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Em condições de stress profissional prolongado, em que as tentativas de coping falham em produzir os efeitos desejados, pode surgir o burnout profissional dos professores, como uma reacção extrema ao stress

profissional cumulativo e prolongado. Esta situação afecta

de forma significativa o bem-estar dos docentes e assume danos tremendos na saúde e no rendimento no trabalho. Uma grande parte das investigações que procuraram avaliar as consequências negativas do stress na profissão docente, debruçaram-se sobre um dos mais fortes indicadores de mal- estar, o burnout (Cardoso, Freitas, Araújo, Ramos, 1998).

Como vimos, não obstante o stress fazer parte integrante da condição humana, quando excessivo poder-se-á tornar disfuncional e incapacitante, contribuindo para a adopção de comportamentos de risco e para o desenvolvimento de perturbações de índole psicológica e biológica (Álvarez, Blanco, Aguado, Ruíz, Cabaco, Sanchez, Alonso & Benabé; 1993), designadamente estados de esgotamento ou burnout (Capel, 1987). Trata-se de um fenómeno característico das profissões de ajuda, que implicam relação, ensino, apoio. É tido como consequência da tensão emocional crónica e do

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excesso de esforço provocado pela inter-relação contínua e exaustiva, com pessoas que padecem de problemas de várias ordens (físicos, psíquicos e sociais) e que necessitam de vários tipos de cuidados. A profissão docente sendo também uma profissão de relação por excelência, merece uma especial atenção tendo em conta a quantidade de agentes stressores com os quais o professor se confronta. O stress no trabalho raramente resulta de uma só fonte, uma vez que o trabalhador não vive compartimentado mas em constante relação com os outros e com o meio envolvente, constituindo o stress no trabalho, o produto final da interacção que se estabelece entre a tarefa, o indivíduo e a profissão.

O estudo do stress profissional na docência insere-se na confluência de duas tradições:

- A investigação geral sobre o stress profissional e saúde (Gold e Roth, 1993).

- A investigação sobre as percepções e sentimentos que os professores associam à profissão docente onde se inclui a satisfação profissional (Smilansky, 1984).

De acordo com a revisão de literatura de Kyriaccou (1987), o estudo específico do stress na profissão docente iniciou-se na segunda metade da década de

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setenta, um pouco por todo o mundo e as estruturas organizacionais reconheceram a gravidade do problema (OIT, 1981). Refira-se que a generalidade dos estudos do stress profissional dos professores são baseados em questionários de auto-relato, avaliando a percepção que o professor tem destes elementos (Kyriaccou, 1987).

Kyriaccou (1987) define o stress aplicado ao

contexto docente, como a experiência (vivida por um

professor) de emoções desagradáveis, como a tensão, frustração, ansiedade, cólera e depressão, resultantes de aspectos do seu trabalho. Gorriell et al (1985) distinguiram duas categorias fundamentais de stress docente: o stress estrutural, resultante das influências negativas das estruturas institucional e administrativa; e o stress conflito, proveniente dos obstáculos à realização das responsabilidades pessoais.

Para os autores Hembling e Gilliand (1981), o stress docente não é uniforme ou de igual intensidade ao longo de todo o ano lectivo. Estes autores, ao estudarem uma população de professores dos ensinos básicos e secundário, verificaram a existência de um ciclo de stress revelador de uma maior intensidade de stress no início e fim do ano lectivo, bem como no final de cada período escolar.

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Goupil et al. (1985) categorizaram os principais

factores geradores de stress docente: externos

(comportamento dos alunos, relações interpessoais, mobilidade no trabalho) e internos (ligados à pessoa – as expectativas, as atitudes, o auto-conceito).

Favretto (1985), ao reflectir sobre as razões do stress procede a uma categorização entre razões internas e externas. Nas primeiras, inclui o facto de os professores viverem com ansiedade e grande envolvimento pessoal a responsabilidade da aula e sentirem as actuais condições de trabalho como geradoras de isolamento. Nas segundas, refere o difícil “choque” de papéis entre professores e alunos, as relações com os alunos e com o contexto social.

