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2.2 Elementos de marketing da estratégia de marcas próprias

2.2.6 Aspectos do canal de distribuição

A utilização de marcas próprias possui implicações estratégicas que impactam os relacionamentos no canal de distribuição. Uma vez que os canais de distribuição constituem uma rede organizada de agências e instituições combinadas, que desempenham as atividades mercadológicas necessárias para ligar produtores e usuários (BERMAN, 1996), as políticas e estratégias de marca dos participantes do canal, sobretudo relativas às marcas de fabricantes e às marcas próprias de distribuidor (atacadista ou varejista), consistem em uma área crítica de decisão no canal de distribuição (BOWERSOX; COOPER, 1992).

Segundo Garretson et al. (2002), a relação entre fabricantes e distribuidores pode ser caracterizada como de dependência mútua e de constante luta pelo controle do canal. Esta disputa cria relações conturbadas entre as partes, pois ao mesmo tempo em que um precisa do outro, simultaneamente eles competem para maximizar seus lucros. A competição entre fabricantes e distribuidores impulsionada pela disputa entre marca nacional e marca própria pode criar problemas no canal de distribuição (SHOCKER; SRIVASTAVA; RUEKERT, 1994; ROSENBLOOM, 2002). É comum atribuir-se à disputa de marcas a razão para alguns conflitos dentro do canal (BOWERSOX; COOPER, 1992).

A competição com as marcas próprias está assustando muitos fabricantes de marcas tradicionais (KOTLER; KELLER, 2006). Essa disputa está obrigando alguns fabricantes de marcas nacionais a concentrarem-se em mercados-alvo nos quais as marcas próprias não competem (SHOCKER; SRIVASTAVA; RUEKERT, 1994). Além disso, alguns fabricantes de marcas líderes de mercado passaram a adotar ações mercadológicas a fim de recuperar o espaço no ponto-de-venda e a parcela de mercado que foram perdidos (TOILLIER, 2003); embora grande parte dessas ações dos fabricantes, principalmente em comunicação, ainda não apresentam bons resultados (VERHOEF; NIJSSEN; SLOOT, 2002). De acordo com Steiner (2004) a disputa entre as marcas próprias e as marcas de fabricantes está baseada nos seguintes elementos: preço, espaço na gôndola do ponto-de-venda, qualidade, inovação como um elemento de diferenciação e propaganda.

Contudo, existe uma implicação desfavorável ao distribuidor nesta disputa. As marcas próprias são de propriedade e controle dos distribuidores mas, em sua maioria, não são produzidas por eles. Isto significa que os distribuidores precisam de fabricantes que estejam dispostos a fornecer produtos para as marcas próprias. Como reflexo das divergências estratégicas, alguns fabricantes não encontram muitas vantagens e se recusam a fabricar

produtos com a marca do distribuidor (BOWERSOX; COOPER, 1992). São casos em que a empresa prefere manter a força de suas marcas e não introduzir nenhum produto que possa diluir suas posições de mercado (SPINELLI; GIRALDI, 2004). As marcas próprias são vistas como uma ameaça por alguns fabricantes, uma vez que disputam espaço no ponto-de-venda, a preferência do consumidor e, conseqüentemente, a participação de mercado (SOUZA; NEMER, 1993; HOCH, 1996; TOILLIER, 2003).

Entretanto, a constante evolução das marcas próprias, revela que muitos fabricantes encontram vantagens no fornecimento de produtos com a marca do distribuidor, tais como: reduzidas despesas de marketing (em alguns casos, a níveis próximos de zero), vendas e distribuição; o fabricante é “anônimo” (com exceções, pois é possível encontrar dados sobre o fabricante no rótulo do produto); permite redução de capacidade ociosa da fábrica; volume de produção/vendas assegurado por prazo definido; presença em número maior de clientes, com possibilidade de entrada em novos mercados não explorados ou de difícil acesso; e geralmente é um negócio lucrativo com risco reduzido (SOUZA; NEMER, 1993; TOILLIER, 2003; YOKOYAMA, 2010).

As vantagens obtidas pelos fabricantes, não necessariamente consistem em desvantagens para os distribuidores (salvo algumas exceções). Desta forma, o relacionamento atual entre fabricante de marca própria e distribuidor, é caracterizado por poucas divergências e acordos contratuais (VELOSO, 2004). Alguns fabricantes aprenderam a coexistir como fornecedores de grandes distribuidores (McGOLDRICK, 2005). A aquisição dos produtos de marca própria deixou de ser um problema no canal de distribuição e passou a ser visto pelos distribuidores como atividade estratégica tão importante quanto o gerenciamento dos outros elementos de marketing.

Assim, a compra/desenvolvimento dos produtos de marcas próprias é atividade essencial para o sucesso da estratégia (ROSENBRÖIJER, 2001). Para alguns atacadistas brasileiros, o processo de aquisição desses produtos possui o status de “função-chave” da estratégia, uma vez que os atacadistas possuem experiência no desempenho dessa função; pois, a negociação e compra de grandes lotes da indústria fazem parte de suas competências centrais (RIEMERS, 1998). Assim, os acordos de prazo de entrega, volume e preço, estão firmados em contratos comerciais (TOILLIER, 2003), nos quais também estão determinadas cláusulas específicas para o desenvolvimento das marcas próprias.16

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16 É interessante destacar que o estudo de Paula (2008) identificou a inexistência de contratos comerciais formais entre fabricantes de marcas prórprias e varejistas ingleses. Na Inglaterra, os acordos de fornecimento de marcas próprias se baseiam em relações de confiança entre os agentes.

