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3. CAPÍTULO EMBASAMENTOS E REFLEXÕES TEÓRICAS

3.1. Aspectos históricos da Educação do Campo

A educação rural segue uma agenda externa às políticas educacionais do país e a Educação do Campo33 em contra ponto a educação rural, busca instituir-se como um novo paradigma educacional em construção. Rocha (2009) corrobora essa dualidade afirmando que existem dois projetos de educação para o meio rural: a escolarização rural e a Educação do Campo, ambos com configurações bem definidas e diferenciadas na composição do debate nacional.

A educação rural é entendida apenas como um processo de escolarização, praticado sobre os moldes e especificidades dos centros urbanos (GAIA, 2009). Segundo Henriques et all (2007), concepções errôneas a respeito das implementações de políticas públicas para a educação rural contribuíram por longo período histórico para a negação e a exclusão da educação escolar de qualidade para as regiões rurais brasileiras.

Uma das primeiras manifestações de políticas de governo34 para a educação rural foi a partir da década de 1960. Do ponto de vista da Didática da Matemática se dá inicialmente no nível da sociedade e da escola. Visava apenas atender as demandas do processo de industrialização com enfoque curricular para a formação tecnicista. Neste projeto de escolarização o Homem do Campo não era contemplado sob nenhuma forma de oferta de educação com o direcionamento de políticas públicas para o seu desenvolvimento social e educacional. Então atender às necessidades reais dos camponeses foi uma bandeira específica dos movimentos sociais, principalmente, na década de 1980/1990. Estas organizações da sociedade civil, tendo resistido ao processo de ditadura militar, conseguiram incluir a Educação do Campo na pauta dos temas estratégicos para a redemocratização do país.

A partir da década de 1980, com a mobilização de movimentos sociais35 algumas ações são fortalecidas, como o requerimento de uma educação que superasse e transformasse o instituído. Essa mobilização levaria em consideração

33 Para

aprofundamento, C.f.: Volumes ―Por uma Educação Básica do Campo‖ da Editora Vozes e Roseli Caldart; Isabel Pereira; Paulo Alentejano; Gaudêncio Frigotto (org.): Dicionário da Educação do Campo. Expressão Popular, São Paulo, (2012).

34 Entende-se aqui por ―políticas de governo‖: programas e projetos de caráter meramente transitórios

e eleitoreiros, geralmente sua vida útil termina quando acaba um mandato político, não possui nível de mudança e desenvolvimento social democraticamente desejado é o oposto de ―políticas de Estado‖.

35 Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Atingidos por

as práticas socioculturais do campo pautadas em uma educação voltada ao contexto campesino e suas relações com os saberes e valores de suas práticas sociais.

Nos anos seguintes, ações educativas promovidas por organizações sociais36 destacaram-se como movimentos de ação educativa que irão culminar em diretrizes incluídas na LDB 9394/96 em complemento à Constituição de 1988, prevendo uma base comum e adequação no calendário escolar às peculiaridades da vida rural (BRASIL, 1998).

Em julho de 1998 entidades dos movimentos sociais organizam a 1ª Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo. O evento compôs uma agenda de ações reivindicativas e de engajamento dos sujeitos, inspirados na educação popular de Paulo Freire, consagra uma nova fase para o debate e mobilização por uma EC.

O intervalo entre a primeira (1998) e a segunda (2004) Conferência significou a continuidade da mobilização iniciada. Entre as principais conquistas estão à consolidação de diretrizes e legislações37 que preconizam princípios educacionais desejados.

No estado do Pará, ecoam-se reivindicações oriundas de organizações envolvendo a sociedade civil, movimentos sociais, estudiosos do assunto das universidades públicas. Deste contexto, destacam-se importantes marcos históricos38 instituindo os moldes fundamentais da Educação do Campo.

36 Como o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), da Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Confederação dos Trabalhadores nas Indústrias (CONTAG) e do Movimento Eclesial de Base. Em 1998 e 2004 são realizadas duas conferências nacionais por uma Educação Básica do Campo. Que resultou na instituição do Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária (PRONERA). Uma parceria estratégica entre governo e instituições de ensino superior e movimentos sociais do campo. 37

Destacam-se as indicações estabelecidas na LDB 9394/96, Artigo 28. A partir de 1999, o surgimento e desenvolvimento de instrumentos institucionais como: o Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável para Agricultura Familiar (Condraf); as diretrizes operacionais para a educação básica do campo brasileiro CNE em 2002. O Grupo Permanente de Trabalho de Educação do Campo (GPT) em 2003; a criação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), em 2004. A criação do Projovem Campo – Saberes da Terra, integrando à qualificação social e profissional, de jovens agricultores/as familiares em 2005. A Res. nº. 02 de 28/04/2008 da CNE/CEB, destacando o que dispõe o Capítulo IX da Resolução n° 003 de 02 de setembro de 2009 do CEE-PA sobre o atendimento da Educação Básica do Campo. O decreto presidencial Nº 7.352, de 4 de Novembro de 2010, que dispõe sobre a política de educação do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA.

