• Nenhum resultado encontrado

Axiom´ aticas n˜ ao completas

No documento Lógica Para Computação - Marcelo Finger (páginas 71-75)

Cap´ıtulo

3.6 Axiom´ aticas n˜ ao completas

Finalizamos este cap´ıtulo mostrando duas axiomatiza¸c˜oes n˜ao completas da

LPC. Estes dois exemplos servir˜ao para mostrar duas coisas: (1) os cuidados que devemos tomar ao tentar axiomatizar uma determinada l´ogica (no caso, a LPC); e (2) uma t´ecnica que pode ser utilizada para provar que um sistema ´e incompleto ou, mas geralmente, para provar que uma determinada f´ormula n˜ ao ´e demonstr´ avel  num dado sistema axiom´atico. Portanto, esta t´ecnica serve tamb´em para provar a independˆencia dos axiomas de uma dada ax- iom´atica, isto ´e: para provar que o sistema obtido de eliminar um dos seus axiomas n˜ao consegue provar o axioma eliminado.

Nesta se¸c˜ao , “Completude” e “Corre¸c˜ao” referem-se a “Completude Fraca” e “Corre¸c˜ao Fraca”, respectivamente.

Defini¸c˜ao 3.6.1.  Considere a assinatura proposicional C 4 dada por C 04 =

{⊥}

, C 24 =

{∨

,

⇒}

e C n4 =

nos outros casos. O sistema axiom´atico P escrito na linguagem L(C 4) consiste dos seguintes axiomas e regras de inferˆencia:

(Ax1) (ϕ

ϕ)

 ϕ (Ax2) ϕ

 (ψ

ϕ)

(Ax3) (ϕ

 ψ)

 ((γ 

ϕ)

 (ψ

γ )) (MP) ϕ ϕ

 ψ

ψ

Defini¸c˜ao 3.6.2. Uma  valora¸c˜ ao para P  ´e uma fun¸c˜ao v : L(C 4)

 →

2 tal que:

1. v(

) = 0;

2. v(ϕ

ψ) =

(v(ϕ), v(ψ)); 3. v(ϕ

 ψ) = (v(ϕ), v(ψ)),

onde

 

: 22

2 e : 22

2 s˜ao as fun¸c˜oes de verdade cl´assicas (veja

Subse¸c˜ao 2.2.1).

Observe que a semˆantica de P coincide com a semˆantica cl´assica para os conectivos

 {⊥

,

,

⇒}

  (um conjunto adequado), portanto as tautologias de P (nesta linguagem e nas linguagens  Prop,  Prop1 e  Prop2, se usarmos as abrevia¸c˜oes usuais) s˜ao as cl´assicas.

Proposi¸c˜ao 3.6.3.  O sistema P  ´e correto com rela¸c˜ ao `as suas valora¸c˜ oes. Demonstra¸c˜ao:  Imediata: os axiomas s˜ao tautologias cl´assicas, e a regra (MP) preserva validade: se as premissas s˜ao verdadeiras, ent˜ao a conclus˜ao ´e tamb´em verdadeira.

Por´em, podemos observar que o sistema P n˜ao ´e completo com rela¸c˜ao `a sua semˆantica cl´assica:

Proposi¸c˜ao 3.6.4.   O sistema P n˜ ao ´e completo com rela¸c˜ ao `as suas val- ora¸c˜ oes.

Demonstra¸c˜ao:  Basta provar que existe uma tautologia (com rela¸c˜ao `as suas valora¸c˜oes, ou seja, uma tautologia cl´assica na linguagem L(C 4)) que n˜ao ´e demonstr´avel em P. Considere a f´ormula ϕ = (

⊥ ⇒

 p0). Claramente ϕ ´e uma tautologia. Provaremos que ϕ n˜ao ´e demonstr´avel em P usando a

t´ecnica seguinte: exibiremos uma semˆantica alternativa para P  que valide seus axiomas e suas regras de inferˆencia (portanto, P ser´a correto para essa semˆantica alternativa). Por´em, ϕ n˜ao ser´a uma tautologia com rela¸c˜ao a essa semˆantica, portanto n˜ao poder´a ser um teorema de P. Considere ent˜ao a seguinte semˆantica para P: as valora¸c˜oes s˜ao fun¸c˜oes como na Defini¸c˜ao 3.6.2, mas agora v(

) = 1 para toda v. Dado que

 ⊥

n˜ao aparece explicitamente nos axiomas e nas regras de P, vemos que P ´e correto com rela¸c˜ao a esta nova semˆantica. Mas, claramente, ϕ n˜ao ´e tautologia com rela¸c˜ao a esta semˆantica, pois para qualquer valora¸c˜ao v   tal que v( p0) = 0 temos que

v(ϕ) = 0. Portanto ϕ n˜ao pode ser um teorema de P, pela corre¸c˜ao de P

com rela¸c˜ao a esta semˆantica.

Um motivo ´obvio na falha de P  para axiomatizar a LPC  ´e a ausˆencia de axiomas e regras governando o s´ımbolo primitivo

 ⊥

 da linguagem de P. Um fato intuitivo b´asico com rela¸c˜ao `a axiomatiza¸c˜ao de sistemas l´ogicos ´e que deveriamos colocar regras e axiomas para cada conectivo declarado na assinatura, caso contr´ario nos vemos expostos a fen´omenos de incompletude como o que acabamos de apresentar.

