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Aspectos psicológicos da gestação

No documento Atencao Saude Da Gestante (páginas 50-52)

5. Formação de vínculo com a gestante e sua família e aspectos psicológicos da

5.2 Aspectos psicológicos da gestação

A compreensão sobre os sentimentos que permeiam a gestação, o parto e o puerpério é considerada uma habilidade essencial dos profissionais de saúde que assistem mulheres gestantes. O objetivo na aquisição deste conhecimento é de prevenir situações adversas, aliviar sintomas e facilitar a expressão e elaboração de sentimentos presentes durante um período de grandes transformações psíquicas (SARMENTO; SETÚBAL, 2003), ainda que, a forma como a gestante vive essas mudanças repercute intensamente na constituição da maternidade e na relação mãe-bebê (MALDONADO, 1997).

Considera-se, entretanto, que a constituição da maternidade é um processo que se inicia muito antes da gestação, partindo das relações estabelecidas e da identificação da menina como mulher, pela atividade lúdica infantil, pelo desejo de um dia ser mãe e pela gravidez em si. A maternagem relaciona- se ainda a aspectos transgeracionais e culturais, ou seja, na forma como a família e a sociedade percebem esta mulher gestante (PICCININI et al, 2008).

A seguir, serão descritos alguns aspectos psicológicos e sugestões de abordagem de acordo com a evolução da gestação, momento em que a mulher de filha passa também a ser mãe, revivendo suas experiências anteriores como filha, necessitando reajustar seu relacionamento conjugal atual, sua situação socioeconômica e suas atividades profissionais. “Os medos relacionados com a perda do bebê, da sua própria autonomia, contrastam e equilibram-se de algum modo com a alegria, o orgulho e o desejo de ser mãe” (SILVA; FIGUEIREDO, 2005).

Em busca desse equilíbrio, que nem sempre ocorre, é que devemos nós, profissionais de saúde, atuar. Conhecendo os sentimentos dos pais e proporcionando um espaço para que eles falem (e principalmente sejam escutados) estaremos mais próximos de atingir os objetivos de uma atenção pré- natal adequada.

No início da gestação predominam os sentimentos ambivalentes, toda a gestante tem dúvidas quanto a querer ou não essa nova condição que irá torná-la mãe irreversivelmente. A mulher busca, na primeira consulta de pré-natal, a confirmação de sua gestação e de suas condições para gestar. Sente- se insegura quanto a isso, quer certificar-se que o bebê está bem e, muitas vezes, tem medo de que ocorra um aborto. Assim, ela busca o serviço de saúde como um recurso que lhe dará apoio e tranqüilidade para superar e esclarecer suas dúvidas. O profissional deve reconhecer e compreender essa ambivalência sem julgamentos; valorizar sempre as queixas e dúvidas da gestante (evitando dizer apenas aquele “isso é normal”); deve procurar estabelecer uma relação de confiança, proporcionando um espaço para expressão, onde será possível conversar sobre todo o tipo de sentimento: tanto bom quanto ruim.

No segundo trimestre da gestação, a presença do bebê já é melhor percebida. Os movimentos do feto, a ausculta cardíaca, a visualização de sua imagem ecográfica, são constatações que favorecem essa percepção. A gestação passa então a representar um momento de desafio na preparação para um relacionamento a três e, ao mesmo tempo, na necessidade de manter o relacionamento com o companheiro, incluindo a sexualidade partilhada enquanto fonte de ligação emocional ao outro

FORMAÇÃO DE VÍNCULO COM A GESTANTE E SUA FAMÍLIA E ASPECTOS PSICOLÓGICOS DA GESTAÇÃO

(WIMMER-PUCHINGER, 1992, apud SILVA; FIGUEIREDO, 2005). Junto a essa demanda, o desejo, o interesse e a atividade sexual tendem a diminuir durante este período, podendo trazer tensões e várias dificuldades no relacionamento sexual com o cônjuge. A importância do profissional de saúde em estar atento a essas questões refere-se a informar acerca da flutuação normal da atividade sexual neste período; considerar possíveis sentimentos, receios e dificuldades que surgem com maior frequência a este nível e/ou, alertar para outras formas de experienciar a sexualidade de modo a diminuir o desconforto para a mulher, caso venha a existir (SILVA; FIGUEIREDO, 2005).

Gutfreind (2010), ao abordar de forma singular sobre a parentalidade, se refere ao período gestacional como um momento rico de idealização e sonho. Sonhar é sempre importante. No entanto, os pais também canalizam nesse momento, por intermédio do filho que virá, frustrações, principalmente as não historiadas/ditas/expressas, em prol da sua própria satisfação. Precisamos estar atentos para as diferenças entre esse bebê imaginado e o bebê real, que poderão vir acompanhadas de muita decepção, constituindo-se em “um abismo que cutuca o amor próprio e essencial para o desempenho no papel de pais” (GUTFREIND, 2010, p. 75), atrapalhando assim a relação dos pais com o filho. Por isso, nesse momento de gestação, torna-se importante ouvir, escutar, procurar entender os sentimentos – as histórias - expressos pelos pais, muitos vindos de longe, de suas próprias infâncias.

Segundo ainda Gutfreind, referindo-se ao processo da parentalidade:

A capacidade de elaborar esta crise depende do grau de narratividade desenvolvido ao longo da vida e, especialmente, em seus primórdios: quanto mais banhado de histórias e situado em sua própria, mais capacidade o bebê terá de levá-la a adiante na hora do solavanco” (2010, p. 47).

A narratividade, que inclui simbolização, criação, escolha e construção, é descrita pelo autor como mais um instrumento de resiliência.

Embora os sentimentos vão e voltem e não sejam divididos em “trimestres”, no terceiro trimestre da gestação a ansiedade costuma relacionar-se mais com o parto e sua imprevisibilidade, o medo da dor e o medo da morte. A mulher tem receio também que durante o trabalho de parto sua genitália seja dilacerada (que se “rasgue”) e que isso modifique sua feminilidade (SARMENTO; SETÚBAL, 2003), subsistindo então a ideia de irreversibilidade relativa à imagem corporal anterior à gravidez (SILVA; FIGUEIREDO, 2005).

A internação em si também preocupa a gestante pois o hospital é um ambiente desconhecido e “assustador”. Portanto, estimular uma visita prévia à maternidade poderá deixar a gestante mais segura e tranquila, minimizando a ansiedade (Ver no cap 15 como referenciar a gestante para uma visita ao HNSC).

Existem ainda, junto a todos esses sentimentos, preocupações em relação ao seu desempenho, a sua capacidade para exercer a maternidade e, principalmente com a saúde do bebê.

De uma maneira geral, recomenda-se ao profissional ouvir, escutar e evitar orientações excessivas, transmitir informações simples, claras e sempre de acordo com o interesse e individualidade de cada gestante (SARMENTO; SETÚBAL, 2003). No entanto, escutar com atenção e empatia, a cada

ATENÇÃO À SAÚDE DA GESTANTE EM APS

APOIO TÉCNICO EM MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE AÇÕES DE SAÚDE DO SERVIÇO DE SAÚDE COMUNITÁRIA

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dia parecem ser tarefas mais difíceis e, ao mesmo tempo, tão necessárias no pré-natal, que ocorre em meio à alta demanda ambulatorial e a uma pressa, digamos que coletiva.

5.3 Identificando gestantes que necessitam de cuidados adicionais

No documento Atencao Saude Da Gestante (páginas 50-52)