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BREVE HISTÓRIA DO MATO GROSSO DO SUL: TERRA DE CANDOMBLÉ

SAUDAÇÕES AOS ORIXÁS

2. BREVE HISTÓRIA DO MATO GROSSO DO SUL: TERRA DE CANDOMBLÉ

Foi numa reportagem sobre um terreiro de Candomblé do Mato Grosso do Sul que encontrei a expressão utilizada como título acima, pois, nos trabalhos de campo que realizei no Estado, os Pais e Mães de Santo entrevistados sempre enfatizaram que essa é uma terra especial para o desenvolvimento do Candomblé.

A forte presença do Cerrado e do Pantanal, biomas possuidores de rios caudalosos e cheios de afluentes que distribuem suas águas por todo o Estado, faz dessa região um atrativo turístico com apelo ecológico.

Pouco povoado e com desenvolvimento econômico voltado à agricultura e criação de gado, a paisagem é formada por diversos elementos naturais, com grandes distâncias entre suas cidades, esses espaços são preenchidos pela vastidão do Cerrado, da agricultura e das pastagens, contribuindo para uma ideia de proximidade com o meio ambiente.

Essas características remetem ao fato de que as religiões afro-brasileiras são adoradoras de entidades que vivem na natureza: Orixás, Inquices e ancestrais como os Caboclos, todos vivem diretamente em seu seio.

A ideia de que o Estado pode ser uma terra de Candomblé está fortemente relacionada às questões naturais, mas também, de acordo com muitas entrevistas realizadas nos trabalhos de campo, há outras questões importantes que devem ser salientadas, como: a história da região; as relações fronteiriças com a Bolívia e o Paraguai e a convivência com as comunidades indígenas. Todos são elementos que contribuem para a formação de um imaginário mágico do lugar, onde costumes religiosos se imbricam permitindo manifestações de fé com rituais específicos, conforme se pretende discutir mais adiante.

Para entender por que essa terra pode ser de Candomblé é preciso voltar no tempo para encontrar os primeiros colonizadores e escravos africanos que por ali chegaram, e que certamente trouxeram elementos religiosos e culturais que, regados por uma água calcária e translúcida, floresceram e criaram suas raízes.

Essa história começa com a ocupação humana do Estado de Mato Grosso do Sul que se iniciou por volta de 10.000 A.C através dos primeiros habitantes indígenas, ancestrais dos índios contemporâneos, hoje denominados Guaranis, Terenas, Kaiowás e Caiapós (VIALOU, 2005).

O lugar permaneceu sob o domínio das diversas comunidades indígenas até o século XVI, quando em 1579 chegou o colonizador europeu mudando o rumo de sua história. Nesse ano, como primeira tentativa de povoamento da região, foi criada a Comunidade de Santiago de Xerez, nas proximidades dos rios Miranda e Aquidauana. Esse povoamento, no entanto, foi destruído pelos índios Guaicurus.

Uma próxima tentativa de povoamento aconteceu somente em 1610 quando uma missão jesuítica de Assunção no Paraguai, vinda pelo Sul de Mato Grosso, tentou reconstruir a comunidade, com proteção da coroa espanhola, ao longo dos anos de 1630 e 1640.

Havia a disputa dessas terras pelas coroas espanhola e portuguesa, mas a tentativa de reconstrução de Santiago de Xerez pelos espanhóis foi destruída pela Bandeira de Antonio Raposo Tavares em 1648, assegurando de fato a posse da região à coroa portuguesa. A redução jesuítica que mais durou foi a de Nuestra Señora de La Fe, situada nas proximidades do Rio Apa ao Sul do atual Estado de Mato Grosso do Sul (CORREA, 1969).

O domínio português se consolidou na Província de Mato Grosso porque a coroa espanhola manteve uma influência somente na porção Sudoeste do atual Estado, ficando o restante das terras com um desenvolvimento muito lento, já que as questões naturais dificultavam a comunicação com o entorno. Esse fato também contribuiu para que a porção Leste recebesse várias incursões das Bandeiras Paulistas, porém sem despertar muito interesse, pelo menos até o achamento do ouro em 1719 nas margens do rio Coxipó no extremo norte, hoje conhecido como Estado de Mato Grosso.

