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BASES TEÓRICAS PARA A CONSTRUÇÃO DO OBJECTO EMPÍRICO

1. Complexidade e relativização

A procura de bases teóricas para a construção do objecto empírico do meu trabalho levou-me ao desenvolvimento da compreensão da complexificação e da relativação radical da noção de organização apresentada por Friedberg (191993; 1995).

Friedberg refere que a teoria das organizações, considerada numa perspectiva analista mais vasta, coloca a tónica nos aspectos complexos, dando-lhes um corpus relativo. Uma tal perspectiva possibilita o entendimento de que, o que interessa, não é o objecto social simples. O que interessa é o processo de construção de uma ordem local, como modalidade particular, central e omnipresente da construção da acção colectiva dos homens.

Trata-se de evidenciar os mecanismos e processos pelos quais é instaurado e assegurado no dia-a-dia o mínimo de coordenação e de ajustamento entre os comportamentos dos indivíduos. Este mínimo de coordenação e de ajustamento torna-se o garante da possibilidade de acontecer a acção colectiva.

A evidência desses mecanismos e processos exige que se desmonte e demonstre de que forma esse mínimo acontece. Essa evidência possibilita ver quão complexo é o objecto social, falsamente considerado simples.

2. O modelo clássico de organização

Para bem entender a complexidade da organização nesta perspectiva torna-se necessário apor as premissas do modelo clássico de organização que Friedberg referencia (1993; 1995).

As premissas apontadas são o carácter instrumental, a unidade e coesão e a delimitação clara e unívoca da organização. O carácter instrumental da organização enfatiza a relação dos membros com vista a fins exógenos, predeterminados e fixos; esse carácter instrumental torna a organização simples correia de transmissão que actua de forma transparente, passiva e obediente. A unidade e coesão enfatiza a organização como um todo homogéneo e coerente que impõe a sua racionalidade, aos seus membros; isto é: aos membros da organização é imposto o respeito pelas regras, pelos papéis a desempenhar, pelas relações previstas na estrutura formal; não há lugar para conflitos dado que todos os membros se orientam pelas mesmas preocupações e valores. A delimitação clara e unívoca denota uma organização com fronteiras formais que separam o funcionamento interno, dos acontecimentos exteriores. Tal delimitação torna estes acontecimentos exteriores sem qualquer

repercussão no interior da organização, a não ser que, sejam mediatizados e retomados pelo topo da organização.

Apontadas as premissas da organização clássica, Friedberg refere que se torna claro a desconstrução ou questionamento a três planos: a nível da racionalidade, do carácter anárquico e das fronteiras.

O questionamento da racionalidade dos comportamentos dos indivíduos e do conjunto que eles formam denunciam a limitação da acção humana. A acção humana em todos os planos só é racional de forma limitada; daí deriva que as organizações, como os indivíduos, não possam pretender uma racionalidade absoluta.

O carácter potencialmente anárquico das organizações é uma constante devido as tendências centrífugas dos comportamentos dos indivíduos ou dos grupos que as compõem; dessas tendências resultam consequências conflituais que questionam a coerência e coesão.

As fronteiras ou limites das organizações não são estáveis nem estanques; são flutuantes, porosas e elásticas devido aos processos de trocas reais realizados pelos seus membros; essas trocas asseguram o funcionamento normal da organização.

A organização depende directamente da acção humana, onde entra em jogo a racionalidade, a afectividade e o cálculo. Os conceitos de racionalidade, afectividade e cálculo constituem o quadro de referência que levantam o problema da acção humana. É possível, dessa forma, explicar e analisar os comportamentos dos indivíduos e dos grupos das organizações. São conceitos que evoluíram separadamente mas que se tornaram complementares para este entendimento.

O conceito de acção humana teve as suas raízes nos trabalhos do movimento das relações humanas. A explicação consigna o alargamento progressivo das concepções e motivações que restituem ao indivíduo um mínimo de autonomia quanto as suas necessidades; o indivíduo é visto como um agente complexo e relativamente imprevisível (Bennis, 66, in Friedberg, 191993; 1995).

