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Capitulo II ENQUADRAMENTO TEÓRICO

3. Práticas de Intervenção Precoce Centradas na Família

3.3. Intervenção nos Contextos Naturais da Criança

3.3.1. As Rotinas Diárias e Oportunidades de Aprendizagem

A perspetiva atual, considera que as respostas às dificuldades específicas das crianças e das famílias devem sempre que possível serem prestadas integradas nas rotinas diárias dos ambientes naturais em que as crianças passam a maior parte do seu tempo de aprendizagem, nomeadamente casa e escola. Assim, constata-se que as rotinas da família passaram a ter grande relevância na nova conceção de IPI, acompanhando as mudanças paradigmáticas desde as práticas centradas na criança até às práticas centradas na família, implicando um modelo de colaboração entre profissionais e pais em que estes últimos são capazes de tomar as suas próprias decisões.

De acordo com Brenheimer e Weisner, (2007, cit. McWilliam 2012, pp. 41-42), as rotinas são "atividades quotidianas que acontecem em casa, em contextos de cuidados de grupo (por.ex. creche, infantário), e na comunidade. Podem "não ter

lugar literalmente todos os dias, mas têm um cariz recorrente e constituem o padrão da vida familiar e escolar". McWilliam (2012. p. 42). E "variam de indivíduo para indivíduo, não só no que diz respeito às atividades identificadas, mas também quanto ao processo de implementação". Enquanto que alguns seguem as rotinas de forma sistemática outros mesmo mantendo um padrão, acabam por ser mais flexíveis, sendo pois necessário "fazer uma avaliação individualizada e cuidadosa das rotinas diárias relativas a cada criança" (Almeida e al, 2011, p. 84).

Segundo diversos autores (como Bricker e Cripe,1992, Yoder e Warren, 1993, Woods-Cripe 1999 e Goldstein 2003, cit. por Almeida e al, 2011, p.84), as rotinas devem obedecer a determinadas condições, nomeadamente:

Serem identificadas pelo prestador de cuidados.

Corresponderem ao interesse do prestador de cuidados e da criança. Manterem uma sequência.

Serem repetitivas.

Promoverem interações positivas.

Integrarem objetivos funcionais que sejam traduzidos em resultados positivos e significativos.

Serem flexíveis e adaptáveis. Serem relativamente breves. Serem previsíveis.

Permitirem a alternância de turnos (dar e tomar a vez), rituais ou atividades. Ocorrerem com frequência.

Permitirem a utilização de várias competências.

Quadro nº 3 - Características das Rotinas. Fonte: Almeida et al, (2011, p. 85)

A convicção de que as crianças em idades precoces aprendem através de "interações repetidas de uma forma dispersa ao longo do tempo e não nos breves períodos em que decorrem as intervenções" e que "as intervenções dos profissionais têm pouco efeito diretamente na criança, têm um impacto importante na melhoria das competências e da autoconfiança dos pais, famílias e outros prestadores de cuidados, que por sua vez tem uma influência grande na promoção do desenvolvimento da criança" (Almeida, et al., 2011, p. 85).) realça a importância de se intervir não tanto diretamente com a criança, mas mais veementemente junto dos prestadores de cuidados.

A característica da previsibilidade das rotinas e importante para a aprendizagem das crianças porque "elas podem despender mais atenção e energia exclusivamente na aprendizagem de novas aptidões". As rotinas são eficazes "quando apresentam um nível moderado de novidade, o que faz com que as crianças não sintam as atividades nem pouco interessantes, que as levem a desistir delas, nem demasiado excitantes que as levem a despender demasiada energia na sua exploração". O nível moderado de novidade da rotina, "conseguido quando se junta um elemento novo ou um aspeto diferente numa rotina previsível e familiar, é o momento ideal para a aprendizagem de novas competências". O envolvimento e a aprendizagem integrados nas rotinas "são conceitos associados e constituem elementos essenciais do ensino eficaz que, por sua vez, conduzem à aprendizagem e generalização eficazes" (Warren e Horn, 1996, cit. Almeida e al, 2011, p. 84).

As práticas de intervenção precoce baseadas nas rotinas, implicam um modelo de colaboração entre profissionais, pais e comunidade, requer "uma planificação complexa" entre todos s envolvidos, "a elaboração de um plano para a sua intervenção", sendo pois “uma componente essencial de um modelo centrado na família e na comunidade, que privilegia, necessariamente, a identificação de rotinas, atividades e acontecimentos que ocorrem nos vários contextos de vida da criança” (Almeida, et al., 2011, pp. 84-85).

