• Nenhum resultado encontrado

BARREIRAS RELACIONADAS COM A SOCIEDADE/CULTURA VIGENTE

CAPÍTULO III APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

CATEGORIA 4 BARREIRAS RELACIONADAS COM A SOCIEDADE/CULTURA VIGENTE

Na categoria 4 emergiram barreiras relacionadas com a própria sociedade e cultura e que na opinião dos profissionais tendem a influenciar a sua capacidade para intervir.

CATEGORIA 4 – BARREIRAS RELACIONADAS COM A SOCIEDADE/CULTURA VIGENTE - SUBCATEGORIA 4.1 - MITOS RELACIONADOS COM OS CUIDADOS PALIATIVOS

Nesta primeira subcategoria estão reflectidas as barreiras da sociedade que se referem aos mitos relacionados com os Cuidados Paliativos.

Referindo-se à localização física da equipa de Cuidados Paliativos no hospital onde trabalha, E2 salienta que “nós havemos de continuar num cantinho

enquanto houver esta ideia de que nós somos para o fim da vida. Ninguém quer chegar ao fim da vida, portanto ninguém se quer confrontar com isto”. A

mesma entrevistada reforça este aspecto dos mitos: “Muitas vezes há muitas

ideias distorcidas em relação àquilo que nós fazemos. É relativamente frequente ouvirmos comentários do género «desde que o doente sabe que está

em Cuidados Paliativos piorou»”.

No discurso de E5 também está referida a situação: “barreiras da sociedade

não estar muito preparada para este tipo de situações…lembro-me de uma vez ter tentado que o filho de uma doente, ele tinha 6 anos e a doente 27 na altura, viesse visitar a mãe porque pareceu-nos a nós, à equipa que era muito importante para ambos e lembro-me do psicólogo da instituição onde a criança estava, não ter aceite, não ter achado próprio…eu mandei fotografias em que a mãe deste menino estava claramente muito bem, esteticamente em termos da cara, em termos da expressão, e não foi possível e isso é uma das coisas que também acaba por ser uma barreira…até da nossa área profissional, psicólogos”.

Também nas palavras de E6 está reflectida a dimensão destas barreiras: “Há

obstáculos em relação às crenças, aos mitos dos Cuidados Paliativos e isso acho que é dever do psicólogo e não só tentar minimizar ao máximo isso”.

147

CATEGORIA 4 – BARREIRAS RELACIONADAS COM A SOCIEDADE/CULTURA VIGENTE - SUBCATEGORIA 4.2 – RESISTÊNCIAS DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE

Esta subcategoria reflecte a opinião das entrevistadas no sentido de identificarem como barreiras a resistência dos profissionais de saúde em relação aos Cuidados Paliativos o que tem impacto na actuação do psicólogo neste contexto.

No discurso de E2 pode verificar-se esta dimensão: “Mas ainda se pensa

assim. Tanto pensam os familiares, como pensam os profissionais, e portanto esta se calhar é a principal dificuldade no relacionamento com os outros profissionais”, e reforça que “é um trabalho de sensibilização progressivo mesmo com os próprios profissionais que às vezes não se consegue, porque há pessoas que simplesmente não têm abertura para compreenderem estas questões”.

A mesma situação é revelada por E4 que salienta: “Remete aqui para esta

questão que é «ainda há muito resistência de alguns médicos e mesmo de outros técnicos que acabam» (…) os enfermeiros, que estão mais em contacto com o doente e que muitas vezes até são eles que fazem a ponte para o médico a dizer «olhe, atenção que este doente já está nesta fase assim, assim» … e há muito esta resistência ainda, admitir que «vamos suspender os tratamentos» (…) Por esta resistência, a maior parte dos doentes não nos chega ou então quando nos chega já é numa fase pré-agónica ou agónica. É

complicado, é complicado”.

