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Branqueamento de Capitais e Droga

No documento O Branqueamento de capitais e a droga (páginas 42-45)

3. Branqueamento de Capitais

3.4. Branqueamento de Capitais e Droga

Situar a presente matéria é retomar o quadro legal em que a mesma se inscreve e salientar os contributos essenciais trazidos por diveros autores que se lhe têm dedicado.

Conforme referimos previamente, embora a expressão Branqueamento de Capitais seja anterior a 1988, foi neste ano, a nível das Nações Unidas, com a respectiva Convenção de 1988 (Nações Unidas, 1990), que aquela foi assumida formal e juridicamente, ou seja, foi então que o Branqueamento de Capitais passou ser considerado uma prática ilegal e passou a ser considerado crime. Esta formulação acompanhada da respectiva regulamentação decorreu precisamente do Branqueamento de Capitais ligado à Droga.

De facto, a evolução da problemática da Droga à época estava a ser objecto de

tal preocupação que, embora se contasse já com Convenções anteriores23, houve

consenso entre os países reunidos naquela organização internacional para reverem o que então havia de normativos e produzirem um actualizado que contemplasse os novos contornos que o problema estava a assumir. Entre as várias questões a rever destacava- se o tráfico de Droga e o produto financeiro decorrente do mesmo. Estava a sentir-se e a perceber-se que os respectivos capitais ao serem obtidos por via ilícita estavam a ser canalizados para aquisição de bens valiosos e para sistemas financeiros com fins de ocultação da sua origem, uma questão que exigia uma intervenção preventiva ou repressiva, conforme os casos, só possível com normativos e acções concertadas internacionalmente visto que o problema era transnacional.

Foi neste quadro que na mencionada Convenção, no seu art.º 3.º, n.º 1 b) i) veio a ser expresso que é infracção e objecto de sanção:

“A conversão ou transferência de bens, quando se saiba que são provenientes de uma das infracções previstas em conformidade com a alínea a) do presente parágrafo [produção, preparação, venda, etc., de qualquer estupefaciente ou substância psicotrópica] ou de participação no seu cometimento, com o intuito de ocultar ou de

23 ‘Convenção Única sobre os estupefacientes de 1961’ e ‘Convenção sobre as substâncias psicotrópicas de 1971’ das Nações Unidas

encobrir a origem ilícita desses bens ou de ajudar alguma pessoa, implicada no cometimento de qualquer uma dessas infracções, a escapar às consequências jurídicas dos seus actos” (Nações Unidas, 1990: 8). Como se vê, tal conversão ou transferência, bem como o intuito de ocultar ou encobrir, correspondem precisamente ao que se entende por Branqueamento de Capitais.

Considerando as diferenciações regionais a nível do globo, no caso da Europa, a região de pertença do nosso país, surgiram de imediato normativos, adaptando ao direito regional o direito internacional decorrente da referida Convenção. Dos mesmos trataremos noutro espaço, porém, importa destacar desde já que a nível do Conselho da Europa, em 1990, se contou também com uma Convenção sobre a matéria, a qual seguiu de perto a das Nações Unidas com a inclusão das especificidades da região Europeia. Paralelamente, tinha sido criado em 1989 o GAFI, Grupo de Acção Financeira Internacional, que emanou 40 recomendações para operar no terreno no sentido de se controlar o Branqueamento de Capitais associado à Droga, aspectos a que ainda regressaremos no capítulo sobre normativos.

Estas matérias têm sido desde então objecto de estudo de diversos autores, sendo de salientar alguns dos respectivos contributos que, por serem eminentemente na área jurídica se revestem de uma linguagem muito própria.

Segundo Dâmaso Simões (2007: 203-204), uma das questões relevantes é a da prova a propósito da qual o autor acentua que:

“[u]m movimento acelerado de globalização (…) levou ao surgimento de ameaças criminais de magnitude e sofisticação também ainda não experimentadas. A sua identificação pode fazer-se por simples remissão para (...) [os] grandes instrumentos de direito internacional produzidos (...) no seio da Organização das Nações Unidas: tráfico de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, criminalidade organizada transnacional (...) corrupção, branqueamento de capitais (...)”.

Por sua vez, num plano mais conceptual e também a este propósito, Saldanha Sanches (2000: 472-473) refere que “[a] passagem da economia aberta para a economia global constitui um problema para todos os países (…) por permitir a deslocalização dos factores de produção de maior mobilidade – como o capital (…)” e acrescenta ainda que tem havido “(…) inadaptação do ordenamento jurídico-tributário aos novos tempos e à nova economia (…)”, constatando-se que “(…) só agora (…) com a criação de novas categorias de rendimento (…) [se poderá] tributar os rendimentos de origem incerta,

como os provenientes de actividades presumivelmente ilícitas” (Saldanha Sanches 2000: 461) nas quais se inclui, obviamente, a Droga.

Neste contexto, para a presente abordagem embora tenhamos procedido a uma recensão de normativos como já referimos, há alguns aspectos legais a salientar de momento, nomeadamente, como assinala Canas (2004: 77). que “[a] criminalização do branqueamento é apenas uma das componentes de um complexo sistema de combate (…)” ao próprio Branqueamento de Capitais, tendo a Lei da Droga (DL n.º 15/93 de 22 Jan.) relevado a necessidade de também no nosso país ser dado “(…) cumprimento à obrigação de criminalização do branqueamento de capitais (…)” (Canas, 2004: 25).

Esta profunda ligação enquadra-se num contexto ainda bastante mais vasto como é o da criminalidade organizada, tendo-se que “[e]stes últimos trinta anos viram crescer o sentimento geral de insegurança face à ameaça que constituem as novas formas sofisticadas de actividades criminais transnacionais (…)”, havendo, “(…) dentre as prioridades, a necessidade de reforçar a cooperação e a coordenação internacionais

neste domínio”24 (Gilmore, 2005: 15). É mesmo sabido que “[s]e o tráfico internacional

de estupefacientes se tornou um assunto de preocupação crucial para a comunidade mundial, isto não é apenas devido ao facto de que o problema da toxicomania se agravou, mas igualmente e antes de mais a uma melhor tomada de consciência do impacto social negativo deste fenómeno, dos seus efeitos danosos sobre as economias e

das suas consequências para a estabilidade política dos países.”25 (Gilmore, 2005: 17).

Enfim, a transnacionalidade do problema, os riscos associados ao mesmo, inclusivamente, no plano económico e político com consequências nocivas a níveis nacionais e internacional, bem como a interligação Droga e Branqueamento de Capitais à luz do nosso tempo serão uma construção em crescente ao longo das últimas décadas.

24

“Ces trente dernières années ont vu croître le sentiment général d’insécurité face à la menace que constituent de nouvelles formes sophistiquées d’activités criminelles tansnationales (…) parmi les priorités, la nécessité de renforcer la coopération et la coordination internationales dans ce domaine.”

25

“Si le trafic international de stupéfiants est devenu un sujet de préoccupation crucial pour la communauté mondiale, cela n’est pas uniquement dû au fait que le problème de la toximanie s’est aggravé, mais également et avant tout à une meilleure prise de conscience de l’impact social négatif de ce phénomène, de ses effets délétères sur les économies et ses conséquences pour la stabilité politique des pays.”

No documento O Branqueamento de capitais e a droga (páginas 42-45)