Efectivamente, as alterações no clima de

trabalho das escolas e os problemas resultantes conduziram

à realização de diversos estudos sobre a fadiga-exaustão e o burnout. Estas alterações verificadas, contribuem para que com o passar do tempo o professor, comece a acusar os efeitos negativos do clima de trabalho, seja ele resultado do contacto directo com os alunos, com os colegas, com os órgãos de gestão ou com os pais dos alunos, seja ele resultado das exigências quotidianas das suas tarefas pedagógicas (planificar, executar, avaliar) (Goupil, 1985). Assim, o passar do tempo vai contribuindo para um desgaste, físico e psíquico, e o professor vai ficando “queimado”

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(burnout) face às dificuldades profissionais. Este docente pode começar a ser reconhecido pelo seu estado de exaustão, pelas suas atitudes e sentimentos negativos para com os estudantes e pela tendência para uma auto-avaliação negativa, sobretudo em relação ao seu trabalho com os alunos (Anderson e Iwanicki, 1984). Na realidade, o desgaste, traduz-se sobretudo em sentimentos de fragilidade, de perda de auto-controlo, de desamparo e abatimento. O sentimento de se sentir “queimado” consiste num estado de fadiga total - física e psicológica - causada, em larga medida pela dedicação a uma causa e a um tipo de profissão que já não produz as recompensas esperadas. Os professores que, diariamente, enfrentam turmas de alunos com diferentes necessidades pessoais e sociais, e que sentem também a pressão dos pais, constituem um dos grupos profissionais mais sujeitos ao burnout (Cardoso et al, 2002). A actividade profissional de um professor que acusa desgaste transforma-se num contínuo processo de empobrecimento físico (esgotamento e fadiga) e psicológico-emocional (falta de esperança e felicidade), auto-conceito negativo, atitudes negativas para com o trabalho, as pessoas, a vida. Trata-se de um processo de “erosão docente” (Guerra, 1983).

A profissão docente, tal como as outras profissões de ajuda tem sido estudada, na óptica do

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burnout. Não existindo contudo um quadro teórico- metodológico específico do burnout na docência, aplicando- se geralmente as mesmas formas de avaliação para estudar os mesmos tipos de relações causais com os mesmos tipos de factores, pessoais e organizacionais que se utilizam para estudar o burnout em geral (Marques Pinto, 2002). Assim, o burnout profissional dos professores, foi conceptualizado ao longo dos três grandes períodos a que nos referimos anteriormente: clínico (Friedman, 1991) fase empírica (Maslach & Jackson, 1986) e conceptualização teórica, de forma não específica reencontrando-se as mesmas abordagens que caracterizam o burnout em geral – modelos individuais (Kelchtermans, 1999) interpessoais (Maslach, 1999) organizacionais (Miller, 1999) e societais (Woods, 1999).

A utilização quase universal do MBI (Maslach Burnout Inventory - Maslach e Jackson, 1981 citados por Maslach, 1993; Schaufeli, Enzmann e Girault, 1993) tem contribuído, decisivamente para uma conceptualização operacional do burnout docente a partir da definição de Maslach (ver revisão de Marques Pinto 2000). Podemos, deste modo, estabelecer três dimensões do burnout profissional dos professores (Maslach et al, 1996; Maslach, 1999):

- Exaustão emocional - refere-se ao sentimento de sobrecarga emocional, sendo este um traço fundamental da síndrome, caracterizado pela perda de energia, esgotamento

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e sentimento de fadiga constante. Os professores sentem de um modo gradativo a redução da sua capacidade de produção e de vigor no trabalho.

- Despersonalização – geralmente vem acompanhada da ansiedade, aumento da irritabilidade e perda da motivação. O docente sente-se tomado por sentimentos negativos para consigo e para com os outros. Ocorre uma redução das metas de trabalho, da responsabilidade com os resultados, alienação e conduta egoísta. Passa a isolar-se como forma de protecção, mantendo uma atitude fria em relação aos demais, já não é capaz de lidar com as suas emoções e com as destes e começa a tratá-los de forma desumanizada.

- Perda de realização pessoal – caracterizada pelo sentimento de inadequação pessoal e profissional ao trabalho, conduz o professor a uma série de respostas negativas para consigo e para com o trabalho como depressão, baixa produtividade, baixa auto-estima e redução das relações interpessoais. O docente tem tendência em avaliar-se negativamente relativamente ao seu desempenho.

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Níveis de Incidência do Burnout na Profissão