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5.1 O INSTITUTO FEDERAL DO PARANÁ

5.1.3 Breves reflexões sobre os documentos

A proposta de organização curricular dos cursos Técnico em Processos Fotográficos e Técnico em Mecânica, tanto na forma de oferta integrada quanto subsequente, contempla o que preveem a LDB e as Diretrizes Curriculares da Educação Profissional Técnica de Nível Médio (Resolução n.º 6 de 20 de setembro de 2012, subsidiada pelo Parecer CNE/CEB n.º 11/2012). Com relação ao currículo e à estrutura dos cursos, as Diretrizes apontam a necessidade de se

considerar a matriz tecnológica, o núcleo politécnico comum, os conhecimentos e habilidades nas áreas de linguagens e códigos, ciências humanas, matemática e ciências da natureza, que são vinculados à Educação Básica, elementos para compreender e discutir as relações de produção e de trabalho e o domínio das tecnologias objetivando a formação e o desenvolvimento profissional da/o cidadã/ão.

Especificamente no que concerne aos princípios postos por esses documentos, compreende-se:

[...] a educação como prática social e cooperativa, visando à formação do profissional- cidadão crítico-reflexivo, competente técnica e eticamente e comprometido com as transformações sociais, políticas e culturais do mundo, capaz de atuar no mundo do trabalho, na perspectiva da edificação de uma sociedade mais justa e igualitária. (IFPR, 2013, p. 17).

Isso também pode ser visualizado na redação do PPC do curso de Processos Fotográficos integrado, o qual nos traz que:

A organização curricular do curso foi construída em consonância com os princípios básicos do currículo integrado, tendo como principais eixos estruturantes a ciência, a cultura, o trabalho e a tecnologia. [...] Isto porque, para atingirmos uma formação integral, o desenvolvimento do trabalho pedagógico caminhará de forma a proporcionar a articulação entre a formação geral e a habilitação técnica. (IFPR, 2015, p. 16).

Nesse sentido, vislumbramos, a partir do exposto, os preceitos de uma educação com perspectivas à educação tecnológica, parte presente da politecnia; essa possibilidade de educação, ao nosso ver, pode ser vislumbrada especialmente ao nos remetermos aos dois cursos (Processos Fotográficos e Mecânica) na forma de oferta integrada. Nesses cursos, almeja-se uma formação integral, aliando a formação generalista a uma habilitação técnica. Diferente é a nossa percepção quanto aos cursos subsequentes, os quais consideram que essa formação generalista já foi completada, sendo dada ênfase, assim, às disciplinas técnicas. Nesse viés, visualiza-se nos documentos uma mistura entre concepções emancipatórias e pressupostos neoliberais. As prováveis explicações para essa miscelânea estão no fato de que, possivelmente, a construção dos documentos não se pautou por uma discussão aprofundada, o que, infelizmente, é realidade, visto a inexistência de uma política permanente de discussões pedagógicas; e, ainda, por terem uma formação técnica, as coordenações dos cursos responsáveis pela elaboração dos documentos, algumas vezes, distanciam-se de discussões mais pedagógicas.

que pudesse nos direcionar às questões diretamente de gênero, o resultado encontrado foi de uma certa invisibidade dessa temática. Conforme destaca Tortato (2015, p. 107), “Questões ligadas à violência contra a mulher, à naturalização e à hierarquização das diferenças entre homens e mulheres, direitos humanos, diversidades e outros temas que não estão no planejamento das atividades, muitas vezes passam ao largo dos trabalhos da escola”.

Nos documentos específicos para a educação profissional, tais como suas Diretrizes Curriculares ou o Parecer que a originou em sua redação, não há algum direcionamento ou mesmo menção sobre uma possível discussão sobre gênero, sexualidade, orientação sexual ou qualquer sinônimo descritivo dessas palavras.

No que concerne aos documentos políticos pedagógicos específicos do IFPR, sejam eles o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2014-2018, o Projeto Político Pedagógico (PPP) do Campus Curitiba ou os PPCs, pode-se afirmar que no âmbito institucional gênero faz parte da linguagem empregada na redação do PDI37, constando como parte das discussões que

devem ser promovidas pela Pró-Reitoria de Extensão, Pesquisa e Inovação, como vejamos a seguir:

Na área social, a política de incentivo à Extensão Social e Tecnológica da PROEPI é estruturada da seguinte forma: [...] promoção e defesa de direitos humanos – constitui- se em política de ações e eventos voltados a discussões de gênero, diversidade, acessibilidade e inclusão, para realizar interlocução com instituições governamentais, não governamentais e particulares com o objetivo de gerar conhecimento, propor políticas institucionais e públicas, e desenvolver ações de promoção e defesa dos Direitos Humanos. (IFPR-PDI, 2014, p. 58).

