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CAPÍTULO 2 Pressupostos teóricos

3.2. Breve apresentação do sítio eletrônico da AJ

Este item se encarrega de apresentar o sítio eletrônico da AJI, de onde pude coletar os dados para o desenvolvimento da pesquisa.

Conjuntamente, serão trazidas algumas fotografias das oficinas promovidas pela ONG, onde é possível observar algumas de suas características, tais como a quantidade de alunos envolvidos, sua organização efetiva participação, a estrutura da sala de aula e as temáticas abordadas. É importante trazer esse recorte de fotografias dispostas em uma seção específica do sítio, ainda que não consistam no foco principal da análise, pois elas permitem visualizar a dimensão característica das próprias práticas de letramento no momento em que estavam ocorrendo, efetivamente, e muito auxiliam na caracterização da ideia de práticas de letramento sociais. Acredito que isso trará ao leitor uma noção mais consistente do trabalho empreendido pelos jovens indígenas.

As visitas ao sítio eletrônico para coleta dos dados ocorreram entre agosto de 2015 e julho de 2016, embora tenha registrado visitas constantes após esse período, na busca por novos textos que passassem a integrar o ambiente virtual e que, de alguma maneira, dialogasse com outro material já coletado.

No que se refere aos materiais produzidos pela AJI selecionados para compor o corpus da pesquisa, o recorte abrange textos produzidos entre maio de 2009 e agosto de 2013, que consistiu em uma época mais constante de publicações. Este intervalo de tempo não compreende todas as atividades desenvolvidas na TI Francisco Horta Barbosa pelo grupo de jovens, no entanto, trata-se de um recorte de material que parece-me já suficiente para compreender a circulação dos discursos e a consequente manipulação de elementos identitários e ideológicos que caracterizam as práticas sociais. Especificamente, da dimensão dos textos descritos, seis foram considerados os mais representativos para prosseguir à análise.

Na sequência, portanto, iniciarei essa apresentação mais generalizada, que melhor contextualizará os dados e as categorias temáticas que serão descritos no próximo Capítulo 4 – Dados de pesquisa e análise, quando seremos guiados para as reflexões conclusivas do trabalho.

O sítio virtual apresenta-se em sete abas elementares: 1) Home, a página inicial do portal que reúne os conteúdos mais gerais ali existentes; 2) Quem somos, traz um texto de apresentação dos integrantes da ONG; 3) Notícias, a seção mais constantemente atualizada,

cuja função é reunir notícias afins aos povos indígenas, normalmente publicadas por sítios especializados em notícias e naquele espaço compartilhadas; 4) Eventos, com tópicos que divulgam eventos nacionais e internacionais afins ao contexto indígena; 5) Comunicação, a seção com maior quantidade de conteúdos locais, que subdivide-se em galeria de fotos, vídeos, publicações, programas de rádio, jornal AJIndo e depoimentos; 6) Links, seção que lista alguns dos principais endereços virtuais que relacionam-se de alguma maneira com a AJI; e, a última aba, 7) Fale conosco, em que são informados o endereço da sede da ONG, seu telefone, e disponibiliza um formulário para que o usuário entre em contato diretamente a partir daquela página.

O sítio principal possui, ainda, dois botões de redirecionamento: um para o blog da AJI, hospedado em um endereço distinto, que se constitui numa alternativa para o acesso aos conteúdos disponibilizados no primeiro endereço; outro, para a página da ONG na rede social Facebook, cuja expansão e popularização alcançada nos últimos anos concretizam a viabilidade do acesso a determinados conteúdos. Com a Figura 8, a seguir, é possível visualizar a página principal do sítio virtual da AJI.

Figura 8. Página inicial do sítio virtual da AJI, com destaque para a aba Comunicação.

Em consonância com o que há pouco mencionei, o recorte para o qual o foco do trabalho aponta, localiza-se na seção Comunicação contida no sítio, cujo menu pode ser observado na mesma Figura 8. Chamo a atenção para o fato de que as seções Programas de

rádio e Depoimentos são espaços vazios no sítio virtual, não contendo seus respectivos conteúdos e, consequentemente, não sendo possível sua descrição e análise.

Embora o espaço destinado a essas fotografias no sítio virtual esteja bem organizado, não estão disponibilizadas imagens de todas as oficinas que já ocorreram desde a fundação da ONG. No entanto, aquelas que lá constam permitem visualizar características importantes sobre os momentos de aula, os espaços utilizados, a quantidade de alunos envolvidos, suas reações a partir de expressões corporais e a organização dos materiais utilizados pelos alunos, por exemplo.

