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CAPÍTULO I – A Deficiência em Contextos Globais

1.2. A Sociedade e a Deficiência

1.2.3. Barreiras Arquitetónicas e Mobilidade do Portador de Deficiência

A primeira vez que se ouve falar em eliminar barreiras arquitetónicas e que surgem alguns documentos oficiais sobre a matéria remonta a 1982. Em 1997 foi aprovado um con- junto de normas para melhorar a acessibilidade das pessoas com mobilidade reduzida e impôs-se como prazo o ano de 2004. No entanto, passados todos estes anos, muita coisa con- tinua por fazer.

Segundo Melo (2001), o conceito de barreiras arquitetónicas expressa que se está a impedir o livre acesso e a livre circulação às pessoas ou coisas, pelo facto de se criarem con- dições arquitetónicas que poderão criar obstáculos físicos, quer da sua volumetria e posicio- namento, quer do seu dimensionamento pouco adequado, quer da sua textura. Os indivíduos que apresentam limitações a estas barreiras arquitetónicas padronizadas pela sociedade, são considerados como deficientes pela mesma. Assim sendo, para Melo (2001), “A ‘deficiência’ começa quando à pessoa não lhe é possível ter independência funcional adentro dos padrões existentes no seu ‘habitat’.” (pág.218).

Um indivíduo com deficiência motora e incapacidade de locomoção, pode não ter des- vantagens na sua mobilidade, se tiver ajudas técnicas que lhe permitam a mobilidade, assim como uma habitação sem barreiras para o exterior.

As barreiras arquitetónicas existem e são uma realidade. Não nos podemos esquecer que esta não é uma realidade exclusiva dos edifícios antigos. Todos os dias se constroem edi- fícios sem acessibilidades, ruas com pisos irregulares e grandes inclinações, passeios sem

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43 rampas de acesso, altos e estreitos; sem respeitar pessoas que têm a sua mobilidade condicio- nada, mas que igualmente têm direito à sua dignidade e a olhar os outros de frente, sem ter que “mendigar” ajuda para uma simples ida à casa de banho.

Face às pressões resultantes dos movimentos nascidos nas Associações de Solidarie- dade Social, mais concretamente no Ano Internacional do Deficiente (1981), reconheceu o Estado português a necessidade de se legislar, com vista à legalização de normas reconhecidas como as condicionantes a que os projetos das edificações deveriam obedecer para garantir as condições mínimas de acessibilidade e a mobilidade dos seus utentes. Foi neste contexto que foi publicado o Decreto-lei 43/82 de 8 de fevereiro, cuja regulamentação nunca foi promulga- da. No entanto, face às pressões de diversas associações e à intervenção do Secretariado Nacional de Reabilitação, foi publicado o Decreto-Lei 123/97 de 22 de maio que vem adotar um conjunto de normas técnicas básicas de eliminação de barreiras arquitetónicas em edifí- cios públicos, equipamentos coletivos e via pública para a melhoria da acessibilidade das pes- soas com mobilidade condicionada. No entanto, este decreto foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 163/2006 de 8 de agosto, cujas normas foram atualizadas, procedendo-se à introdução de novas normas técnicas aplicáveis especificamente aos edifícios habitacionais. De acordo com o mesmo decreto:

De entre as principais inovações introduzidas com o presente decreto-lei, é de referir, em primeiro lugar, o alargamento do âmbito de aplicação das normas técnicas de acessibilidades aos edifícios habitacionais, garantindo-se assim a mobilidade sem condicionamentos, quer nos espaços públicos, como já resul- tava do diploma anterior e o presente manteve, quer nos espaços privados (acessos às habitações e seus interiores). (Decreto-Lei n.º 163/2006 de 8 de agosto)

Um estudo realizado em 2000 pela Associação de Defesa do Consumidor (DECO), revela-nos dados surpreendentes de como a vida dos portadores de deficiência é afetada devi- do à falta do cumprimento da lei.

