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A Bienal de Veneza de 2013: Contributo de Ai Weiwei.

Conforme dados conclusivos do capítulo anterior, passamos, agora, à terceira e última análise de três das intervenções artísticas patentes na Bienal de Veneza, do ano de 2013, fechando, assim, um ciclo de abordagem de uma das grandes exposições internacionais em que se ancora o nosso trabalho.

A curadoria do Pavilhão da Alemanha na edição da Bienal de Veneza que nos ocupa coube a Susanne Gaensheimer (Munique, 1967-) 758, historiadora de arte.

No texto introdutório que escreveu para o catálogo da representação da Alemanha na exposição mencionada, Gaensheimer esclarece que, com o seu conceito, pretendeu evidenciar a articulação da produção cultural actual na Alemanha com a globalização 759. Nesse sentido, constata que, por comparação com o que sucede noutros países europeus, é, de facto, na Alemanha que se verifica a grande concentração de artistas de todo o mundo – que aí vivem, estudam e trabalham 760. Por isso, frisa, actualmente a Alemanha é um país de imigração. E isto não é agora apenas um facto,

mas também um dos grandes desafios para o futuro 761.

Numa perspectiva idêntica, Leonhard Emmerling 762, director do sector de artes visuais do Goethe Institut, diz, no prefácio do catálogo mencionado, que teremos de

758 Susanne Gaensheimer, PhD com tese sobre o artista Americano Bruce Nauman. (1941-), Ludwig

Maximilian University, Munique. Desde 2009, directora do Museum für Moderne Kunst (MMK) / Museu de Arte Moderna, em Frankfurt/Main. Comissária do Pavilhão da Alemanha na Bienal de Veneza de 2011, premiado com o Leão de Ouro para o melhor pavilhão nacional. ARTSY / Não assinado. 18.05.2013. About the Curator: Susanne Gaensheimer. German Pavilion at the 55th Venice Biennale / Sobre a curadora: Susanne Gaensheimer. Pavilhão da Alemanha, na 55ª edição da Bienal de Veneza. https://artsy.net/post/germanpavilion-about-the-curator-susanne-gaensheimer; e: Susanne Gaensheimer. GOETHE INSTITUT / Não assinado. Biographical Information / Informação Biográfica. http://www.goethe.de/kue/bku/kur/kur/ag/gae/enindex.htm (21.05.2014).

759 GAENSHEIMER, Susanne. “Foreword / Preâmbulo”. In: 2013: p. 52. Ai Weiwei, Romuald Karmakar,

Santu Mofokeng, Dayanita Singh. 55th International Art Exhibition, La Biennale di Venezia / 55ª edição da Exposição de Arte Internacional, Bienal de Veneza. Ed. Gestalten.

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Susanne Gaensheimer cita o exemplo de academias como a Staedelschule, em Frankfurt, onde se fala inglês – precisamente porque o número de estudantes que falam alemão é inferior a trinta por cento do total de inscritos. GAENSHEIMER, Susanne. In idem.

761 This is now not only a fact but also one of the great challenges for the future. In: GAENSHEIMER,

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questionar cada vez mais como é que a ideia de nação pode ser conciliada com a realidade de um mundo globalizado, e como poderemos fazer justiça à especificidade das práticas e aspirações culturais locais e nacionais sem abandonar a nossa convicção de que certos valores são universais 763.

Por sua vez, Mark Terkessidis (Eschweiler, 1966-) 764, escritor alemão, esclarece, ainda no mesmo catálogo, datado de 2013, que nas cidades alemãs, e na faixa etária de crianças com idade inferior a seis anos, a maioria é de origem migratória. Por exemplo, em Frankfurt on Main sessenta e sete por cento desse grupo de crianças tem pelo menos um dos pais na condição de imigrante na Alemanha 765.