O achamento do ouro criou um novo interesse pela região, que levou no mesmo ano de 1719 à fundação de Cuiabá, assim, o objetivo principal nas terras à Oeste não era mais o apresamento do índio, mas a exploração de metais preciosos e a promoção do povoamento para garantir a posse dessas terras.

O ouro contribuiu para o desenvolvimento de um comércio periférico que permitiu a criação de muitas rotas de comunicação entre a Província e outras regiões da colônia, principalmente Goiás, Minas Gerais e, especialmente, São Paulo, de onde saíam as maiores e mais importantes expedições que levavam produtos para abastecer as minas de Cuiabá. Embora todo esse movimento se deslocasse para o Norte dessas terras, deixando a porção Sul sem muita atenção, ali se desenvolveram núcleos populacionais com o objetivo de dar suporte às expedições fluviais paulistas rumo às minas. Monções, como eram chamadas essas expedições, partiam de Porto Feliz e Itu

paraCuiabá e no trajeto passavam pela Fazenda Camapuã, Santana do Paranaíba, Albuquerque (atual Corumbá), núcleos desenvolvidos com o fim de dar suporte ao comércio das minas.

Sérgio Buarque de Holanda (1976) dá noticias de várias rotas originadas para o alcance desse comércio nas minas cuiabanas. A rota de São Paulo instituídaem 1720 ia do Rio Tietê, seguia pelo Rio Grande depois pelo Pardo e, por fim, pelo Sanguessuga, passando pela antiga fazenda de Camapuã considerada um varadouro por terra, até alcançar o rio Coxim, depois o Taquari, o Paraguai e o São Lourenço, e com aproximadamente cinco meses de viagem, atingia-se Cuiabá.

É nesse contexto de Monções que aparece no Mato Grosso, o escravo africano, uma vez que esse movimento inclui a província na economia colonial, e, portanto, a mão de obra escrava também se insere nesse contexto. Para Brazil (2002) a dominação escravista estabelecida em Mato Grosso a partir do século XVIII fazia parte do articulado sistema montado no Brasil desde o início do século XVI, o qual fazia da exploração escravista um trabalho central. Desta forma os primeiros trabalhadores africanos escravizados em Mato Grosso, foram introduzidos em pequenas quantidades pelas bandeiras paulistas do século XVIII.

Para a autora o projeto expansionista associado ao antigo sonho da Metrópole de encontrar novas minas de metais preciosos, concretizou-se com as descobertas auríferas de Cuiabá. A partir daí houve o prolongamento das bandeiras num movimento conhecido comoMonções, cujo objetivo era suprir os núcleos mineradores com aves, equinos, cativos, muares, sal, gado vacum, artigos de luxo e outras mercadorias.

Sérgio Buarque de Holanda (Op. Cit.) em seu livro “Monções” cita um relatório que mostra com clareza as dificuldades enfrentadas pelos viajantes e aventureiros ao seguirem rumo ao sertão de Cuiabá nessas primeiras viagens:

Eu saí de Sorocaba com quatorze negros e três canoas, perdi duas no caminho e cheguei com uma e com setecentas oitavas de empréstimo e gastos de mantimento que comprei pelo caminho: dos negros vendi seis meus, que tinha comprado fiado em Sorocaba, quatro de uns oito que tinha dado ao meu tio e todos dez que me ficaram, morreram três, e só me ficou um único e o mesmo sucedeu a todos os que foram ao Cuiabá. Enfim, de vinte e três canoas que saímos de Sorocaba, chegamos só quatorze ao Cuiabá; as nove perderam-se e ao mesmo sucedeu às mais tropas e sucede cada ano nesta viagem (pag. 202-203).

A própria viagem do trabalhador escravizado até os núcleos mineradores constituía-se numa grande dificuldade, conforme narrada pelo próprio Sérgio Buarque,

fato esse que contribuiu para o desenvolvimento de uma religiosidade que no curso dessa história, permitiu o florescimento e a difusão das manifestações religiosas em estudo neste trabalho.

