Carbono da biomassa microbiana

Os atributos biológicos do solo como o carbono da biomassa microbiana (CBM) e a atividade heterotrófica de microrganismos do solo têm sido utilizados como indicadores bioquímicos da qualidade do solo. A biomassa microbiana (BM) importante componente ecológico, pois é responsável pela decomposição e mineralização dos resíduos vegetais e

animais no solo, utilizando-os como fonte de nutrientes e energia para a formação e o desenvolvimento de suas células, bem como para síntese de substâncias orgânicas no solo. Durante seus processos metabólicos, os microrganismos são capazes de transformar, reter e liberar nutrientes às plantas (GAMA-RODRIGUES & DE-POLLI, 2000).

A BM é a principal fonte de enzimas no solo, sendo assim responsável pela quase totalidade da atividade biológica deste, catalisando as transformações bioquímicas, representando fonte e dreno de C e troca de nutrientes entre a atmosfera e o ecossistema solo- planta. A biomassa representa o destino inicial do carbono em transformação no solo, sendo influenciada principalmente pela disponibilidade de carbono, nitrogênio, fósforo e enxofre, umidade do solo, aeração, pH e textura do solo (MOREIRA & SIQUEIRA, 2006).

Por ser a fração ativa da matéria orgânica do solo, a BM é mais sensível que os resultados de carbono orgânico e nitrogênio total para aferir alterações na matéria orgânica do solo causadas por manejo ou práticas de cultivo (GAMA-RODRIGUES & GAMA- RODRIGUES, 2008). Além disso, a BM é influenciada pelas mudanças no manejo dos resíduos superficiais em um curto espaço de tempo (GALDOS; CERRI; CERRI, 2009) e pode ser utilizada como indicador de qualidade ambiental (SCHLOTER; DILLY; MUNCH, 2003).

A BM é considerada tanto um agente de transformação, pelo qual passam todos os materiais orgânicos adicionados ao solo, quanto um reservatório de nutrientes, sendo o seu estudo de grande importância em sistemas de manejo do solo, uma vez que influi na dinâmica dos nutrientes e na fertilidade do solo (BROOKES, 1995).

Isoladamente, a BM pouco reflete as alterações na qualidade do solo, apesar de ser um indicador precoce de intervenções antrópicas (BROOKES, 1995). Entretanto, a BM associada ao conteúdo de matéria orgânica pode ser utilizada como índices para comparar a qualidade do solo sob diferentes manejos. Embora, a resposta da BM seja mais rápida, se comparado com o conteúdo de matéria orgânica (JENKINSON; LADD, 1981). Estes autores sugerem que as mudanças no conteúdo de BM predizem em longo tempo o conteúdo de matéria orgânica do solo. Dessa forma, segundo Larson e Pierce (1994) as taxas de mudanças da biomassa podem indicar, em longo tempo, a qualidade e a saúde do solo. Vários trabalhos mostraram a influência de diferentes sistemas de manejo no conteúdo de biomassa microbiana e matéria orgânica do solo (TABELA 1).

TABELA 1. Comparação entre o conteúdo de biomassa microbiana (Cmic) e Carbono

orgânico total (Corg) em diferentes sistemas de manejo do solo (camada de 0,0 -0,10 m)

Solo e local Sistema de manejo _{(μg g}Cmic* -1₎

Corg** (g kg-1) Referência Franco argiloso (Nova Zelândia) Pastagem 1557 50,24 SPARLING; SHEPHED; KETTLES, 1992 Milho 540 30,59 Franco siltoso (Nova Zelândia) Floresta nativa 1295 90,9 YEATES et al., 1991 Pastagem 1905 80,7 Argiloso (Brasil) Cerrado nativo 1310 18,0 D’ANDREA et al., 2002 Pastagem Brachiaria decumbens – 10 anos sem

intervenção

666,2 19,0 Plantio direto Irrigado

Pivô (milho/feijão) 550 19,0 Plantio Convencional

Irrigado Pivô (Milho) 213,4 14,0 Franco argiloso

(EUA)

Maçã – Orgânico 354 14,9 GLOVER;

