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Célula C: O efeito de conhecimentos específicos sobre a avaliação de evidências

3.3 Estudos que focam aspectos unicelulares referentes ao processo de investigação

3.3.3 Célula C: O efeito de conhecimentos específicos sobre a avaliação de evidências

Os estudos apresentados a seguir, que investigam o efeito de conhecimentos específicos sobre a avaliação de evidências, concentram-se na habilidade dos indivíduos em decidir quais hipóteses são corroboradas ou não a partir de determinados conjuntos de evidências. Essas evidências são, normalmente, apresentadas sob a forma de desenhos ou tabelas de covariação. Nesses estudos, o principal foco de atenção dos pesquisadores é a

capacidade dos participantes da pesquisa em coordenar seus conhecimentos específicos com as evidências apresentadas.

Em seu trabalho com crianças, Kuhn e Brannock (1977) avaliam o surgimento e o desenvolvimento da habilidade de reconhecer situações em que um controle de variáveis adequado foi exercido e estimam o “estado final” desse desenvolvimento em adultos. Para isso, foram utilizados dois problemas com contextos bastante distintos: um envolvendo o pêndulo simples e, o outro, chamado de “natural”, que abordava o crescimento de uma planta e que, na opinião dos autores, aproxima-se melhor dos problemas naturais do dia-a-dia.

Participaram da pesquisa 60 crianças, divididas em três faixas etárias com idades variando entre 10 e 12 anos e 20 adultos universitários. As evidências foram apresentadas aos participantes na forma de desenhos. Todos os participantes trabalharam com os dois problemas. Para o problema da planta, por exemplo, havia três variáveis independentes (água, loção para as folhas e tipo de adubo) e apenas uma (tipo de adubo) influenciava na forma como a planta se desenvolvia. Os participantes eram, então, solicitados a julgar e justificar seu julgamento sobre a causalidade das variáveis independentes sobre o crescimento sadio ou não da planta.

Os resultados da pesquisa indicam que apenas gradualmente as pessoas desenvolvem a habilidade de avaliar a causalidade de variáveis em contextos “naturais”, ou seja, com a presença de diversas variáveis. Além disso, os dados suportam a idéia de que os indivíduos, ao justificarem as escolhas realizadas, não se baseiam apenas nas evidências apresentadas, mas utilizam concepções e teorias para ajudá-los. Com isso, o desempenho dos indivíduos nos dois problemas apresenta diferenças significativas, apesar de requererem a mesma habilidade para avaliar a causalidade de variáveis.

Amsel e Brock (1996) tentam explicar as diferenças e o processo de desenvolvimento da habilidade de avaliar evidências ao trabalharem com diversas faixas etárias e escolaridade (dois grupos de crianças com idades entre 7 e 10 anos e entre 11 e 14 anos e dois grupos de adultos, universitários e não-universitários, com idades entre 18 e 55 anos). O objetivo da pesquisa era o de determinar a capacidade de avaliação de evidências dos indivíduos em uma situação familiar na qual o conhecimento prévio é bastante acentuado. Para isso, foi solicitado aos participantes da pesquisa que julgassem e justificassem o status de causalidade de duas determinadas variáveis. Essas variáveis foram selecionadas a partir de uma pesquisa-piloto. Nesse piloto, os então participantes haviam julgado que a presença/ausência de sol era fundamental para decidir se a planta iria ou não crescer saudável.

Além disso, eles consideraram o elemento sorte como não-causal para o crescimento da planta.

A atividade foi desenvolvida tentando minimizar as demandas cognitivas dos participantes, uma vez que trata-se de um domínio teórico familiar (crescimento de planta) e aborda apenas o efeito de uma variável independente sobre outra dependente.

