As Três Hipóteses do Conhecimento

Piaget classifica o conhecimento em três tipos:  Conhecimento físico;

 Conhecimento lógico-matemático e;  Conhecimento social-arbitrário.

A construção dos três tipos de conhecimento é afetada pelas ações da criança. O conhecimento físico ocorre por abstração simples, diretamente dos objetos; o conhecimento lógico-matemático ocorre por abstração-reflexivante, através das ações das crianças sobre os objetos e; o conhecimento social-arbitrário ocorre através da interação da criança com o meio.

[...] atualmente sabemos que a experiência é necessária para que a inteligência se desenvolva, mas só isso não é suficiente e sobretudo ela ocorre de duas formas bastante diversas, as quais o empiricismo clássico deixou de distinguir; a experiência física e a lógico-matemática. A experiência física consiste na ação sobre os objetos e na descoberta das propriedades através da abstração obtida desses objetos (conhecimento concreto): por exemplo, pesar objetos e observar que os mais pesados nem sempre são os maiores. A experiência lógico- matemática...também consiste em agir sobre os objetos, mas o processo de abstração através do qual as suas propriedades são descobertas é dirigido não aos objetos como tais mas às ações produzidas nos objetos (conhecimento abstrato): por exemplo, colocar pedregulhos enfileirados e descobrir que o seu número é o mesmo quer eles se movam da esquerda para a direita ou da direita para a esquerda (ou em círculo, etc.); nesse caso, nem a ordem e tampouco a soma numérica eram propriedades dos pedregulhos antes de serem ordenados ou antes de serem contados e a descoberta de que a soma é independente da ordem consiste em abstrair essa observação a partis das ações de enumerar e ordenar, embora a “leitura” do experimento estivesse dirigida aos objetos, pois essas propriedades da soma e da ordem foram na realidade introduzidas nos objetos através das ações. (WADSWORTH, 1989, p. 57-8 apud PIAGET, 1969 a, p.37-38)

A abstração simples ou conhecimento físico resume-se na consequência das ações sobre os objetos ou pelo resultado das ações desenvolvidas sobre eles. O autor citado acima observa que a aquisição desse conhecimento não exige reforço de outra pessoa, pois, quando a criança está construindo esse conhecimento, as propriedades físicas dos objetos corrigem ou reforçam a aprendizagem da criança.

Ao contrário do conhecimento físico, o conhecimento lógico-matemático não parte dos objetos, sendo construído, e não ensinado, a partir das ações da criança sobre os objetos, advindo das próprias ações que a criança criou. Conforme verifica o autor supra citado, o conhecimento lógico-matemático é inventado pela criança. Quando a criança constrói o conhecimento lógico matemático ela o faz através da coerência, pois não existe nada

arbitrário nesse conhecimento. Uma vez construído esse conhecimento, ele não há de ser esquecido.

Conforme observado, o conhecimento físico não pode existir sem o conhecimento lógico matemático e vice-versa. Em relação a essa observação Kamii e DeVries (1992, p.26) pontuam que:

Um quadro lógico-matemático é necessário para uma abstração simples porque nenhum fato do mundo exterior pode ser “exteriorizado” se cada fato é um incidente isolado, sem relação com o conhecimento prévio. Por exemplo,uma criança observa um determinado copo que é vermelho e transparente, ela precisa ter algum esquema de classificação de “vermelho” e transparente”. Se ela recém quebrou um copo, ela precisa saber que os pedaços quebrados e o copo original são a mesma coisa, e que o quebrar ocorreu como resultado de sua ação. A organização da criança de seu conhecimento prévio e a rede de relações que ela cria constantemente entre os objetos são seu quadro lógico-matemático. Cada fato a criança exterioriza, na realidade é exteriorizado pela assimilação no seu quadro lógico-matemático.

Segundo a visão de Piaget, a fonte do conhecimento físico é parcialmente dos objetos e a fonte do conhecimento lógico-matemático provém do indivíduo. Sobre esse aspecto Kamii e DeVries (1992) analisam que o conhecimento lógico matemático, na teoria de Piaget, representa a tradição racionalista no qual a verdade não pode ser decidida pelo que é observável. Deve ser enfatizado, entretanto, que Piaget não adere às reações racionalistas de que as estruturas lógico-matemáticas são inatas. Elas são “construídas” pela própria atividade mental da criança.

No período pré-operacional, o pensamento da criança ainda é subjugado pelo lado físico, ou seja, pela interpretação do lado físico que a criança observa, continuando a ser relativamente indiferenciados os aspectos físicos e lógico-matemáticos das ações.

No decorrer do período das operações concretas, o aspecto lógico-matemático passa a ser, em parte, separado do aspecto físico. E quando alcançar às operações formais, a forma lógico-matemática se difere do conteúdo físico para, conforme especifica Kamii e DeVries (1992, p. 27) “fazer operações em operações possíveis”.

Em relação ao conhecimento social-arbitrário, considera-se que este é o conhecimento que a criança aprende pela interação social. É um conhecimento transmitido por pessoas, e somente por meio delas é que ele pode ser aprendido. Isso ocorre devido à interação que a criança desempenha com outras crianças. Para Kamii e DeVries (1992, p. 27-28):

O modo de estruturação do conhecimento lógico-matemático é muito diferente do conhecimento físico-social. Conhecimento lógico-matemático é construído pela elaboração de uma estrutura originalmente criada pela criança. Cada estrutura

posterior, entretanto, é construída a partir das anteriores, e estruturas anteriores tornam-se integrantes das posteriores. Por exemplo, no nível pré-operacional „dependente funcional” pode ser reconhecida na seriação de operações concretas. Seriação pode também ser reconhecida no sistema combinatório de operações formais. Enquanto a estrutura lógica-matemática torna-se mais e mais independente do conteúdo à medida em que a criança cresce,os conhecimento físico e social sempre ficam dependentes e indissociáveis do quadro lógico-matemático.

O conhecimento social também é conhecido como um conhecimento arbitrário pelo fato de ele se basear no consenso social, não podendo ser constatado logicamente ou por experiências com objetos. Ele só pode ser transmitido pela interação entre as pessoas.

A seguir, pode-se observar um Quadro com o resumo sobre os três tipos de conhecimentos, propostos por Piaget:

Conhecimento Físico Conhecimento Lógico-

Matemático

Conhecimento Social- Arbitrário

Definição Conhecimento a respeito

das propriedades físicas dos objetos

Conhecimento abstrato Conhecimento feito pelas pessoas

Como se adquire Descoberto através das

ações sobre os objetos; os objetos são a fonte

Inventado a partir das ações sobre os objetos; as

ações são a fonte

Obtido a partir das ações sobre e das interações

com as pessoas. As pessoas são a fonte

Tipo de Reforço Objetos Objetos Outras pessoas

Exemplo de áreas de conhecimento

Tamanho, cor, textura, grossura, sabor, som, flexibilidade, densidade

Número, massa, área, volume, comprimento,

classe, ordem, tempo, velocidade, peso

Linguagem, regras, morais, valores, cultura,

história, sistemas de símbolos. Quadro 4: Os três tipos de conhecimento. (WADSWORTH, 1989, p. 66)