Nesse sentido, Morton e Zettelmeyer (2004) afirmam que o poder exercido sobre a decisão de posicionamento permite aos distribuidores negociarem com os fabricantes de marcas próprias alguns termos do contrato de fornecimento das marcas nacionais. Segundo os autores, a pressão sobre alguns fabricantes de marcas tradicionais resulta em implicações estratégicas que determinam a maneira como os distribuidores negociam o posicionamento das marcas próprias em relação às marcas dos fabricantes-fornecedores.17 Nesse caso, os fornecedores habitualmente posicionam suas marcas pouco acima das marcas próprias; muitas vezes, em posições que concorrem diretamente com a percepção de valor de marcas líderes de mercado; ou um pouco abaixo (quando a marca própria almeja uma posição premium).

Contudo, eventualmente as marcas próprias podem concorrer com as marcas dos fabricantes-fornecedores18. Porém, essa competição é natural e inerente à dinâmica do mercado, porque qualquer marca de uma empresa, fabricante ou distribuidor, pode posicionar marcas que gerem percepção de valor similar no mesmo mercado-alvo. Além disso, Toillier (2003) afirma que muitos fabricantes concordam em produzir marcas próprias visando eliminar concorrentes, pois, caso um fabricante opte por não produzir esses produtos, provavelmente algum concorrente irá fabricá-los.

Normalmente, os fornecedores de marcas próprias querem manter acordos de fornecimento de longo prazo, pois eles precisam arcar com custos de desenvolvimento de produtos, embalagens e de ajustes na linha de produção (YOKOYAMA, 2010). Por conseqüência, também é importante para os distribuidores um acordo de longo prazo, uma vez que a continuidade da relação é uma maneira de manter o nível de qualidade dos produtos (BLYTHE; ZIMMERMAN, 2005). A preocupação com o nível de qualidade é um aspecto crítico da estratégia, pois coloca em jogo a imagem e a credibilidade dos distribuidores. Destaca-se a existência de forte dependência entre atacadista distribuidor e fabricante; afinal, problemas na produção afetam a disponibilidade do produto (confiabilidade) na prateleira (SOUZA; NEMER, 1993; SULLIVAN; ADCOCK, 2002) e, consequentemente, a imagem da marca junto ao cliente varejista e ao consumidor final.

Segundo Rosenbloom (2002) e Paula (2008) a gestão do canal de distribuição deve envolver a construção de relacionamentos viáveis, à base de cooperação entre os agentes, para que cada um deles alcance seus objetivos de distribuição. Principalmente por _____________________

17 Muitas vezes, essa negociação não existe, pois alguns fornecedores de marcas próprias são especializados e não possuem marca de fabricante (KUMAR; STEENKAMP, 2008; YOKOYAMA, 2010).

18 Com frequência, alguns produtos comercializados com marca própria do distribuidor recebem modificações apenas na embalagem, ou seja, o produto mantém-se idêntico ao distribuído com a marca do fabricante que, neste caso, também é o fornecedor da marca própria (YOKOYAMA, 2010).

envolver diferentes organizações, com objetivos, interesses, metas e expectativas diferentes, a viabilidade de um canal de distribuição eficiente depende diretamente de negociação e cooperação entre os agentes. Nesse sentido, alguns atacadistas brasileiros apontam para a necessidade de construção de uma “joint venture” da marca própria (PIATO, 2006), no qual o fabricante e o atacadista atuam de forma conjunta e coordenada para garantir a qualidade e o bom desempenho dos produtos de marcas próprias.

Os agentes do canal de distribuição precisam reconhecer a relação de dependência que se forma entre os negócios, principalmente no caso das marcas próprias, onde o fornecedor/fabricante, atacadista e varejista estreitam ainda mais essa relação. Para tanto, é essencial a existência de situações do tipo ganha-ganha, com metas compartilhadas, na qual o ideal é que todos venham a colher juntos os resultados da estratégia. Assim, a estratégia de marcas próprias dos atacadistas distribuidores necessita relacionamentos de parceria tanto com fornecedores, fundamentais no desenvolvimento do produto entre outros aspectos, quanto com os clientes varejistas responsáveis por parte do gerenciamento do produto/marca no ponto-de-venda.

Nesse sentido, os próximos tópicos iniciam outro pilar de discussão, no qual são apresentadas algumas características dos agentes atacadistas e varejistas, bem como os aspectos do relacionamento comum entre eles e em função da estratégia de marcas próprias. Primeiramente, são apresentadas as características estruturais e funcionais de cada setor, para que sejam destacadas as atividades e o tipo/formato de atacadista e varejista que esta pesquisa considerou como agentes de análise. Essa caracterização é essencial para delimitar a análise.