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Breve resenha histórica dos primórdios dos MCI

Capítulo 1 Introdução

1.3 Breve resenha histórica dos primórdios dos MCI

Os motores térmicos servem a humanidade desde os primórdios da revolução industrial, há mais de dois séculos e meio. Nos primeiros 150 anos foram usadas as máquinas a vapor, onde o fluido de trabalho era o vapor aquecido e vaporizado numa caldeira. Os gases resultantes da combustão aqueciam e vaporizavam o fluido de trabalho. Estas máquinas a vapor eram motores de combustão externa.

Em meados do seculo XIX surgiram os primeiros motores de combustão interna que transformam a energia térmica libertada pela reação química de combustão entre o ar e o combustível em energia mecânica, disponibilizada sob a forma de trabalho. Estes motores térmicos utilizavam o aumento da pressão da mistura gasosa resultante da combustão para realizar trabalho. Os primeiros trabalhos conhecidos sobre motores de combustão interna foram atribuídos a Christian Huygens em 1673 com um motor que elevava um pistão no interior de um cilindro onde se queimava pólvora. Enquanto os gases no interior do cilindro arrefeciam, baixava a pressão e a descida do pistão fazia subir água ou carvão por ação da pressão atmosférica. Denis Papin aproveitou esta ideia e propôs em 1688 o funcionamento da máquina a vapor segundo o “princípio atmosférico”, isto é, estes motores funcionavam por depressão e evitavam aproveitar a força devida ao aumento da pressão, aquilo que na época se chamava a força viva. Esta máquina a vapor foi evoluída posteriormente por Thomas Savery, Thomas Newcomen e por

último, pelo escocês James Watt que brilhantemente aproveita a força viva da expansão do vapor com o sucesso que se conhece.

Com o advento e rápido desenvolvimento da máquina a vapor os motores de combustão interna estagnaram e só em 1805 Isaac de Rivaz, consegue desenvolver com algum sucesso o motor de pistão livre, figura 8, Martins (2005). Em 1854 Barsanti e Matteuci patentearam um motor de cilindro vertical que no entanto, dadas as condicionantes do seu tempo não teve sucesso comercial Lucchesi (1989).

Figura 8 Representação esquemática do motor de Rivaz. Eckermann (2001).

Foi necessário esperar até ao início da segunda metade do século XIX para com Jean Lenoir, se pensar de novo no motor de combustão interna. Apoiado nos trabalhos e na experiência da máquina de vapor, construiu um primeiro protótipo em 1860. Tratava-se de um motor pouco distinto da máquina a vapor, de que era derivado: monocilíndrico, horizontal, pistão de duplo efeito, dois tempos tinha distribuição por válvulas de corrediça para a admissão da mistura e o escape dos gases queimados Martins (2005). Atribui-se ainda a Lenoir o arrefecimento do cilindro, a introdução do carburador e da inflamação elétrica.

Em 1861 Jean Lenoir comercializou os primeiros motores de combustão interna cerca de 500 unidades. Este motor da figura 9 fazia a admissão da mistura na primeira metade do curso, na segunda metade desse curso dava-se a ignição com a correspondente inflamação e expansão da mistura gasosa. A partir daí o pistão retorna ao ponto inicial onde se abria a válvula de escape permitindo a saída dos gases devido ao aumento da pressão.

Figura 9 Motor de Lenoir. Stone (1992)

Em 1860, Nicolaus August Otto (1852-1891), entusiasmado com os trabalhos de Lenoir, dedicou- se a experimentar a técnica deste. Numa pequena oficina de Colónia quase realizava o primeiro motor sem compressão a quatro tempos. Finalmente em associação com Eugen Langen desenvolvem em 1866 o motor de pistão livre, com um princípio de funcionamento semelhante ao de Rivaz, e fundam a Fábrica de motores Deutz AG, onde fabricaram mais de 5000 motores na sua fábrica de Colónia, Martins (2005). Este motor da figura 10, funcionava com a introdução do combustível no primeiro décimo do curso, de seguida a mistura inflamava e a expansão obrigava à subida do pistão que armazenava desta forma energia potencial que era depois transformada em trabalho através de um volante de inércia colocado no topo do cilindro e que funcionava em roda livre, isto é, só era acionado para realizar trabalho enquanto o pistão descia. O escape realizava-se na parte final deste curso de descida.

Tendo verificado as limitações deste motor Nicolaus Otto assumiu a direção dos trabalhos na Deutz e começa a trabalhar num motor de compressão prévia com 4 tempos. Em 1876 produz e patenteia a sua grande descoberta: o motor a quatro tempos com compressão prévia contribuindo deste modo para o fim do ciclo de Lenoir. Este motor era mais silencioso, mais eficiente, semelhante ao desenvolvido sem sucesso por Barnett em 1838 e usava a compressão prévia descrita por Schmidt em 1861, Stone (1992).

O motor de Otto funcionava segundo os princípios enunciados por Beau de Rochas em 1862, numa patente que deixou caducar, onde sugeria 4 pontos fundamentais para o desenvolvimento do “seu” motor de compressão prévia e combustão a volume constante, Martins (2005):

 A mais alta velocidade possível;  A maior expansão possível;

 A maior pressão possível no início da expansão.

Figura 10 Motor de Otto e Langen. Stone (1992)

Dado que foi Otto o primeiro a ter sucesso comercial com este motor, o seu nome ficaria para sempre associado ao ciclo de 4 tempos com compressão prévia e combustão a volume constante, apesar dos problemas associados à sua patente.

Enquanto a patente de Otto não foi anulada, vários construtores adotaram o ciclo de dois tempos como se mostra na figura 11 com compressão prévia, entre os quais se destacaram Dugald Clerk na Escócia, James Robson em Inglaterra e Karl Benz na Alemanha.

Figura 11 Vista em perspetiva do motor de dois tempos. Stone (1992)

Entretanto Wittig desenvolve na Alemanha por volta de 1878 o primeiro motor de pistões opostos (OPE) bem-sucedido, figura 12. Os motores de pistões opostos caracterizam-se por terem um par de pistões a operar face a face em sentidos opostos no mesmo cilindro, eliminando dessa forma a necessidade das cabeças dos cilindros. Este motor monocilíndrico funcionava inicialmente a quatro tempos, com as condutas de admissão e de escape na zona central do cilindro, usava uma única cambota de três braços, onde longas bielas laterais, com um desfasamento de 180o relativamente à biela central, impulsionavam o pistão “exterior” através de uma ligação em ponte (barra transversal), enquanto a biela central impulsionava o pistão “interior”. O pistão exterior era um pistão de ar que também podia impulsionar uma bomba de lavagem.

Em 1892 Rudolf Diesel inventou e patenteou o motor de ignição por compressão, de combustão a pressão constante e compressão prévia que ficaria conhecido pelo seu nome, cuja característica fundamental era “comprimir ar puro num cilindro a uma temperatura superior à da auto inflamação do combustível, que seria introduzido a partir do PMS”. Estava assim criado o novo ciclo termodinâmico a quatro tempos. Logo no primeiro protótipo, atingiu um rendimento de 22%, equivalente a um consumo específico de 235 g/cv.h, que batia todos os recordes da época. O seu primeiro motor de aplicação prática data de 1898. Este motor de 1898 queimava gás que era injetado no seio de ar comprimido. Embora Diesel tenha concebido a injeção direta do combustível, esta apenas foi realizada 20 anos depois. Após um período de intensa crise, durante o qual muitos dos detentores de licenças abandonaram a sua construção, o motor acabou por vingar e impor-se.