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LITERATURA INFANTIL NA ATUALIDADE

3.1 Breve panorama sobre a leitura, a diversidade e o currículo nas séries iniciais

A literatura em geral constitui uma modalidade de construção de sentidos na qual as representações perpetuam ou criam novos sentidos, alterando os conceitos e modos de conceber a realidade e construindo as relações de pertencimento identitário. Neste capítulo são apresentados brevemente o surgimento da literatura infantil na Europa e no Brasil ainda carregado dos sentidos que a caracterizavam na Europa.

Inicialmente, fazemos uma referência ao pensamento de Zilberman (2003), Souza (2010) e Cademartori (2007) por apresentarem em seus trabalhos o histórico do surgimento da literatura infantil na Europa, como parte de uma necessidade da burguesia por volta do século XVIII devido ao status que a infância passa a ter, levando a escola a assumir, junto com a família, a educação das crianças.

Não há pretensão em se trazer o histórico da trajetória da elaboração do que hoje, com muitas controvérsias, denomina-se literatura infantil. Porém, partindo das ideias de Zilberman (2003), a literatura infantil surgiu com o reconhecimento da infância por parte burguesia como fase da vida. A necessidade de educar as crianças dentro dos valores e padrões da época e a possibilidade de se abrir mais um mercado com promissora rentabilidade fizeram com que a literatura surgisse envolta em preconceitos e destinação diferente da verdadeira função da literatura, que é a de proporcionar o conhecimento do mundo por meio da fantasia do autor.

Zilberman (2003) evidencia também em sua obra os caminhos que os textos literários para a infância percorreram, partindo da forma utilitarista, como manual de informações, doutrinas e veículo de regras morais, e chegando até as diferentes dimensões que podemos identificar na literatura infantil contemporânea.

Diante do compromisso da escola em educar as crianças, surge a literatura infantil como material pedagógico auxiliar na educação dos pequenos. Escrita inicialmente por professores, teve caráter pedagógico. O objetivo de doutrinar veio expresso nos textos recortados de obras para adultos, sem muito sentido e preocupação com o universo infantil, já que ainda preponderavam os resquícios da ideia de que a criança era um adulto em miniatura. Perrotti (1986) colabora criticando o modelo vigente de literatura:

Uma literatura menos utilitária, feita especialmente para crianças, começa a aparecer timidamente, na Europa, somente no século XIX. Evidentemente ela não conseguirá se tornar-se hegemônica. O discurso moralizante, o caráter pedagogizante da narrativa ainda dominará nesse campo [...] somente no nosso século é que a concepção utilitarista da arte para crianças sofreria abalos consideráveis, sendo profundamente questionada por artistas, estudiosos e por todos aqueles que se interessam pela questão (PERROTTI, 1986, p. 52).

Ao localizar o surgimento da literatura infantil entrelaçada com a história da estabilização do poder burguês, Zilberman (2003) e Souza (2010) mostram que, anteriormente, a infância não fazia parte da preocupação central dos adultos. O conceito de família esteve intimamente ligado ao da aristocracia, em que não havia esse caráter intimista da família nuclear.

A família tinha um sentido pautado no agregamento de pessoas que estariam submetidas ao aristocrata, algo como o poder feudal numa concepção medieval em que as famílias tinham um compromisso social em manter o poder dos donos das terras em uma relação baseada no feudalismo e no poder rural. Não havia a identidade de família como a conhecemos hoje. A criança nesse meio não era pensada como alguém que precisava ser educada e protegida. Viviam as mesmas experiências e frequentavam os mesmos espaços que os adultos. Nessa época, era alto o índice de mortandade na infância.

Com a ascensão da burguesia, que se afirmava como classe, a família ganhou um novo modo de ser e pensar as relações entre seus membros. A organização patriarcal confere à mulher o papel de organizadora da dinâmica familiar, passando as crianças a receberem cuidado materno, afeto e educação formal em instituições escolares.

A ampliação da instituição escola se deve a interesses econômicos. Os modos de produção estavam pautados na industrialização. Diante da necessidade de manutenção dos interesses burgueses, a criança proletária, que vivia uma infância fadada ao trabalho, constituía mão de obra barata. Por isso, começou a receber cuidados também do estado, que, por interesses voltados para o capital, alfabetizava e preparava as crianças para assumirem os postos nas fábricas.

No Brasil, a literatura surge no final do século XIX. As obras de origem europeia tinham tradução nacional, e a circulação era insuficiente. Com a Proclamação da República e o status de país rumo à modernização, com o fim do modelo escravocrata, o surgimento e fortalecimento das metrópoles e a nova conformação da sociedade brasileira com a chegada dos imigrantes, a educação torna-se necessária. Mais uma vez,

na Europa, a literatura infantil tem como primeira função educar. A escola como espaço de reprodução ideológica se limita à literatura vinculada aos objetivos do Estado.

Monteiro Lobato, figura importante quando se fala em literatura infantojuvenil, surge com uma literatura escrita sem rebuscamentos, espontânea, com linguagem popular, com a proposta de estimular o leitor a ter senso crítico e pensar a sua realidade social em um país que precisava romper com o modelo rural e tornar-se urbanizado. Lajolo (1998) atribui a Monteiro Lobato o rompimento com a literatura infantil baseada em pressupostos europeus, como a ausência de crianças como personagem e a marca da forte presença do elemento maravilhoso em suas histórias, bem como temas relacionados à realidade social brasileira voltada para a vida na zona rural. No decorrer da pesquisa, veremos seu o personagem Jeca Tatu, que personificou o conceito de progresso e atraso segundo autor. Mais adiante, será abordado o pensamento do autor em sua obra Caçadas de Pedrinho (2009).

Entre as décadas de 1940 e 1960, a literatura infantil teve como enredo a vida rural, os bandeirantes, os índios e os mitos da Amazônia, uma repetição do período anterior. A literatura infantil tinha um caráter patriótico, diferentemente das décadas de 1960 a 1980, nas quais a literatura rompeu com os compromissos com a escola e a pátria e incorporou a cultura de massa presente nas grandes cidades. Nesse período, o professor tornou-se uma possibilidade de veicular obras com o argumento de serem auxiliares em sua prática pedagógica.

Nos dias atuais, a escola possui um currículo oficial, aquele que os professores procuram “vencer a todo custo”, e outros currículos que se relacionam às determinações impostas pelo poder dominante, como as religiões cristãs, a heterossexualidade, os conceitos de famílias “estruturadas”, os modos de consumo, as concepções de seres humano, enfim, uma gama imensa de conteúdos que não está escrita nem determinada oficialmente nos currículos, mas fazem parte do conjunto de ensino e aprendizagem oferecido pela instituição escola.

Para Cademartori (2007), os anos 1980 apresentaram uma faceta da literatura infantil, dentro da concepção do poder atribuído ao adulto escritor, professor e pais: a definição do que é importante na formação da criança. Esse poder relega às crianças um processo de formação distante da realidade do mundo conflituoso, que exige reflexões sobre questões que a literatura muitas vezes não trata por ser, na verdade, uma decisão do adulto partindo da sua concepção do que a criança deve ou não ter contato.

Tradicionalmente a literatura infantil apresentou, por determinação pedagógica, um discurso monológico que, pelo caráter persuasivo, não abria brechas para interrogações, para o choque de verdades, para o desafio da diversidade, tudo se homogeneizando numa só voz, no caso a do narrador (CADERMATORI, 2007, p. 24).

A literatura infantil não está desvinculada dessas representações sociais. Traz em forma de imagem e texto um mundo a ser seguido. Por mais que nos dias de hoje os autores consigam fazer literatura de qualidade, sendo as crianças protagonistas em seus anseios e com enredos pensados para a infância, tais obras não são inocentes. Movidas pela produção do prazer e pelas emoções, trazem doutrinas, modos de vida escritos da maneira mais atraente possível, conseguindo atingir o imaginário das crianças e estabelecendo possibilidade de reprodução desses parâmetros na realidade vivida.

As crianças têm na literatura uma oportunidade de se conectar com os vários mundos e estabelecer experiências que as ajudem a compreender melhor suas realidades, como simplesmente rir, emocionarem-se, encantarem-se com o enredo e identificarem-se com a personagem principal.

