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Ausência de comunicação na relação hélice tríplice

CAPÍTULO 3 Comunicação integrada para um novo desenho

3.2 Ausência de comunicação na relação hélice tríplice

Tonelli e Zambalde (2007) buscaram uma concepção teórica com ênfase no ambiente institucional ideal como forma de integrar as esferas acadêmica, empresarial e governamental em torno de redes de comunicações dinâmicas. Neste estudo, concluíram que se por um lado a teoria oferece uma idealização das comunicações entre esses três vértices, por outro, a realidade brasileira demonstra sérias barreiras acerca deste fluxo. Eles ressaltam que a teoria da Hélice Tríplice preconiza a formação de arranjos institucionais e o surgimento de formas organizacionais que tornariam o fluxo de informação e a construção de conhecimento mais leve e contínuo.

Neste campo de estudo, Abdalla, Calvosa e Batista (2009) além de apontarem forte afinidade entre a relação Hélice Tríplice e a necessidade de inovação, chamam atenção para a carência de canais institucionais de comunicação entre a universidade e a empresa (U-E), o que na opinião desses autores acentua a desvinculação entre a oferta e a demanda de tecnologia, sem o

aproveitamento de conhecimentos e tecnologias que poderiam ser de interesse social.

A existência de um articulador central no cerne da relação entre as hélices U-E-G poderia representar uma importante interface de comunicação entre os segmentos. Vale ressaltar que o conceito de interface é amplo, sendo aqui destacado o seu papel de conexão entre ambientes distintos. Na definição

da Wikipédia5, a interface pode ser explicada pela presença de uma ou mais

ferramentas para o uso e movimentação de qualquer sistema de informações, seja ele material, seja ele virtual. É o conjunto de meios planejadamente dispostos sejam eles físicos ou lógicos com vista a fazer a adaptação entre dois sistemas, para se obter um certo fim cujo resultado possui partes comuns, ou seja, o objeto final possui características dos dois sistemas. No campo da comunicação, interface seria o espaço em que dos meios se relacionam.

Assim, a ausência de uma interface de comunicação entre as três esferas poderia prejudicar o equilíbrio de todo o sistema e, portanto, reduzir as possibilidades de promover as articulações necessárias para o desenvolvimento de dada solução tecnológica. Neste mesmo sentido, na visão de Etzkowitz e Mello (2004), falta ao Brasil uma interação bem articulada entre a universidade, a indústria e o governo, que possa ser verdadeiramente qualificada como uma hélice tríplice. Como ponto fundamental desta falta de interação, cita o reduzido fluxo de informações entre as universidades e as empresas.

Como medida para reduzir esta carência, Paula et al. (2008) citam o empenho do governo e das universidades em propor medidas para o aumento de comunicação entre os diferentes atores. Dentre estas iniciativas, destacam-se a criação de núcleos e fundações nas universidades para gestão de contratos com empresas, a criação de Incubadoras de Empresas, Parques Tecnológicos, Tecnopólis e Escritórios de Transferência de Tecnologia.

Leydesdorff (2003), além de ressaltar que as relações entre U-E-G fornecem uma infraestrutura de rede de conhecimentos que favorecem os sistemas de inovação, propôs que estas relações entre as instituições podem ser medidas por meio dos fluxos de interação. Estes fluxos geram uma entropia positiva ou negativa, isto é, uma tendência à desordem ou ao equilíbrio das relações. Segundo este autor, a informação mútua entre as três dimensões institucionais pode fornecer um indicador deste desempenho, tendo como ponto principal a forma de comunicação entre os atores. Para isto, Leydesdorff utilizou representações gráficas para explicar o conceito de informação mútua nas três dimensões. Estas ideias foram originalmente apresentadas em sua obra “The sociological theory off comunication” de 2001.

Na Figura 8, Leydesdorff (2003) apresenta a configuração onde há a sobreposição das três hélices, formando um espaço na área sobreposta comum, indicada na figura como a. Esta representação é conhecida como Diagrama de Venn6, que aponta uma sobreposição entre os subsistemas. Porém, em condições normais, esta sobreposição pode tornar-se zero ou mesmo negativa, como descrita na Figura 9. Neste caso, a integração de diferentes interfaces de comunicação poderia resultar em um hiperciclo representado de forma simbólica. Isto significa dizer que a comunicação poderia representar o elo de interação entre os setores.

