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O bem-estar social associado a uma distribuição de renda deve ser, em princípio, uma função crescente da “eficiência econômica” (que tem como proxy a renda média) e da “justiça social” (que pode ter como proxy a desigualdade) (RAMOS; MENDONÇA, 2005, p. 359).

Seguindo o mesmo conceito de bem-estar social, Barros e Mendonça (1995a) investigaram empiricamente o efeito combinado das mudanças na renda média e na desigualdade de renda ocorridas no Brasil sobre o nível da pobreza durante as décadas de 1960 e 1970. Com base nas informações dos censos demográficos para

a população economicamente ativa (PEA) com renda positiva de acordo com a renda pessoal total (soma das rendas de todas as fontes), os autores mostraram que o nível médio de renda aumentou 25% de 1960 para 1970, o que equivale a uma taxa de crescimento médio anual de 2,2%. Apesar do crescimento da renda, houve um aumento acentuado do grau de desigualdade nos anos 1960, com o coeficiente de Gini passando de 0,50 para 0,57, enquanto a razão entre a renda média do décimo superior e a dos 40% mais pobres subiu de 13,7 para 18,6 (RAMOS; MENDONÇA, 2005).

Porém, o crescimento verificado no período foi desigualmente distribuído. Os 10% mais ricos da distribuição foram aqueles que mais se beneficiaram do processo de crescimento, atingindo uma taxa de quase 4% a.a. – o dobro da taxa de crescimento média nos anos 1960. Com isso, a parcela da renda total apropriada por eles passou de 39,7% para 46,5%, o que se compara a uma variação de 11,6% para 10,0% na renda em mãos dos quatro décimos inferiores. Os mais pobres cresceram menos e perderam participação na renda total, mas quem menos usufruiu do crescimento foram aqueles situados nos décimos centrais da distribuição, que em alguns casos chegam até mesmo a sofrer reduções na renda média (RAMOS; MENDONÇA, 2005, p. 365).

O fato de não ter havido crescimento na renda média de todos os décimos da distribuição de 1970 em relação à de 1960 significa que não ocorreu melhoria de Pareto.22 Portanto, não foi possível concluir a respeito do que aconteceu com o bem- estar social e com o grau de pobreza. A distribuição de renda para 1970 domina em segunda ordem a distribuição para 1960 e, consequentemente, o nível de bem-estar social aumentou e a pobreza declinou ao longo dos anos 1960. A década de 1970, que engloba o período do chamado “milagre brasileiro”, foi caracterizada por um excepcional crescimento econômico. O nível médio de renda aumentou 97% de 1970 para 1980, o que equivale a uma taxa de crescimento média anual de 7%. Em paralelo a esse crescimento observado na renda, houve um pequeno aumento do grau de desigualdade, com o Gini subindo para 0,59. A fração da renda apropriada

22 Varian define a melhoria de Pareto do seguinte modo: se pudermos encontrar uma forma de melhorar a situação de uma pessoa sem piorar a de nenhuma outra, teremos uma melhoria de Pareto. Se uma alocação permite uma melhoria de Pareto, diz-se que ela é ineficiente no sentido de Pareto, se a alocação não permitir nenhuma melhoria de Pareto, então ela é eficiente no sentido de Pareto. (VARIAN, 2006, p. 15).

pelos 10% mais ricos aumentou em 1,4 pontos percentuais, chegando a 47,9%, enquanto a fração em mãos dos 40% mais pobres declinou ligeiramente para 9,7%.

Portanto, podemos avaliar que é possível afirmar que houve uma melhoria de Pareto quando a distribuição de renda de 1980 é comparada com a de 1970. A implicação direta desse fato é que, pode-se concluir que o bem-estar social aumentou e a pobreza diminuiu nesse período. Quando consideradas as duas décadas em conjunto, as taxas de crescimento são positivas para todos os décimos, tornando claro que houve uma melhoria de Pareto na distribuição entre 1960 e 1980. Isso caracteriza uma evolução e permite afirmar que a distribuição de renda para 1980 é superior à observada em 1960. Portanto, examinando o período 1960-1980 como um todo, apesar do aumento observado na desigualdade, o bem-estar social aumentou e a pobreza diminuiu.

A respeito da evolução do bem-estar social ao longo dos anos 1980, Ramos e Mendonça não chegaram a uma conclusão clara. Já na década seguinte, caracterizada por um período de maior crescimento econômico, esses autores concluem que o bem-estar social aumentou. O crescimento da renda beneficiou todos os estratos de distribuição de renda para 2002 em relação à distribuição da renda para 1992. Quando consideram o período de 1981 a 2002 como um todo, concluem que evidenciou uma melhoria no bem-estar social “[...] em decorrência, fundamentalmente, do crescimento da renda média” (RAMOS; MENDONÇA, 2005, p. 367).

Esta é a razão para Ramos e Mendonça deduzirem que tanto a pobreza como a extrema pobreza declinaram nas duas décadas. O grau de pobreza declinou sete pontos percentuais, passando de 40% em 1981 para 33% em 2002.23 Destacam que, apesar do crescimento da renda média no período, em 2002, o Brasil ainda apresentava cerca de um terço de sua população vivendo em domicílios pobres (RAMOS; MENDONÇA, 2005).

Ramos e Mendonça (2005, p. 371) verificaram, ainda, que a redução da pobreza de sete pontos percentuais, observada nas duas décadas como um todo, se

23 A década de 1990 se refere ao período de 1992 até 2002, pois, em 1991, a PNAD não foi coletada por causa do Censo Demográfico. Conforme Ramos e Mendonça, se compararem os dados de 1990 com os de 2002, identifica-se uma acentuada queda na renda média e uma também expressiva melhora na desigualdade. É preciso cautela, antes de tirar maiores conclusões, haja vista as transformações metodológicas introduzidas na PNAD entre esses dois anos. Apesar de não terem perdido de vez a compatibilidade entre as pesquisas das duas décadas, é sempre segura a comparação entre as PNADs de 1981 e 1992 (RAMOS; MENDONÇA, 2005).

deu inteiramente na década de 1990, mais especificamente após a implantação do Plano Real, em 1994. Ao contrário do observado durante a década de 1980, nos anos 1990, não somente o crescimento da renda média foi maior (2,7% a.a.), mas também foi mais bem distribuído, com o décimo mais pobre apresentando a maior taxa de crescimento da renda. Fruto dessa combinação, o resultado foi uma queda de oito pontos percentuais na incidência de pobreza entre 1992 e 2002.

Entretanto, é preciso deixar claro que a redução do percentual de pobres não necessariamente significa diminuição do número de pobres. É a partir dessa observação que Barros, Carvalho, Franco e Mendonça (2007) vão afirmar que, devido ao crescimento populacional ao longo das duas décadas (1992 a 2002), a população pobre aumentou em 8 milhões, apesar do grau de pobreza ter declinado em sete pontos percentuais. De acordo com os referidos autores, devido ao crescimento populacional, o montante de recursos necessários para aumentar a renda dos pobres de tal forma a eliminar a pobreza é maior em 2002 do que no início da década de 1980.

3.3 A PARTICIPAÇÃO DA MULHER NO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO