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Sobre a legislação e eficácia do sistema no que se reporta ao crime de Branqueamento

No documento O Branqueamento de capitais e a droga (páginas 77-79)

7. Contributo de especialistas em matéria de Branqueamento de Capitais

7.2. Sobre a legislação e eficácia do sistema no que se reporta ao crime de Branqueamento

Uma segunda questão múltipla que colocámos, cuja síntese das respostas a que juntámos a nossa análise aqui incluímos, foi a seguinte: É a nível da legislação propriamente dita ou a nível da aplicação da lei que em Portugal mais se coloca a insuficiente eficácia na luta contra o Branqueamento de Capitais? Continua a fazer sentido levantar a questão a ambos os níveis? Que resistências/obstáculos mais se levantam e que medidas legislativas (controle, fiscalização e/ou outras) deveriam ser tomadas para uma acção mais eficiente? Que alterações/contributos se possam ter operado entretanto para que se obviassem resistências/obstáculos, bem como que medidas poderão ou terão sido consubstanciadas neste âmbito?

Sobre a legislação portuguesa neste domínio, Célia Ramos e M.ª da Graça Damião do BdP consideraram-na boa e bem concebida, inclusivamente, lembraram que aquela tem sido reconhecida e que há aspectos que passaram mesmo para o nível internacional (um exemplo foi a proposta do Banco de Portugal para inclusão das entidades não financeiras nos normativos respectivos). Acentuaram a relevância da determinação legal quanto a funções de fiscalização e supervisão, as quais estão cometidas também ao BdP e têm permitido aumentar a eficácia da acção a este nível. Destacaram que as questões se colocam mais no plano da aplicação da lei, designadamente, no que se reporta a deveres de alerta de operações suspeitas que entendem ser um aspecto com tratamento ainda insuficiente apesar de reconhecerem que houve melhoria com a criação da UIF. Enfatizaram ainda a importância para esta área dos normativos internacionais relativos à corrupção dado o envolvimento desta com os tipos de criminalidade aqui em causa.

Relativamente a Fernando Jordão da PJ, como vimos, preferiu remeter o assunto para o conteúdo de documentos do GAFI e, no que se refere a aspectos legislativos, endossou a questão para as respectivas 40+9 recomendações (GAFI/FAFT, 2003 e

2004) que considerou serem a «bíblia» nestas matérias48.

No que se reporta ao presente domínio, Dâmaso Simões da PGR atribuiu à «opacidade» das instituições financeiras as maiores dificuldades para o combate ao crime de Branqueamento de Capitais e incluiu nestas a multiplicidade de produtos

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propostos aos clientes como «soluções» com interesse fiscal. Levantou o problema dos offshores e demais instituições de âmbito afim que considera figuras jurídico- financeiras «impenetráveis» e que constituem uma «barreira» para a investigação do Branqueamento de Capitais. Acrescentou que um outro obstáculo na investigação respectiva passa pela necessidade de diligências no âmbito da cooperação judiciária internacional para a recolha de prova. Sugeriu a implementação de mecanimos que favoreçam a investigação efectiva tais como, no caso de Portugal, o acesso a bases de dados para detecção eficaz do património ilícito e bens branqueados, bem como a criação dos Gabinetes de Recuperação de Activos impostos pela Decisão-Quadro n.º 2007/845/JAI do Conselho Europeu.

Quanto ao evolutivo registado a nível da legislação, Henriques Gaspar do STJ acentuou que o próprio facto do Branqueamento de Capitais ser considerado nalguns casos, em «desvio contraditório», como crime «semi-público (art.º 368.º-A do Código Penal)» foi uma contribuição que retirou a inicial carga «semântica negativa», tendo a «autonomia e o concurso real» construídos pela jurisprudência ficado anulados devido à «generalização» das infracções subjacentes, perdendo mesmo sentido com o alargamento a «limites impensáveis» da lista de infracções subjacentes. Do seu ponto de vista, com esse alargamento perdeu-se «consistência» e houve «diluição» da função e da finalidade do crime.

No que toca a questões legislativas, Moraes Rocha do TRL centrou a problemática nas dificuldades de investigação e não nos aspectos legais pois, segundo ele, «para que a legislação opere é necessário que haja uma máquina que funcione». Acrescentou mesmo que sem esta «toda e qualquer legislação é absolutamente ineficaz», passando as medidas por apetrechar a PJ e o MP, bem como por «conceder aos tribunais uma operacionalidade que não existe». Concluiu que é matéria que depende da vontade política, vontade essa que, insistiu, «não existe».

Por fim, Carlos Poiares da ULHT referiu, em relação à presente questão, que a insuficiente eficácia do nosso país contra o Branqueamento de Capitais se coloca tanto a nível da legislação como da aplicação da lei. Considerou que um «combate a sério» passa pela vontade dos «decisores políticos» mas salientou que tal pode pôr em causa o próprio financiamento de partidos e campanhas eleitorais como será o caso da Colômbia. Aponta para o facto de que, segundo a sua opinião, por um lado, são de âmbito económico as resistências a mudanças legislativas quanto ao controlo e

fiscalização do sistema financeiro e outros e, por outro lado, são de ordem política as iniciativas quanto a medidas a tomar para o efeito.

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Da apreciação conjunta das contribuições acima em matéria de legislação e eficácia do sistema respeitante ao Branqueamento de Capitais, ressalta a insistência de que reside na investigação a maior dificuldade. É mesmo referido que a legislação só resulta com um aparelho que funcione o qual consideram que, neste caso, passa por dotar de meios a Polícia Judiciária, o Ministério Público e os Tribunais. É reconhecida ineficácia no sistema mas não atribuída especialmente à legislação, a qual é referida como de qualidade, tendo mesmo tido algum papel no plano internacional com a proposta do nosso país de inclusão das entidades não financeiras nos normativos supra- nacionais e nacionais. É destacado que o menos regulamentado é o sistema não financeiro, o que dificulta a sua fiscalização e combate ao Branqueamento de Capitais. Outros alertas reportam-se à multiplicidade legislativa e ao alargamento de crimes primários, o qual é considerado excessivo. São salientados como factores de ineficácia a opacidade das instituições financeiras, os offshores enquanto barreira à investigação e a cooperação judiciária internacional pela articulação institucional que implica. Para maior sucesso na recolha de prova na investigação é proposto que, entre os mecanismos que favoreçam a investigação financeira, é necessário criar os Gabinetes de Recuperação de Activos. Na generalidade, consideram que o problema se coloca mais no plano económico-político do que legislativo, sendo evocada a necessidade de vontade política para que se possa contar com medidas que operem mudanças favoráveis a uma maior eficácia do sistema.

7.3. Sobre instituições/entidades ligadas ao crime de Branqueamento de

No documento O Branqueamento de capitais e a droga (páginas 77-79)