No mesmo sentido, E4 reforça o impacto da resistência dos profissionais no seu trabalho: “Outras têm um desconhecimento puro de prognóstico, já nem

digo do diagnóstico, porque ainda os há, mas isto dificulta imenso a intervenção de toda a equipa e claro que nós levamos também por tabela. É muito difícil, muito difícil nós trabalharmos reacções emocionais com aquela pessoa, fazermos a preparação para toda a despedida, fazer a retrospectiva de vida com ela, quando ela não está pr´aí virada, não é?”.

Outra das entrevistadas a referir a barreira relacionada com a resistência de outros profissionais foi E6 que afirma: “Acho que é dos próprios profissionais,

148

não referenciando o doente ou referenciam muito tarde. Muitas vezes em fase agónica e aí, fazemos, mas temos pouco tempo, não é?”.

CATEGORIA 4 – BARREIRAS RELACIONADAS COM A SOCIEDADE/CULTURA VIGENTE - SUBCATEGORIA 4.3 – DESCONHECIMENTO ACERCA DO QUE FAZ O PSICÓLOGO

A presente subcategoria refere-se a uma barreira identificada pelas entrevistadas que se prende com o desconhecimento acerca do que faz o psicólogo na sua prática profissional.

Como refere E1: “Acho que depois com o tempo as pessoas vão reconhecendo

que é uma mais valia, mas ainda acho que às vezes as pessoas criam expectativas irrealistas em relação ao psicólogo”. E1 prossegue, reforçando

este aspecto: “Esse é um dos constrangimentos que eu às vezes sinto. Neste

momento se calhar não tanto, mas reportando aos anos todos que eu trabalho, «Então, foste lá e falaste uma vez e não resolveste nada?», não é? É isso”.

Nas palavras de E3 está presente esta barreira: “há muito desconhecimento

sobre o que é que o psicólogo faz ou pode fazer e como é que ajuda, como é que não ajuda… e portanto, há muito pouca informação neste sentido … as pessoas têm medo, têm medo mesmo”. A mesma entrevistada reforça: “Depois é a questão de associarem muito a questão do psicólogo ao maluco, mais do que o psiquiatra, o que é uma coisa curiosa … ãh, ao maluco e ao fraco… «eu sou forte, eu não preciso de psicólogo porque eu sou forte», há muito esta ideia ainda de que quem é fraco de emoções ou de espírito é que vai ao psicólogo, porque as pessoas fortes não precisam de ir, aguentam”.

No mesmo sentido, E4 aborda esta barreira: “depois, os mitos em relação à

intervenção do psicólogo que ainda existem. Mesmo, ãh … os mitos que existem quer da parte dos técnicos, quer dos doentes … ãh, alguns doentes

dizem assim: «ai, então … mas eu não sou maluco», é o chavão, e outros

dizem : «ai, vem cá o psicólogo falar comigo, eu devo estar muito mal mesmo!». Portanto, há muitas vezes este mito mesmo integrado na equipa aquilo que nós tentamos fazer é até os outros elementos desmistificarem isso também: «Olhe, nós somos uma equipa que é composta por vários elementos,

149

nós todos vamos passar, claro que não vamos passar aqui todos ao mesmo tempo, mas vamos passando, vai-nos conhecer a todos»”.

As subcategorias identificadas neste âmbito pelas participantes são consonantes com a literatura que aborda as resistências à efectiva implantação dos Cuidados Paliativos.

Da literatura consultada, verifica-se que subsistem ideias distorcidas acerca dos Cuidados Paliativos e que, por inerência, poderão condicionar a intervenção do psicólogo neste contexto.

Em secção oportuna da presente dissertação foram detalhadas as barreiras identificadas por diversos autores no que se refere à aceitação dos Cuidados Paliativos. Importa ressaltar a este respeito o estudo a nível europeu levado a cabo pela EAPC (LYNCH et al.., 2010), no qual se evidenciam alguns dos obstáculos mais apontados em diferentes países e dos quais se salienta os mitos e desconhecimento acerca dos Cuidados Paliativos na sociedade em geral e também ao nível político e institucional.