Mas as coisas n˜ao s˜ao t˜ao f´aceis, e mesmo colocando axiomas que repre- sentam as inferˆencias b´asicas de uma l´ogica intuitivamente suficientes para ger´a-la, podemos ter surpressas. Mostraremos a seguir uma extens˜ao de P

acrescentando alguns axiomas para a constante

 e para a nega¸c˜ao derivada

¬

ϕ := (ϕ

 ⇒ ⊥

), que ainda resultar´a ser incompleta. A prova de incom- pletude ´e an´aloga `a prova da Proposi¸c˜ao 3.6.4, mas agora utilizaremos uma semˆantica trivalente, isto ´e, com trˆes valores de verdade.

Defini¸c˜ao 3.6.5.   O sistema P+ definido sobre L(C 4) ´e a extens˜ao de P

obtida pelo acr´escimo dos seguintes axiomas a P (onde

 ¬

ϕ denota ϕ

⇒ ⊥

): (Ax4)

⊥ ⇒

 ϕ

(Ax5) ϕ

 (

¬

ϕ

 ψ) (Ax6)

¬¬

ϕ

 ϕ (Ax7) ϕ

⇒ ¬¬

ϕ (Ax8)

¬

ϕ

ϕ

Primeiro de tudo, observemos que os acr´escimos feitos ao sistema P s˜ao classicamente corretos.

Proposi¸c˜ao 3.6.6. O sistema  P +´e correto com rela¸c˜ ao `a semˆ antica cl´ assica  de valora¸c˜ oes  v tais que  v(

) = 0.

Demonstra¸c˜ao: Imediata.

Para provar a incompletude de P+ com rela¸c˜ao `a semˆantica cl´assica intro- duzimos uma semˆantica alternativa para o sistema, tal que P+ ´e correto com rela¸c˜ao a essa semˆantica; por´em, essa semˆantica n˜ao valida uma certa tautologia cl´assica.

Defini¸c˜ao 3.6.7. Seja 3 =

{

0, 12, 1

}

. Uma valora¸c˜ ao∗ para  P +´e uma fun¸c˜ao v :  L(C 4)

 3 tal que:

1. v(

) = 0;

2. v(ϕ

ψ) =

(v(ϕ), v(ψ)); 3. v(ϕ

 ψ) = (v(ϕ), v(ψ)),

onde

 

: 32

3 e : 32

3 s˜ao as fun¸c˜oes de verdade definidas pelas

matrices abaixo.

1 1/2 0 1 1 1 1 1/ 2 1 0 0 0 1 0 0  1 1/2 0 1 1 0 0 1/ 2 1 1/2 1 0 1 1 1

(Aqui, o primeiro argumento das fun¸c˜oes

 

 e  ´e dado pela primeira coluna

de cada matriz, e o segundo argumento vem dado pela primeira linha de cada matriz; por exemplo, (1

2, 1) = 1.) A no¸c˜ao de conseq¨uˆencia semˆantica

 |

=∗

´e definida como segue: Γ

|

= ϕ  se, para toda valora¸c˜ao∗ v, se v(γ ) = 1 para toda γ 

 ∈

 Γ, ent˜ao v(ϕ) = 1.

 p

 p 1 0

1/

2 1

0 1

Proposi¸c˜ao 3.6.8.   O sistema  P + ´e correto com rela¸c˜ ao `a semˆ antica de  valora¸c˜ oes ∗ da Defini¸c˜ ao 3.6.7.

Demonstra¸c˜ao:  Uma verifica¸c˜ao rotineira, que deixamos como exerc´ıcio para o leitor.

Proposi¸c˜ao 3.6.9. O sistema P + n˜ ao ´e completo com rela¸c˜ ao `a semˆ antica  de valora¸c˜ oes cl´ assicas.

Demonstra¸c˜ao: A f´ormula ϕ = ( p0

 ⇒

 p0) ´e uma tautologia cl´assica, por´em

n˜ao ´e uma tautologia com rela¸c˜ao `a semˆantica de valora¸c˜oes∗ para P+ in- troduzida na Defini¸c˜ao 3.6.7. Com efeito, qualquer valora¸c˜ao∗ v   tal que v( p0) = 12  produz v(ϕ) = 12, portanto

|

=∗ ϕ. Pela Proposi¸c˜ao 3.6.8 temos

que



P+ ϕ. Logo, P+ n˜ao ´e uma axiom´atica completa para a LPC.

Como conseq¨uˆencia imediata da prova da Proposi¸c˜ao 3.6.9 obtemos que P+

n˜ao satisfaz o Teorema da Dedu¸c˜ao: com efeito, temos que p0

 

P+ p0, por´em



P+ ( p0

 ⇒

 p0). O mesmo fenˆomeno acontece com a rela¸c˜ao de conseq¨uˆencia

semˆantica

 |

=∗.

No documento Lógica Para Computação - Marcelo Finger (páginas 71-75)

Documentos relacionados