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ASPECTOS ASSOCIADOS: TRANSTORNOS ALIMENTARES,

No documento anacarolinasoaresamaral (páginas 37-42)

Anexo XXI Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa

3.3 ASPECTOS ASSOCIADOS: TRANSTORNOS ALIMENTARES,

A associação entre as preocupações com a aparência corporal e os transtornos alimentares (TAs) já está bastante consolidada na literatura. Existem vários tipos de transtornos da alimentação; entretanto, alguns deles se tornam singulares pela presença da distorção da Imagem Corporal em sua etiologia (Appolinário & Claudino, 2000). Entre estes, destaca-se a Anorexia Nervosa (AN), definida por uma recusa em manter o peso normal para a idade e altura, bem como

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amenorreia (ausência de menstruação), medo mórbido de engordar e distúrbio na forma como a pessoa percebe o próprio corpo, influenciando indevidamente a autoavaliação (American Psychiatric Association [APA], 1994; Claudino & Borges, 2002). Segundo Delinsky (2011), estes últimos critérios são relacionados diretamente à Imagem Corporal. Já a Bulimia Nervosa (BN) é caracterizada por repetidos episódios de compulsão alimentar e uso de técnicas compensatórias inapropriadas, que neutralizem os efeitos indesejáveis do consumo excessivo de comida, particularmente o ganho de peso (APA, 1994; Crowther & Williams, 2011).

Entretanto, alguns autores alertam para a dificuldade em determinar a incidência e prevalência destes transtornos em crianças e adolescentes, devido à não especificidade dos critérios diagnósticos propostos pelo Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorder – revised (DSM- IV-R) para estas fases do desenvolvimento (Smolak & Thompson, 2009; Watkins & Lask, 2009). Segundo estes autores, a maior parte das crianças e adolescentes pré-púberes acabam não sendo classificados dentro do DSM-IV-R, ou são diagnosticados com transtorno alimentar não especificado, por não atenderem a todos os critérios diagnósticos para anorexia e bulimia nervosa, quando, na verdade, são os critérios que não atendem às características da faixa etária. É o caso, por exemplo, do distúrbio menstrual, o qual só pode ser notado em meninas pós-menarca.

Alguns esforços para a determinação da prevalência de AN e BN têm estimado um índice entre 0,1 e 0,2% para adolescentes, sendo 90 a 95% dos casos representados por meninas (Watkins & Lask, 2009). Segundo Delinsky (2011) e Crowther e Williams (2011), em ambas as manifestações o indivíduo vivencia distúrbios na Imagem Corporal, incluindo seus aspectos perceptivos, cognitivos, afetivos e comportamentais. Esta proposição é comprovada por Timmerman et al. (2010), que verificaram, na fase de pré-tratamento, elevados índices de insatisfação e depreciação corporal entre pacientes com BN, sendo essa insatisfação reduzida ao final do tratamento.

Além disso, os distúrbios da Imagem Corporal também são fortemente associados à ocorrência de manifestações subclínicas e sintomas dos TAs. Segundo Stice, Marti e Rohde (2013), aproximadamente 13% das mulheres com idade em torno dos 20 anos atendem aos critérios diagnósticos para TAs pelo DSM-52.

2 O Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorder foi proposto pela American Psychiatric Association

com o intuito de reunir e classificar os critérios diagnósticos para os transtornos mentais. Desde sua primeira versão, datada de 1952, já foram publicadas outras quatro versões, além de uma revisão no texto do DSM-IV, realizada no ano 2000. A versão em inglês do DSM-5 foi publicada apenas em maio de 2013. Em função disso, muitos estudos ainda utilizam o DSM-IV e sua versão revisada (DSM-IV-R) para diagnosticar os transtornos mentais, entre eles os alimentares. No DSM-5, os critérios diagnósticos para Anorexia Nervosa foram mantidos, com exceção da amenorreia. Já para a Bulimia Nervosa, foi reduzida a frequência mínima de eventos de compulsão, podendo ser diagnosticados com este transtorno alimentar indivíduos que apresentam estas ocorrências a partir de uma vez por semana.

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Em estudo com meninas adolescentes da cidade de Florianópolis (SC, Brasil), Alves et al. (2008) verificaram uma prevalência de 15,6% de sintomas de anorexia nervosa, estando esta associada à faixa etária de 10 a 13 anos, sobrepeso e obesidade, à rede pública de ensino e à insatisfação com a Imagem Corporal. Em pesquisa anterior realizada com escolares de sete a 19 anos, residentes em municípios do interior de Minas Gerais (Brasil), Vilela et al. (2004) já haviam verificado uma prevalência de 13,3% para quadros subclínicos de anorexia nervosa, sendo significativamente maior em meninas. Neste mesmo estudo, os autores apontaram para um índice de 1,1% dos alunos com possível diagnóstico de bulimia nervosa, sendo 63% destes representados por meninas.

