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3. Em busca de um perfil do webcamming brasileiro

3.2. Organização e estruturação do camming no Brasil

3.2.6. Atuação das redes sociais

Tanto em cenário nacional quanto no internacional, as camgirls utilizam as redes sociais amplamente, sobretudo o Twitter92. De acordo com Bleakley (2014), esses espaços online são usados para ampliar a comunicação com a audiência e a visibilidade

92 Segundo as modelos, o Twitter permite a divulgação de conteúdo erótico e sexual, raramente banindo um de seus usuários por compartilhar imagens explícitas de nudez ou sexo. Já as outras redes sociais, como o Facebook e o Instagram, possuem políticas mais rígidas em relação a esses materiais e constantemente excluem perfis que os apresentem.

das mulheres e de seu trabalho. Horários e dias de apresentação, bem como fotografias e vídeos são postados diariamente, além de rifas e listas de desejos que ampliam os lucros das modelos. O marketing por meio das mídias sociais “mantém um perfil público proeminente que permite que as camgirls se lancem como pseudo-celebridades, contando com uma campanha de boca-a-boca para aumentarem o público e se diferenciarem da legião de outras modelos” (BLEAKLEY, 2014, p. 901). Nayar (2017) considera que esses meios colaboram com o aumento do número de espectadores de determinada garota, garantindo maior circulação de pessoas em suas salas. Ademais, são ambientes nos quais podem interagir com as colegas, criando uma rede de troca de informações e apoio. W. Silva (2014) percebeu na realidade brasileira do webcamming um contínuo emprego do Twitter e dos blogs, principalmente para venda de pacotes com fotos e vídeos exclusivos.

As redes sociais mais utilizadas pelas camgirls que entrevistei são o Twitter (majoritariamente) e o Instagram. Percebi a importância desses espaços online desde que iniciei esta investigação: na mesma medida em que as mulheres precisam dos sites especializados para atuarem na câmera, elas necessitam do Twitter e Instagram para aumentarem e personalizarem sua publicidade. Nesse sentido, existe uma confluência entre websites e mídias sociais na composição do camming brasileiro. Fernanda explica essa situação da seguinte forma:

Então, o que aconteceu é que, assim, como dito normalmente, alguns comentários falam, assim, quando você é modelo nova é natural você ter uma procura muito maior pela curiosidade de usuários que já estão ali nesse site no qual eu trabalho, já tem, eu acho, que mais de três anos. Então tem muito usuário que acompanha desde o começo. Então é aquela curiosidade. Depois de um tempo alguns, tem alguns dias, tem alguns momentos de estiagem desse movimento. Então, de repente, falei assim "não, vamos montar uma redezinha social e tá se entrosando com o pessoal” para não cair no risco de morrer na praia, sabe, depois de passar um tempo.

Angélica relatou a situação de boa parte das exibicionistas quando afirmou que atualmente utiliza mais seu perfil de trabalho que o pessoal. Segundo ela, “o retorno foi muito interessante e é necessário, exige de você né, não tem como desassociar, uma vez que você trabalha com uma coisa tão ligada à rede social, porque se você olhar o meu perfil no site é uma rede social erótica” e, no fim das contas, “eu acredito que é mais uma rede social que eu administro, só que essa é a que me dá retorno financeiro”. Angélica costuma divulgar suas fotos e vídeos, responder recados e comentar sua rotina diária. Beatriz considera o emprego do Twitter uma excelente estratégia para se

distinguir das outras diversas webcam models e se destacar, de modo que os usuários não a associem apenas à página na qual ela trabalha. Mas, segundo ela, há muitas meninas que se restringem ao website e mesmo assim angariam imenso público – ou seja, o Twitter pode ajudar a aumentar a visibilidade da garota e o número de espectadores, mas isso não é regra.

Jennifer considera que o Twitter “deu um retorno superpositivo, os retornos de Skype, os retornos na minha sala, o número de seguidores subiu, minha renda aumentou”. Lúcia, que é pouco assídua no site e passa longo períodos sem se conectar, afirma que as redes sociais “ajudam muito, as vezes um seguidor que não te conhecia, ele vê suas fotos, as suas publicações, passa a te seguir e aí ele pergunta como faz para te ver, como que funciona o site, como é a venda de fotos, essas coisas”. Anelise ficou assídua nessas mídias após perceber que a venda de fotografias e vídeos aumentava substancialmente, sendo que todo o dinheiro recebido ficava com ela (sem ter que retirar a porcentagem do site). Além disso, ela se aproximou de seu público e passou a conhecê-lo melhor e, como consequência, conseguiu produzir conteúdos que chamassem a atenção e fossem mais rentáveis. Eliane é a única das entrevistadas que além do Twitter possui um website dedicado à divulgação de seu trabalho.

Outro ponto importante do Twitter é que ele permite a interação entre as diversas modelos, funcionando como um espaço de troca de informações e rede de apoio. O emprego da internet e das redes sociais para estabelecer espaços de interlocução e ajuda mútua entre as trabalhadoras sexuais foi comento por Sanders et al. (2018) e Kibby e Costello (2001), uma estratégia utilizada em vários serviços erótico-sexuais, sejam elas realizadas presencial ou remotamente. Jennifer me disse que a primeira vez que conseguiu ter contato com uma camgirl que ela admirava foi por meio dessa mídia social. Para além disso, ela ainda conseguiu manter diálogo com mulheres que trabalhavam em outros sites e passou a conhecer novas dinâmicas de trabalho. Lúcia me disse que o Twitter foi muito importante para ela, especialmente quando teve um grave problema no website em que trabalha: um de seus usuários havia gastado muito dinheiro em um show longo, mas, posteriormente, os administradores da página descobriram que o cartão de crédito usado para pagamento era clonado. No fim das contas, a empresa devolveu o valor para o verdadeiro dono do cartão e Lúcia ficou com o prejuízo. Nessa ocasião, “muitas modelos ficaram do meu lado, elas entenderam meu lado, não ficaram em favor do site, elas ficaram ao meu favor e elas se colocaram no meu lugar”. Segundo Lúcia, “acontece bastante, como quando uma das modelos sofreu um acidente, elas

abriram vaquinha na internet para poder arrecadar dinheiro para o tratamento dela, pelo fato dela ter ficado ausente, porque ela teve um problema sério no acidente, ela ficou internada e tudo”.

Todavia, nem todas as minhas entrevistadas são entusiastas das redes sociais: Fernanda, Manuela, Denise e Cibele desconfiam se a divulgação via Twitter e Instagram surtem realmente algum efeito prático. Fernanda migrou para essas plataformas, mas sempre ocorreram “sérias dúvidas se esse tipo de público, esse nicho que me segue no Twitter e principalmente nos vários canais do Youtube, é o mesmo nicho, o mesmo público que eles, os usuários propriamente do site”. Denise e Cibele não investem muito em seus perfis no Twitter porque acreditam que o retorno em termos financeiros e de divulgação de suas imagens não é efetivo. Manuela idem: “a minoria, a maioria dos clientes da minha sala não tem Twitter. Eu já perguntei se tem Twitter, ‘não, não tenho’, a maioria não tem”. Manuela considera as redes sociais importantes apenas devido aos divulgadores (perfis que promovem a publicidade das modelos), eles sim responsáveis por ampliar a quantidade de usuários circulando em sua sala. Mas mesmo as mais céticas atribuem uma função ao Twitter: como me disse Manuela “é um termômetro né, acaba sendo um termômetro para o nosso trabalho, a rede social” e mantém as camgirls em diálogo constante, formando um sistema de apoio impossível pelos sites especializados.