O conceito da noção clássica de racionalidade passou a ser relativizado ao ser tomado em consideração os efeitos da afectividade e do cálculo que os indivíduos realizam. Esta relativização decorreu graças aos trabalhos de Simon no percurso decorrente de 119955 a 119957, e aos trabalhos de March e Simon no ano de 119958 (Friedberg, 191993; 1995). Desta forma ultrapassava-se as questões da psicologização da racionalidade da teoria clássica das organizações. Para a teoria clássica o comportamento humano não constituía problema. Os comportamentos negativos a corrigir não eram resultado da racionalidade do comportamento do indivíduo no trabalho, decorriam, sim, de estruturas de trabalho mal pensadas e não realizadas. A existência dos comportamentos negativos dos indivíduos surgiam devido a aplicação defeituosa dos preceitos de uma ciência da organização que era mister construir. A questão de fundo era então: o factor humano podia ser desproblematizado a partir do momento em que existisse uma boa organização.

A partir do postulado do homo economicus, a ciência da organização passa a dispor da teoria das motivações. Através desta teoria, os comportamentos humanos tornavam-se perfeitamente

previsíveis. Cada agente da organização era, a cada instante, racional. Isto é, agia de forma esteriotipada às mudanças das condições físicas do seu meio ambiente. Essa acção era realizada através da procura da maximização dos seus ganhos ou cálculos.

Os estudos realizados no âmbito da perspectiva tayloriana do homo economicus trouxeram à luz o que era inexplicável na óptica clássica. O indivíduo é então entendido, não apenas como movido pelo apetite inexorável do ganho, mas também é motivado pela sua afectividade e pelas suas necessidades psicológicas que são mais ou menos conscientes. Crozier refere que "Ele não é só uma

mão, é também coração" (1964, m Friedberg, 191993; 1995).

Com estes estudos nasceu o movimento das relações humanas, desenvolvendo-se estudos no âmbito da antropologia e da etnometodologia que se constituíram como os grandes momentos da sociologia industrial, da psicossociologia do trabalho e da sociologia da burocracia, quer nos Estados Unidos, quer na Europa.

Esses estudos demarcaram um novo entendimento da vida concreta das organizações. Revelaram que as práticas de comando, a eficácia das relações hierárquicas, a realidade das interacções informais se constituíam e se escondiam atrás de relações formais.

A ideia geral resultante desses estudos foi a de que havendo melhores relações humanas haveria organizações mais capazes. No entanto os contributos do movimento foram ilusórios. O movimento das relações humanas não integrou os contributos de ordem afectiva dos membros da organização. O elo entre as estruturas formais da organização do trabalho e as estruturas informais dos sentimentos e relações não foi problematizado nem elucidado.

As relações humanas, vistas na perspectiva do movimento, desenvolviam-se num vazio social, num campo onde a lógica dos sentimentos não tinha lugar. Manteve-se a visão tayloriana de que um indivíduo exercia o seu trabalho de forma passiva respondendo de maneira esteriotipada aos estímulos. Os estímulos afectivos foram apenas acrescentados aos económicos.

A introdução da afectividade no raciocínio é contrabalançada e dominada pela natureza humana que é entendida como possuidora de propriedades e necessidades inventariadas, previsíveis e influenciáveis. Tudo se passava no âmbito da necessidade social, onde a necessidade era pertencer e ser reconhecido. Não havia reconhecimento da vastidão das motivações humanas.

Foi o movimento das relações humanas que substituiu a visão do homo economicus pelo homem social. Manteve porém o raciocínio de natureza dedutiva: o comportamento do homem tem traços substituíveis e através deles pode-se deduzir os seus comportamentos. Mantinha-se assim realizada a psicologização do estudo das organizações. A pirâmide de Maslow imputa aos membros das organizações necessidades psicológicas que eles procuram realizar pela participação na organização. As necessidades são então hierarquizadas e explicadas à luz das etapas de desenvolvimento individual e social. Quando as necessidades estão relativamente estáveis e uniformes impõem constrangimentos autónomos ao funcionamento das organizações. Esses

constrangimentos são tidos em conta ao mesmo nível dos constrangimentos técnicos e económicos quando se pretende que as organizações sejam de sucesso.

A performance satisfatória de uma organização depende da congruência entre as estruturas, os modos de funcionamento da organização e o estado de desenvolvimento das necessidade psicológicas dos indivíduos. A noção de congruência constitui-se como quadro teórico onde se pretende que melhores relações conduzam a melhores organizações. Trata-se de um quadro teórico que é colocado ao serviço das organizações de forma prescritiva.