O ideal de um compromisso de partilha de uma cultura europeia, no contexto de uma comunidade cultural global foi a base comum de trabalho das curadoras dos pavilhões da Alemanha e da França para a 55ª edição da Bienal de Veneza. Nomeadamente, Susanne Gaensheimer, cuja biografia foi atrás referida, e Christine Macel 766, também curadora do Centro Pompidou, assim como dos artistas participantes

762 Leonhard Emmerling, doutorado pela Universidade de Heidelberg com a tese Kunsttheorie Jean

Dubuffets / A teoria da arte de Jean Dubuffet. Trabalha em curadoria de exposições de arte contemporânea desde 2002. Foi director da St Paul Gallery, Auckland, New Zealand e curador do pavilhão da Nova Zelândia para a Bienal de Veneza de 2009. É autor da obra, de 2003, Jean-Michel Basquiat, 1960-1988, Ed. Taschen. ALIBRIS / Não assinado. Não datado. Leonhard Emmerling. http://www.alibris.com/search/books/author/Leonhard-Emmerling (21.05.2014).

763 We will increasingly have to adress questions about how the idea of the nation may be reconciled with

the reality of a globalized world, and how we can do justice to the specificity of local and national cultural practices and aspirations without abandoning our conviction that certain values are universal. EMMERLING, Leonhard. “Preface / Prefácio”. In: 2013: p. 50. Ai Weiwei, Romuald Karmakar, Santu Mofokeng, Dayanita Singh. 55th International Art Exhibition, La Biennale di Venezia / 55ª edição da Exposição de Arte Internacional, Bienal de Veneza. Ed. Gestalten.

764 Vive em Berlim e Colónia. PhD em Pedagogia. Escreveu artigos para vários jornais e revistas alemães

sobre as temáticas de juventude, cultura popular, migração e racismo. Mark Terkessidis. Writer, psychologist, educator / Escritor, psicólogo, educador. http://www.academycologne.org/en/academy-of- the-arts-of-the-world/academy-members/mark-terkessidis.html (16.04.2014). Mark Terkessidis: Entre 2009-2011 foi membro do comité consultivo de Ciência e Actualidades no Goethe-Institut. Em 2009 foi membro da Cologne Initiative to Found an Academy of the Arts of the World / Iniciativa de Colónia para Fundar uma Academia de Artes do Mundo. Em 2012-2013 é leitor convidado na Universidade de St. Gallen, Suiça. Terkessidis integra o júri do Prémio BMW para o Compromisso Cultural. “Authors Biographies / Biografias de Autores”. In: 2013: p. 227. Ai Weiwei, Romuald Karmakar, Santu Mofokeng, Dayanita Singh. 55th International Art Exhibition, La Biennale di Venezia / 55ª edição da Exposição de Arte Internacional, Bienal de Veneza. Ed. Gestalten.

765 TERKESSIDIS, Mark. “National Turbulances. Unromantic Reflections on Post-Migrant Urbanity and

Art Production / Turbulências Nacionais. Reflexões não românticas sobre a Urbanidade Pós-Migrante e a Produção Artística”. In: 2013: p. 59. Ai Weiwei, Romuald Karmakar, Santu Mofokeng, Dayanita Singh. 55th International Art Exhibition, La Biennale di Venezia / 55ª edição da Exposição de Arte Internacional, Bienal de Veneza. Ed. Gestalten.

167 nos respectivos projectos: Ai Weiwei (Pequim, 1957-) 767, Romuald Karmakar (Alemanha, 1965-) 768, Santu Mofokeng (Joanesburgo, 1956-) 769 e Dayanita Singh

766 Christine Macel é curadora principal no Museu Nacional de Arte Moderna - Centro Pompidou (Paris)

desde 2000. Para além da sua curadoria de várias exposições, na qualidade de líder do Departamento de Criações Contemporâneas e Prospectivas, apresentou muitos jovens artistas no Espaço 315 do Centro Pompidou. Tem textos publicados em diversos catálogos, assim como em revistas de arte como a Flash Art e a Artforum. Autora do ensaio de 2007 Time taken, the work of time in the work of art / Captações do tempo, o trabalho do tempo na obra de arte (Monografik / Monografia, Centre Pompidou). ARTSY / Não assinado. 20.05.2013. About the Curator / Acerca da curadora: Christine Macel. https://artsy.net/post/frenchpavilion-about-the-curator-christine-macel (21.05.2014).