Em que pese diretamente a redação dos PPCs, nenhuma menção foi feita à palavra gênero. No que tange à possível discussão do tema gênero, ambos cursos têm por prerrogativa o trabalho com os temas e conteúdos transversais38 que englobam a Educação Ambiental,

Educação para o Trânsito, Educação em Direitos Humanos, Educação Alimentar e Nutrição Escolar, História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, Educação Financeira, os quais são tratados por meio de palestras, simpósios e seminários, no caso do curso na forma subsequente, e por meio interdisciplinar em todo currículo escolar, no caso dos cursos na forma integrada. Nesse sentido, e justificando nossa hipótese de que gênero pode ser discutido nos cursos como

37 Em vários momentos, o documento afirma o respeito pela diversidade. No entanto, a diversidade de gênero não é lembrada como necessária de respeito.

38 Lei nº 9.795/99, que dispõe sobre a Política Nacional de Educação Ambiental, e Resolução CNE/CP nº 02/12; Lei nº 9.503/97, que institui o Código de Trânsito Brasileiro; Decreto nº 7.037/09, que institui o Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH; Lei nº 11.947/09, que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar; Lei 10.639/03, que estabelece o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana.

tema transversal, destaca-se que, no decorrer do ano de 2016, a coordenação do núcleo comum39

implantou o componente curricular “Temas Contemporâneos”, direcionado especificamente aos terceiros anos dos cursos integrados. Esse componente, a partir da eleição dos estudantes, discute, uma vez ao mês, um tema considerado contemporâneo. Na escolha de 2016, a temática gênero foi apontada como o segundo tema mais votado. Cabe ressaltar que essa discussão privilegia somente o último ano do ensino médio integrado.

Também é importante salientar o aspecto linguístico encontrado nos documentos, os quais seguem a regra gramatical culta; dessa forma, não se observa a inflexão de gênero, ficando sempre a mulher invisibilizada ou sendo incluída pelo chamamento masculino. Nesse sentido, é possível concordar com Louro (1997, p. 64, grifos da autora) ao afirmar:

Currículos, normas, procedimentos de ensino, teorias, linguagem, materiais didáticos, processos de avaliação são, seguramente, loci das diferenças de gênero, sexualidade, etnia, classe – são constituídos por essas distinções e, ao mesmo tempo, seus produtores. Todas essas dimensões precisam, pois, ser colocadas em questão.

Concordamos com a autora, ainda, sobre a necessidade de estarmos atentas/os, especialmente para a nossa linguagem, buscando perceber o sexismo, o racismo e o etnocentrismo que ela comumente carrega e, principalmente, institui.

Conforme mencionado, não encontramos nenhum conteúdo ou programação de conteúdo que tenha por base a proposta de discussão sobre o tema gênero a ser trabalhado nos cursos. Esse tema vem sendo trabalhado no rol de temas transversais, tal como descrito anteriormente. Essa possibilidade gera-nos insegurança e inquietação, visto que essa probabilidade de transversalidade pode ser deixada somente para debates em seminários, em vez de perpassar todos os componentes curriculares cotidianamente. De toda forma, acreditamos na necessidade de que as/os professoras/es em sala de aula provoquem discussões sobre as relações de gênero, permitindo às/aos estudantes o acesso e o enriquecimento de debates sobre o tema. Concordando com Schiebinger (2014), acreditamos que todas as escolas, têm possibilidade e deveriam incluir em seus currículos temas tendo por métodos de análise gênero e sexo, englobando resultados de pesquisa que tratem desse assunto. Isso traria a possibilidade de que as próximas gerações pudessem incluir a análise de gênero nos mais diversos campos, seja de aprendizagem, pesquisas, trabalhos e outras dimensões sociais.

39 Núcleo Comum é a denominação do conjunto de disciplinas básicas (História, Filosofia, Matemática, Sociologia, Geografia, Língua Portuguesa, Língua Espanhola, dentre outras) e caracteriza-se pela atuação dos profissionais em todos os cursos da Instituição, diferentemente dos docentes das disciplinas técnicas, que via de regra atuam especificamente em um ou alguns cursos diretamente ligados a sua área de formação.