A evolução das necessidades psicológicas do homem levou à substituição do homem social (perfil caro ao movimento das relações humanas) a um novo perfil - o perfil psicológico. Pelo perfil psicológico o homem procura realizar-se, actualizar-se. Para tal realização tornava-se necessário criar estruturas congruentes com a realização e actualização. Essas estruturas ou espaços eram enquadradas como desburocratizantes, para devolver ao homem os seus espaços de autonomia. Dessa forma o homem tinha oportunidade de se empenhar e de se realizar, aumentando as recompensas intrínsecas das tarefas (Herzberg, 66, in Friedberg, 191993; 1995).

As necessidades psicológicas dos indivíduos mostram-se diferenciadas e a estrutura formal torna-se parte integrante da reflexão a realizar. A estrutura formal é então objecto de todos os esforços de mudança. Mais do que mudar as pessoas tornava-se contingente mudar as estruturas induzindo à uma abordagem situacional dos comportamentos (Fiedler, 67, in Fridberg, 191993; 1995). A mudança das estruturas, a mudança do situacional tornou-se a base do movimento de fundo - o das relações humanas - que promoveu: a multiplicação da melhoria das condições de trabalho; a humanização do trabalho e a reestruturação do mesmo.

Este movimento teve o seu apogeu nos meados dos anos setenta, em França, sendo referido por Friedberg, que verificaram-se os mesmos efeitos de moda e entusiasmo nos anos oitenta através do que se passou a chamar Círculos de Qualidade.

O movimento das relações humanas teve porém um efeito limitado. As suas prescrições baseavam-se numa reflexão reestruturadora do taylorismo. O raciocínio implícito nas prescrições implicava uma visão ou entendimento abstracto, isolado, da pessoa humana. As prescrições não tinham em conta o contexto, esquecendo-se que aquele era o plano de acção de actualização da pessoa.

Desta forma os teóricos da corrente do movimento das relações humanas incluíam as estruturas formais no campo de análise, insistindo nas mudanças estruturais para que a mudança acontecesse. Esqueciam porém de conceptualizar a complexidade e reciprocidade entre os elementos formais e informais da organização. Realizavam uma dicotomia entre os elementos formais e informais como se, se tratassem de variáveis independentes. A pessoa humana em acção na organização é reduzida aos imperativos técnicos e económicos da eficácia. De forma abusiva, como refere Friedberg, o funcionamento das organizações é reduzido a uma das duas lógicas: a) a da

eficácia organizacional; b) a das aspirações/necessidades dos indivíduos. O movimento das relações humanas adapta o indivíduo à organização.

Friedberg realça que esta forma de análise/interpretação do movimento de relações humanas, ou o inverso, a forma do estilo disfuncionalista de intervenção (Enriquez, 1972) - adaptação da organização aos desejos dos indivíduos - são visões normativas que procuram reconstruir a organização ideal de maneira dedutiva. Trata-se de explicar o funcionamento das organizações e das modalidades de mudança numa abordagem puramente psicológica.

Esta abordagem de carácter redutor, estático e de raciocínio normativo foi contestada por vários autores. Argyris (1964) explica os comportamentos alienados de apatia do homem teórico não realizado, falando de necessidades reprimidas ou espezinhadas. Vroom (1964), Schein (1965) e Bennis (1966) introduziram a noção de 'homem complexo', flexibilizando os esquemas de interpretação, permitindo a aceitação da multiplicidade de motivações inerentes ás situações reais. Com estes últimos autores foi restituído ao homem a sua autonomia, logo a sua imprevisibilidade.

3. Da racionalidade objectiva à racionalidade subjectiva: a dimensão oportunista do comportamento do homem

No ponto anterior viu-se de que forma a abordagem psicológica explicou o comportamento humano no seio das organizações como tendo carácter funcional e instrumental. Tal decorreu da conceptualização realizada que não tomou em consideração os laços entre os indivíduos e as estruturas nas quais esses indivíduos agem.