767 Ai Weiwei é um dos artistas contemporâneos chineses de maior destaque. Ajudou a criar, nos anos 90,

em Pequim, East Village, uma comunidade apostando no campo artístico experimental. Colaborou com a empresa suiça Herzog e de Meuron como consultor artístico, na área da Arquitectura, no projecto do Bird's Nest / Ninho de Pássaros, o Estádio Nacional de Pequim, inaugurado no ano de 2008. Para além de ter o seu trabalho artístico divulgado a nível mundial, Ai Weiwei tem-se destacado como activista e defensor de uma mudança política na China. THE GUARDIAN / Não assinado. Setembro, 2015. Ai Weiwei. http://www.theguardian.com/profile/aiweiwei (21.05.2014).

768 Romuald Karmakar vive em Berlim e é um cineasta independente. O seu primeiro filme de ficção,

datado de 1995, intitula-se Der Totmacher, na versão inglesa The Deathmaker / O Matador. É baseado em registos de âmbito psiquiátrico de um assassino compulsivo na Alemanha, nos anos 20. Recebeu o prémio Coppa Volpi para o melhor actor do Festival de Cinema de Veneza e, ainda, três prémios dos German Films Awards /Prémios do Cinema Alemão. O seu trabalho recente de não-ficção, Angriff auf die Demokratie—Eine Intervention / Democracy Under Attack - An Intervention / Democracia sob Ataque — Uma Intervenção, apresenta uma reflexão sobre o estado da democracia no contexto da crise financeira europeia. Foi exibido, em 2012, no Internationale Filmfestspiele / Festival internacional de Cinema de Berlim, conhecido por Berlinale. O cineasta é um membro da Akademie der Künste / Academia de Artes, de Berlim. RADCLIFFE INSTITUTE FOR AVANCED STUDY. HARVARD UNIVERSITY / Não assinado. Romuald Karmakar. https://www.radcliffe.harvard.edu/people/romuald- karmakar (21.05.2014).

769 Santu Mofokeng: O seu percurso como fotógrafo apresenta um interesse por uma incursão no

universo da espiritualidade, que a série Chasing Shadows / Perseguindo Sombras ilustra. O seu trabalho em torno da paisagem é gerido pelas coordenadas de espaço, ecologia, pertença e memória. As suas fotografias de paisagem urbana são pretexto para uma reflexão de teor existencial A qualidade da sua produção tem sido várias vezes premiada. CARGO (Personal Publishing Platform / Plataforma de publicação personalizada) / Não assinado. Não datado. Santu Mofokeng. http://cargocollective.com/santumofokeng/biography (21.05.2014).

168 (India, 1961-) 770 para o projecto de Gaensheimer, e Anri Sala (Albânia, 1974-) 771 para o de Macel 772.

Essa vontade comum pode traduzir-se na aceitação de uma proposta de natureza política, que partiu dos Ministros de Negócios Estrangeiros dos dois países acima citados. A proposta foi a da troca recíproca de pavilhões durante a exposição que nos ocupa. No ano de 2013 completou-se o cinquagésimo quinto aniversário do Elysée

Treaty / Tratado de Eliseu, que data de 1963 773, e incide na cooperação franco-alemã. Os signatários desse tratado, também conhecido como o Tratado da Amizade, foram Konrad Adenauer (Colónia, 1876-1966) 774, chanceler da República Federal da Alemanha, e o General Charles de Gaulle (Lille, França,1890-1970) 775, Presidente de

770 Dayanita Singh: Desde há três décadas que trabalha em séries fotográficas que revisita em diferentes

contextos, muitas vezes sob a forma de livros. A artista reorganiza essas imagens em narrativas diarísticas relacionadas com a vida e a cultura na Índia. A partir de 2013 começou a construir Museus Portáteis, constituídos por estruturas de madeira versáteis, como suporte expositivo para as suas imagens fotográficas, algumas mostradas, outras ocultas, num jogo de revelações ritmadas. ART INSTITUTE. CHICAGO / Não assinado. Não datado. Dayanita Singh. http://www.artic.edu/exhibition/dayanita-singh (21.05.2014).

