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A sociedade brasileira nos princípios do século XIX era caracterizada pela escravidão, o que representou grande influência nos diversos setores da vida econômica e social deste período, alcançando grandes dimensões. Há que se ressaltar aqui, que o grande contingente de escravos incluídos na sociedade colonial mal preparados e mal adaptados, vão formar nela um corpo estranho e incômodo, porém, presente corroborando com os problemas existenciais da colônia, fundada na monocultura de exportação. Tal processo de absorção da classe escravagista se prolongará até finais do século XIX.

Neste aspecto, além de outros problemas, o que pesou mais na formação da sociedade brasileira foi o baixo nível dessas classes escravizadas, que vieram constituir a imensa maioria da população do País, agravando ainda mais os problemas da colônia. Sobre esta parte, PRADO JÚNIOR, em sua obra já clássica, "Formação do Brasil contemporâneo", nos fornece argumentos que retratam os problemas relacionados ao tráfico de escravos ao comentar a gravidade da situação deste contingente populacional, que passará a fazer parte da sociedade colonial, ressaltando que:

"O tráfico africano se mantinha, ganhava até em volume, despejando ininterruptamente na colônia contingentes maciços de populações semi- bárbaras. O que resultará daí não poderia deixar de ser este aglomerado incoerente e desconexo, mal amalgamado e repousando em bases precárias que é a sociedade colonial brasileira. Certas conseqüências serão mais salientes: assim o baixo teor moral nela reinante, que se verifica entre outros sintomas na relaxação geral de costumes, assinalada e deplorada por todos os observadores contemporâneos, nacionais e estrangeiros. Bem como o baixo nível e ineficiência do trabalho e da produção, entregues como estavam a pretos boçais e índios apáticos. O ritmo retardado da economia colonial tem aí uma de suas principais causas." (1965, p.274-5)

Além dos resultados da escravidão e de outros elementos que para ela concorreram, nos permite avaliar que o problema da exclusão social e marginalidade no Brasil, não é de hoje, já existiam em grandes proporções na época. PRADO JÚNIOR, sobre este ponto específico, refere-se ao problema descrevendo até com minúcias o grande número de grupos ociosos e vadios que perambulavam no interior do Brasil, inclusive nas cidades mais povoadas da colônia.

"Nas cidades, os vadios são mais perigosos e nocivos, pois não encontram, como no campo, a larga hospitalidade que lá se pratica, nem chefes sertanejos prontos a engajarem sua belicosidade. No Rio de Janeiro era perigoso transitar só e desarmado em lugares ermos, até em pleno dia. O primeiro intendente de polícia da cidade, nomeado quando a corte se transferiu para ela, Paulo Fernandes, tomará medidas enérgicas contra tais elementos. Mas o mal se perpetuará, e só na República, ninguém o ignora, serão os famosos 'capoeiras', sucessores dos vadios da colônia, eliminados da capital." (1965, p.282)

Outro problema, o da prostituição, também merece ser visto com atenção neste período. Neste particular, o autor assim se refere:

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"Tocamos aqui um ponto que é o mais alarmante sintoma da geral indisciplina de costumes que reina na sociedade colonial: a larga disseminação da prostituição. Não há recanto da colônia em que não houvesse penetrado, e em larga escala. Não falemos naturalmente das grandes e médias aglomerações, onde o fato é mais natural, e sempre se encontrou em toda parte. Observemos os pequenos, os mais insignificantes arraiais: quase toda a sua população fixa é constituída, além dos vadios, de prostitutas. É um depoimento este geral: "Nos mais humildes povoados, testemunhará St. Hilaire, a mais vergonhosa libidinagem se mostra com uma impudência que não se encontraria nas cidades mais corrompidas da Europa." (1S65, p.353-4)

De um lado, a população masculina vivia entre a ociosidade e o crime. De outro, a população feminina por falta de meios para se sustentarem, se prostituíam. São circunstâncias que demonstram claramente a pobreza e a miséria reinantes na população da colônia, de um modo geral, cujo futuro, era nenhum.

Como pudemos observar, a questão da marginalidade já vem desde há muito tempo. Entretanto, esse processo de exclusão social é muito mais acentuado hoje pelo próprio processo econômico e pela excessiva concentração de renda.

Com efeito, a grande transferência da população do campo para os centros urbanos, que se verificou em tão pouco espaço de tempo, tem criado inúmeros problemas, na maior parte das vezes insuperáveis tanto para aqueles que abandonam o campo como para os centros urbanos já densamente povoados.

Segundo SANTOS, em "A urbanização brasileira", o Brasil foi por muito tempo um País "essencialmente agrícola". Porém, a ruptura desse processo é verificado, inicialmente, no Recôncavo da Bahia e na Zona da Mata do Nordeste, quando passam a apresentar os primeiros sinais de urbanização que será deslanchado com Salvador e as demais cidades de Cachoeira, Santo Amaro e Nazaré, por serem centros comerciais importantes e promissores.

As palavras de Oliveira Vianna citado por SANTOS, reforçam as afirmações do autor citado acima, quando assim se refere à questão urbana no Brasil:

"O urbanismo é condição modemíssima da nossa evolução social. Toda a nossa história é a história de um povo agrícola, é a história de uma sociedade de lavradores e pastores. É no campo que se forma a nossa raça e se elaboram as forças íntimas de nossa civilização. O dinamismo da nossa história, no período colonial, vem do campo. Do campo, as bases em que se assenta a estabilidade admirável da nossa sociedade no período imperial." (1993, p. 17)

Com as grandes transformações econômicas ocorridas nos fins do século XVIII, o século XIX é pois, marcado por uma nova fase de evolução da questão urbana no Brasil. O Rio de Janeiro, nesta época, desponta como principal base urbana que será reforçada com a instalação das primeiras indústrias naquele território. Sem dúvida, a industrialização vem acelerar o processo de urbanização brasileiro na segunda metade do século XIX e início do século XX, assinalado, profundamente, pela entrada de capitais estrangeiros no País, o que irá refletir nas atividades econômicas de um modo geral.

De acordo com a Enciclopédia Mirador Internacional, nessa fase, São Paulo já começa a absorver o processo de industrialização, e em 1900, já era a segunda maior cidade brasileira com uma população de duzentos e quarenta mil habitantes, embora o Rio de Janeiro continuava à frente com uma população de seiscentos e vinte e nove mil habitantes.

No caso de São Paulo, os lucros das atividades cafeeiras incrementaram as atividades industriais provocando uma aceleração da urbanização. Os próprios

"barões do café" são forçados a deixar suas fazendas, passando a se instalar na cidade por um período de tempo maior para melhor administrar seus negócios. Observa-se já neste período a expressão que a cidade vinha adquirindo.

Na verdade, é a partir do século XVIII que começamos a sentir efetivamente as primeiras modificações operadas em relação à urbanização mas, é no século XIX que este processo se consolida e é tão somente no século XX que iremos verificar uma verdadeira revolução urbana.

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