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4.3 Reúso de efluente nos atributos do solo

4.3.2 Atributos químicos do solo

A disposição de águas residuárias no solo mediante a irrigação de plantas pode alterar as características químicas do solo (FEIGIN et al., 19991; PESCOD, 1992; BOND, 1998), tal fator associado com provável aumento, no futuro, da área irrigada com efluente e da quantidade de água residuárias gerada, evidenciam o surgimento paralelo de possíveis problemas quanto a quantidade de elementos químicos presentes no solo (BOUWER, 2000).

No trabalho de Baumgartner et al. (2007), os autores confirmaram alterações químicas no solo proporcionais às características das águas utilizadas. Dessa forma, o aumento da fertilidade do solo, com a disposição de efluentes, tem sido observado por diversos autores, que reportam elevação nos teores de nitrogênio no solo (SANTOS et al., 2006b), fósforo e potássio (HEIDARPOUR et al., 2007), cálcio e magnésio (SANTOS et al., 2006a, HEIDARPOUR et al., 2007). Fonseca et. al (2007a) concluiram que a irrigação com efluente de esgoto tratado em substituição à água convencional (rios, lagos, represas) levou a uma economia de 32 a 81% na dose de fertilização nitrogenada mineral necessário para o alto rendimento produtivo de capim Tifton 85, sem ocasionar alterações negativas no solo e planta.

Para Franco et al. (2008) o lodo de esgoto proporciona maior acúmulo de N na planta e maior teor residual de N no solo, onde a aplicação de lodo de esgoto e vinhaça na cultura da cana-de-açúcar (SP81-3250) pode substituir a adubação mineral, tanto para cana-planta quanto para cana-soca. No mesmo sentindo, Hespanhol (2002) afirma de acordo com a lâmina aplicada, podem ser fornecidas doses até 60 kg ha-1 ano-1 de fósforo e até 300 kg ha-1 ano-1 de nitrogênio. Entretanto, esses valores não podem ser tomados como base, pois há consenso de que as características químicas e físicas do esgoto urbano possuem grande variação,

principalmente nas concentrações de elementos químicos, as quais possuem grandes amplitudes que refletem os usos ao qual o efluente foi submetido (VON SPERLING, 1996), podendo também sua vazão variar temporalmente ao longo do dia.

Em estudo de CÓ JÚNIOR et al., 2008 observou que os efeitos residuais de aplicações de lodo de esgoto e vinhaça, em suas diferentes combinações, doses e formas de aplicação, não influenciaram na qualidade tecnológica da cana-de-açúcar (soqueira de quinto corte), onde o uso dos resíduos, em comparação ao da fertilização mineral, não alterou a qualidade da matéria-prima, destacando o expressivo potencial dos mesmos para essa função. Logo, a fertilidade do solo é melhorada sob fertirrigação com efluente, porém, o aumento do carbono total, nitrogênio total e atividade microbiana no solo, segundo Friedel et al., (2000) são observados em experimentos de longa duração. Resultados semelhantes também foram relatados por Ramirez et al. (2002) e Paula (2008) que observaram aumento potencial metabólico dos microorganismos no solo após a irrigação com efluente de esgoto tratado.

No entanto, em outro estudo foi relatado diminuição na concentração de carbono e nitrogênio total. A esses resultados, foram atribuídos aos seguintes fatores condicionantes: (I) predominância do nitrogênio no efluente na forma mineral (DUARTE et al., 2008), (II) a rápida mineralização da fração de nitrogênio orgânico dos efluentes, (III) a manutenção de condições ideais para a mineralização da matéria orgânica, como a umidade (MYERS; CAMPBELL; WEIER, 1982), temperatura (ARTIOLA & PEPPER, 1992), oferta de O2, (IV) baixa relação C/N do efluente (FONSECA et al., 2007b) e aumento da atividade acelerando a decomposição da matéria orgânica do solo.

Em pastagens irrigadas com efluente doméstico tratado foi constatado aumento das concentrações de amônio na solução do solo e, principalmente, de nitrato (FONSECA et al., 2007a) que em excesso, pode ser perdido por lixiviação, contaminando lençóis freáticos e cursos d’água, além de estimular a desnitrificação pela perda de nitrogênio na forma gasosa.