Na fase inicial da pesquisa, os participantes foram entrevistados sobre a suposta causalidade das duas variáveis (sol e sorte) para o crescimento sadio de uma planta. Apenas aqueles entrevistados que acreditavam que a quantidade de sol era importante ou causal para o crescimento sadio da planta e que o elemento sorte não era importante ou não-causal passaram para a segunda fase da pesquisa. Nessa fase, os participantes deveriam julgar e justificar a suposta causalidade dessas duas variáveis para o crescimento sadio da planta, baseando-se apenas em quatro conjuntos de evidências apresentadas. Uma importante característica do estudo foi que as respostas eram dadas na forma de escores, que forneciam uma idéia da certeza do indivíduo sobre a causalidade das variáveis em cada situação.

Cada conjunto de evidências era composto por desenhos que apresentavam plantas sadias ou plantas doentes covariando ou não perfeitamente com as duas variáveis. Além disso, para alguns participantes, além desses quatro conjuntos de evidências, foram apresentados outros dois conjuntos de evidências em que havia informações incompletas a respeito das variáveis (presença/ausência de sol; presença/ausência de sorte) ou do resultado (planta sadia ou planta doente).

Como resultado da pesquisa, Amsel e Brock sustentam a idéia de que o processo de desenvolvimento da habilidade de avaliar evidências pode ser encarado como um processo contínuo e, ao mesmo tempo, descontínuo. O processo pode ser considerado contínuo, uma vez que os participantes de todas as faixas etárias julgaram corretamente a variável como causal quando ela covariou com o resultado da planta sadia e, julgaram a mesma variável como não causal, quando ela não covariou com o resultado da planta sadia.

Porém, o processo do desenvolvimento da habilidade de avaliar evidências pode ser considerado descontínuo uma vez que há uma diferença significativa entre os grupos de crianças e adultos com relação a três aspectos, a saber: (i) a quantidade de justificativas baseadas em teorias realizadas pelos grupos de crianças; (ii) a dificuldade de julgar uma variável previamente considerada causal (sol) como sendo não-causal, mesmo na presença de uma covariação perfeita com o resultado de uma planta doente; (iii) a influência que o conjunto de evidências contendo informações incompletas exerceu sobre a avaliação dos grupos de crianças.

Koslowski, Okagaki, Lorenz e Umbach (1989) analisam se jovens (idades entre 11 e 15 anos) e adultos universitários, ao julgarem a suposta causalidade de fatores sobre determinados efeitos, em fenômenos de diversas naturezas, baseiam-se apenas em evidências de covariação ou se fatores como o mecanismo de causalidade, o sistema de amostragem e o tamanho da amostra exercem alguma influência sobre esse julgamento.

Para o estudo, os participantes da pesquisa foram apresentados a uma série de estórias nas quais um personagem procurava descobrir se determinado fator estava ou não relacionado causalmente com determinado efeito. Foram construídas seis estórias que envolviam diversas áreas como a venda de livros, aditivos para gasolina e o tratamento de uma doença. Cada estória consistia de três seções. A seção do problema descrevia a situação e definia o problema que o personagem gostaria de resolver. A seção da evidência continha informações adicionais que o personagem possuía e a seção da conclusão continha uma escala na qual o participante deveria opinar sobre a suposta causalidade do fator sobre o efeito e algumas perguntas adicionais.

Para todos os participantes, as seções do problema e da conclusão foram iguais, apenas a seção da evidência foi diferente. Nela, os pesquisadores controlaram as informações e as evidências que eram passadas aos participantes. Essas informações apresentavam diferenças sobre a presença/ausência de um mecanismo de causalidade, o sistema de amostragem (controlado ou natural), o tamanho da amostra (grande ou pequena) e a presença/ausência de covariação com o efeito.

Os resultados da pesquisa sugerem que adolescentes possuem um conhecimento, muitas vezes tácito, de que a presença da covariação entre fator/efeito é considerada fundamental uma vez que os adolescentes mantiveram o status de causalidade mesmo quando não havia a presença de um mecanismo de causalidade e o tamanho da amostra era pequeno. O que é aprendido com a escolaridade e a idade é uma maior preocupação com as outras informações e o reconhecimento da limitação da simples covariação para indicar a causalidade entre fenômenos.