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A IMAGEM CORPORAL DE ADOLESCENTES

No documento anacarolinasoaresamaral (páginas 32-37)

Anexo XXI Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa

3.2 A IMAGEM CORPORAL DE ADOLESCENTES

A adolescência é definida pela Organização Mundial de Saúde, em termos de idade cronológica, entre 10 e 19 anos de idade (World Health Organization [WHO], 2005). Pode-se entender a adolescência como um período de mudanças e ajustamento das capacidades do sujeito, tanto no aspecto produtivo quanto reprodutivo (Kanauth & Gonçalves, 2006). Além disso, as mudanças corporais advindas da puberdade apresentam implicações biológicas e, principalmente psicológicas, as quais podem alterar a forma como o adolescente se relaciona com seu próprio corpo (Campagna & Souza, 2006; Wertheim & Paxton, 2011). Neste sentido, alguns autores afirmam que a adolescência é a fase mais importante para a estruturação da Imagem Corporal (Conti, 2008), pois é nela que o sujeito consolida a formação de sua personalidade e de sua identidade corporal (Tavares, 2003).

Em adição, é importante compreender as particularidades que afetam meninos e meninas nesta faixa etária. Entre as meninas, a maturação sexual se manifesta, entre outras características, pelo aumento do depósito de gordura em áreas como quadris e seios, além do aparecimento de acnes e pelos corporais (Wertheim & Paxton, 2011). Assim, pode-se dizer que as mudanças corporais, características desta fase do desenvolvimento, fazem com que as meninas se afastem do ideal de corpo magro tido como padrão de beleza (Knauss, Paxton, & Alsaker, 2007), fazendo com que este grupo seja mais susceptível ao desenvolvimento da insatisfação corporal do que em outras fases da vida. Segundo Wertheim e Paxton (2011), a insatisfação corporal se

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manifesta, nas meninas, não só em relação ao peso e à forma do corpo, mas também nas características faciais, na aparência da pele, na tonicidade da musculatura e na força.

Muitos podem ser os motivadores e mantenedores desta insatisfação entre as meninas. Pesquisadores têm destacado o papel da mídia, dos pais e dos amigos neste processo, destacando que as meninas associam a magreza à felicidade, saúde, boa aparência, além de sucesso e maior chance de relacionamento amoroso (Wertheim, Paxton, & Blaney, 2009). Em função deste descontentamento com o próprio corpo, muitas meninas engajam em comportamentos alimentares direcionados à perda de peso, bem como prática excessiva de exercícios físicos, autoindução de vômitos e uso de diuréticos e laxantes (Miranda, Neves, Amaral, & Ferreira, 2014).

Neste sentido, em estudo realizado com 641 adolescentes de 10 a 17 anos do município de Saudades (SC, Brasil), Petroski, Pelegrini e Glaner (2012) verificaram que não houve diferença entre os motivos para insatisfação corporal entre meninos e meninas, sendo estes representados principalmente pela estética e a autoestima. Já a influência dessa insatisfação na adoção de comportamentos insalubres é evidenciada no estudo de Fortes, Amaral, Almeida e Ferreira (2013a), que verificaram que a insatisfação corporal, o grau de comprometimento psicológico ao exercício, além do IMC e do percentual de gordura, modularam a restrição alimentar e a preocupação com a aparência corporal tanto entre meninas quanto entre os meninos.

Apesar de a maior parte dos estudos destinados a investigar a Imagem Corporal de adolescentes possuir caráter transversal, os estudos longitudinais já realizados indicam certa estabilidade das preocupações com o corpo entre meninas ao longo do tempo, especialmente para as mais velhas (Wertheim et al., 2009). No estudo de Davison, Markey e Birch (2003), os autores verificaram correlações significantes na insatisfação corporal de meninas em dois pontos no tempo, sendo que a força desta associação foi tanto maior quanto maior a idade, indicando que a insatisfação corporal parece ser particularmente estável em meninas adolescentes. Em oposição a estes resultados, os autores de um estudo realizado com adolescentes brasileiras encontraram um aumento da insatisfação corporal ao longo de um ano, apontando para a não estabilidade deste construto (Fortes, Conti, Almeida, & Ferreira, 2013). Alguns pesquisadores questionam, portanto, se esta estabilidade verificada em algumas pesquisas não seria influência de certo viés de resposta em função das medidas repetidas (Wertheim et al., 2009), indicando a necessidade de maiores investigações das mudanças na Imagem Corporal, a partir de delineamentos longitudinais.