No estudo conduzido por Duarte et al. (2008), a fertirrigação com efluente doméstico tratado não afetou o pH do solo devido à alta capacidade tampão do solo. No entanto, em estudo realizado por Fonseca, Melfi, Montes (2005) houve aumento do pH do solo em diferentes sistemas fertirrigados com EDT, onde o aumento do pH do solo tem sido atribuído principalmente ao elevado pH do efluente (STEWART; HOPMANS; FLINN, 1990). Entretanto, as mudanças de pH são geralmente de baixa magnitude sem importância prática no que diz respeito à disponibilidade de nutrientes, em especial nos solos ácidos do Brasil, com baixa fertilidade inerente (FONSECA; MELFI; MONTES, 2005).

O aporte de fósforo no solo pelo uso de esgoto doméstico tratado geralmente não ocorre em excesso. Nos casos de concentrações crescentes de fósforo disponível foram observadas tanto na camada superficial e na camada subsuperficial (MOHAMMAD & MAZAHREH, 2003) e foram mais pronunciados em experimentos realizados por mais de cinco anos.

A capacidade de adsorção específica do solo pelo fósforo pode contribuir para evitar que este nutriente lixivie da zona de raiz para as camadas mais profundas e representar um fator para manter a sustentabilidade ambiental do sistema de cultivo com uso de esgoto doméstico tratado. Assim, estudos de campo de longo prazo são necessários para compreender os processos que controlam a dinâmica do fósforo no solo oriundo de efluentes (BOND, 1998).

Em trabalho de Fonseca, Melfi, Montes (2005), relataram alterações insignificantes na disponibilidade de enxofre na fertirrigação com esgoto doméstico tratado. Com relação ao boro não foram encontrados alterações em estudos de curto prazo por estes mesmos autores. Estudos sobre os impactos dos metais pesados no sistema solo-planta após a aplicação de EDT revelam resultados divergentes, como diminuição, aumento ou nenhuma alteração na disponibilidade de cádmio, cromo, cobre, ferro, níquel, chumbo e zinco. Mohammad & Mazahreh (2003) observaram que não houve mudanças na disponibilidade de cádmio, cromo, cobre, níquel, chumbo e zinco no solo com uso de EDT. Resultados similares foram encontrados por Ramirez et al., (2002) para cromo, ferro, níquel, cádmio, cromo, cobre, níquel e zinco em solos com mais de 80 anos de uso com efluente de esgoto.

Para pesquisa de Al-Nakshabandi et al. (1997) observaram maiores concentrações de cádmio, cobre, ferro, manganês, chumbo e zinco no solo devido a altas concentrações destes no esgoto doméstico. No entanto, devido à persistência de metais pesados no meio ambiente o acompanhamento desses elementos em solos sob uso de EDT em longo prazo deve ser avaliado.

Para um Latossolo, Gloaguen et al. (2007) observaram que após o uso de EDT, níveis de saturação de sódio acima de 6%, o que causou progressiva sodificação do solo. Heidapour et al. (2007), aplicando efluente de esgoto por tubos porosos, enterrados e sobre a superfície do solo, observaram aumento na concentração de sódio nas camadas superiores do solo, quando fertirrigados por subsuperfície e aumento na concentração de sódio nas camadas inferiores, quando a fertirrigação era feita superficialmente.

Em trabalho de Medeiros et al., (2008) constataram após aplicação de lâminas de esgoto urbano tratado até 532 mm em 270 dias, aumentos na concentração de sódio trocável,

na condutividade elétrica do solo, na razão de adsorção de sódio e na porcentagem de sódio trocável, entretanto, estes valores não foram suficientes para causar salinização do solo.