Sobre esse contato da criança com a realidade mediante a literatura infantil, Zilberman (2003) contribui:

[...] devido não só à sua circunstancia social, mas também por razões existenciais – se vê privada ainda de um meio interior para a experimentação do mundo, ela necessitará de um suporte fora de si que lhe sirva de auxiliar. É esse lugar que a literatura infantil preenche de modo particular, porque, ao contrário da pedagogia ou dos ensinamentos escolares, ela lida com dois elementos adequados para a compreensão do real: uma história, que apresenta, de maneira sistemática, as relações presentes na realidade, que a criança não pode perceber por conta própria e a linguagem, que é mediador entre a criança e o mundo, de modo que, propiciado pela leitura, um alargamento do domínio linguístico [...] (ZILBERMAM, 2003, p. 45)

A literatura infantil ainda é uma questão de poder. Como todos os bens da atualidade, está carregada de possibilidade de formação, seja aquela literatura de má qualidade vendida nas portas das escolas, seja a literatura selecionada dentro de uma política de leitura para os alunos, como é o caso dos livros que chegam às bibliotecas das escolas públicas de todo o Brasil.

A globalização, a mídia, a indústria de produtos para crianças, junto com a indústria cultural e a literatura contemporânea ou clássica, bem como outros materiais acessíveis dentro e fora da escola, veiculam imagens, ideias, modos de vida que não condizem com a realidade das famílias negras e não lhes dão visibilidade, tanto pelas

culturas impostas quanto pela constituição de um imaginário social branco e burguês, ratificado em produtos que funcionam como veículos de ideologias brancas sobre um modo único de ser e estar no mundo. Esses produtos passam ao largo da realidade das famílias negras, porém influenciam o modo como a sociedade vê essas famílias.

Guattari e Rolnik (2005) discorrem sobre a cultura de massa e a produção de indivíduos por meio de sistemas de valores dissimulados, que produzem subjetividades sociais inconscientes intimamente relacionadas ao consumo. Os autores acreditam que a oposição a esse modo de submeter o ser humano a uma hegemonia cultural seria a construção de uma subjetividade individual, denominada de “processo de singularização”: a possibilidade de recusar esses “modos de encodificação preestabelecidos”.

Recusá-los para construir modos de sensibilidade, modos de relação com o outro, modos de produção, modos de criatividade que produzam uma subjetividade singular. Uma singularização que coincida com o desejo, com um gosto de viver, com uma vontade de construir o mundo no qual nos encontramos (GUATTARI; ROLNIK, 2005, p. 22).

Os meios de comunicação em geral têm uma imagem no poder. É a imagem do homem e da mulher branca que entra todos os dias nos lares por meio da televisão e ratifica no imaginário social a identidade estética que prevalece no Brasil. As crianças sentem, sabem que os seus cabelos, cor de pele e jeito de viver não estão representados, não aparecem na televisão, ou pelo menos gozando o mesmo status e na mesma proporção em que as brancas e brancos aparecem. São os meios de comunicação a serviço de uma homogeneização identitária. Sobre isso, Santos (2010) contribui ao abordar a questão das teorias manipulatórias que estão contidas nas produções, no consumo e na concepção de seres humanos e que estão embutidas na globalização que atinge também a escola.

Os poderes hegemônicos que comandam a globalização neoliberal, a sociedade de consumo e a sociedade de informação tem vindo a promover teorias e imagens que apelam a uma totalidade, seja ela a da espécie, do mundo ou mesmo do universo, que existe por sobre as divisões entre as partes que a compõe. São aspirações dos povos, sexos, regiões, etnias, etc., bem como as relações desiguais, de exploração e de vitimização, que tem unido partes que compõem esta pseudo totalidade. Mas o órgão de credibilidade destas teorias e imagens consiste em apelarem, ainda que de modo manipulatório, para uma comunidade imaginada da humanidade em seu todo (SANTOS, 2010, p. 84).

