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BARREIRAS RELACIONADAS COM O PRÓPRIO PSICÓLOGO

CAPÍTULO III APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

CATEGORIA 3 BARREIRAS RELACIONADAS COM O PRÓPRIO PSICÓLOGO

Na categoria 3 evidenciaram-se aspectos condicionantes da intervenção do psicólogo relacionados com o próprio profissional.

Apresenta-se de seguida as subcategorias que emergiram da análise das respostas das participantes no que se refere a barreiras à sua intervenção.

CATEGORIA 3 BARREIRAS RELACIONADAS COM O PRÓPRIO PSICÓLOGO - SUBCATEGORIA 3.1– LIDAR COM DIFICULDADES PESSOAIS

A primeira subcategoria refere-se a aspectos relacionados com o próprio psicólogo no âmbito da necessidade deste lidar com dificuldades pessoais para intervir no contexto de Cuidados Paliativos.

Esta questão foi levantada por E5 que refere ser necessário dar atenção às próprias emoções no contacto com doentes e famílias acompanhadas em Cuidados Paliativos: “Primeiro obstáculos interiores…acho que isso qualquer

psicólogo, penso eu, que vai para Cuidados Paliativos deve estar atento às suas reacções”. A entrevistada quis salientar a tendência para, no contexto de

Cuidados Paliativos, surgir a tendência para se actuar em dois polos opostos, e ambos rígidos, caso não se faça uma reflexão pessoal acerca do significado para os próprios profissionais da intervenção nesta área: “ou de facto ficamos

quase compulsivos no cuidar e lembro-me de no princípio ser muito difícil ir de fim-de-semana, porque eu pensava «o que é que vai acontecer nestes dois dias”» e lembro-me de ser realmente muito complicado, ou lembro-me, também, de ter atenção ao tipo de roupa, sempre que havia um falecimento”,

ou no outro polo em que o profissional pode desejar proteger-se do impacto: “ a

ideia do psicólogo de «eu tenho é que me defender» e caímos no pólo…do tecnicismo, aplicar técnicas”.

Outras dificuldades com as quais o psicólogo pode ter que lidar são expressas igualmente por E5: “as barreiras de ser um setting completamente diferente…E

é uma área onde nós trabalhamos à cabeceira do doente e muitas vezes é uma área onde vemos muitas coisas esteticamente, sentimos muitas coisas, até em termos de odores…se não estamos preparados para controlar as nossas emoções e geri-las o melhor possível, podemos ter um comportamento não

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verbal e reacções faciais que vão tornar o nosso trabalho difícil até porque o

outro vai perceber que estamos desconfortáveis”.

CATEGORIA 3 BARREIRAS RELACIONADAS COM O PRÓPRIO PSICÓLOGO - SUBCATEGORIA 3.2 – NECESSIDADE DE AFIRMAÇÃO DA CLASSE PROFISSIONAL

Uma das barreiras identificadas refere-se á necessidade de afirmação da classe profissional, sendo apontada como função do psicólogo ajudar a esse esclarecimento.

No discurso de E1 está referida esta barreira: “Há outra questão para mim que

também é um constrangimento que eu acho que tem sido um trabalho que nós como psicólogos temos feito que é a nossa afirmação efectivamente”.

Também para E3 este aspecto é importante: “outra das maiores dificuldades é

nós mostrarmos, é eu conseguir mostrar às pessoas que há vantagens em usufruir do psicólogo”.

CATEGORIA 3 BARREIRAS RELACIONADAS COM O PRÓPRIO PSICÓLOGO - SUBCATEGORIA 3.3 – NECESSIDADE DE ESTABELECER LIMITES PARA A INTERVENÇÃO

Nesta subcategoria surgiu como potencial barreira relacionada com o próprio psicólogo a necessidade deste profissional estabelecer limites para a intervenção.

Esta dimensão é revelada por E3 na sua reflexão acerca do trabalho em Cuidados Paliativos: “Exige outra disposição e acho que exige um mecanismo

muito grande de nós constantemente estarmos a dizer a nós próprios quais são os limites”, reforçando que “em termos de obstáculos e dificuldades a intervenção… desde que haja o limite… o estabelecimento dos limites, acerca daquilo que nós temos competência para fazer, do género de «eu não transmito diagnósticos» e outras coisas…”.

Também no discurso de E5 é referido este aspecto: “porque isto é um trabalho

cansativo, muito, muito exaustivo e desgastante para todos os técnicos, mas eu penso que para o psicólogo, precisamente pelas áreas em que intervém, pelos conteúdos, pela profundidade, pelo sofrimento psicológico existencial em que

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muitas vezes intervém, é também muito doloroso e também pela quantidade…se multiplicarmos os 10 doentes pelas famílias em luto…tudo isto é trabalho…desgasta muito”.

As respostas das participantes nesta categoria são consistentes com a perspectiva detida por alguns autores no que se refere aos desafios que o trabalho no contexto dos Cuidados Paliativos coloca aos psicólogos. Refira-se aqui a perspectiva evidenciada por Carqueja (2010) que aborda esta dimensão: “Ser psicólogo em Cuidados Paliativos é bem diferente de ser psicólogo noutro contexto, noutra área de saúde, seja ela especificamente clínica ou da saúde. Esta relação psicólogo-doente-família assenta numa relação totalmente diferente daquela que habitualmente os psicólogos costumam adoptar (…)”. Daqui resulta para este autor uma necessidade de consciência dos seus limites, salientando contudo que: “Esta consciência não diminui o meu ser, enriquece o diálogo íntimo com o mais profundo de mim mesmo” (CARQUEJA,

2010, pp. 208).

No mesmo sentido, no relatório da APA (2000, pp. 2) ressalta-se a necessidade do psicólogo que pretende actuar em Cuidados Paliativos realizar uma auto- análise acerca das suas crenças pessoais e profissionais acerca do processo de morrer e das decisões em fim de vida, procurando avaliar o impacto dos seus valores e atitudes na sua intervenção neste âmbito.

No que se refere a barreiras relacionadas com a identidade profissional do psicólogo, releva-se a existência de mitos na sociedade associados à intervenção do psicólogo e que possuem raízes históricas por vezes difíceis de mitigar, relacionadas sobretudo com a associação entre o psicólogo e a doença mental grave, geralmente conotada negativamente (BAPTISTA, 2012). Obviamente que a persistência na actualidade de algumas dessas crenças, dificultarão a aceitação do psicólogo por parte de algumas pessoas, exigindo do profissional a capacidade de veicular as mensagens adequadas à desmistificação de alguns conceitos.

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