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Anri Sala estudou na Academia Nacional de Artes de Tirana, Albânia; na Escola Superior Nacional de Artes Decorativas de Paris; e no Estúdio Nacional de Artes Contemporâneas de Tourcoing, França. Expôs, entre outras instituições, no Centro Pompidou, Paris (2012) e na Serpentine Gallery, Londres (2011). Recebeu vários prémios, entre o quais o Young Artist Prize / Prémio Jovem Artista da Bienal de Veneza (2001). Vive e trabalha em Berlim. MARIA GOODMAN GALLERY / Não assinado. Não datado. Anri Sala. http://www.mariangoodman.com/artists/anri-sala/ (21.05.2014).

772 The national container (of the German Pavilion) moves from its own to another national container, to

also demonstrate that the turbulences of the national principle are similar to each other in different countries. / O contentor nacional (do pavilhão alemão) move-se do seu próprio lugar para outro contentor nacional, para demonstrar que as turbulências do princípio nacional são semelhantes entre si em países diferentes. TERKESSIDIS, Mark. “National Turbulences / Turbulências Nacionais”. In: 2013: p. 60. Ai Weiwei, Romuald Karmakar, Santu Mofokeng, Dayanita Singh. 55th International Art Exhibition, La Biennale di Venezia / 55ª edição da Exposição Internacional de Arte, Bienal de Veneza . Ed. Gestalten.

773 Fonte: GAENSHEIMER, Susanne. “Foreword / Preâmbulo”. In: 2013: pp. 52-53. Ai Weiwei, Romuald

Karmakar, Santu Mofokeng, Dayanita Singh. 55th International Art Exhibition, La Biennale di Venezia. Ed. Gestalten.

774 Konrad Adenauer estudou nas universidades de Freiburg, Munique e Bona, formando-se em

advocacia. Foi preso pela Gestapo em 1944. Mais tarde, em 1949, tornou-se o primeiro chanceler alemão da Alemanha Ocidental, mantendo-se no cargo até 1963. Empenhou-se na reconstrução do país no período posterior à Segunda Guerra Mundial. A ocupação militar da Alemanha Ocidental terminou em 1952. Em 1955 foi reconhecida, internacionalmente, como uma nação independente. Adenauer foi, ainda, o fundador de um novo partido, a Christian Democratic Union (CDU) / União Democrata Cristã. BBC /

Não assinado. Não datado. Konrad Adenauer (1876-1967).

http://www.bbc.co.uk/history/historic_figures/adenauer_konrad.shtml (21.05.2014).

775 General de Gaulle, Presidente de França entre 1959-1969. Apoiou a independência da Argélia, tendo

esse país deixado de ser uma colónia francesa em 1962. Defendeu a ideia de uma Europa unida mas independente das grandes potências económicas. Assim, lutou para que a Grã-Bretanha não pertencesse à Comunidade Económica Europeia, devido ao envolvimento desse país com os E.U.A.

169 França. A partir de então 776, os dois países acordaram em juntar esforços, reconhecendo

que o aumento da cooperação entre os dois países, constitui uma etapa indispensável no caminho para uma Europa unida, que é o objectivo dos dois povos 777.

A troca dos dois pavilhões na Bienal de Veneza de 2013 articula-se, obviamente, com o questionamento do conceito de nação no contexto de um mundo globalizado, no sentido em que Appadurai o coloca, tal como já foi por nós referido no segundo capítulo desta tese 778. A primeira foto de grande destaque do catálogo da representação da Alemanha na bienal acima citada mostra a fachada do edifício do Pavilhão da Alemanha sujeita a uma intervenção que altera, profundamente, o seu significado. Assim, nessa imagem a palavra GERMANIA, gravada, em maiúsculas, na pedra dura e resistente aos muitos anos de construção do edifício 779 foi amputada perdendo as três primeiras letras, que foram substituídas por outras três. A leitura daí resultante passou a ser EGO MANIA

780

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BIOGRAPHY.COM EDITORS / Não assinado. Última actualização: 05.08.2016. Charles de Gaulle. http://www.biography.com/people/charles-de-gaulle-9269794#death-and-

legacy&awesm=~oExNV2W0yn4zkW (21.05.2014).