5 Wikipédia – Enciclopédia digital construída colaborativamente.

6 Representação gráfica da articulação entre as esferas: acadêmica, empresarial e

Figura 8 Configuração com três subdinâmicas onde há uma sobreposição comum positiva em a

Fonte Leydesdorff (2003)

Figura 9 Configuração com três subdinâmicas onde existem apenas sobreposições bilaterais

Fonte Leydesdorff (2003)

Neste sentido, Leydesdorff (2003) defende que a existência de canais de comunicação que abrangem as três esferas reduziria as incertezas do sistema como um todo. Quando a comunicação ocorre apenas em duas esferas, ao longo do tempo, ao invés de criar sinergias, a comunicação poderia desenvolver uma desordem, chamada pelo autor de entropia positiva. Neste sentido, a comunicação é apontada como variável fundamental para a relação em hélice tríplice, já que pela existência de uma comunicação há a formação de um hiperciclo que integra e reorganiza as subdinâmicas que ocorrem dentro do sistema. Ainda, tendo em vista que o sistema é evolucionista, e sustentado por interações recursivas, a comunicação deve acontecer entre todas as esferas (LEYDESDORFF, 2003).

Leydesdorff e Etzkowitz (1998) destacam ainda que novas linguagens tendem a surgir nas interfaces entre as esferas institucionais, facilitando a comunicação entre códigos diferentes e fortalecendo a interação entre os atores. Ao se reorganizarem, a partir de novas informações, as instituições se tornam mais informadas e mais intensivas em conhecimento.

Outro indicador da existência de uma rede de comunicação, segundo Wagner e Leydesdorff (2005), seria a expansão de co-autorias em projetos de

pesquisa, feitas pela escolha dos próprios pesquisadores. Desta forma, utilizando as ligações fora da instituição, seria uma forma de testar o poder da comunicação para despertar o interesse de novas parcerias, visando à união de competências, a reputação das co-autorias e os demais recursos oferecidos pela rede colaborativa.

Na visão de Martinho (2003), uma rede coloca em ação uma dinâmica de comunidade, que por sua vez utiliza um processo de interlocução (comunicação), ação coordenada (coordenação) e decisão compartilhada (democracia). Cita que no relacionamento, assim como na prática da comunicação, o que há é uma profunda troca de fluxos formadores e reguladores, na qual os atores vão moldando, construindo, alterando ideias, valores, visões de mundo e projetos. Para este autor, este ambiente de troca e auto-regulamentação coletiva, baseado na comunicação, faz de um conjunto de elementos díspares, um grupo, uma comunidade. Neste sentido, a comunicação é vista não apenas como o meio pela qual se dá a interação, mas, sobretudo, o insumo necessário para a organização da rede. E mais, a diversidade dos integrantes e sua disposição espacial exigem um trabalho de comunicação permanente para dar organicidade ao conjunto. A articulação de múltiplas lideranças e a devida coordenação de suas ações é intensificada mediante a troca de informações, como um elemento regulador de todo o sistema.

O espaço de intersecção entre as esferas U-E-G, com ênfase no fluxo de informações e interfaces deste ambiente, pode ser comparado a um “Ba”. Baseando no conceito original proposto pelo filósofo japonês Nishida (1990 citado por NONAKA; TOYAMA, 2003, p. 6) definem “Ba” como “um contexto compartilhado em movimento, que pode transcender tempo, espaço, limites organizacionais para criar e compartilhar conhecimento.” Os contextos sociais, culturais e históricos são importantes para os indivíduos na interpretação da informação e na criação de significado. Ba é o lugar onde a informação é

interpretada para se tornar conhecimento. Por meio do “Ba” é possível a criação e compartilhamento de informações organizacional e inter-organizacional.

Cassiolato e Lastres (2003) acrescentam que o aprendizado interativo resultante da interação nestes espaços de compartilhamento constitui fonte fundamental para a transmissão de informações e para a ampliação da capacitação produtiva e inovativa das empresas e outras organizações, sendo essencial para garantir a competitividade sustentada dos diferentes atores locais, tanto individuais como coletivamente.