Em oposição ao notado entre as meninas, o desenvolvimento característico da puberdade é, usualmente, uma experiência positiva para os meninos, na medida em que os mesmos se aproximam do ideal corporal estabelecido para os homens (Ricciardelli & McCabe, 2011). Para eles, a adolescência se caracteriza pelo aumento da massa muscular e o crescimento em estatura

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(Papalia, Olds, & Feldman, 2008). Entre os aspectos relacionados à insatisfação corporal entre os meninos, Ricciardelli e McCabe (2011) destacam a busca pela muscularidade (aumento da massa magra), além de aspectos relacionados à performance esportiva, como força, velocidade e resistência.

Pesquisadores, tais como Ricciardelli, McCabe, Mussap, e Holt (2009) e Cafri et al. (2005) têm verificado a associação da insatisfação corporal de meninos a diversos comportamentos deletérios à saúde, como baixa autoestima, depressão, transtornos alimentares, dismorfia corporal e uso de suplementos e esteroides.

Um achado bastante consolidado, na literatura, é de que as meninas apresentam maior insatisfação corporal que seus pares do sexo masculino, independentemente da idade. Pesquisas em diversas realidades culturais, inclusive a brasileira, têm corroborado estes resultados, revelando índices elevados de insatisfação corporal entre meninas na faixa etária da adolescência. Laus, Miranda, Almeida, Costa e Ferreira (2012) identificaram, em seu estudo com adolescentes de diferentes cidades brasileiras, que a preocupação com a aparência foi mais prevalente entre meninas, especialmente aquelas com sobrepeso. Nesta mesma direção, Dumith et al. (2012), em seu estudo populacional na cidade de Pelotas (RS), verificaram índices de insatisfação corporal de 65,6% e 51% para meninas e meninos, respectivamente.

Entretanto, um aspecto relevante no que diz respeito à avaliação da Imagem Corporal, entre meninos, é a utilização de instrumentos suficientemente sensíveis para detectar as preocupações masculinas (Ricciardelli & McCabe, 2011). A maior parte das medidas utilizadas, atualmente, ainda se limita a avaliar aspectos particulares da insatisfação corporal feminina, como a preocupação com o peso e a forma do corpo direcionada à magreza, o que pode fornecer resultados irreais em relação à depreciação corporal entre os meninos (Cafri & Thompson, 2004; Smolak & Stein, 2010).

Assim, uma tendência importante nas pesquisas é a verificação dos componentes da Imagem Corporal de forma completa, buscando esclarecer os aspectos mais fortemente relacionados à insatisfação corporal na adolescência, em ambos os sexos. Em estudo realizado com adolescentes suíços, meninos e meninas, Knauss et al. (2007) verificaram que a internalização do ideal de magreza, a pressão social da mídia e o índice de massa corporal predisseram a insatisfação corporal, tanto entre meninos quanto entre meninas, mas as forças destas associações foram diferentes. Enquanto, entre as meninas, a internalização se mostrou o preditor mais forte, entre os meninos este foi representado pela pressão. Estes achados sugerem, ainda, a importância de se avaliar aspectos específicos da satisfação corporal para meninos e meninas, a despeito de mascarar os resultados reais.

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Na tentativa de explicar o desenvolvimento da insatisfação corporal entre adolescentes, Thompson, Heinberg, Altabe e Tuntleff-Dunn (1999) propuseram o Modelo de Influência dos Três Fatores1, segundo o qual existem três fontes primárias que influenciam a construção da Imagem Corporal: os pais, os amigos e a mídia. Inicialmente, este modelo foi proposto apenas para a população feminina, tendo como aspectos mediadores a comparação social e a internalização do ideal de magreza (Figura 2). No estudo de Shroff e Thompson (2006), os autores avaliaram a aplicabilidade deste modelo para uma amostra de meninas adolescentes e verificaram que as influências dos amigos e da mídia foram mais importantes para a amostra estudada que a influência dos pais.

Figura 2. Modelo de Influência dos Três Fatores. Adaptado de Thompson et al. (1999). Tradução: a autora.

Uma versão modificada deste modelo foi proposta por Smolak, Murnen e Thompson (2005) para adolescentes do sexo masculino, na qual a adoção de técnicas para o aumento muscular foi inserida como variável dependente. Os resultados indicaram que pais, amigos e mídia influenciaram a adoção destas estratégias de forma independente e, também, a partir da mediação da comparação social. Estes resultados apontam para a validade do modelo também para meninos, a partir da alteração da direção da insatisfação: da magreza para a muscularidade.