Somando-se às dificuldades descritas, Brazil (Op. Cit.) afirma que havia um quadro de sofrimentos enfrentado pelo negro ao chegar a Mato Grosso, pois a muitos eram acionados diversos procedimentos de dominação, que envolviam disciplina e o contínuo desgaste emocional por causa do controle senhorial, o uso do chicote, as mais cruéis ‘sevícias’ e até a morte.

Foi a partir do século XVIII que a presençado africano e do afrodescendente em Mato Grosso tornou-se cada vez mais significativa. Esse afluxo de escravos deveu-se a diversos fatores. Segundo Sá Junior (2008) primeiramente essa mão de obra foi absorvida pela mineração, montagem da máquina administrativa, engenhos de açúcar e criação de gado, caracterizando a primeira metade do século XVIII, enquanto que na segunda metade do mesmo século, essa mão de obra foi usada para a construção de Vila Bela, a proliferação de engenhos e, por fim, a construção de fortes visando garantir a defesa de suas fronteiras.

Com o tempo, a população da província deixou de ser essencialmente branca e adquiriu também uma dinâmica cultural e religiosa que tornou difícil separar da presença do africano. Quem analisa essa questão é Maria de Lourdes Bandeira em seu trabalho “Território negro em espaço branco: estudo antropológico de Vila Bela”(1988).

“Território negro” analisa a construção de Vila Bela, uma comunidade rural etnicamente diferenciada que foi planejada em Portugal como primeira capital da província de Mato Grosso, sendo reinaugurada como uma comunidade negra pelos pretos12 que ali permaneceram depois da mudança da capital para Cuiabá. Em seu primeiro século, Vila Belateria sido essencialmente de brancos, ainda que a população majoritária fossem de pretos.

A autora ainda relata que quando a elite branca mudou-se com a capital para Cuiabá, os brancos que ficaram não foram capazes de rearticular a sua ‘casta’ no novo quadro politico, econômico e social. A mudança dos brancos criou objetivamente descontinuidade na dominação do espaço, assim o controle social pelos brancos perdeu força na medida em que a ocupação pelos africanos ou pretos aumentava.

12Na obra a autora usa o termo étnico “preto” para designar a comunidade de Vila Bela e aos seus membros respeitando a preferencia do grupo que considera “preto” como conotativo de raça e “negro” como conotativo de inferioridade social e cultural. Neste texto utilizarei a expressão em itálico para designar a expressão utilizada pela autora.

Desse modo as instituições políticas, sociais e religiosas dirigidas e controladas pela elite branca tiveram seus quadros desfalcados e sua força, coesão e prestígio foram comprometidos. Esse fato levou essa elite branca a redefinir suas relações com os pretos livres de modo a assegurar a reprodução da vida social e a sua própria existência com termos da continuidade da ordem social e econômica.

Ainda de acordo com a autora, os pretos foram aos poucos assumindo posições sociais que antes lhes eram proibidas, nesse contexto, como não havia na vida urbana ainda existente, brancos para ocupar certas posições ou espaços sociais, esses foram preenchidos pelos pretos disponíveis, que passaram a compartilhar com os brancos a vida social. A última instituição que resistiu a ocupação negra foi a militar, mas até a Guerra do Paraguai. Ainda assim, por volta de 1850 haveria em Vila Bela um padre preto, e um capitão preto.

As atividades dependiam cada vez mais da participação dos pretos e eles se dispunham a mantê-las de acordo com as normas dos brancos. Desta maneira, a autora ressalta que a saída dos brancos não provocou rupturas e mudanças econômicas, culturais e políticas, mas marcou a definição da identidade de pretos como forma de resistência na situação crítica de oposição entre negros e brancos. Nos períodos de muita fome e doenças, os trabalhadores escravizados morriam precocemente em todas as áreas de mineração do país e em Vila Bela essa realidade atingia seus limites máximos.

Diante desse quadro, a solidariedade entre os pretos, na doença e na morte, seguramente preservou-os do aniquilamento e os predestinou à existência coletiva. Moura (2008), sobre o mesmo assunto afirma que:

A solidariedade, que envolvia as práticas curativas e o igualitarismo, fluía no acesso de todos os meios de tratamentos. Na situação de alteridade configurada em Vila Bela dos Brancos, os negros definiam-se e afirmavam-se em oposição aos senhores brancos pela recusa à escravidão e ao seu estigma, através da fuga individual, da resistência cultural e dos quilombos (pag. 45).

É visto que, como narrou Sérgio Buarque de Holanda (Id.), a vida nos sertões mato-grossenses era difícil não apenas para os africanos quanto para os brancos também, que para superar as dificuldades buscaram diversos recursos, conforme narra Sá Junior em seu artigo “As bolsas de mandingas e os embrulhos de feitiço no Mato Grosso setecentista” (2012). Havia um apelo ao mundo espiritual ou ao ‘outro mundo’

que era parte das estratégias desenvolvidas pelos viajantes que se deslocavam para a região. Assim, desde o início da viagem, seguindo as rotas das Monções, a busca por

esse outro mundo era constante e continha características tanto do bem quanto do mal, pois se manifestou de várias formas.

O autor ainda salienta que a busca do apoio espiritual, principalmente no início das Monções, era feito com a benção das canoas e depois seguia ao apelo aos céus em forma de ajuda e de intervenções miraculosas. Após a chegada as minas em Cuiabá essa busca continuava, pois o apoio imaterial era indispensável nesses primeiros anos de ocupação dos sertões. Mesmo com forte característica católica, que se observapor meio de missas rezadas todos os domingos e dias santos, reza do terço aos sábados, o apelo ao mundo espiritual ou imaterial não era uma exclusividade somente de colonos brancos.

Há registros apresentados por muitos historiadores, Barbosa de Sá, citado por Sá Júnior diz que em 1722 uns pretos haviam levantado, sabe-se lá porque motivo, uma capelinha a São Benedito junto a um lugar chamado depois de Rua do Sebo (idem. Pág. 16), o que pode significar muitas coisas, mas, sobretudo a construção dessa capela traz a tona uma lógica constitutiva da sociedade mato-grossense, pois:

Um santo negro, demonstrando, como em boa parte do país, que africanos e afrodescendentes foram reorganizando algumas de suas crenças, inserindo como ícones santos católicos. Essa africanização do catolicismo ou a cristianização das religiões africanas seguiram algumas lógicas culturais (idem. Pág. 18).

Assim, o autor ainda acrescenta que se africanos e descendentes tiveram forças para erigir uma capela, que demandava esforços monetários e exposição social, também foram capazes de encontrar espaços em Cuiabá, Vila Bela e suas adjacências para edificarem as suas práticas mágicas, feitiçarias, curandeirismos, rezas e benzeduras. Havia nessa região uma natureza cultural que permitiu que essas práticas por brancos, africanos, indígenas e seus descendentes pudessem existir. De uma natureza física onde as matas, os rios, as florestas, que serviam como espaços de santuários e inspirações às práticas.

Sá Júnior (id.) ainda acrescenta que isso só foi possível porque as religiões africanas, americanas e europeias apresentavam em suas estruturas cosmológicas bases comuns. Baseado no trabalho de John Thornton “A África e os africanos na formação do mundo atlântico (1400-1800)”, havia um conjunto de elementos comuns que foram classificados a partir desse estudo com sendo uma base muito ampla e comum a todas as religiões africanas atlânticas e desta com o cristianismo europeu.

Sá Júnior (id.) resume a questão dizendo que além do cosmos ser dividido em dois, ambas as partes eramhabitadas e por isso existiam formas de comunicação entre elas e pessoas para realizar essa comunicação. Desta maneira, para entender essa cosmologia era preciso fazê-lo por partes, sendo assim, a primeira divisão seria do: a) Cosmos, concebido como um todo dividido em duas partes, o mundo dos vivos e outro mundo, não perceptível aos humanos; b) Os habitantes do outro mundo, espaço ou local que recebia a alma daqueles que morriam no plano material; c) As formas de contato entre os dois mundos, que acontecia por meio de revelações, presságios, adivinhações, interpretação de sonhos ou de forma mais direta através da possessão; d) Os intermediários ou os escolhidos – Santos, sacerdotes, nganga ngombo, médiuns e feiticeiros -que eram capazes de manter contato com o outro mundo; e) As interferências do outro mundo, que certamente influenciava o mundo dos vivos através de pragas, doenças, derrotas em guerras e, por outro lado, fartura, saúde, vitória, sinais físicos de satisfação ou insatisfação que o outro mundo demonstra sobre o mundo dos vivos.