A literatura na educação escolar cumpre um papel que vai além da necessidade pedagógica escolar de construir e desenvolver nas crianças a importante habilidade de ler as fichas literárias, tão utilizadas para verificar se a obra imposta havia mesmo sido lida e compreendida de uma única forma, desconsiderando as infinitas possibilidades de interpretação, de interação entre leitor e escritor. Tal como é vista, a literatura infantil contribui para a interação e o desenvolvimento social das pessoas, ainda que essa não seja sua função primeira para os teóricos e escritores.

A literatura pensada nesta pesquisa tem a sua dimensão formativa no sentido de revelar outras possibilidades de culturas, de pessoas e de modos de viver e estar no mundo e de fazer sonhar, envolvendo as crianças nas tramas, estabelecendo uma relação com base nos significados atribuídos ao conteúdo da leitura. Para Souza (2010), literatura é:

[...] antes de tudo, engenharia de palavras. É por meio da palavra oral ou escrita que ela se realiza. Seu campo é vasto. Ela nasce da necessidade de os homens, desde as origens, registrarem e compartilharem suas experiências, fantasias e, mais do que isso, valores e ensinamentos, transmitindo-os para gerações vindouras. Deste modo a literatura existiu antes mesmo da invenção dos códigos escritos (SOUZA, 2010, p. 9) A referência de literatura mais conhecida nas escolas brasileiras, conhecida por clássicos infantis como Chapeuzinho Vermelho, Cinderela e Branca de Neve, entre outras, são obras de autores europeus. Não abordaremos o caráter estritamente comercial de como entram na escola. Tais obras trazem, originalmente, um fundo doutrinador de valores como a obediência, a resignação e a bondade como princípios a serem apreendidos pelas crianças.

Segundo Bettelhein (2007), ao se referir à importância dos contos, traz outra visão do conto de fadas para formação global da criança, mas reconhece o distanciamento dessa modalidade de literatura da realidade:

Em todos esses aspectos e em vários outros, no conjunto da “literatura infantil” – com raras exceções – nada é tão enriquecedor e satisfatório, seja para criança ou para o adulto, do que o conto de fadas popular. É bem verdade que num nível manifesto, os contos de fadas pouco ensinam sobre as condições específicas da vida na moderna sociedade de massa; eles foram inventados muito antes do seu surgimento (BETTELHEIN, 2007, p. 12).

Há nessas produções um caráter pedagógico: os ensinamentos sobre a moral, a obediência, a honestidade tornam-se a tônica da literatura, a ser observada na seleção

de tais clássicos, uma vez que estes são muito utilizados nas escolas. Ademais, contribui para essa disseminação o mercado editorial, que produz releituras de clássicos e os comercializa nas portas das escolas como literatura infantil, tornando tais obras referência de qualidade duvidosa. Cademartori (2007) ajuda a fundamentar essa ideia sobre a literatura, que tem um caráter homogêneo e que não aborda os conflitos existenciais da pós-modernidade, como as diferenças culturais e humanas.

Foi com a preocupação pedagógica que, por muito tempo, silenciou no texto questões relativas à sexualidade, ao racismo, à segregação das mulheres e outras mazelas da sociedade e de seus jogos de poder. Já nos contos clássicos se observa o silenciamento de qualquer conflito que não seja solúvel e a negação de qualquer situação de falta que não seja resgatável. [...] Tradicionalmente a literatura infantil apresenta por determinação pedagógica um discurso monológico, que, pelo caráter persuasivo, não abria brechas para interrogações, para o choque de verdades, para o desafio da diversidade, tudo se homogeneizando, numa só voz, no caso, a do narrador (CADEMARTORI, 2007, p. 24). Ao pensarmos a escola atual com todas as suas funções e teorias sobre a necessidade de democratizar e incluir verdadeiramente os diversos grupos e suas reivindicações acerca das suas identidades, cabe análise e reflexão sobre a literatura infantil clássica e como esta apresenta a estética e a cultura negra. As obras enviadas às escolas por meio de políticas ou introduzidas na escola com intuito puramente mercantilista não contribuem para a implementação das políticas de valorização da população afro-brasileira por passarem distante do mundo conhecido e vivido das crianças. O cenário social criado para os enredos não fazem menção ao legado cultural africano presente na língua, religião, danças e festejos que compõem a cultura brasileira.

