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Atos atentatórios aos princípios da administração pública

1. O COMBATE À IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

2.2 Modalidades de atos de improbidade administrativa

2.2.3 Atos atentatórios aos princípios da administração pública

A disciplina do art. 11 da Lei de Improbidade — complementando e integrando o art. 4° da referida lei e, por sua vez, o art. 37 da Constituição Federal — trata da violação dos deveres de honestidade57, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, para em seguida, especificar outras práticas ainda mais específicas. A improbidade, aqui, advém dos atos que atentam ―à sanidade e moralidade administrativa porque revelam o desvio ético da conduta do servidor ou agente e dos terceiros favorecidos, a falta de habilidade moral, o abalo da credibilidade e a degeneração da seriedade administrativa‖ (RIZZARDO, 2012, p. 486). Dessa forma, para que se configure o ato de improbidade administrativa, ―a conduta ilegal do agente deve revelar deslealdade e parcialidade, no exercício funcional‖ (GOMES JUNIOR e FAVRETO et al, 2012, p. 270).

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

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Nos dispositivos enumerados, verifica-se que a aplicação do artigo em análise limita aos aspectos meramente financeiros, restando claro o interesse do legislador em proteger o patrimônio público econômico, não se cogitando, portanto, a lesão ao patrimônio público em sentido amplo.

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―Honestidade é um dever de estado permanente do homem público, não podendo ser violado este princípio em hipótese alguma. A honestidade, conjugada com a eficiência e a lealdade às instituições públicas, é o mínimo que se espera dos agentes públicos‖ (MATTOS, 2006, p. 430).

II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;

III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo;

IV - negar publicidade aos atos oficiais; V - frustrar a licitude de concurso público;

VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;

VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.

Oportuno asseverar que a incidência do art. 11 da LIA é admitida como norma de cunho residual, quando o agente público ofender os princípios da administração pública, pois ―abrange qualquer violação aos princípios da Administração Pública que não caracterizem enriquecimento ilícito ou lesão ao erário‖ (MARTINS JÚNIOR, 2009, p. 285).

Osório (2011) e Martins Júnior (2009) admitem a possibilidade da modalidade culposa do art. 11, comungando a tese de que a norma preocupa-se com o elemento volitivo do agente, ao passo que Oliveira58 (2009) e Pazzaglini Filho (2009) exigem dolo no comportamento do agente, ou seja, ―que ele aja de forma ilícita, consciente da violação de preceito da administração, motivado por desonestidade, por falta de probidade‖ (Pazzaglini, 2009, p. 101).

Independente da concepção a ser seguida, não pode o legislador considerar qualquer ato como atentatório à probidade, uma vez que seria desarrazoado ―a pretexto, de dar cumprimento à Constituição, juridicizar e equiparar legalidade à improbidade‖ (FIGUEIREDO, 2009, p. 104). ―É obvio que a norma também protege legalidade como bem jurídico, mas este não responde pela singularidade axiológica da regra‖ (OLIVEIRA, 2009, p. 263), visto que os pequenos equívocos, que não comprometam a probidade ou não invadam indevidamente o erário público, não podem ser enquadrados no raio de atuação do art. 11 da Lei n° 8.429, sob pena de gerar uma insegurança ao agente ao se considerar de que qualquer ato contra o princípio da legalidade59 será, também, ímprobo.

58 Para o autor, todos os tipos elencados no art. 11 são de dano, e não de perigo, isto é, ―são atos

ímprobos para cuja consumação é necessária a ocorrência da lesão efetiva do bem jurídico‖ (OLIVEIRA, 2009, p. 263).

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―Ilegalidade não é sinônimo de improbidade e a prática de ato funcional ilegal, por si só, não configura ato de improbidade administrativa. Para tipifica-lo como tal, é necessário que ele tenha origem em comportamento desonesto, denotativo de má-fé, de falta de probidade do agente público‖ (PAZZAGLINI FILHO, 2009, p. 99). No juízo de Martins Júnior (2009) ―A violação ao princípio da legalidade caracteriza improbidade administrativa quando o caso concreto demonstre nítida intenção de violação do ordenamento jurídico e grave ofensa aos deveres éticos, com conotação do desvio de poder, como no caso de contratação de pessoal temporário à míngua do processo legal e dos requisitos excepcionais, e sua prorrogação, o pagamento de horas extraordinárias a servidores comissionados, a admissão irregular de servidores inclusive parentes, a prorrogação de contratos temporários, o descumprimento da ordem cronológica de pagamento ou a não-inclusão de verba para tanto, gastos com mordomias, publicidade abusiva, violação de incompatibilidades etc.‖ (MARTINS JÚNIOR, 2009, p. 288).

Com precisão, segue a visão de Fazzio Júnior apud Mattos (2006, p. 430):

É necessário que se adote muita cautela na compreensão das regras do art. 11, da LIA. Sua evidente amplitude constitui sério risco para o intérprete porque enseja radicalismos exegéticos capazes de acoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, cometidas sem a má-fé, que arranha os princípios éticos ou critérios morais. Práticas sem maiores repercussões no universo administrativo, ditadas, eventualmente, pelo despacho intelectual e pela ausência de habilidade do prefeito, se examinada à luz de legalismo preciosista, podem assumir a configuração de atos de improbidade, quando, de fato, não contêm tanta gravidade. As deficiências pessoais, culturais e profissionais do Chefe do Executivo municipal podem promover irregularidades e, até mesmo, ilegalidades formais, mas é só o desvio de caráter que faz o ilegal sinônimo de ímprobo.

A exemplo de atos que atentem aos princípios da probidade pode-se considerar a conduta de prefeito municipal que deixa de repassar o duodécimo à Câmara Municipal60, a utilização do espaço público para promoção pessoal de agente político61 e a contratação de serviços técnicos sem prévio procedimento licitatório e de não formalizar processo para justificar a inexigibilidade da licitação62.

Todas essas situações, à luz do que já foi dito, nada mais são do que a transgressão aos ideais de conduta elencados no art. 11 da LIA, sujeitando o chefe executivo municipal às diversas sanções a serem descritas no próximo tópico.