Em sua pesquisa com escolares de sete a 14 anos, da cidade de Salvador (BA, Brasil), Alves, Santana, Silva, Pinto e Assis (2012) verificaram uma prevalência de 23% para os sintomas de transtornos alimentares, configurando como uma das maiores taxas registradas na literatura nacional. Os autores identificaram, ainda, que a insatisfação corporal foi um dos maiores preditores da ocorrência de sintomas de transtornos alimentares entre os participantes do estudo (Alves et al., 2012).

Esta associação da insatisfação a manifestações subclínicas de TAs é confirmada, ainda, na investigação de Fortes, Oliveira e Ferreira (2012) com jovens atletas do sexo feminino. Nesta pesquisa, a insatisfação corporal e o percentual de gordura foram os únicos fatores que modularam a ocorrência de sintomas de TAs entre as meninas estudadas (Fortes et al., 2012). De forma semelhante, estudos comprovam que a insatisfação corporal aumenta as chances do desenvolvimento de comportamentos alimentares inadequados em meninas adolescentes, configurando como um dos principais fatores de risco para a adoção de atitudes alimentares insalubres (Fortes, Morgado, & Ferreira, 2013; Scherer, Martins, Pelegrini, Matheus, & Petroski, 2010).

Dado o aumento da preocupação com a aparência, presenciado na atualidade, muitos pesquisadores têm se dedicado a investigar a associação dos componentes da Imagem Corporal a outras variáveis psicológicas (Brausch & Muehlenkamp, 2007; Evans, Tovée, Boothroyd, & Drewett, 2013; Hughes & Gullone, 2011; Philipps, Pinto, & Jain, 2004), especialmente a autoestima e a ocorrência de sintomas de depressão, os quais são caracterizados como fatores predisponentes ao desenvolvimento de transtornos alimentares (Morgan, Vecchiatti, & Negrão, 2002).

No que diz respeito à autoestima, é sabido que as preocupações com a Imagem Corporal estão associadas com o autoconceito negativo em adolescentes, o que inclui piora no autoconceito físico, social e redução da autoestima. Pode-se compreender que a autoestima reflete

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o componente afetivo do autoconceito, ou seja, os sentimentos e emoções que o sujeito tem a respeito de si mesmo (Sisto & Martinelli, 2004).

Para O’Dea (2012a), a autoestima pode ser expressada de três maneiras. A primeira delas, autoestima global ou autoestima traço, se refere à variável da personalidade que representa a forma como a pessoa realmente se sente a respeito de si mesma, e é relativamente estável ao longo do tempo e nas diversas situações. A segunda é caracterizada pelo sentimento de autoestima ou autoestima estado, a qual representa as reações aos eventos da vida. A terceira está relacionada à forma como a pessoa avalia suas habilidades e atributos e é denominada autoavaliação.

Segundo Tiggemann (2005), a insatisfação com um componente particular tem impacto na autoestima global do indivíduo. Esta mesma autora alerta para a relevância que a insatisfação com a aparência tem para uma piora nos níveis de autoestima entre os adolescentes, particularmente entre as meninas. De forma análoga, um autoconceito positivo se configura como um facilitador em potencial para o desenvolvimento da Imagem Corporal positiva, atuando como fator protetor contra eventos que possam prejudicar a autoimagem (O’Dea, 2012a).

Furnham, Badmin e Sneade (2002) investigaram as diferenças de sexo em relação à autoestima, atitudes alimentares e razões para se exercitar, e suas associações à insatisfação corporal entre adolescentes. Os autores encontraram níveis mais elevados de insatisfação corporal entre as meninas que entre os meninos e, além disso, houve correlação entre a insatisfação corporal e a autoestima apenas entre as meninas, sustentando a hipótese de que aqueles que são mais insatisfeitos com a aparência apresentam menor autoestima (Furnham et al., 2002).

Em estudo realizado com adolescentes americanos, van den Berg, Mond, Eisenberg, Ackard e Newmark-Sztainer (2010) verificaram a associação entre baixa autoestima e insatisfação corporal de acordo com o sexo, a idade, o peso, a etnia, o status socioeconômico e o tempo. Os resultados indicaram que os meninos apresentaram menor insatisfação corporal e maior autoestima que as meninas. Entretanto, a forte associação entre estas variáveis foi semelhante entre os grupos estratificados pelo sexo (van de Berg et al., 2010).