776 O Tratado da Amizade foi assinado em Paris, no dia 22 de Janeiro de 1963 em duplicado, nas versões

alemã e francesa. ADENEUR e DE GAULE, Charles. 1963. “Franco-German Friendship / Amizade entre a França e Inglaterra (1963)”. In: Documents - Politics between Immobility and Change. Franco-German Friendship (1963) / Documentos – Política entre a imobilidade e a Mudança. Cooperação entre a França e a Alemanha. (1963). 1963. Source of English translation: “Text of the Franco-German Treaty signed in Paris (22nd January 1963)”, in Western European Union Assembly-General Affairs Committee: A Retrospective View of the Political Year in Europe 1963. March 1964, p. 29f. / Fonte da tradução inglesa: “Texto do Tratado Franco-Germânico, assinado em Paris (22.01.1963)”, no Comité dos Assuntos Gerais da Assembleia da União Europeia Ocidental: Uma Visão Retrospectiva do Ano Político na Europa de 1963. Março, 1964, p. 29. http://germanhistorydocs.ghi-dc.org/sub_document.cfm?document_id=864 (17.05.2014).

777 Recognizing that increased co-operation between the two countries constitutes an indispensable stage

on the way to a united Europe, which is the aim of the two peoples. Documents - Politics between Immobility and Change. Franco-German Friendship (1963) / Documentos – Política entre a imobilidade e a Mudança. Cooperação entre a França e a Alemanha. ADENEUR e DE GAULE, Charles. In idem.

778 II Capítulo. GLOBALIZAÇÃO E MAINSTREAM: Arte e pedagogia. Página: 5.

779 O Pavilhão da Alemanha foi concebido pelo arquitecto Daniele Donghi. Primeiro foi mostrada aí arte

bávara. A partir de 1912 foram aí mostradas obras de toda a Alemanha. Encerrado ao público durante a Grande Guerra, reabriu em 1922, mostrando trabalhos da República Federal do Reich Alemão. Mais tarde foi reconstruído por ordem de Hitler, de acordo com um projecto de Ernst Haiger. LA BIENNALE / Não assinado. Não datado. The first Pavilions / Os Primeiros Pavilhões. http://www.labiennale.org/en/art/history/pavilions.html?back=true (21.05.2014).

170 Elke aus dem Moore (1965-) 781, directora do Departamento de Arte do Instituto

de Relações Culturais Internacionais, curadora, artista e historiadora de arte, refere no

catálogo acima citado, que Susanne Gaensheimer, através da curadoria para a bienal de 2013, dá continuidade à sua pesquisa de como superar um modo de pensamento de teor nacionalista. Nessa perspectiva, a troca de pavilhões celebrando o Tratado de Eliseu optimiza, pelo oportuno simbolismo, a sua actuação.

A relação histórica entre a França e a Alemanha é também tema de reflexão de Philipp Bagus, no contexto da questão mais alargada da implementação da moeda única na União Europeia. Intitulando essa reflexão Porque motivo Abdicou a Alemanha do

Marco, Bagus considera plausível a ideia de que a Alemanha tenha cedido na sua

soberania monetária, aceitando perder o marco pelo euro, como garantia para a reunificação 782, tal como afirmou Richard von Weizsaecker (1920-) 783, ex-presidente alemão. Philipp Bagus fundamenta, ainda, essa possibilidade no facto mencionado, em 2010, no website Spiegel Online (SPON) 784 de que o acesso a actas secretas validou a

tese de que Mitterrand exigira a moeda única para dar o seu acordo à reunificação 785.

781 MEDIENKULTUR, STTUTGART. Não datado. Interview mit Elke aus dem Moore, künstlerische

Leiterin des Künstlerhauses / Entrevista com Elke aus dem Moore, directora artística da Künstlerhauses. http://www.medienkultur-stuttgart.de/thema02/2archiv/news8/mks8moore.htm (18.05.2014). Link desactivado (24.06.2017).