Torna-se necessário perceber junto das famílias e da escola como decorre o dia a dia da criança, mas também que estes prestadores de cuidados percecionem a relevância da utilização de atividades, consideradas triviais (ex. hora do banho, alimentação, vestir, ir à casa de banho, hora de dormir, etc), como oportunidades de ensino e aprendizagem e consequentemente promotoras do desenvolvimento da criança.

Devemos ter presente que algumas rotinas podem constituir fontes de aprendizagem para umas crianças, não o serão certamente para outras, que não são estáticas, antes dinâmicas, podendo por isso serem gradualmente ou abruptamente alteradas, consoante o decursos dos vários acontecimentos que ocorrem no seu contexto (ex. o nascimento de um irmão, a morte de um familiar, a mudança de casa, etc). Assim, uma intervenção com base nas rotinas, "tem de ser suficientemente flexível para se

adaptar a todas as circunstâncias, tendo sempre como objetivo final proporcionar interações positivas entre a criança e os seus prestadores de cuidados" (Almeida e al, 2011, p. 85).

3.3.1.1. Envolvimento, Independência e Relações Sociais

De acordo com Sameroff e Friese (2000) as atuais correntes sobre o desenvolvimento infantil indicam que "as interações da criança no decorrer das suas experiências com o seu ambiente físico e social podem favorecer ou impedir os processos de aprendizagem e de desenvolvimento precoces" sendo o envolvimento individual da criança um fator decisivo. Para McWilliam e Bailey (1995), o envolvimento consiste na "quantidade de tempo que a criança despende a interagir ativa ou atentamente com o ambiente (com adultos, pares ou materiais) de uma forma desenvolvimental e contextualmente adequada em diferentes níveis de competência" remetendo-nos pois o conceito não só para a quantidade de tempo que a criança se envolve nessa atividade, mas também a qualidade desse envolvimento, sendo algo avaliado através do tipo e nível de comportamentos da criança. McWilliam e Kruif (1998) referem que o tipo de envolvimento integra interações sociais, nomeadamente com os adultos e pares e interações com os seus objetos e com o self. Quanto aos níveis de desenvolvimento estão subjacentes dois critérios. O de adequação desenvolvimental, que implica que o comportamento seja adequando às capacidades e nível desenvolvimental da criança e o de adequação contextual que determina que o comportamento seja adequado à atividade que está a ser realizada e às expectativas da situação (cit. Almeida et al, 2011, p.87).

McWilliam (2005, p. 2) propõe cinco variáveis que determinam o envolvimento da criança na tarefa, a saber: relações com os objetos (envolvimento com os materiais), relações sociais (envolvimento com adultos e pares), efeitos das carateristicas ambientais e influência da maturação nos níveis de competência da criança (o envolvimento tornasse mais sofisticado com o avançar da idade desenvolvimental), considerando que o ambiente pode ser modificado para promover o envolvimento, sendo pois importante uma cuidadosa organização do ambiente físico e social e também da necessidade de prevenir a ocorrência de níveis baixos de envolvimento.

Ao "focalizar o envolvimento da criança, devemos considerar a ocorrência de variações no seu comportamento, ir de encontro aos seus interesses e evitar práticas que diminuam o seu envolvimento (algumas terapias) ou que não o incrementem (ensinar capacidades isoladas com base em testes ou currículos que não são fundamentadas nas rotinas naturais da criança)" devendo ter em atenção a independência e as relações sociais (Almeida et al, 2011, pp. 88-89).

No contexto das rotinas envolvimento significa "a quantidade de participação da criança numa determinada rotina, o que pode incluir a autonomia e as relações sociais", sendo "três domínios que não se excluem uns dos outros". As relações sociais "incluem tanto aptidões de comunicação como de relacionamento com outras pessoas" (McWilliam, 2012, p. 43). "A criança que estabelece relações sociais bem sucedidas exprime-se de forma adequada, interage com os pares nas rotinas e segue essas rotinas" (McWilliam, 2005, cit, Almeida et al, 2011, p. 89).

3.3.2. O Modelo de Intervenção Precoce em Contextos Naturais de McWilliam