Logo no início do trabalho, afirmou-se que o Brasil incorporou diversos institutos
relacionados ao modelo precedental.
Quanto à CF/88, foram abalizados os seguintes movimentos: ampliação dos
instrumentos de revisão judicial; aperfeiçoamento da sistemática de conformação
constitucional; e alinhamento da técnica normativa à fluidez social (“principialização” das
normas jurídicas especificadas na Constituição).
Ainda nesse sentido, exaltou-se a importância das reformas constitucionais no
combate à instabilidade decisória, apontando-se como isso também foi buscado pelo
legislador infraconstitucional.
Em relação aos paradigmas impostos pelo CPC/15, verificou-se que ele instaurou
toda uma intersecção com a seara constitucional, bem como positivou nortes elementares à
materialização da dinâmica de precedentes.
Contudo, não se pode deixar de destacar que, a despeito de ter avançado bastante
nesse sentido, o legislador perdeu uma grande oportunidade de fazê-lo de maneira mais
acurada, principalmente no que se refere à previsão específica de dispositivos legais
relacionados aos parâmetros de aplicabilidade do “distinguishing” e do “overruling”.
Válido ponderar que, ao longo do trâmite legislativo trilhado até à aprovação da atual
legislação, foram instaurados intensos debates em relação ao tema.
O Projeto de Lei nº 8.046/2010 (versão que tramitou à época na Câmara dos
Deputados) trazia um capítulo exclusivo sobre “precedente judicial” (Capítulo XV do Título I
do Livro I).
Quanto à técnica da distinção, o projeto de lei trazia a possibilidade de não seguir o
precedente ou a jurisprudência, “quando o órgão jurisdicional distinguir o caso sob
julgamento, demonstrando fundamentadamente se tratar de situação particularizada por
hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada, a impor solução jurídica
diversa.” (§5º).
Fez-se menção, portanto, à “hipótese fática distinta” e à “questão jurídica não
examinada”, pressupostos que, como visto, têm ampla relação com o manejo do
“distinguishing”.
No caso do “overruling”, a iniciativa também trazia previsão específica acerca do
instituto. No §7º do art. 521 do Projeto expunha-se as hipóteses que justificariam a
“modificação de entendimento sedimentado”, sendo apontadas as seguintes situações: (i)
revogação ou modificação de norma em que se fundou a tese ou (ii) alteração econômica,
política ou social referente à matéria decidida. Assim, em relação à superação, também se
pretendia positivar condicionantes materiais para sua operabilidade.
Tais inovações foram descartadas e a versão final do texto legal acabou por não
reproduzir tais avanços. O CPC/15, no inciso VI do §1º do art. 489
44, alude expressamente à
distinção no caso em julgamento e à superação do entendimento.
A partir disso, são expostas várias situações quanto ao uso dessas técnicas.
Por exemplo, no que tange à “superação”, faz-se menção a ela na parte que trata do
Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas e do Incidente de Assunção de
44
Diz o dispositivo: “Art. 489. [...] § 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: [...] VI - deixar de seguir enunciado de súmula,
Competência, o que se vê, respectivamente, no arts. 986 e no § 3º do 947. Quanto à
“distinção”, ela aparece como fundamento para o ajuizamento de ação rescisória (art. 966,
§5º) e também como fundamento para exclusão de recursos do sobrestamento decorrente da
sistemática de julgamento de recursos repetitivos (art. 1.037, § 9º).
Entrementes, todas elas são menções genéricas e, como afirmado, o legislador
acabou por não delinear de maneira expressa parâmetros de aplicabilidade circundantes à
utilização do “distinguishing” e do “overruling”.
Como confirma Jaldemiro Rodrigues de Ataíde Jr. (2015, p. 684): “[...] o CPC/2015
não trata explicitamente dos institutos e técnicas fundamentais à aplicação e superação dos
precedentes, como: a ratio decidendi, o obiter dictum, o distinguishing e o overruling. [...]”
(grifos nossos).
Por essas e outras razões, percebe-se o retrocesso do caminhar legislativo. Lucas
Buril de Macêdo (2015b, p. 471-472) aponta a crítica:
[...] No caminhar legislativo, vicissitudes são inevitáveis, pois são imanentes ao processo político. A derrocada dos precedentes judiciais no Código de Processo Civil bem demonstra isso, pois, aqui, foi particularmente grave. O regime dos precedentes judiciais no CPC/2015, em comparação às disposições da versão Câmara dos Deputados, é bastante pobre. Na verdade, uma parcela significativa das conquistas foi descartada, com um retorno à regulação dos precedentes nos moldes de como havia na versão aprovada pelo Senado Federal.
[...]
As modificações enfraqueceram sobremaneira a implantação do stare decisis brasileiro, que agora volta a depender de um forte esforço interpretativo e construtivo, tanto doutrinário como jurisprudencial. [...]