A este respeito, Abiven (1997) afirma que “Se quisermos que alguma coisa mude na nossa sociedade, é preciso aceitar, num momento ou outro, confrontos com esta última”, referindo-se à morte. O mesmo autor reitera no âmbito de uma disputa conceptual e semântica do termo “Cuidados Paliativos” que existe uma maioria que critica o termo porque na verdade se opõe aos próprios cuidados preconizados pela expressão. Abiven (1997) também salienta que provavelmente a maior percentagem de pessoas que não compreende a nova terminologia de Cuidados Paliativos está entre os prestadores de cuidados, na medida em que “vem perturbar os seus esquemas de pensamento e os seus hábitos”(pp. 19).

A propósito de terminologia e de barreiras aos Cuidados Paliativos refira-se um estudo que de forma objectiva visou avaliar o impacto de uma alteração na designação dos cuidados prestados numa entidade em relação ao tempo médio de referenciação de doentes para este local a partir de unidades de oncologia (DALAL et al., 2011). Os investigadores substituíram a designação do serviço de Cuidados Paliativos por Cuidados de Suporte, tendo verificando de

150

forma surpreendente uma diminuição significativa do tempo de referenciação por parte dos oncologistas de doentes em fases avançadas, o que provavelmente evidencia as resistências existentes em relação aos Cuidados Paliativos entre alguns profissionais de saúde de outras áreas da medicina. Ainda no que se refere aos preconceitos que poderão constituir-se verdadeiras barreiras aos Cuidados Paliativos, Neto (2010, pp. 15) salienta que apesar de nos últimos anos se falar mais de Cuidados Paliativos “Certo é que, para uma parte dos portugueses, incluindo muitos profissionais de saúde, este tipo de Cuidados permanece desconhecido, ou então é olhado com alguma desconfiança devido aos preconceitos e ideias erradas a eles associados”. Esta autora considera ainda que: “Também para muitos profissionais de saúde, nomeadamente para alguns médicos, a incurabilidade e a morte são vistas como insucessos, como derrotas pessoais (…)” e nesta linha de pensamento, Neto (2010, pp. 18) faz questão de reiterar a “ necessidade de os médicos e os outros profissionais de saúde estarem devidamente preparados para prestar tanto cuidados clínicos de índole curativa como também de índole paliativa”, reforçando que “Desta forma, estarão seguramente mais próximos dos que sofrem dos que sofrem, e serão também melhores profissionais”.

Refira-se adicionalmente que em relação aos psicólogos também se verificam concepções erróneas acerca das suas competências ou funções entre o público em geral e que têm impacto na imagem profissional do psicólogo perante a sociedade, o que, por sua vez, pode condicionar a sua aproximação aos doentes e familiares no contexto de Cuidados Paliativos. A este respeito, no âmbito da actuação do psicólogo no domínio da saúde e, mais concretamente, na intervenção sobre a dor crónica, Baptista (2012, pp.120) afirma que: “O trabalho do psicólogo no tratamento da dor crónica é dificultado pelas ideias erradas que ainda subsistem sobre o trabalho dos psicólogos na área da saúde em geral”, acrescentando que “Subsiste uma visão de que a psicologia se dedica sobretudo à intervenção clínica para problemas mentais, e inclusive para problemas mentais graves”.

151

D) ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DA QUARTA QUESTÃO DA ENTREVISTA AOS PARTICIPANTES

Ilustração 5 - Análise de Conteúdo - Categorias Tema 4

A análise da quarta questão permitiu a identificação de duas categorias. Na primeira categoria emergiram 3 subcategorias e da segunda categoria apenas foi identificada uma subcategoria. Detalha-se a seguir a análise das mesmas.

TEMA 4 – NECESSIDADES DE FORMAÇÃO PARA INTERVIR EM CUIDADOS PALIATIVOS