Nos livros infantis, com forte influência europeia, além da construção de um imaginário de mulheres frágeis, dóceis, passivas e em condição de inferioridade ao homem, todas são brancas, possuem cabelos longos e louros e estão sempre à espera do resgate de um príncipe, também branco, forte, belo, rico e que as tornem princesas ou as resgatem de uma situação de pobreza ou de alguma madrasta ou bruxa má para, enfim, serem felizes para sempre. Nesse sentido, vale o pensamento de Felisberto (2006) para enforcar outra possibilidade de literatura: “Nós que tanto precisamos de nossa literatura para nos entreter e para expressar as várias demandas que temos por igualdade de gênero, para expressar religiosidades marginais, para exercer autoestima [...]” (FELISBERTO, 2006, p. 75).

Segundo Cademartori (2007), a Charles Perrault, francês do século XVII, é atribuído o mérito pelo início da literatura infantil, que já existia como literatura

pedagógica da cultura erudita, a exemplo dos textos dos jesuítas, e como cultura popular expressa nos contos e provérbios. Mesmo desprezando a cultura popular, Perrault se apropriou desta, coletando contos e os adaptando ao gosto burguês com caráter moralizante e pedagógico. Os contos populares se tornaram meio para a elevação da criança à condição de adulto, nascendo assim a literatura infantil.

Esses elementos formadores de concepções, de preferências e que estabelecem modos de vida, de conceber o mundo e o outro estão sendo considerados aqui devido ao entendimento de que a educação não acontece somente dentro dos muros da escola. A educação como parte vital das construções sociais e culturais de tudo o que somos deve levar em consideração os meios externos à escola e a relação dialógica que se estabelece nos espaços escolares entre as crianças e as diferentes concepções. Sobre essa dimensão do texto literário, Souza (2010) evidencia que:

Não só o uso estético da palavra, mas a disposição do texto no papel, as escolhas gráficas, a ilustração, tudo disputa espaço na busca das opções valorativas, éticas e pedagógicas eleitas pelo autor, para que a narrativa atinja a sensibilidade do leitor, altere seus horizontes de expectativas e sedimente valores formativos (SOUZA, 2010, p. 59). Essas compreensões podem redimensionar os objetivos dos currículos e das práticas pedagógicas cotidianas, viabilizando interações respeitosas, inclusivas e democráticas por meio do rompimento com modelos únicos de cultura.

Moreira e Silva (1995) colocam o currículo como um “artefato social e cultural” importante para a organização da sociedade e da educação e, por isso, um espaço de poder no processo educacional por trazer para a formação dos educandos conhecimentos relacionados à determinados grupos:

O currículo não é um elemento inocente e neutro de transmissão desinteressada do conhecimento social. O currículo está implicado em relações de poder, o currículo transmite visões sociais particulares e interessadas, o currículo produz identidades individuais e sociais particulares (MOREIRA; SILVA, 1995, p. 8).

É em meio ao pensamento uno de concepção de vidas, de estética e de mundo que as crianças negras constroem as concepções sobre si mesmas. Esses modos de pensar chegam à escola por meio de muitos canais e também pela literatura infantil, que traz consigo imagens e códigos que internalizam conceitos que, mesmo sem a força da palavra pronunciada pela fala, diretamente expressam e designam quem faz parte do

grupo dos considerados bonitos, detentores do poder e, portanto, mais aceitos no ambiente escolar.

A literatura infantil propõe valores e regras, mas nesse caso há um ingrediente a mais: a seleção é baseada no racismo, influenciando a forma como as crianças se constituem na condição de seres humanos cujas referências principais estão ligadas ao pertencimento étnico-racial.

As meninas, muito mais que os meninos, sofrem porque a invenção social do feminino está intimamente ligada a um conjunto de signos que as indústrias se apropriam para incentivar o consumo de roupas e objetos patenteados pela mídia, sobretudo a televisão, por meio de atores famosos, filmes e desenho animado de empresas