No que diz respeito às fontes de influência, os pais atuam de maneira direta, através de comentários relacionados à aparência, provocações e críticas, ou pela pressão para que o filho

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modifique seu corpo; ou indireta, pela aprendizagem e modelagem de comportamentos e preocupações com o corpo (Amaral, Carvalho, & Ferreira, 2014; Thompson, Schaefer, & Menzel, 2012). Para alguns autores, a criança, ao nascer, é introduzida em um meio social com características próprias e valores sobre beleza e atratividade física bem definidos, sendo, portanto, influenciada por esse contexto a assimilar estes conceitos (Kearney-Cooke, 2002). Neste sentido, Wertheim, Martin, Prior, Sanson e Smart (2002) verificaram que o encorajamento da prática de dietas, pelos pais, está relacionado ao aumento da insatisfação corporal e da busca pela magreza entre as filhas, independente do índice de massa corporal. Nesta mesma pesquisa, 25% dos pais relataram encorajarem seus filhos a perder peso.

De forma semelhante, os amigos possuem um impacto relevante na internalização dos ideais de beleza, particularmente na adolescência (Thompson et al., 2012). Jones (2011) e Tantleff- Dunn e Gokee (2002) destacam as críticas, a provocação e a ridicularização, por parte do grupo de amigos, como uma importante ferramenta de internalização das mensagens sobre o peso e a forma corporais, durante esta fase da vida. Estudo de Jones, Vigfusdottir e Lee (2004) apontou que as conversas sobre a aparência e as críticas dos amigos foram significativamente relacionadas à internalização entre meninos e meninas adolescentes.

A mídia, por sua vez, é considerada o principal fator de influência sociocultural sobre a insatisfação corporal. Estudos transversais e prospectivos são enfáticos ao apontar a importância da mídia na determinação da internalização do ideal de magreza/muscular e, consequentemente, da insatisfação com a aparência (Barlett, Vowels, & Saucier, 2008; Hausenblas et al., 2013; Kerry et al., 2004). Thompson et al. (2012) destacam que as mensagens da mídia permeiam o mundo contemporâneo de formas diversas, como revistas, televisão, internet, filmes, livros, propagandas, entre outras. Segundo estes autores, estas fontes propagam um ideal de beleza magro para as mulheres e delgado e musculoso para os homens, além de enfatizar a necessidade de alcançar este ideal através de dietas, exercícios e produtos de beleza.

Buscando avaliar esta influência sociocultural na construção da Imagem Corporal, Conti, Bertolin e Peres (2010), em estudo realizado com adolescentes brasileiros, utilizando como instrumento uma entrevista semi-estruturada, verificaram que os participantes relataram uma associação negativa entre a mídia e o corpo, sendo destacada a cobrança por um tipo físico ideal como a principal manifestação desta relação. Em concordância com estes resultados, Fortes, Amaral, Almeida e Ferreira (2013b) encontraram associação positiva entre a insatisfação corporal e a internalização do ideal de magreza, entre meninas brasileiras, indicando que quanto maior a insatisfação corporal maior, também, a influência sociocultural.

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Ao contrário dos aspectos relacionados à depreciação do próprio corpo, as investigações acerca da Imagem Corporal positiva são escassas entre a população adolescente. A esse respeito, os estudos entre adolescentes têm encontrado alguns desafios, como as formas de avaliação deste construto. Segundo Halliwell (2015), as influências do processo de desenvolvimento sobre a Imagem Corporal positiva têm sido examinadas apenas em estudos transversais. Além disso, as pesquisas sobre aspectos negativos da Imagem Corporal, como a insatisfação, indicam que a força e a direção das relações causais podem variar em função do estágio de desenvolvimento, sendo que o mesmo pode ocorrer para a apreciação corporal (Halliwell, 2015).

Segundo Tiggemann (2015), meninas adolescentes com Imagem Corporal positiva são mais propensas a se envolverem em atividades físicas prazerosas, sem razões baseadas na aparência. Para Tylka (2011), o processo mais importante envolvido na promoção e manutenção de uma Imagem Corporal positiva entre as adolescentes são os “filtros de proteção”, pelos quais a informação sobre o corpo é interpretada de forma a proteger a si mesmo, deixando de fora informações negativas que seriam potencialmente prejudiciais à Imagem Corporal.

Poucos são os estudos focados neste construto, entre os meninos, os quais têm demonstrado que a Imagem Corporal positiva está relacionada ao bem-estar psicológico também entre o público masculino (Tiggemann, 2015). Em diferentes populações, tem sido verificada que a apreciação corporal entre os homens é maior que entre as mulheres (Lobera & Rios, 2011; Swami, Stieger, Haubner, & Voracek, 2008; Tylka, 2013), inclusive entre adultos brasileiros (Swami et al., 2011).

Independente do sexo e do gênero (McArdle & Hill, 2009), o componente atitudinal da Imagem Corporal demonstra-se relacionado a alguns aspectos associados, especialmente a ocorrência de sintomas de transtornos alimentares e da depressão, bem como baixa autoestima. As relações entre estes fenômenos serão discutidas no tópico a seguir.

3.3 ASPECTOS ASSOCIADOS: TRANSTORNOS ALIMENTARES, AUTOESTIMA E

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