Já o estudo de Ricciardelli e McCabe (2001) apontou que as influências socioculturais predisseram tanto a insatisfação corporal quanto a adoção de estratégias de modificação do corpo entre meninos e meninas. Entretanto, a autoestima apresentou efeito moderador desta relação apenas entre os meninos, indicando que meninos com baixa autoestima foram mais afetados pelas pressões socioculturais, enquanto as meninas foram influenciadas independentemente de sua autoestima (Ricciardelli & McCabe, 2001).

Ainda nesta perspectiva, Mellor et al. (2010) investigaram a associação entre Imagem Corporal e autoestima entre adultos de ambos os sexos. Os resultados deste estudo confirmaram a

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existência de relação negativa entre estas variáveis, de forma que o aumento da autoestima esteve associado com a redução nos níveis de insatisfação corporal. Entretanto, a direção da associação entre a insatisfação corporal e a autoestima ainda é desconhecida, necessitando de estudos longitudinais que avaliem estes dois fenômenos e sua precedência temporal (Tiggemann, 2005).

Muitos estudos têm indicado, também, associação entre níveis reduzidos de autoestima, Imagem Corporal negativa e depressão (O’Dea, 2012a). Segundo o DSM-IV (APA, 1994), a depressão é definida por umhumor deprimido e pela perda de interesse ou satisfação em relação à maior parte das atividades3. Vários modelos têm buscado explicar a etiologia da depressão patológica, sempre associados a teorias específicas, como os modelos biológico, comportamental, cognitivo e psicanalítico (Curvinel, 2003). A versão revisada do DSM-IV propõe uma subdivisão a fim de favorecer o diagnóstico da depressão, a qual inclui a “depressão severa com manifestações psicóticas” que é caracterizada pela presença de delírios e alucinações, muitas vezes associadas às características físicas, como o sentimento de deformidade e aparência ruim (Hollander, Siragusa, & Berkson, 2012).

Em estudo realizado com meninas de sete a 11 anos, Evans et al. (2013) investigaram a adequação de um modelo sociocultural, que explicasse a insatisfação corporal e as atitudes relacionadas aos transtornos alimentares. Segundo este modelo, a depressão, assim como as dietas restritivas, mediaram totalmente a relação entre a insatisfação corporal e as atitudes alimentares de risco. Para os autores, esta relação pode ser explicada devido à relevância da aparência para a autoavaliação entre meninas, levando à adoção de comportamentos alimentares de risco, que aliviem o descontentamento com o corpo (Evans et al., 2013).

Resultados semelhantes foram encontrados por Hughes e Gullone (2011), em estudo com adolescentes australianos de ambos os sexos. Os autores verificaram associação significante entre os sintomas depressivos e maior frequência de preocupação com a aparência, exceto quando adotadas estratégias de aceitação internas. Brausch e Muehlenkamp (2007) foram além ao verificarem, entre uma amostra de adolescentes, que a Imagem Corporal foi o mais forte preditor de comportamentos de ideação suicida, excedendo os valores encontrados para depressão, desesperança e eventos suicidas passados.

Entretanto, a relação causal entre a piora da Imagem Corporal e a ocorrência de sintomas depressivos permanece obscura, especialmente a direção desta relação (Hollander et al., 2012; Paxton et al., 2006). Hollander et al. (2012) afirmam que os estudos prospectivos

3 Segundo a American Psychiatric Association, em sua publicação intitulada Highlights of Changes from DSM- IV-TR to DSM-5, os critérios diagnósticos para a depressão propostos no DSM-5 são idênticos aos elencados na

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desenvolvidos até o momento indicam a insatisfação corporal como importante precursor do risco de depressão, corroborando o modelo proposto por Stice e Bearman (2001). Neste modelo, os autores propuseram que a internalização do ideal de magreza, a insatisfação corporal, a prática de dietas restritivas e os sintomas de transtornos alimentares exerceriam influência sobre aumentos subsequentes nos sintomas depressivos. Estas relações foram comprovadas entre uma amostra de meninas, com idade entre 13 e 17 anos.

Estudos como estes demonstram a relevância dos componentes da Imagem Corporal na determinação do bem-estar psicológico, além da etiologia dos transtornos alimentares. No entanto, pouco se sabe sobre a direção e a precedência temporal destes fenômenos em relação à insatisfação corporal (Paxton et al., 2006; Tiggemann, 2005). Sabe-se, em contrapartida, que estes se configuram como importantes temas para a elaboração de programas de prevenção dos transtornos de Imagem Corporal (O’Dea & Yager, 2011).

3.4 ELABORAÇÃO DE PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DOS TRANSTORNOS

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