De acordo com a DECO, das atividades que os inquiridos tiveram de desistir por falta de acessibilidades, encontra-se em primeiro lugar, o entretenimento, sendo também relevante

44 o facto de um quarto dos deficientes motores ter deixado de trabalhar, passando-se o mesmo com 13% dos deficientes visuais.

O Decreto-lei 247/89 de 5 de agosto veio subsidiar as entidades que admitissem pes- soas com deficiência ou mantivessem nos seus quadros trabalhadores que se tivessem tornado deficientes e cujas limitações assim o justificassem, como forma de incentivar a criação e manutenção de postos de trabalho para pessoas portadoras de deficiência:

b) Os subsídios de compensação e de acolhimento personalizado só são conce- didos, em caso de concorrência com os pedidos de atribuição de apoio finan- ceiro para adaptação de postos de trabalho, para eliminação de barreiras arqui- tetónicas, quando estas medidas se mostrem executadas ou em curso de execu- ção;

c) Os subsídios para adaptação de postos de trabalho e eliminação de barreiras arquitetónicas não podem ser concedidos por mais de uma vez à mesma empre- sa em relação às mesmas adaptações. (Artigo 25º - Acumulação de Subsídios)

O mesmo Decreto afirma:

1 - O subsídio para eliminação de barreiras arquitetónicas é concedido às enti- dades que admitam pessoas deficientes ou mantenham nos seus quadros traba- lhadores que se tenham tornado deficientes e cujas limitações o justifiquem.

2 - Os serviços do Instituto apreciam, caso a caso, as soluções técnicas para as quais foi requerido o subsídio, bem como o tipo de deficiência que fundamen- tou o pedido do mesmo. (Artigo 32º - Natureza e condições de concessão do subsídio para eliminação de barreiras arquitetónicas)

Embora já em 1989 houvesse uma preocupação em legislar no sentido de subsidiar as entidades que acolhessem pessoas portadoras de deficiência nos quadros, a criação do referido

45 o decreto não vem alterar, significativamente, a realidade destes indivíduos a nível profissio- nal, tal como nos é possível de verificar pelo estudo realizado pela DECO.

Os problemas das pessoas portadoras de deficiência ultrapassam as meras questões específicas de saúde, educação e transportes. Estas pessoas não conseguem transpor as barrei- ras arquitetónicas que o dia-a-dia lhes reserva, em locais públicos diversos, que todos têm o direito de aceder. Assistimos, diariamente, a situações reveladoras de falta de civismo, que numa dimensão mais abrangente se traduzem na falta de respeito pelos cidadãos que, pelas suas caraterísticas específicas, se encontram limitados pela sua mobilidade.

A falta de iniciativas, ou melhor, o desrespeito por estas, traduz-se em situações diá- rias de falta de civismo e reveladoras de alienação. Ignorar as pessoas portadoras de deficiên- cia e os seus direitos é ignorar a dignidade inerente a todos os seres humanos.

A orientação e a mobilidade do cidadão portador de deficiência são, sem dúvida, duas das questões mais importantes no processo da sua reabilitação e integração na sociedade. A questão da sua mobilidade por entre os mais diversos obstáculos, e tantas vezes por entre as barreiras arquitetónicas presentes em cada passo, e é de extrema importância, uma vez que esta se traduz na sua liberdade e por conseguinte, na sua autonomia.

Todos os dias, os cidadãos portadores de deficiência se vêem confrontados com obstá- culos que em muitos casos colocam a sua vida em risco, desde uma simples saída de autocar- ro, o pavimento degradado, as ruas modificadas por motivos de obras ou porque algum obstá- culo foi colocado no caminho. Seria mais fácil se o pavimento fosse nivelado, se existissem rampas e se as obras fossem sinalizadas. Durante vários anos, uma das lacunas no que diz respeito ao processo educativo e reabilitativo do portador de deficiência foi a sua orientação e mobilidade.

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