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5. Para além dos esbarrões produzir encontros: A construção do SUS em São Bernardo do Campo

5.1. Atenção especializada em SBC

A Atenção Especializada Ambulatorial no SUS, sem privilégio para nenhum município, manteve a estrutura de organização praticada no INAMPS e que continua sendo praticada pela rede privada: atuação médico-centrada (na verdade, quase que médico-exclusiva), sem integração com a Atenção Básica, com encaminhamentos muitas vezes solicitados “a pedido” do usuário e com “fidelização de clientela" (bem à La plano de saúde).

A atuação dos especialistas é, na maior parte dos lugares, restrita ao consultório, sem integração com os demais profissionais de saúde e, acima de tudo,

sem integração com outros pontos de atenção da rede de serviços. Os profissionais “não médicos”, igualmente especialistas (nutricionista, enfermeira, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, dentista, psicólogo, etc.), por sua vez, demandam cada vez mais espaços privativos de atendimento, igualmente sem integração com o que há dentro e fora do serviço ambulatorial especializado. Ou seja, não é um problema da atuação da profissão médica, mas da racionalidade medicalizante que fortalece a fragmentação e descontextualização do trabalho dos profissionais, muitas vezes marcada pela queixa-conduta. E a atenção especializada em São Bernardo do Campo, em 2009, não era diferente.

O Departamento de Atenção Básica Especializada (nome oficial da pasta) é composto por duas divisões: a Divisão Ambulatorial e a Divisão de Saúde Mental (que não será discutida aqui). A Divisão Ambulatorial ainda é dividida em seções: a Seção de Saúde Funcional e Auditiva, responsável pelos serviços de reabilitação e monitoramento dos contratos de prestadores de serviço nesta área e a Seção de Serviços de Apoio Diagnostico e Terapêutico, que é responsável pelo acompanhamento técnico dos prestadores de serviço em laboratório e imagem.

Nos primeiros anos de gestão do prefeito Luiz Marinho, tanto por decisão da gestão da Secretaria da Saúde como pelo desejo da população, expresso no Orçamento Participativo, houve um intenso investimento na melhoria da estrutura física de todas as Unidades Básicas de Saúde e a implantação das UPAS, bem como a ampliação da cobertura destes serviços e implantação do SAMU. Esta decisão, naquele momento, fazia muito sentido, dadas as condições da rede de saúde do município. Estruturar a atenção especializada sem antes estruturar a atenção básica significaria ampliar as filas, com tempo de espera muito grande e aumento da sensação de “descuidado”. Além da reformulação da estrutura física, foram feitos muitos investimentos na produção ativa de rede, na construção de espaços e dispositivos que favorecessem o encontro e o compartilhamento do cuidado.

Dentre esses investimentos, destaco a implantação da estratégia de apoiadores em saúde, divididos por território. Esse foi um investimento que não se pode categorizar como de estrutura, que é o mais comum ao se falar de investimento, mas na ampliação da capacidade de conexão, de costura de rede. Os

apoiadores foram um dispositivo para isso e ajudaram a impulsionar a mobilização pelo e para o cuidado, favorecendo que muitos outros trabalhadores se movimentassem produzindo conexões, responsabilizando-se, produzindo arranjos intra e extra setoriais.

Nesse mesmo período, como já comentado, as discussões acerca da organização da atenção especializada estavam ainda pautadas pela organização física e espacial da atenção especializada, pensando na quantidade de Policlínicas que o município deveria ter e em sua localização, bem como na quantidade de especialidades de cada uma delas.

A discussão sobre a política de atenção especializada iniciou com as pessoas que compunham o DAE, sem participação de outros setores da gestão e foi sistematizada numa apresentação em Power point, que indicava quantas e quais unidades de atenção especializada o município teria (o que implicava no fechamento de uma das existentes) e quais especialidades haveria em cada Policlínica (este seria o novo nome destas unidades especializadas). Também havia um documento elaborado por um Grupo Técnico composto por representantes do Departamento de Apoio à Gestão- DAG, Departamento De Atenção Especializada - DAE, Departamento de Atenção Básica - DAB e Complexo Hospitalar, coordenado pela equipe de Regulação.

Este documento era dividido em dois tópicos:

(1) Desenho regionalizado e (2) Estrutura e Programação das Policlínicas Regionais Descentralizadas.

No tópico chamado “DESENHO REGIONALIZADO”, era apresentada a proposta de desenho para a atenção especializada em SBC. O desenho regionalizado consistia em “03 unidades descentralizadas (Policlínicas Regionais), que atenderão a população das UBS de referência (...) e uma unidade centralizada, de referência para a população de todo o município” (São Bernardo, 2012).

O segundo tópico tratava da ESTRUTURA E PROGRAMAÇÃO DAS POLICLÍNICAS REGIONAIS DESCENTRALIZADAS e dizia: “As Policlínicas

Regionais descentralizadas do Alvarenga, Rudge Ramos e Centro constituirão referências diretas às Unidades Básicas de Saúde e contarão com as seguintes especialidades clínicas: Cardiologia Adulto, Dermatologia, Endocrinologia Adulto, Neurologia Adulto, Oftalmologia Básica (refração e suporte às Linhas de Cuidado de Hipertensão Arterial Sistêmica - HAS e Diabetes Melittus-Dm), Ortopedia, Pneumologia Adulto”. Foi construído, para este tópico, um quadro com a programação de consultas, a partir da oferta e cálculo de produção.

Tabela 1: Programação de primeiras consultas especializadas para as Policlínicas Regionais de SBC.

FONTE: Central Municipal de Regulação de SBC, 2012.

Não diferente do que se costuma fazer quando se discute atenção especializada no SUS, a construção da proposta foi feita com base na fila existente e somente sobre as especialidades médicas. O documento apresenta as considerações abaixo para explicar o que foi chamado de “metodologia para cálculo da “necessidade” de consultas especializadas” (o negrito e as aspas na palavra necessidade são do documento original):

 “Considerando que a demanda reprimida acumulada, em média, representa a entrada de pedidos dos últimos 10 meses;

 Considerando a oferta média mensal total de consultas;

 Considerando que mensalmente são utilizadas todas as vagas e 1/10 da demanda reprimida representa a quantidade de guias que ficam com agendamento pendente;

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