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Capítulo 3 O Teatro traduzido na década de sessenta – Aspectos Gerais

3.1 Os Autores Traduzidos

Em termos de conteúdos, os autores de teatro traduzidos na década de 60 são dramaturgos, que na grande maioria, viveu a Segunda Grande Guerra, em que a sua única e possível estratégia de sobrevivência foi a escrita sobre melhores condições de vida. Embora criando sob a capa de vários tipos de dramaturgias, estes autores queriam basicamente afastar o espectro da guerra, das câmaras de gás, das perseguições, criaram a imagem do homem inadaptado perante uma sociedade desumanizada, vencido por ela, ou lutando pela mudança social.

Relativamente às novas formas de fazer teatro, já nos finais dos anos 40, e durante os anos 50, o Teatro Estúdio do Salitre, tinha iniciado uma grande reflexão sobre o teatro, criando novas expectativas, novas técnicas de encenação, quebrando o cansaço e a morte lenta que se afigurava no panorama do teatro português. A técnica de Sabotai, em articulação com a teoria de Fernando Amado, tornou-se uma verdadeira escola de renovação da cena teatral portuguesa.

O teatro dos anos 60 tentou autonomizar-se relativamente ao poder oficial, passando a ser um teatro que procurava as novas técnicas, os novos experimentalismo, as novas encenações. A figura do encenador começava nesta época a ser apreciada.

A Censura redobrava de atenção relativamente à encenação. Já não são só as palavras, mas tudo o que rodeava a cena que era preocupante.

A sociedade estava motivada. O teatro amador vivia uma época de ouro. Nesta época, as Colectividades, os Grupos Dramáticos, os Empregados de

O Teatro Universitário assumiu posições de grande contestação na cena portuguesa, e nesta época revelou uma dinâmica extraordinariamente importante para a grande mudança social e política em Portugal.

…(Era um tempo de) baldas e as músicas de protesto e de intervenção. Havia aqueles espectáculos com o Zeca Afonso, o Adriano, e mesmo pequenas sessões, mais restritas, nas Repúblicas. E depois a actividade teatral era intensa com o TEUC e o CITAC.

Nós nem éramos um grupo de teatro com pretensões vanguardistas. O que defendíamos era fazer coisas novas, não era repetir, repor, repor… O que é certo é que o Paulo Quintita sai, entra o Luís de Lima, e o TEUC ganha outro fôlego. Inclusivamente, com a Ilha dos Escravos de Maridais, consegue ludibriar o Ministro da Educação, o José Hermano Saraiva. Quando o texto foi à censura, o ministro olha para aquilo e diz: «sempre quero ver o que é que eles conseguem fazer com este texto». Viu e não gostou. Tanto que a PIDE expulsou o Luís de Lima do país.

Portanto, era possível fazer coisas e nós provámos que era possível. (CRUZEIRO e BEBIANO, 2006:124-128)

Os grupos de teatro universitários pouco preocupados com o gosto do público ou em fazer grandes bilheteiras foram os responsáveis pela divulgação de algum do melhor teatro de vanguarda. Na década de 60, o teatro universitário apresentou Unesco em perfeita contemporaneidade com o resto da Europa Ocidental.

A Censura não tinha mãos a medir, por isso, os cortes e as inúmeras interferências em todas as peças que lhe eram submetidas era enorme em finais dos anos sessenta.

Os autores que a mudança desta década de 60 vai buscar são os autores estrangeiros que criam novos valores, investigam as razões para o teatro, experimentam os novos estilos; surrealismo, expressionismo, teatro de Brecha, teatro documenta, apeninos, teatro de rua, improvisações colectivas,

Na lista que consta no Anexo 5 desta dissertação, encontramos uma tabela com os nomes de todos os autores que foram traduzidos durante a década em estudo.

Para um maior relacionamento do nome do autor com a sua obra, data, tradutor, empresa e decisão da Comissão, podemos verificar a Tabela Sinóptica no Anexo 2.

Passo a apresentar o quadro com os autores mais traduzidos ao longo de toda a década.

AUTORES DE TEATRO MAIS TRADUZIDOS PARA PORTUGUÊS NA DÉCADA DE 60

AUTORES NACIONALIDADE Nº PEÇAS MAIS TRADUZIDAS

Alexandro Casona  Espanhol  Alfonso Paso  Espanhol  Alfonso Sastre  Espanhol  Anton Tchekov  Russo  Arrabal  Espanhol  Barilet e Gredy  Francês  Bernard Shaw  Inglês  Charles Cordier  Francês  16  Eugène Labiche  Francês  Goldoni  Italiano  11  Ionesco   Romeno  Jaime D`Armiñan  Espanhol  Jean Anouilh  Francês  Jean Marsus  Belga  29  Max Frisch  Alemão  Molière  Francês  Musset  Francês  Nicolai Gogol  Russo  Pirandello  Italiano  Shakespeare  Inglês  Strindberg  Sueco  Tenessee Williams  Inglês  Terence Rattingan  Inglês  William Saroyan  Inglês 

3.2 QUEM ERAM OS TRADUTORES ?

Conforme os depoimentos presentes neste trabalho, havia muita gente a traduzir sob pseudónimo por razões políticas em boa parte.

As minhas relações com os tradutores eram boas na qualidade dos textos, mas uma perfeita dor de cabeça na altura da sua entrega. Alguns tradutores entregavam o 1º e o 3º actos e demoravam muito tempo a terminar o 2º.

No caso do pagamento aos tradutores, fazia-se uma combinação logo no começo da tradução e eu pagava logo, nunca ficava à espera da bilheteira. No princípio de cada ano indicava os nomes das peças que queria traduzir. O Goulart Nogueira era um excelente tradutor que conhecia muito bem a língua portuguesa, para além de conhecer muito bem os meandros da Companhia porque trabalhava comigo. Estava sempre a traduzir porque precisava de dinheiro. Penso que ele traduzia também sob pseudónimos. Claro que mexíamos muito nos textos traduzidos na tentativa de tornar as frases mais maleáveis para os actores. Pequenos acertos…

(COUTO VIANA cf. Anexo 1)

Quem traduzia para teatro era na sua maioria gente que conhecia a linguagem do palco.

Eram actores de teatro na sua generalidade. O Vasco Morgado tinha horror a fazer contratos. Só a título de exemplo, o Vasco pagou 10.000$00 a um actor para lhe traduzir uma peça que foi um êxito retumbante e que lhe encheu a casa durante um ano.

Na minha opinião acho que deve ser um autor de teatro, alguém muito conhecedor da linguagem do teatro que deve traduzir para teatro.

(REBELLO, cf. Anexo1)

Ninguém traduzia sabendo de antemão que o seu trabalho ia ser reprovado pela Comissão. Não era bom para o empresário, nem para o tradutor que deixava de ter trabalho. Portanto, a tradução para teatro durante o período de vigência do Estado Novo, era à partida muito contida, muito auto manipulada ainda antes de chegar à Comissão de Censura:

Para escrever e publicar em Portugal era preciso fazer acrobacias geniais. A Censura é uma prática. As pessoas automutilavam-se. Precisávamos todos de conhecer bem os códigos. O Batista Bastos foi correspondente de alguns jornais portugueses enquanto esteve no estrangeiro. Escrevia semanalmente textos primorosos mas que eram todos cortados. Como estava fora já não se mostrava tão vigilante, já estava com outros azimutes e outras apetências.

(RAUL SOLNADO, cf. Anexo 1)

A tradução sob pseudónimo era um subterfúgio que, por vezes, resultava bem, como aconteceu no caso da peça A Casa de Bernarda Alba, de Lorca, onde foi a estratégia utilizada para conseguir levar à cena esta peça de cariz tão forte, quase revolucionário.

Quem traduziu sob pseudónimo foi o Manuel Mendes e o José Gomes Ferreira. Tudo gente da oposição. E foi assim que se conseguiu furar a censura, conseguindo iludi-los…

(MARIA BARROSO, cf. Anexo1)

grandeza. Outros são actores. Alguns ainda estão entre nós, outros que já cá não estão. Muitos que reconhecidamente pertenceram a uma época. E muitos outros que o seu nome, verdadeiro ou falso, já foi esquecido pelas próprias empresas para quem trabalharam.

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