Em algumas dessas imagens que trarei na sequência, será possível observar com maior facilidade o trabalho que engloba a questão da saúde, uma das temáticas a serem analisadas mais adiante.

A Galeria de Fotos consiste em uma representação de eventos e práticas de letramento, isto é, as fotos que compõem a referida galeria retratam momentos específicos de alguns dos eventos mediados pela AJI sob o formato de oficina, e nesse contexto, define- se o resultado ou a conclusão de cada uma normalmente por meio da apresentação de um trabalho. Os conteúdos trabalhados em sala de aula, no entanto, não estão disponibilizados. Esse fato não caracterizou um problema para o desenvolvimento da pesquisa, pois que o foco maior do trabalho direciona-se às atividades propostas pelos integrantes da AJI, não tendo a pretensão de dar conta de analisar todas as consequências de suas práticas que são levadas adiante pelos membros da comunidade indígena.

Adentrando esse espaço no sítio virtual, as oficinas fotografadas são classificadas pelos seguintes títulos: Conhecendo os problemas dos jovens, Oficina de fotografia, Família, Saúde sexual, Higiene bucal, Vídeos relacionados a drogas e Violência. Reitero que, com base em contato que tive em momentos distintos com membros da AJI, estas não são as únicas oficinas realizadas ao longo do tempo de funcionamento da ONG. Contudo, me deterei ao conteúdo acessível pelo sítio virtual. Cada uma das oficinas ministradas e fotografadas constitui um evento de letramento distinto e é responsável por práticas situadas de letramento.

Vejamos as Figuras 9 e 10, que mostram momentos da oficina Conhecendo os problemas dos jovens.

Figura 9. Realização da oficina Conhecendo os problemas dos jovens (I).

Fonte: AJI.

Figura 10. Realização da oficina Conhecendo os problemas dos jovens (II).

Fonte: AJI.

Neste evento, pode-se verificar, na Figura 9, a professora responsável por ministrar a oficina em pé, com os alunos participantes organizados em um círculo maior de cadeiras, de

forma que a garanta mobilidade durante sua explanação e acesso rápido a cada um dos presentes.

O ambiente onde ocorre a oficina é um salão, cujas características escolares se apresentam, primeiramente, pela organização dos sujeitos que ali estão, embora esta organização não seja tradicional, quando se tem um aluno anteposto ao outro de modo a compor um espaço livre à frente para que o(a) professor(a) utilize. Também, há caráter escolar na existência de quadros-negros, embora pequenos e utilizados para a fixação de papéis. Uma estante que condiciona diversos livros, uma pintura e alguns artefatos, contribui para o aspecto escolar naquele ambiente, bem como desenhos que enfeitam paredes e portas. A Figura 10, correspondente ao mesmo evento, apresenta um segundo momento da oficina em realização. Na ocasião, a professora ministrante não aparece e a roda de cadeiras organizada pelos alunos é visivelmente menor, de modo que a interação interpessoal seja exercitada sob a forma de um debate em grupos.

A ausência, contudo, de materiais de uso individual como cadernos, lápis, canetas, por exemplo, indicia uma prática de letramento que não envolve diretamente a escrita, mas o contato mais próximo e conversacional, que permite uma compreensão pelo diálogo em si, e pelas expressões faciais e corporais.

A maioria dos alunos que aparece na Figura 9, quando a atividade já ocorria havia algum tempo, encontra-se em posição de atenção e de participação. Apesar disso, não parece haver uma atenção direcionada a um ponto específico. Com uma divisão imaginária da Figura 10 em três níveis, fundo, centro e frente, verifica-se certa interação entre os alunos ao fundo, olhares que se entrecruzam entre os alunos do centro da fotografia, e alunos posicionados como se prestando atenção na interação entre os alunos ao fundo, atravessando o centro.

Com uma metodologia distinta, as Figuras 11, 12 e 13, que seguem, mostram momentos da oficina Vídeos relacionados a drogas, na qual vídeos selecionados foram apresentados aos alunos para associá-los com a questão da violência existente nas aldeias.

Figura 11. Realização da oficina Vídeos relacionados a drogas.

Fonte: AJI.

Figura 12. Alunos apresentando trabalho relacionado às questões de drogas e violência

nas aldeias. Fonte: AJI.