REGANOLD; ANDREWS, 2000 Maçã – Integrado 390 15,6 Maçã – Convencional 302 13,0 Franco arenoso (EUA)

Hortícola – Orgânico 311 11,2 TU; RISTAINO; RU, 2006 Hortícola - Convencional 215 8,5 Latossolo Vermelho (Brasil) Cana-de-açúcar (5 anos) Verão 186,7 4,31 TAVARES et al., 2015 Inverno 282,8 Cana-de-açúcar (10 anos) Verão 197,6 3,37 Inverno 321,3

*Método Fumigação-extração de Jenkinson e Powlson (1976) e (Vance et al.,1987); ** Método de Walkley & Black (1934).

Neste sentido observa-se que a biomassa microbiana representa um compartimento lábil de muitos nutrientes, que são reciclados com tempo de residência em torno de três meses, onde o carbono contido na biomassa microbiana é o destino inicial do carbono em transformação no solo e funciona como energia armazenada para processos microbianos e, por apresentar respostas rápidas a alterações no solo, pode ser utilizada como identificador precoce para as possíveis alterações da matéria orgânica do solo, como pode ser observado na Tabela 1 nos trabalhos listados, onde, por exemplo, na pesquisa de Spaling, Shephed, Kettles (1992) nota-se que para o sistema de cultivo de pastagem e milho a biomassa do solo inferiu as possíveis quantidades da matéria orgânica do solo de acordo com manejo avaliado, para maiores concentrações de biomassa maiores valores de matéria orgânica.

Já em trabalho de D’ Andrea et al. (2002) o sistema de manejo plantio direto e convencional mostraram relação direta da biomassa com a matéria orgânica, porém, para o sistema de manejo adotado como referência (Cerrado Nativo) mostrou maior atividade da

biomassa e menor da matéria orgânica, fato este que pode ser explicado por elevados valores de respiração, mostrando que uma alta taxa de respiração pode significar, em curto prazo, liberação de nutrientes para as plantas, porém, em longo prazo, perda de carbono orgânico do solo para a atmosfera.

Em pesquisa realizada por Matsuoka, Mendes, Loureiro (2003) os autores encontraram redução da BM e do teor de matéria orgânica em solos de cerrado submetidos a cultivos perenes e anuais. Todavia, as reduções nos teores de carbono da BM foram mais acentuadas que as reduções na matéria orgânica, mostrando que o carbono da BM é mais sensível à remoção da cobertura vegetal nativa que a parte não viva da matéria orgânica do solo. Por esta razão, pode ser utilizada como indicador de qualidade dos solos, permitindo detectar modificações antes mesmo que os teores de matéria orgânica se alterem significativamente.

Há várias metodologias para estimativa da BM. Os métodos mais recentes da fumigação-incubação e fumigação-extração têm sido preferidos por serem de uso mais fácil e possibilitarem o acesso às quantidades dos elementos contidos dentro da BM (CARDOSO, 2004). A medida direta da quantidade de carbono e nutrientes imobilizados pelos microrganismos é essencial para avaliar a BM na dinâmica da matéria orgânica do solo e ciclagem de nutrientes (GAMA-RODRIGUES & GAMA-RODRIGUES, 2008).

As relações carbono microbiano: carbono orgânico (Cmic:Corg) e nitrogênio microbiano: nitrogênio total (Nmic:Ntotal) expressam a qualidade nutricional da matéria orgânica. Em solos com matéria orgânica do solo de baixa qualidade nutricional, a BM está sob condições de estresse, tornando-se incapaz de utilizar o nitrogênio e Corg e nesse caso as relações Cmic:Corg e Nmic:Ntotal diminuem. O CBM poderá aumentar rapidamente, ainda que os níveis de Corg permaneçam inalterados, quando da adição de matéria orgânica de boa qualidade nutricional (GAMA-RODRIGUES & GAMA-RODRIGUES, 2008). Uma relação Cmic:Corg (quociente microbiano) constante indica que o sistema está em equilíbrio (ANDERSON & DOMSCH, 1989), onde estes autores sugerem que a relação é maior em sistemas de rotação de culturas que em monoculturas e há ainda evidências de que a adição de adubos orgânicos aumente essa relação.