Elke aus dem Moore, Directora do Departamento de Arte do Institut fuer Auslandsbeziehungen (IFA) / Instituto de Relações Culturais Internacionais, Alemanha. AUS DEM MOORE, Elke. “Preface / Prefácio”. 2013: p. 48. In: Ai Weiwei, Romuald Karmakar, Santu Mofokeng, Dayanita Singh. 55th International Art Exhibition, La Biennale di Venezia / 55ª Exposição Internacional de Arte, Bienal de Veneza. Ed. Gestalten.

782 A cedência da soberania monetária pela parte da Alemanha ocorreu em 1990. Nota de autor.

783 Richard von Weizsaecker, Presidente da Alemanha entre 1984-1994. Filiou-se na União Democrata-

Cristã em 1954. Richard von Weizsäcker (1984 - 1994). DER BUNDESPRAESIDENT /O Presidente Federal. Não assinado. Não datado. Richard von Weizsäcker (1984 - 1994). http://www.bundespraesident.de/DE/Die-Bundespraesidenten/Richard-von-Weizsaecker/richard-von- weizsaecker-node.html (25.05.2014).

Richard von Weizsaecker afirmou que o euro seria “nada mais nada menos do que o preço da reunificação”. WEIZSAECKKER, Richard von, Cit. in BAGUS, Philipp. 2011: p. 103. “Porque motivo abdicou a Alemanha do Marco”. In: A Tragédia do Euro. Ed. Actual.

784 Website referente ao semanário alemão Der Spiegel. Spiegel Online.www.spiegel.de (25.05.2014). 785 BAGUS, Philipp. 2011: p. 103, nota 61. “Porque motivo abdicou a Alemanha do Marco”. In: A

Tragédia do Euro. Ed. Actual. Fonte indicada pelo autor: MIK. 2010. Mitterrand forderte Euro als Gegenleistung fuer die Einheit / Mitterrand exigiu o euro como condição para a unidade.

171 Assim, ainda segundo o mesmo autor, uma das explicações para a aceitação do euro por parte da Alemanha, contra as aspirações da maioria da população alemã 786, é a de que o seu governo abdicou do marco para concretizar a reunificação das Alemanhas ocidental e do leste, em 1990. As negociações visando a reunificação começaram depois da queda do muro de Berlim. Os negociadores eram as duas Alemanhas e os Aliados vencedores da II Grande Guerra: o Reino Unido, os E.U.A., a França e a União Soviética, que, como é sabido, chegaria ao seu término em 1991, na sequência da queda do muro de Berlim, em 1989 787. De facto, depois da queda do muro de Berlim, a Alemanha ainda se encontrava sob dominação. O acordo de Potsdam (1945) 788 estipulara que após o estabelecimento de um governo adequado na Alemanha seria assinado um tratado de paz, o que não se verificou 789. Conforme relata Philipp Bagus, relembramos, economista alemão, em 1990 a União Soviética continuava a manter tropa destacada na Alemanha do Leste 790.

Segundo o ponto de vista em análise, o poder de uma Alemanha unificada era sobretudo temido pelos governos britânico e francês. O Acordo de 1990 foi elaborado para refrear esse poder 791. Mas, na verdade, para determinados países, e sobretudo para a França, a ameaça considerada mais constrangedora vinda da Alemanha era o seu Banco Central - o Bundesbank, porque antes da introdução do euro o marco era o

786 Aspirações da maioria da população alemã tornadas claras através de sondagens da opinião pública.

BAGUS, Philipp. 2011: p. 101. “Porque motivo abdicou a Alemanha do Marco”. In: A Tragédia do Euro. Ed. Actual.

787 Os aliados vencedores da II Grande Guerra foram o Reino Unido, os EUA, a França e a União

Soviética. No entanto, pouco tempo após a queda do Muro de Berlim a União Soviética desmembrou-se, tendo existido entre os anos de 1922 e 1991. Nota de autor.

788 A Conferência de Potsdam ocorreu em Potsdam, Alemanha, entre Julho e Agosto de 1945.

Participaram na conferência os aliados vitoriosos da Segunda Grande Guerra. Os objectivos do encontro foram a administração da Alemanha e o estabelecimento da ordem do pós-guerra. Entre os resultados da conferência conta-se o acordo de Potsdam referente à divisão da Alemanha e da Áustria em zonas de

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