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CAPÍTULO 4 CARACTERIZAÇÃO DA ESTRUTURA FUNDIÁRIA DA REGIÃO DE

4.2 A Política de Reforma Agrária na Região de Andradina-SP

4.2.1 O Avanço da Cana na Região

Não se pode negar um fato relevante que está acontecendo nessa região. Historicamente a região foi caracterizada presença da atividade pecuária, principalmente gado de corte e em menor expressão gado leiteiro, além da alternância de culturas sazonais, como:

algodão, milho, amendoim, mandioca e feijão. Mas, o cenário tem se reconfigurado em decorrência das transformações geradas pelo avanço do capital sucroalcooleiro. As terras voltadas à pecuária, que era antes a principal atividade econômica da região, vêm sendo ostensivamente substituída pela cana-de-açúcar, de forma mais acentuada a partir dos últimos oito anos.

De acordo com os dados do IEA (Instituto de Economia Agrícola, 2009), no intervalo dos últimos cinco anos, o rebanho para corte sofreu uma redução de aproximadamente 25%, enquanto que para o gado leiteiro esta redução foi ainda maior, chegando a quase 60% no período. (XAVIER, 2010, p. 72).

Na região de Andradina, que se configura como uma área de expansão da canavicultura, o que se viu num primeiro momento, é que grande parte das plantações de cana-de-açúcar ocorrem nas grandes propriedades arrendadas. Nessa região, historicamente marcada pela grilagem de terras e pela constituição de grandes propriedades improdutivas e/ou subutilizadas, a entrada do capital agroindustrial, estabelecendo relações de arrendamento com essas grandes propriedades, revela a manutenção desse caráter rentista da terra.

Nas novas áreas caracterizadas pelo avanço da atividade canavieira, verifica-se a constituição de uma estreita relação entre os representantes do capital sucroalcooleiro e os proprietários de terras, principalmente com os grandes proprietários, que antes se dedicavam a pecuária extensiva. Constata-se que com a expansão da agroindústria da cana, muitas dessas fazendas que se apresentavam como improdutivas ou ainda com uma baixa geração de renda da terra, considerando a produtividade baixa da pecuária extensiva que se praticava, passaram a estabelecer contratos de arrendamento com as usinas, sob o argumento de que ao assumir a posição de rentistas da agroindústria, haveria a possibilidade de gerar para si, rendimentos mais “vantajosos”.

A conformação de tal cenário, de certa forma, revela a expectativa por parte do agronegócio canavieiro de que até este 2013 o número de usinas de açúcar e álcool instaladas no Oeste Paulista (onde se localiza a região de Andradina) chegue a aproximadamente 100 agroindústrias e que a área plantada com a gramínea atinja a marca de 31% do total de terras cultivadas (AZEVEDO; THOMAZ JÚNIOR; OLIVEIRA, 2008).

Este cenário revela o caráter rentista de como a terra se apresenta no Brasil, tendo como fim não a produção de alimentos, mas a especulação, intimamente condicionada a questões conjunturais que favoreçam a extração da renda (PAULINO, 1998). Essas terras que

se encontram concentradas na forma de grandes propriedades reproduzem esse caráter, funcionando ora como reserva de valor, ora como reserva patrimonial. Funcionam, ainda, como mecanismo que visa garantir o acesso ao sistema de financiamentos bancários, ou ao sistema de políticas de incentivos governamentais (OLIVEIRA, 2001, p. 187).

Dessa forma, o aspecto “vantajoso” apontado por parte dos proprietários, que arrendam terra para a agroindústria da cana, se deve ao fato de que na condição de rentistas, recebem renda sem nenhum dispêndio de força de trabalho, já que com a expansão do monocultivo da cana, quem vai comandar a produção das terras é a agroindústria sucroalcooleira, que aparece na condição de arrendatário.

Atualmente, com o etanol elevado a condição commodities, a agroindústria da cana, que historicamente foi marcada pela produção em grandes propriedades, agora não mais aparece associada aos grandes latifúndios, mas sim como modernas empresas rurais – mais um dos casos que ilustram esse mito da modernidade.

Assim, a expansão da cana na região de Andradina é processo que se encontra em movimento e que pode gerar implicações diretas sobre à reforma agrária, na medida em que a tendência é intensificar a demanda por mais terra com a concentração fundiária, o que tende a gerar reflexos que já podem ser observados sobre a reforma agrária da região.

O aumento da área ocupada com a cana pode gerar implicações diretas na constituição de novos assentamentos, e até mesmo alterações no que se refere à dinâmica dos assentamentos já constituídos – considerando que a cada nova safra, suas áreas passam a ficar cada vez mais imersas em um “mar de cana” (OLIVEIRA, 2003).

No entanto, na região de Andradina, onde a questão agrária se faz presente, verifica-se que a luta dos pequenos agricultores para se estabelecer no campo é, antes de tudo, uma demonstração de resistência contra a expropriação de suas terras. Fenômeno não exclusivo da região, mas de todo Brasil:

A prova disto é que os dados censitários revelam que, ao mesmo tempo em que há o aumento dos latifúndios capitalistas, há um aumento das unidades camponesas de produção. Este processo revela que, ao mesmo tempo em que aumenta a concentração de terras nas mãos dos latifundiários, aumenta o número de camponeses em luta pela recuperação destas terras expropriadas. Nem que para isso eles tenham que continuar seu devir histórico: a estrada como caminho (OLIVEIRA, 1988, p. 10).

Nesse contexto, concomitante a este processo de expansão do capital, verificou-se a ocorrência de um movimento de resistência do modo de vida camponês. A luta do pequeno

agricultor em permanecer no campo, é um movimento que entra em choque como processo de expansão da cana.

Na região, como uma tentativa de barrar o movimento de luta pela Reforma Agrária, levantam-se controvérsias com relação a quem de fato é responsável pela participação mais expressiva na produção agropecuária: a grande ou a pequena propriedade. Martins (1983) evidencia que este não tem sido um posicionamento recente no campo brasileiro. Há tempos os argumentos que apelam pela superioridade técnica da grande propriedade são utilizados na tentativa de suplantar e/ou mascarar a produção das pequenas unidades

Alguns argumentam pela superioridade da grande propriedade na produção agropecuária, que pode mais facilmente desenvolver as suas forças produtivas, utilizar maquinaria, etc. Essa afirmação é capciosa. Para que haja a grande unidade de produção não é necessário que haja a grande unidade de propriedade. A extensão da produção não está irremediável e necessariamente vinculada à extensão da propriedade, a não ser na cabeça do capitalista, daquele que não imagina o crescimento econômico senão com base na exploração do trabalho alheio (MARTINS, 1983, p. 149, grifo do autor).

Esse fato pode ser observado, por exemplo, no Assentamento Pousada Alegre, onde o aumento da produtividade da terra não depende necessariamente do aumento da área das propriedades. Onde hoje se encontram 60 famílias que sobrevivem da pequena propriedade familiar, o que existia era uma antiga fazenda onde se praticava a pecuária extensiva, marcada pela deficiente produtividade. Constituía-se mais em uma área voltada a servir de reserva patrimonial e de valor. Assim, a terra somente tem sentido se for apropriada com fins produtivos.

Nesse sentido, destaca-se a resistência do trabalhador no campo: “[...] luta contra a

conversão da terra de trabalho, terra utilizada para trabalhar e produzir, em terra de exploração, terra para especular e explorar o trabalho alheio.” (MARTINS, 1983, p. 145,

grifo nosso).

4.3 Situação Geral da Atual Configuração dos Assentamentos Rurais da Região de