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A resistência de um hospedeiro contra uma infecção depende de uma complexa interação entre mecanismos imunes inatos e adquiridos.

O sistema imune inato atua na primeira linha de defesa do organismo, controlando a infecção até que a imunidade adaptativa ou adquirida seja estabelecida. Portanto, a indução dos mecanismos que caracterizam a imunidade inata independe do contato prévio do indivíduo com o patógeno, indicando que sua ativação é mediada por moléculas co (61)nservadas entre as diferentes espécies ou cepa do microorganismo (62). Os macrófagos, as células natural killer (NK), as células dendríticas (CDs) e as células T γδ são apontadas como os mais importantes componentes da imunidade inata (62). No entanto, fatores genéticos relacionados ao hospedeiro vertebrado, tais como anemia falciforme, deficiência da glicose 6 fosfato desidrogenase (G6PD), talassemias e antígenos de grupo sanguíneo contribuem parcial ou totalmente para a proteção do indivíduo contra a infecção (63).

A imunidade adquirida contra os estágios sanguíneos do Plasmodium envolve dois mecanismos: a resposta imune humoral e a resposta imune mediada por células.

A peça-chave para o entendimento da imunidade adquirida contra o plasmódio pode nos levar a uma vacina protetora contra a malária, ou contra a malária grave. Este fato faz que muitos grupos de pesquisa no mundo inteiro tentem entender como é dada a resposta contra o plasmódio. Existem vários estudos focados no entendimento desta resposta utilizando modelos, cepas de laboratório ou estudos extensivos com isolados de campo, este último é dado em maior concentração em isolados africanos.

Durante o ciclo de vida sanguíneo do parasito ele exporta uma série de proteínas variantes na superfície da hemácia infectada (VSA - variant surface antigens) que ficam expostas ao sistema imune do hospedeiro. Agindo contra estes antígenos, os anticorpos são as principais moléculas responsáveis pela imunidade adquirida contra os estágios sanguíneos do Plasmodium (64). Os anticorpos são produzidos por linfócitos B ativados, podendo atuar promovendo distintos mecanismos, como a fagocitose do EI e o bloqueio da invasão do eritrócitos por merozoítos (65;66). Anticorpos específicos dirigidos contra a PfEMP1, expressa na superfície dos eritrócitos infectados, podem interferir no processo de citoaderência, protegendo o hospedeiro contra a forma grave da infecção (67). Estas moléculas podem ainda reconhecer moléculas expressas exclusivamente na superfície de gametócitos, interferindo no desenvolvimento do parasito no mosquito vetor (68). Em virtude dessas observações, discute-se atualmente a possibilidade de se sintetizar anticorpos com propósito terapêutico ou vacinal (69).

Moradores de áreas endêmicas adquirem proteção contra os sintomas da malária ao longo dos anos e isto intensifica a busca por padrões que possam ser reconhecidos e utilizados como base para uma vacina anti-malárica. Uma das evidências para a resposta imune adquirida é que a maior parcela de mortes acometidas por esta parasitose acontece nos primeiros anos de vida, com o passar dos anos é muito raro a malária levar a óbito (70).

No primeiro semestre de vida, crianças recém-nascidas possuem dois fatores que podem contribuir com a ausência da infecção por malária: 1) a mãe pode transmitir passivamente anticorpos protetores do tipo IgG para o recém-nascido (71;72); 2) o fator cultural, onde o cuidado com o recém-nascido geralmente é muito intenso, evitando que este seja picado pelo mosquito, impedindo que este lhe transmita a doença.

No entanto, em áreas de altas taxas de transmissão e a partir dos seis meses de idades até os cinco anos crianças estão sujeitas a um grande número de infecções com o desenvolvimento do quadro clínico e eventualmente infecções letais.

Os sintomas clínicos durante a infecção malária ocorrem durante o ciclo eritrocitário do parasita. No início os sintomas podem ser confundidos com um resfriado, no entanto no quadro malárico as febres que acometem o doente são cíclicas. Sendo assim, os primeiros sintomas são febre, dores de cabeça e no corpo, fadiga, sudorese, calafrios, náuseas, vômito e vertigem. No caso da infecção por P. falciparum, a falta de tratamento pode levar a manifestações mais graves da doença, onde podem ocorrer complicações no cérebro, rim, pulmão e anemia grave. No Brasil, em um estudo recente em área endêmica mostrou que os sintomas mais freqüentes são dores de cabeça, febres e mialgia (73).

Após múltiplas infecções o indivíduo pode adquirir imunidade e não mais manifestar os sintomas clínicos da doença, mesmo na presença do parasita. Acredita-se que a diminuição dos sintomas clínicos possa ser devido a anticorpos contra os estágios eritrocitários do parasita, uma vez que é nesta fase que os sintomas clínicos se manifestam (70).

É consenso que anticorpos são um fator decisivo na imunidade adquirida. Já nos anos 1920, foi observada uma proteção de indivíduos suscetíveis pela transfusão de soro de pessoas semi-imunes. Antes do advento dos antibióticos, a infecção por malária havia sido utilizada no tratamento de neurosífilis (74;75), e foi a partir destes estudos que surgiram as primeiras evidências de que a imunidade contra a malária era espécie e cepa específica (74;75). Hoje sabemos que é devido à diversidade de variantes antigênicos de superfície (VSA - variant surface antigens) o qual pode ser completamente variável entre cepas circulantes em diferentes regiões (76).

Indivíduos infectados, mas sem manifestações de sintomas clínicos, possuem um vasto repertório anti-VSA, existindo uma correlação positiva entre positividade para o parasita e reconhecimento de VSAs, embora apenas a presença do parasita não possa ser associada à proteção contra sintomas de malárias subseqüentes (77). Crianças as quais tiveram malária grave adquirem imunidade logo após poucas infecções, tornando-se parcialmente imune logo nos primeiros anos de vida. Ao contrário, crianças que apenas

tiveram malária moderada (não-complicada) levam mais tempo para adquirir o mesmo grau de imunidade (76).

Jovens e adultos moradores de área endêmica, mesmo em constante contato com o agente infectante raramente ficam doentes devido à infecção malária (78). Isto não significa dizer que a imunidade é esterilizante, ela é apenas parcial, onde os sintomas observados vão aos poucos diminuindo, e por vezes até mesmo desaparecendo por completo. Em alguns casos, apenas testes mais sensíveis, como o PCR, podem confirmar a presença do parasita (79).

Embora com o passar todo tempo, moradores de área endêmica tendem a apresentar menos sintomas relacionados a esta patologia, um caso muito particular acontece durante a gravidez. Mulheres nas primeiras gestações podem desenvolver um quadro grave denominado malária gestacional. Embora a gestante possa ter passado anos sem sentir os sintomas da doença durante sucessivas infecções maláricas, durante a gravidez, e em particular na primeira e segunda gestação, é comum o desenvolvimento de quadro clínico. Contudo após a segunda gestação, a mulher já possui anticorpos contra estes variantes, e em uma nova gestação, caso a pessoa seja infectada com o parasita, este não deve mais representar um grande problema para a gestação (80).