Figura 13. Alunos apresentando trabalho relacionado às questões de drogas e violência

nas aldeias (II). Fonte: AJI.

Especificamente na Figura 11, a maioria dos alunos parece atentar à professora e às imagens transmitidas por ela. Nas Figuras 12 e 13, em um momento de apresentação de trabalho de dois grupos que selecionei para constar nesta seção, é válido notar a questão da individualidade na apresentação coletiva. Em ambas as imagens, uma única integrante parece segurar a folha que dá sequência à apresentação, enquanto os outros participantes aparentam distração.

Figura 14. Oficina de Educação sexual.

Fonte: AJI.

Figura 15. Oficina de Educação sexual.

Figura 16. Alunos apresentando trabalho para a oficina de Educação sexual (I).

Fonte: AJI.

Figura 17. Alunos elaborando trabalho para ser apresentado na oficina de Educação sexual.

Figura 18. Alunos apresentando trabalho para a oficina de Educação sexual (II).

Fonte: AJI.

Na Figura 14, temos, mais uma vez, a professora ministrante circundada pelos alunos. Semelhantemente às características reunidas em figuras anteriores, naquele momento de explanação, a maioria dos alunos parece desatenta. Embora estejam todos sentados, as expressões faciais demonstram atenção voltada a outros elementos quaisquer, que não a professora. Talvez, tal comportamento esteja associado à temática abordada, ainda considerada um tabu no meio em que se apresenta. A Figura 15 mostra a sequência do momento de aula, em que alunas são chamadas para uma apresentação.

No entanto, o comportamento é outro quando observamos as Figuras 16, 17 e 18. Dois grupos apresentam seus trabalhos sobre a oficina, e parece haver, de fato, interação. No primeiro trabalho, ainda que pareça haver alguma dispersão, pode-se verificar que o cartaz escrito segurado por uma aluna serve de base para o que seu colega apresenta oralmente. O cartaz é essencialmente composto por um texto escrito, contendo um elemento visual. No segundo trabalho, observamos dois cartazes, um com texto verbal, já saindo de uso naquela apresentação, e outro com texto visual, então em uso.

A galeria de vídeos existente no portal estudado contempla materiais visuais e verbais produzidos pela AJI.

Esses conteúdos ganharam forma através de três tipos de atividades. Um deles refere- se à realização de entrevistas com indígenas de sua comunidade a fim de apresentar com maior proximidade casos que envolvem a situação escolar, o uso de drogas, a violência nas aldeias e seus desdobramentos, por exemplo, além de entrevistarem, ainda, alguns profissionais não indígenas que desempenham um trabalho formal e participativo nesses casos. Outra vertente da produção videográfica corresponde ao resultado das oficinas de roteiro e produção audiovisual, mediadas pela AJI, que contam com elementos cênicos para retratar questões consideradas preocupantes nas aldeias. A terceira abordagem que pode, ainda, ser acessada, diz respeito a uma seleção de vídeos externos, cuja produção não é de autoria própria da AJI, mas que é por ela indexada junto aos demais vídeos.

Essa seleção compreende vídeos de caráter informativo que visam ao esclarecimento de questões pertinentes tanto à comunidade indígena local como à sociedade envolvente.

Durante o tempo de desenvolvimento desta pesquisa, a galeria de vídeos no site da AJI totalizou catorze produções, isto é, aquelas realizadas pelos jovens douradenses da comunidade indígena, e aquelas produzidas a partir de outros projetos, e que por dialogarem com as questões locais, estão presentes no sítio virtual e considero que sejam, portanto, importantes fontes para a compreensão das propostas de letramento desenvolvidas na RID.

A seguir, copio uma ilustração (Figura 19) da seção Vídeos, como consta no sítio virtual da ONG.

Figura 19. Parte da página que dispõe da galeria de vídeos.

Concernente ao jornal AJIndo, o folhetim produzido e organizado pela AJI é uma publicação de periodicidade bimestral, originalmente, mas que encontra-se temporariamente interrompida. Suas edições consistem em um dos instrumentos mais difundidos tanto nas oficinas realizadas com os jovens das aldeias da RID, como na comunidade em geral.

As trinta e uma edições publicadas até a presente investigação contam com textos escritos, em sua maioria, por indígenas locais e em língua portuguesa. A língua guarani é empregada com baixa frequência, quase sempre se limitando a alguma manchete ou título. Cada uma das edições é guiada por uma temática central, a partir da qual emergem perspectivas diversas, de modo a garantir seu caráter informativo, cultural, social e, claro, jornalístico.

