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3. VISCONDE DE CAIRU A SERVIÇO DA MONARQUIA

3.2. CAIRU E O LIVRE COMÉRCIO

Nesta segunda parte serão expostas as considerações políticas e econômicas de José da Silva Lisboa em suas obras durante o período de 1808 a 1835, ano da chegada da Família Real a então capital carioca, até a data de falecimento de Cairu.

Neste recorte temporal, para Sampaio, a elite mercantil carioca encontrava-se bem desenvolvida que se mostrava bastante influente e determinante frente aos negociantes lusos na compra de contratos (FRAGOSO; BICALHO; GOUVÊA, 2001, p. 94).

De acordo com João Fragoso, os negociantes fluminenses, à época em que o Brasil ainda se encontrava na condição colonial, atuavam em conformidade com os ditames do Antigo Regime, mas lograram êxito na obtenção de algumas rotas fundamentais, bem como no controle de esferas primárias da economia colonial. Além da exportação de produtos agrícolas, tais mercadores participavam da comercialização de escravos. Inclusive, esse comércio destacava-se como altamente lucrativo e fundamental.

Por seu turno, o perfil diversificado das atividades dos negociantes de grosso trato do Rio apresenta um dos traços fundamentais do funcionamento

econômico do Império luso da época. Em outras palavras, nas primeiras décadas do oitocentos eram tênues as linhas divisórias entre os circuitos comerciais internos da América luso-brasileira, dependia do ultramar para existir; e, dentro de certos limites, é claro, o inverso era também verdadeiro. Para esta última observação basta lembrar que o Rio, além de ser o principal porto importador e exportador do Brasil colonial entre 1796 e 1811, era provavelmente a principal área reexportadora dos manufaturados reinóis, dos escravos angolanos e dos têxteis indianos (FRAGOSO; BICALHO; GOUVÊA, 2001, P. 334).

O pacto colonial, bem como o exclusivismo comercial, a partir da Carta Régia de 28 de janeiro de 1808, a famosa Abertura dos Portos às Nações Amigas, pois possibilitou ao recente reino uma agitação da economia, pois as leis de embargos de comércio e navegação que outrora vigoravam no Brasil, tornam-se sem efeito.

O Alvará de 1º de abril de 1808 e a elevação do Brasil a Reino Unido Portugal, fizeram com que Silva Lisboa aplicasse os conceitos de ordem natural, livre comércio e Estado Liberal para inquirir acerca do cenário no Império Brasileiro. De acordo com Rocha (1996, p. 29 – 31 passim), a Revolução Francesa, segundo o brasileiro, havia modificado a ordem social. A desorganização ocasionada pelo grande acontecimento francês, por outro lado, oportunizou o aparecimento da ordem social no Brasil, uma vez que a vinda da realeza para a antiga colônia, proporcionou a criação de um novo império com bases sólidas propostas. A abertura dos portos e o fim do exclusivismo colonial favoreceu ao Brasil a sua inserção e comercialização com os demais mercados. Ainda que essa deliberação tenha sido feita mormente devido ao temor da ocupação francesa em Portugal e a possibilidade de isolamento da Corte no Brasil, o fato é que a abertura favoreceu o comércio internacional brasileiro.

Em síntese, a Abertura do Portos havia sido produto de uma decisão consciente do Soberano para implantar o livre comércio no Brasil. Ocorre que o livre comércio, como categoria teórica, tinha uma grande importância no pensamento de Silva Lisboa, que lhe atribuía a capacidade de criar a riqueza nacional, assim, ao projetar sobre um fato histórico – a Abertura dos Portos – um princípio de saber econômico, o economista celebrava a amplitude da visão de D. João VI, capaz de fomentar a prosperidade do Brasil (ROCHA, 1996, p. 31).

Um outro acontecimento que propiciou a aplicação dos conceitos mencionados acima foi a elevação do Brasil à condição de Reino Unido no ano de 1815. O fim definitivo do período colonial possibilitou ao pensador brasileiro Visconde de Cairu empregar os princípios abstratos de livre comércio, ordem natural e estado liberal.

Com efeito após a Revolução Francesa, começa a ser restabelecido a ordem natural e o Brasil foi favorecido neste momento em virtude da atuação de um governo que reduziu substancialmente a ingerência do Estado na ordem social, por ser iluminado pelos princípios do sistema liberal de Economia Política. O livre comércio, e com ele o fim do sistema colonial, era um desdobramento lógico da confluência de dois fatores – Revolução Francesa e governo ilustrado. Por outro lado, a convergência da ordem natural, de um Estado “liberal” e do livre comércio, ou seja, a convergência de iniciativas econômicas beneficentes, anunciava o início de uma era de prosperidade para o Brasil (ROCHA, 1996, p. 38).

O ano de 1808 se mostrou bastante dinâmico também para José da Silva Lisboa: designado para a regência da cátedra de Economia Política; mudou-se para o Rio de Janeiro; e recebeu nomeações para os exercícios de Desembargador da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens, para membro da Junta Diretora da Impressão Régia, para Deputado à Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegações, do Estado do Brasil e para Desembargador da Relação da Bahia.

Visconde de Cairu revela-se uma figura notável para a história brasileira. Discípulo de Smith para com as questões econômicas e influenciado por Burke em matéria política, representava um grande entusiasta das ideias inglesas. O brasileiro, homem de grande erudição, não só expôs como também disseminou o pensamento liberal no Brasil. Dentre livros, panfletos e discursos parlamentares, foram inúmeras as obras de Cairu no recorte proposto para este capítulo. Porém, somente os livros publicados serão averiguados no que concerne à livre concorrência.