Testando lâminas excessivas de irrigação de 100 até 200% da evapotranspiração da cultura da cana-de-açúcar, Leal et al. (2009a) observaram aumentos no teor de sódio trocável de 2,4 para 6,0 mmolc kg-1, na razão de adsorção de sódio (RAS) de 3,6 para 12 mmolc L-1 e a porcentagem de sódio trocável de 8 para 18%, corroborando com os dados obtidos por Herpin et al. (2007). Gloaguem et al. (2007) observaram o aumento da RAS, da condutividade elétrica, além de um leve aumento do pH. Leal et al. (2009b) concluíram que houve adição de sódio, nitrogênio, e, potássio no solo, sob irrigação com EDT, cultivado com cana-de-açúcar.

Diante das informações relatados por diversos autores sobre possíveis alterações na química do solo em função do uso de águas residuárias na agricultura é necessário também entender além das quantificações, determinações e inferências diretas das análises da solução do solo, qual sua relação com a produtividade e qualidade tecnológica da cultura, para isso faz-se saber que de acordo com Malavolta et al. (1989) os elementos (nutrientes), exercem funções específicas na vida da planta, embora em algumas delas possa haver, dependendo do elemento, um certo grau de substituição.

Dentre os elementos podemos citar o nitrogênio que segundo Malavolta et al. (1989a) além de participar dos aminoácidos e proteínas, participa estruturalmente, também em bases nitrogenadas e ácidos nucléicos, enzimas e coenzimas, vitaminas, glico e lipoproteínas, pigmentos e produtos secundários e de processos bioquímicos envolvidos na absorção iônica, fotossíntese, respiração, síntese, multiplicação e diferenciação celulares e herança. Para Orlando Filho et al. (1992), a fixação biológica de nitrogênio (FBN) pela cana-de-açúcar é uma realidade. Solos eutróficos apresentam maior potencial de resposta ao nitrogênio tanto em cana-planta como em soqueiras. Porém, quando a qualidade de nitrogênio aplicada é elevada, a qualidade do caldo é afetada, resultando em menores teores de sacarose e baixa pureza em altos teores de aminoácidos e de açúcares redutores, estes precursores de cor (STUPIELLO, 2001).

O fósforo também tem uma importância bastante grande na qualidade da matéria- prima; teores de P2O5, de 300 mg kg-1 para cima, facilitam o processo de clarificação do caldo, na indústria (CASAGRANDE, 1991). Para Orlando Filho et al. (1992) um grande número de produtores tem suprimido a adulação fosfatada das soqueiras, mas colocando uma quantidade maior do nutriente na cana-planta no fundo do sulco.

O potássio na planta além de importante na função do processo da fotossíntese, na assimilação de CO2, pela abertura ou fechamento de estômatos, crescimento meristemático

(CASAGRANDE 1991), está ligado diretamente na síntese de açúcares, devido sua correlação positiva com a formação de sacarose.

Já para o cálcio Malavolta et al. (1989) abordam que este nutriente estimula o desenvolvimento das raízes, aumenta a resistência a pragas e moléstias, auxilia na fixação simbiótica de nitrogênio e maior pegamento da floradas. Ao passo que para Gascho & Taha (1972) citados por CASAGRANDE (1991), a deficiência prejudica os pontos de crescimento, o desenvolvimento radicular e o vigor dos colmos. No caso de deficiências severas, a gema apical e a planta podem morrer.

De acordo com Malavolta et al. (1989), o enxofre aumenta a vegetação e frutificação, aumenta o teor de óleos, gorduras e proteínas, ajuda a fixação simbiótica de nitrogênio. Em relação à extração de S pela cultura, para uma produção de 100 t de colmos ha-1, Catani (1959) determinaram em 12,2 kg, Malavolta et al. (1984), em 50 kg e 40kg para cana-planta e soca; e o PLANALSUCAR (1975 /1976), para essas categorias de corte, em 33 kg e 26,3 kg, 27 kg e 26,6 kg, 33,7 kg e 21,7 kg, respectivamente, para LATOSSOLO VERMELHO Distrófico, LATOSSOLO VERMELHO Distroférrico e LATOSSOLO VERMELHO - AMARELO Distrófico. Casagrande et al. (2001), estudando a influência da vinhaça no teor de enxofre de um solo manejado por sistema mecanizado de cana crua e queimada concluiu que a vinhaça é uma boa fonte de S, pois o teor no solo aumentou 40 a 70% devido a aplicação deste resíduo, não houve influência da cana crua ou queimada no S do solo.