Além de textos escritos, as edições do periódico admitem desenhos feitos por alunos das escolas locais, respeitando a temática proposta para cada edição, e fotos de eventos organizados ou com participação de integrantes da AJI.

Com o objetivo de apresentar a publicação ao leitor da tese, trago, na sequência, a capa de duas edições publicadas. A edição de número vinte e seis (Figura 20), publicada na metade do ano de 2011, tematiza os problemas multiplicados pela questão do acúmulo de lixo na aldeia, sobretudo aqueles que comprometem a saúde. O problema advém da inoperância do sistema de coleta de lixo na região da aldeia, assunto que é abordado em textos da edição. Também, ilustro com a capa da edição de número vinte e quatro (Figura 21), publicada no primeiro mês de 2011, época de retorno às aulas, de compra de materiais escolares e de possíveis mudanças estruturais ou sistemáticas, importantes para a comparação das escolas em anos anteriores. No final de 2009, publica-se a edição de número 18 (Figura 22), que se dedica à fotografia, apresentando à população alguns resultados obtidos com as oficinas realizadas, as quais dois anos mais tarde, em 2011, organizadas juntamente com fotografias capturadas em oficinas subsequentes, foram reunidas para a composição do livro de fotografias Nossos olhares sobre a cidade (ALCÂNTARA et al., 2011). A edição 16 do AJIndo (Figura 23) é a primeira disponibilizada no sítio virtual e foi publicada em maio de 2009, voltando-se, entre outras questões, para a segurança na construção de moradias populares nas aldeias.

Figura 20. Capa da edição nº 26 do AJIndo. Figura 21. Capa da edição nº 24 do AJIndo.

Fonte: AJI. Fonte: AJI.

Figura 22. Capa da edição nº 18 do AJIndo. Figura 23. Capa da edição nº 16 do AJIndo.

Fonte: AJI. Fonte: AJI.

Apresentados os dados gerais com a finalidade de delinear o contexto temático, darei início ao Capítulo 4 – Dados de pesquisa e análise, no qual um recorte com seis dos textos apresentados serão analisados. Esse recorte satisfaz os objetivos da pesquisa e não a tornará cansativa, tendo em vista que a análise de todos os dados gerais traria algumas repetições e pontos de vista bastante semelhantes entre si e, em virtude disso, a opção por apresentá-los somente como mecanismo de contextualização pareceu-me a mais adequada ao trabalho.

CAPÍTULO 4

Dados de pesquisa e análise

Este último capítulo do trabalho reúne os dados de que me servi para delinear um percurso temporal do sítio eletrônico da AJI, a fim de averiguar os possíveis desdobramentos dos discursos atinentes aos três sistemas temáticos maiores – a violência, a problemática da educação e a questão da saúde – que puderam ser identificados a partir dos indícios presentes nos textos ali disponibilizados.

Sob esse aspecto, o paradigma indiciário mostrou-se fundamental para perceber quais são os elementos que mais são tensionados nos contatos culturais e, consequentemente, merecem atenção direta na tentativa de compreendê-los em sua profundidade, direcionando sobre eles novos olhares de distintas áreas de estudo.

Cada um dos grandes sistemas é apresentado em uma subseção própria, na seção 4.1 Apresentando os dados de pesquisa, e cada subseção segue organizada por outras três, que darão conta de apresentar os dados do jornal AJIndo, da Galeria de vídeos e das Publicações, respectivamente.

Posteriormente, a seção 4.2 Análises a partir da triangulação teórico-metodológica abrange o tratamento dos dados sob a ótica da ACD. Para esse estágio analítico, utilizo-me dos fundamentos teórico-metodológicos de Fairclough, chamando a atenção, na sequência, para algumas questões que devem ser observadas, no sentido de demonstrar a medida em que esses textos se fazem coerentes do ponto de vista de seus produtores (escritores) e de seus consumidores (leitores).

A coerência que menciono deve, antes de tudo, ser entendida como o próprio fenômeno da tradução, apresentado e discutido anteriormente, o qual esta pesquisa articulou com base em uma dupla perspectiva: a) a tradução realizada pelos produtores dos materiais, isto é, o modo como as temáticas se fizeram coerentes para eles, e b) a tradução realizada pelo pesquisador, ou como a coerência se institui para o leitor externo, estrangeiro, no que se refere a algumas características socioculturais específicas.