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SEÇÃO 1: Uma história da instrução comercial em Portugal e no Brasil e sua

2. Breves considerações sobre a história do comércio

Para dar início à compreensão do ensino de inglês na instrução comercial, será apresentado a seguir um panorama da história do comércio. De acordo com o dicionário de Raphael Bluteau (1728, p. 402), o “commércio ou negócio de mercâncias ou de dinheiro com mercadores naturais” consiste em “vender & comprar”. Outra interpretação curiosa oferecida ao verbete pelo mesmo dicionário é de “communicação” que uma pessoa tem com a outra. O primeiro ato de comércio teria se dado no começo dos tempos, quando o homem primitivo percebeu que outro poderia necessitar de um produto que lhe sobrava.

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Embora o termo „método direto‟ nos estudos de ensino de línguas tenha sido sistematizado e descrito no final do século XIX, a base teórica deste método reuniu influências de teóricos como Comenius (1592-1670), Montaigne (1533-1592), Locke (1632-1704), Spencer (1820-1903). Todos concordavam que a aprendizagem deveria valorizar o contexto, as ideias e a oralidade, em vez de regras gramaticais e memorizações. Dessa forma, o referido método dava ênfase à habilidade oral e tinha como princípio a transmissão do conhecimento sobre a língua através da língua, sem traduções ou análises gramaticais. Para saber mais sobre o método direto e suas origens, além de conhecer sua oficialização no Brasil, ver a dissertação A instituição do método direto para o ensino de inglês no Brasil de Rodrigo Belfort Gomes (2015).

No cerne da discussão da criação da instrução comercial, encontram-se algumas ideias da teoria econômica que podem apresentar uma fundamentação esclarecedora acerca da importância do comércio para o desenvolvimento português através da elevação da ciência econômica a algo útil ao Estado. Na obra Instrução e Economia: as ideias económicas no

discurso da ilustração portuguesa (1746-1820), de Francisco António Lourenço Vaz (2001),

o comércio é abordado a partir das ideias de diversos pensadores, dentre eles os fisiocratas da escola de direito natural. Esta escola francesa da segunda metade do século XVII foi responsável por alguns preceitos que dariam à luz a ideia de especialização determinante para uma nova ciência.

No intuito de possibilitar a conservação da sociedade, o comércio sofre influência de teses jusnaturalistas e alcança uma dignificação nos debates da nobreza comerciante. As teorias mercantilistas – algumas serão vistas adiante – foram compatibilizadas com a vontade do soberano e vão influenciar sobremaneira o discurso pedagógico da ilustração portuguesa encontrado nos manuais escolares que falam de ensino econômico, textos e preleções de direito, lições de comércio e reflexões econômicas.

Segundo relatos históricos, a exemplo de Vaz (2001) e Meirelles (1983), em sua origem o comércio ocupava um setor relativamente insignificante da vida econômica, “limitando-se em sua maior parte aos artigos de luxo” (MEIRELLES, 1983, p. 30-31). Os egípcios são entendidos como os primeiros povos a manterem atividades mercantis, com seu cultivo de linho e sua produção de artigos com o emprego desse produto. Os famosos objetos de pedras preciosas, além dos utensílios confeccionados de madeira, couro e metal, bem como as porcelanas e vasos de argilas, eram também procurados para comércio grego através dos portos egípcios por volta de 600 a.C.

Apesar de se observar que nesse período a vida econômica ainda estava baseada na agricultura, o princípio da divisão de trabalho começa a se apresentar através das primeiras manifestações industriais de ofícios como artesão, alfaiate, comerciante. Os fenícios são entendidos como o povo mais antigo a se interessar pela indústria e comércio em sua vida econômica. De acordo com Meirelles, “o solo de seu país pela escassa fecundidade do solo, oferecia à agricultura escasso rendimento, daí considerarem, desde épocas muito remotas, o mar como fonte de seu sustento”. Essa condição, juntamente com a posição geográfica da Fenícia, certamente explica porque os fenícios foram “educados para a navegação e o comércio marítimo” (MEIRELLES, 1983, p. 31).

Com respeito ao domínio marítimo fenício, a Grécia somente tomou impulso mercantil quando sua atividade industrial passou a assegurar mercados estrangeiros. Em pouco tempo,

os gregos passaram a ocupar a hegemonia mercantil com produção variada e substituindo os fenícios em muitas rotas comerciais além do mar Egeu, avançando pelo Ocidente Mediterrâneo. Simultaneamente, as cidades fundadas como bases militares por Alexandre Magno „O Grande‟ (356 a.C. – 323 a.C.) tornaram-se importantes colônias gregas, bem colocadas geograficamente para o interesse comercial. A praça comercial mais grandiosa do mundo antigo encontrava-se em Alexandria.

Dentro do circuito comercial europeu estabelecido até o século IV, Constantinopla foi um grande centro comercial, palco de significativas transformações. Foi ali que a maioria dos produtos de procedência europeia se concentrava, o que despertou o interesse dos Impérios Romano, Bizantino e Latino. Motivadas inicialmente pela conquista de terras santas e difusão das religiões católica e islâmica, as Cruzadas foram responsáveis por destituir o poder de Constantinopla e reorientar o centro comercial para Veneza. Tal deslocamento privilegiou, com o passar dos anos, a consolidação de três grandes zonas comerciais na Idade Média: o Oceano Índico-Arábico, o Mediterrâneo e os mares do Norte e Báltico.

No intervalo que sucedeu a redistribuição das principais zonas comerciais, o impulso do colonialismo e do mercantilismo resultaram no destaque de outros centros comerciais, passando por Champagne, Florença, Amsterdam, Londres, Flandres, Normandia, Alexandria, Colônia, entre outros. Com o estabelecimento das funções de produtora e consumidora de cada região, o crescimento demográfico dos centros urbanos e o desenvolvimento do mercador medieval em mercador itinerante e suas associações, a intensificação das relações comerciais levou a uma reconfiguração geográfica ainda maior do comércio.

Foi por volta do século XV que o homem ultrapassou o mundo já conhecido ao explorar uma rota marítima para as Índias. Esta descoberta provocou uma grande transformação na vida econômica da Europa com a gradativa substituição do comércio local do Mediterrâneo e do Báltico pelo comércio marítimo internacional. Como se sabe, “Portugal foi a primeira nação que lançou as vistas para a imensidade do Oceano, podendo mesmo essa pequena nação ser considerada como a precursora do moderno tráfico mundial” (MEIRELLES, 1983, p. 60).