38 O encontro Estadual realizado na Escola Agrotécnica Federal de Castanhal (EAFC), em Novembro de 2003; o I Seminário Estadual de Educação do Campo - UFRA - fevereiro de 2004; Implementação e pesquisas do Programa EDUCAMAZÔNIA – 2004 – 2008 da UFPA; o II Seminário Estadual de

Desde o processo inicial até os dias atuais, o contexto histórico de demarcação e conquista da territorialidade da Educação do Campo, teve seus desafios e enfrentamentos na tentativa de consolidar seus pressupostos políticos e pedagógicos para os CEFFAs. Essa busca parece postular e imprimir uma nova feição institucional e curricular do saber para as escolas do campo que se dá no nível da pedagogia.

Assim, o termo Educação do Campo surge não apenas como uma nova nomenclatura em substituição às práticas pedagógicas do modelo de educação rural, mas, como uma possibilidade que busca assumir, declarar e adotar em suas feições didáticas e pedagógicas uma abordagem mais ampla sobre educação nas dimensões familiar, afetiva e de trabalho, criando assim, a nosso ver seus habitus sociais institucionalizados. Cuja constituição do protagonismo dos sujeitos do campo brasileiro em suas organizações sociais são aspetos fundamentais para reconhecimento da instituição da coletividade e validação das práticas sociais que se realiza nas Etnocomunidades.

Entendemos que a CEPE pode ser caracterizada como um CEFFA, devido as suas características peculiares de um centro de formação que utiliza a pedagogia da alternância, como uma metodologia capaz de afeiçoar as práticas docentes. Delineada institucionalmente sob os moldes e princípios políticos e pedagógicos da Educação do Campo, como um centro de formação diferenciado das escolas rurais.

Do ponto de vista histórico podemos perceber que um dos fatores determinantes para instituir o paradigma da Educação do Campo se dá no direcionamento político e pedagógico que se desejam como processo de consolidação de uma educação básica (GAIA; GUERRA, 2014), tais fatores são delineados mediante um discurso e uma prática que justifique o acolhimento dessas praxeologias pelos sujeitos do campo e agentes institucionais como um habitus que segue na contramão do modelo de educação rural.

De acordo com Bourdieu (1983), estamos diante de um jogo de dominação e reprodução de valores. Esse jogo de dominação se caracteriza pela incorporação de Educação do Campo - Seminário Pio X – junho de 2005. o Portal da Educação do Campo do Pará 2007, http://www.educampoparaense.org; III Seminário Estadual de Educação do Campo - Seminário Pio X - Junho de 2007; I Seminário Estadual de Juventude do Campo - Seminário Pio X - Junho de 2007; I Encontro de Pesquisa em Educação do Campo do Estado do Pará – UFPA – Maio de 2008; em Janeiro de 2009.

uma determinada estrutura social pelos indivíduos, a qual irá influir seu modo de sentir, pensar e agir, de tal forma que se inclina a confirmá-la e reproduzi-la.

Nesse sentido, ―a perspectiva histórica, a interpenetração entre passado, presente (trajetória) e futuro (o devir) são dimensões constitutivas do habitus individual‖ (ARAÚJO; OLIVEIRA, 2014, p. 66). De acordo com os referidos autores a transmissão da herança cultural depende de um trabalho ativo realizado tanto pelos pais quanto pelos próprios filhos e que pode ou não ser bem-sucedido. Podemos inferir que a transmissão de herança sociocultural pode ocorrer na dialética entre uma instituição/grupo e uma pessoa/grupo em campos de práticas. Podemos tomar as práticas sociais que ocorrem no contexto da CEPE como exemplo dessa transmissão interinstitucional: as parcerias estabelecidas, valores educativos inculcados, as Práticas com Matemáticas mobilizando objetos que se ressignificam nas práticas da pesca e os aspectos políticos e pedagógicos acolhidos em seu habitat.