Com as contribuições dos estudos empíricos relativos à tomada de decisão 'nas' e 'pelas' organizações, tornou-se possível visualizar um novo funcionamento das organizações. Mais do que visualizar, a reflexão empírica realizada sobre os mecanismos cognitivos e sociais das escolhas humanas, permitiu o desenvolvimento de um novo modelo mais modesto, mas mais realista. Coube a Herbert Simon (1957; citado por Friedberg, 1993;1995) o desenvolvimento do conceito de racionalidade limitada. Segundo Simon a conduta humana acontece nas organizações como sendo desejada de maneira racional.

Esse conceito implica o entendimento de que a teoria das organizações só tem utilidade e justificação se admitir que a racionalidade humana está sujeita a limites. Estes limites existem em função do meio ambiente organizacional onde se encontram aqueles que têm que tomar decisões. Aquele que decide, quem quer que seja, tem por função prioritária explorar esses limites.

Explicando o seu conceito e justifícando-o, Simon contesta o modelo da racionalidade omnisciente ou objectiva que explica a forma como o decisor selecciona a melhor solução em função das suas preferências. Tal modelo assenta em três premissas a seguir apontadas. Uma dessas premissas é a de que o decisor dispunha de todas as informações que precisava, bem como, de uma capacidade ilimitada para as tratar. Era como se o decisor estivesse num universo de transparência e

fosse dotado de omnipotência cognitiva. A segunda premissa implica que o decisor teria uma ideia clara das suas preferências que eram estáveis, coerentes e hierarquizadas. A terceira premissa implica que o decisor tinha competência para accionar um raciocínio sinóptico, realizado através de um exame comparativo, exaustivo e simultâneo de todas as soluções possíveis, bem como das suas consequências.

Não aceitando este modelo e explorando as questões da racionalidade limitada, Simon (1955; 1956; March & Simon, 1958) refere que toda a escolha se faz sob coacção. O comportamento humano acontece de forma contingente, oportunista face aos constrangimentos e as oportunidades existentes no contexto. O comportamento é potencialmente instável e variável (Williamson, 1975; Crozier & Friedberg 1977). O conceito implica que os indivíduos não são simples reflexos da sua socialização. São antes, o resultado da interacção dessa socialização com as características, constrangimentos e oportunidades do contexto de acção.

A racionalidade limitada liberta o homem da concepção sobressocializada do homem (Wrong, 1967 in Friedberg, 1993; 1995). Esta última explica o comportamento presente com base no passado e nas experiências dos indivíduos. A socialização é a forma marcante que leva os indivíduos a agir.

Contrário a concepção de Wrong, Simon considera que a racionalidade limita permite ao indivíduo a recuperação do mínimo de distância e autonomia em relação as experiências passadas, a tudo o que elas inculcaram: normas, valores e atitudes.

Para Simon, a racionalidade humana é limitada a dois grandes constrangimentos: 1) a informação é sempre incompleta, o conhecimento é fragmentário face as consequências das diferentes possibilidades de acção e dos seus valores no futuro; 2) nenhum decisor é capaz de optimizar as suas soluções dado que a complexidade dos processos mentais ultrapassa a capacidade de tratamento das informações e do raciocínio humano. No referente ao primeiro constrangimento, a fragmentação, a incompletitude decorre de toda uma espécie de razões como seja falta: de tempo, de recursos, de imaginação e de atenção. O que o decisor analisa é apenas um pequeno número de soluções possíveis ou imagináveis. Quanto ao segundo constrangimento, o que ocorre é o desenvolvimento de um raciocínio sequencial (e não um raciocínio sinóptico). O decisor parte de uma ideia mais ou menos precisa daquilo que ele considera ser aceitável de ser analisado. O decisor examina cada opção aberta (que se lhe apresenta) e escolhe aquela que corresponde a essa ideia. A sua escolha recaí sobre o que ele considera ser a melhor das soluções examinadas. Para o decisor a escolha é uma boa solução ou pelo menos uma solução razoável.

Simon (1976; in Friedberg, 191993;1995) salienta que a racionalidade limitada é uma racionalidade procedimental. Tal deve-se ao facto de ser realizada segundo um procedimento racional de escolha realizado face aos constrangimentos e oportunidades. Nesse sentido trata-se de uma escolha subjectiva do decisor (Simon, 1982; idem). O decisor não maximiza, nem optimiza a escolha; apenas contenta-se com uma solução satisfatória.