Para estudos da solução do solo, em que o há um grande número de variáveis para avaliação, ferramentas de análise exploratória como a análise de componentes principais (ACP) permitem revelar a existência ou não de amostras anômalas, de relações entre as variáveis medidas e de relações ou agrupamentos entre amostras (Lyra et al., 2010). Para Cruz-Castilho et al. (1994) e Baretta et al. (2007) a ACP, é uma ferramenta estatística, que permite estabelecer não só a identificação de diferenças entre tratamentos, mas também qual é o atributo que mais contribui para a separação entre as áreas estudadas, permitindo, assim, a eliminação de tempo e dinheiro gastos com aqueles atributos do solo que apresentam pouca informação da fertilidade do solo.

Para Coscione et al. (2014), a ACP pode ser utilizada também como ferramenta de compressão, uma vez que reduz a dimensionalidade da matriz de dados originais, pois as primeiras componentes principais têm maior contribuição das variáveis que apresentam maior variância no conjunto das medidas experimentais realizadas, o que consequentemente facilita a visualização dos dados. Dessa forma, a ACP pode ser utilizada para a identificação de um conjunto mínimo de variáveis ou medições necessárias para explicar a variância de

determinado conjunto de dados. Torna-se necessário, entretanto, lembrar que as variáveis excluídas nem sempre apresentam resultados baixos, mas apenas não contribuem para mostrar as diferenças entre os tratamentos na área estudada.

A ACP foi utilizada por Coscione et al. (2014) em trabalho para identificar variáveis relacionadas com a solução do solo, em razão do uso do lodo de esgoto e da adubação mineral, onde foi possível distinguir as áreas em função da adubação aplicada (quatro anos sem interrupção das aplicações sucessivas de lodo de esgoto). Os autores por meio desta análise não verificaram concentração apreciável de metais na solução do solo, embora ainda seja possível identificar traços da mineralização do resíduo. Já para as variáveis pH, Mn2+, SO42-, NO3-, NH4+ e Carbono orgânico dissolvido na solução do solo puderam ser utilizadas no monitoramento de áreas tratadas com lodo de esgoto.

Para pesquisa realizada por Hadlich & Ucha (2010), os autores avaliaram a distribuição de Cd na fase sólida de um solo cultivado na Bretanha, França, assim como os fatores que influenciaram sua disponibilidade. Para isso, foi avaliada a concentração total de Cd em 22 amostras, as quais variaram de 0,13 a 0,37 mg kg-1. Pela ACP, percebeu-se o efeito sinérgico do P2O5 na retenção de Cd nos solos cultivados. Considerando que o manejo agrícola com agroquímicos pode contaminar o solo com metais pesados, Valladares et al. (2009) utilizaram a ACP e técnicas de geoprocessamento para identificar a origem dos metais pesados Cu, Fe, Mn, Zn, Ni, Pb, Cr e Cd como contaminantes potenciais em solos agrícolas, em área cultivada com vinhedos no Estado de São Paulo. A ACP indicou enriquecimento do solo com Cu e Zn em razão do uso e manejo dos vinhedos com agroquímicos.

Diante do exposto os sais solúveis contidos nas águas de irrigação podem, em certas condições climáticas, salinizar o solo e/ou modificar a composição iônica no complexo sortivo, alterando as características químicas do solo, como o regime de umidade, aeração, nutrientes, desenvolvimento vegetativo e produtividade. Neste sentido, investigar as alterações químicas da solução do solo por meio da ACP, considerando aspectos químicos do solo, a planta e as condições ambientais, em resposta à aplicação de EDT e ARS, permitirá o conhecimento da capacidade de suporte do solo para receber diferentes qualidades de água de irrigação, onde a associação destes fatores poderão subsidiar informações fundamentais na viabilização técnica e na sustentabilidade do sistema de manejo utilizado.

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