É nesse contexto de lógica cosmológica que as manifestações religiosas em Mato Grosso se desenvolvem para a construção de um imaginário coletivo que no decorrer do processo histórico ressignifica um tipo de religiosidade do povo sendo disseminado por estruturas da cultura também popular.

Assim, em meio a um universo tão árduo, a utilização das práticas mágicas e feitiçarias contribuíram para a formação de lógicas explicativas que seriam respostas muitas vezes encontradas no mundo dos vivos.

No Mato Grosso, o limite entre um feiticeiro, um benzedor, um curandeiro ou outras designações foi delimitada em sua grande maioria pela prática de produzir ou retirar o mal. E foi o cotidiano monçoeiro, com seus incontáveis desafios que contribuiu para a formação de muitos saberes entre os viajantes. As tecnologias de navegação, a farmacopeia, a caça, o conhecimento sobre as possibilidades de alimentação, foram construídos na própria vivência desses movimentos de comércio e exploração aos sertões de Mato Grosso, que desde seu início no grande Tietê até Cuiabá, fazia com que as aventuras fossem inevitáveis, o convívio com os africanos, a troca de saberes, os limites entre o branco e o preto se diluíram frente aos obstáculos e contribuíram ao mesmo tempo para reorganizar as crenças e elementos culturais que seriam característicos do Mato Grosso.

Não se pode esquecer que os índios já eram catequizados nessas terras desde o século XVI, de modo que antes da chegada dos africanos em terras mato-grossenses, os elementos indígenas já viviam um ‘sincretismo’ católico. Sá Júnior (id.) faz menção às bolsas de mandiga que os soldados portavam, feitas com conteúdo sagrado, geralmente uma hóstia dobrada, embrulhada em um papel e que eram comuns serem portadas por índios, como Lazaro Vieira, Matias e Joaquim recuperados pelo autor a partir da obra “Devassa da Visita Geral da Comarca Eclesiástica de Cuiabá (1785)” que contribuem para o entendimento dessa religiosidade em formação na sociedade escravista mato-grossense, que mantinha também sintonia com o resto da colônia e do império português.

O autor ainda ressalta que essas práticas faziam parte de um tipo de trabalho bastante desenvolvido na colônia, principalmente a partir do século XVIII, através da chamada escravidão de ganho. Os produtores e vendedores de bolsas de mandinga e embrulhos de feitiço acabaram por construir uma modalidade específica de trabalho escravo: a feitiçaria de ganho.

Os elementos compósitos das práticas mágicas e feitiçarias partilharam um diálogo intercultural nesse mesmo contexto e possibilitaram o desenvolvimento de estruturas mais organizadas. Sá Júnior (Id.) levando em consideração os estudos do historiador português Francisco Bethencourt (2004), concorda que lá as práticas mágicas atuavam basicamente sobre assuntos amorosos, problemas de saúde, aspirações sociais, problemas econômicos e demandas judiciais, com suas respectivas diferenças no contexto desses sertões.

É importante dizer que essas práticas se davam numa sintonia do Mato Grosso com o restante da colônia, Europa e localidades africanas, variando, conforme assinala o autor, seus instrumentos, fórmulas e ingredientes, além das fórmulas oraisem formato de bênçãos, orações e chamadas de palavras, que podem ou não ter relação direta com o idioma africano e indígena.

Assim, o achamento do ouro nas minas de Cuiabá contribuiu para o total povoamento do norte da província trazendo para esta região uma variedade de elementos culturais que criaram um imaginário próprio para a constituição das bases de sua religiosidade popular.No entanto, o Sul da província teve um povoamento insipiente em detrimento do norte, que só se efetivou de forma mais completa após a Guerra do Paraguai (1864-1870) e se deu com a construção de fortes para a defesa das fronteiras

do Império, como os Fortes Coimbra, Albuquerque, Colônia Militar dos Dourados e Colônia Militar de Nioac, dando origem a muitos municípios hoje constituídos.

Mesmo após o término da guerra, o desenvolvimento desse Sul, que mais tarde chamou-se Estado de Mato Grosso do Sul13, continuou comprometido, desta vez, por

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