Outra característica da racionalidade limitada é que ela é tributária do presente e do passado do decisor. Essa racionalidade decorre do produto conjunto do que Boudon chamou de efeito de posição e ainda do efeito de disposição. O efeito de posição, ou seja, a posição que o decisor ocupa nas estruturas do contexto de acção condiciona, ou, dá-lhe acesso a diferentes informações. O efeito de posição realça o contexto da tomada de decisão. Isto é são tidas em conta as condições organizacionais e sociais. O efeito de disposição é aquele que faz o decisor variar a sua decisão de acordo com as suas disposições mentais, cognitivas, afectivas. Esse efeito não é resultado simplesmente do momento, mais do que isso, ele resulta de toda a socialização a qual o decisor foi sujeito (1986, in Friedberg, 1993;1995).

A noção de racionalidade limitada implica a relativização radical da ideia de racionalidade. Por um lado o contexto da tomada de decisão considera as condições organizacionais e sociais. Dessa forma a percepção, a racionalidade, é construída, condicionada, tendo por base as estruturas do espaço de acção. Nesse espaço de acção estão as diferentes características: materiais, técnicas, regras, procedimentos, equilíbrios de poder e as alianças que orientam a sua decisão. A percepção dos problemas dos actores, a emergência das soluções possíveis levam a estabilização que ocorre face a decisão tomada da forma acima referenciada.

Implica ainda, uma outra direcção. Nesta, a decisão tomada é explicada face as preferências dos decisores. São essas preferências que dão génese aos critérios de satisfação (Friedberg salienta ser o mesmo que racionalidade) dos decisores. Esses critérios tanto são conscientes como inconscientes e orientam as escolhas realizadas. Nesta linha de decisão de acordo com preferências estáveis e exógenas está o que foi convencionando chamar-se de 'Teoria da Escolha Racional'. Nesta linha Friedberg destaca os trabalhos de Festinger (119957) sobre dissonância cognitiva.

A dissonância ocorre entre várias cognições, sendo nesse sentido entendidas como todo o conhecimento, opinião ou crenças que os indivíduos tenham sobre o contexto, sobre si mesmo e sobre o seu comportamento.

A dissonância origina um estado de desconforto psicológico levando o indivíduo a agir para libertar-se desse estado. Face à uma dissonância o indivíduo pode mudar os seus valores, as situações e os comportamentos. Não há uma superioridade de qualquer destes componentes. Isto é: nem os valores comandam os comportamentos, nem tão pouco os comportamentos comandam os valores. O que estiver em causa, valores, comportamentos, situação, forma um sistema sem qualquer lógica causal linear. No entanto forçam a um constrangimento, sendo este o fundamental para desenvolver a dissonância que precisa ser resolvida.

Autores citados por Fridberg como Elster, Hirschman, Lindblom, March e Weick e Cohen resumem em quatro, os aspectos referentes à esta ideia do peso das preferências sobre a acção ou decisão a tomar. Num primeiro ponto está a questão da multiplicidade, fluidez, ambiguidade e contradição das decisões a tomar pelo decisor face as suas preferências. Dito de outro modo as preferências do decisor num determinado momento não são unívocas, nem tão pouco precisas ou

mesmo coerentes, muito pelo contrário. Num segundo aspecto é salientado que essas preferências podem ser posteriores, criadas pela acção e pela dinâmica que lhe é inerente. Logo, não é obrigatório que as preferências sejam necessariamente anteriores à acção. Já num terceiro aspecto é realçado que as preferências não são estáveis e independentes das condições de escolha. O inverso é verdadeiro: as preferências são adaptativas e sujeitas à modificações endógenas, significando isto que são produzidas pela própria situação de escolha. Finalmente o quarto aspecto: as preferências estão sujeitas à manipulações voluntárias ou involuntárias, conscientes ou inconscientes, logo não são intangíveis.

Estes quatro aspectos remetem para a afirmação de Friedberg: "É pois necessário desapertar

os laços entre o comportamento de um indivíduo e as suas preferências, as suas representações e os seus fins." (pp: 50; 1993; 1995). Na verdade as preferências e os fins dos actores não são fixos. Não

são tão pouco simplesmente os objectivos que o indivíduo adopta, ou julga adoptar. É pela, e na,