desde o neolítico, outros desde o artesanato e outros a partir da Revolução Industrial, na maioria dos casos, sob uma visã o tripartite. Entre os autores citados, o mais abrangente e o que consideramos mais relevante para esta pesquisa é a de Fu-chen-Lo (1991). Santos (1996, p.139), elaborou um quadro sumário do avanço das técnicas a partir do referido autor. Vejamos:

Quadro 6. Os cinco períodos técnicos segundo Fu-chen-Lo (1991)

Paradigma Técnico econômico Primeira Mecanização 1770-1840 Máquina a vapor e Estrada de ferro 1830-1890 Eletricidade e engenharia pesada 1880-1940 Produção Fordista de massa 1930-1990 Informação e comunicação 1980-? 110 Setores de crescimento -Máquinas têxteis -química -fundição -máquinas a vapor -estradas de ferro e seus equipamentos - máquinas - instrumentos -Engenharia elétrica -Engenharia mecânica - Cabos e fios -Produtos siderúrgicos -automóvel -avião -produtos sintéticos -petroquímica -computadores -bens eletrônicos de capital -telecomunicações -robótica -biotecnologia Inovações -máquina a vapor -aço -eletricidade -gás -colorantes artificiais -automóvel -avião - rádio - alumínio - petróleo -plásticos -computadores -televisão -radar -máquinas- instrumentos -drogas In: Santos (1996, p.139)

No exemplo estão instrumentos técnicos logísticos e não logísticos, mas nota-se que os instrumentos logísticos compõem em alguns períodos, a espinha dorsal que os sustentam.

Na maior parte das periodizações elaboradas por intelectuais com o intuito de se verificar as técnicas e tecnologias responsáveis pelas mudanças estruturais na economia e na sociedade, veremos instrumentos logísticos sustentando as mudanças. A diferença é que na tese das “revoluções logísticas”, são os transportes e as comunicações os principais responsáveis pelas mudanças.

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Todavia, como destacamos na introdução, conjeturamos que, observando o atual estágio, sob a ótica estrutural das “revoluções logísticas”, a curto e médio prazo pode não haver outra revolução, já que, a velocidade atingida pelos meios de transportes chegou nos seus limites. Tendo em vista esse processo, entendemos que é aí é que entra o papel da organização logística.

É nos interstícios da estrutura da longa duração, que temos a logística de organizações e métodos, que, através do aproveitamento da estrutura fixa existente e possível, elabora formas de otimizar a circulação, propondo inclusive, a fabricação e desenvolvimento de tecnologias alternativas às revolucionárias (trens, caminhões, etc.).