Decerto, as matrizes intelectuais expostas no primeiro capítulo desta dissertação moldaram o pensamento de Visconde de Cairu quanto à postura conservadora e aplicação do liberalismo econômico. Todavia, o reformismo ilustrado que Silva Lisboa assimilou na Universidade de Coimbra foi resolutivo para sua conduta durante a vida. De acordo com Munteal Filho

O poder da razão parecia ocupar um lugar cada vez mais forte nos círculos lisboetas, a despeito da presença da tradição católica em muitas indagações de natureza filosófica. As conquistas intelectuais em Portugal passaram pelas leituras dos filósofos morais, naturalistas, teóricos do direito natural a sim como pela canalização destas leituras para as finalidades propostas pelo subgrupo naturalista-utilitário da Academia. O novo pensamento português pós-pombalino não estava centrado nas teorias mais avançadas no campo da física, da química ou da história natural. Havia, no entanto, um interesse por estas esferas de saber e, sobretudo, pelos resultados que poderiam ser alcançados através do conhecimento da natureza colonial, por meio da observação, através do cálculo diferencial, das leis básicas que governam o movimento dos corpos, da crença no efeito potencializador da pesquisa no âmbito da história natural e no papel do raciocínio, da experiência e da

utilidade como alavancas do progresso material do reino e dos seus domínios (GUIMARÃES; PRADO, 2011, p. 57)

A primeira obra escrita neste período foi Observações sobre o Comércio Franco no

Brasil (1808). Tal obra tinha como objetivo apresentar os benefícios que seriam

obtidos pelo Brasil com a abertura dos portos uma vez que as refutações para com essa medida eram sucessivas. Silva Lisboa lidou com rejeições acerca do livre comércio, pois os contrários à referida prática acreditavam que a franqueza comercial faria com que no Brasil se formassem os monopólios, dessa forma, os comerciantes nacionais seriam lesados face à concorrência com produtos estrangeiros. Contudo, para Cairu, franqueza de comércio e monopólios constituíam argumentos paradoxais (LISBOA, 1808, p. 110).

A franqueza do comércio no Brasil será de progressivo interesse à Coroa, e Nação. Aquela terá mais rendas, em proporção à maior quantidade de valores importados e exportados, que pagarem os direitos estabelecidos; e esta aumentará continuamente os seus recursos, despertando-se da letargia, em que jazem as indústrias do país, introduzindo-se outras por novas direções, que a energia do interesse particular, deixada a sua natural elasticidade, removidos todos os obstáculos, deve achar, até pela constante emulação e conflito dos competidores nacionais e estrangeiros. Onde concorrem mais comerciantes, aí é sempre mais ativo o espírito de especulação, para se descobrirem os melhores meios de emprego de capitais. Até o presente, nosso comércio era muito mecânico, rotineiro e apoucado. A principal parte consistia na grosseira compra e remessa de gêneros coloniais para os dois portos do Reino, Lisboa e Porto. Pode-se sem exageração dizer, que ignorávamos o comércio do mundo. As nossas amizades, e correspondências mercantis, se limitava a poucas pessoas, a quem se dava as vezes forçada, indiscreta, e ilimitada confiança. Por isso agora nos achamos em tão grandes embaraços, que só se podem remover com a franqueza do comércio estrangeiro (LISBOA, 1808, p. 15).

Visconde de Cairu propõe ao Brasil uma conduta liberal, pois assim oportunizaria ao país o desenvolvimento. Além disso, produtos importados elevam as arrecadações alfandegárias. Os receios que permeiam os comerciantes acerca de tais mercadorias não se justificam. No Brasil não havia manufaturas relevantes que pudessem concorrer com as Nações europeias, ademais, os produtos existentes por aqui, tais como o açúcar e o café (LISBOA, 1808, p. 101), existiam abundantemente e, certamente, não seriam importados.

Para Silva Lisboa, as apreensões por parte dos comerciantes acerca da abertura mercantil são infundadas, pois esses conhecem o funcionamento do mercado nacional, o que lhes colocam em vantagem sobre os estrangeiros. De fato, a abertura dos portos beneficiaria de forma geral.

O livre comércio, em detrimento dos monopólios, possibilita a cada indivíduo optar pelo mais profícuo em relação à sua indústria. Isso elevará as riquezas, pois o patrimônio nacional é a soma dos patrimônios individuais.

Não é racionável sustentar monopólios de fabricantes com o pretexto de se evitar falta de trabalho e subsistência às classes pobres. Quanto é a maior franqueza do comércio, e é livre a cada um empregar a sua indústria na direção que entende ser-lhe mais vantajosa, nunca pode faltar matéria de emprego útil e a devida subsistência aos industriosos; pois todas as coisas são no mercado mais abundantes, e os fundos não se estagnam e esterilizam em ramos menos vantajosos à Nação, e todos se dirigem para onde se declara a demanda do país, ou dos estrangeiros. Além disto, é notório que os fabricantes que são mais importunos em requerer monopólios, se enriquecem à custa dos obreiros, a quem salariam pelo mais baixo preço, que mal lhes dá mesquinha mantença (LISBOA, 1808, p. 150).

O livre comércio, logicamente, necessita de algumas condições para agir de maneira satisfatória. A justiça deve acordar com aqueles que estabelecerão transações em países estrangeiros bem como outros quesitos, por exemplo, tolerância com as condutas religiosas e políticas de cada povo. É necessário que as leis não sejam violadas tendo em vista cada nação. Sob tais circunstâncias, a Nação mais propícia fará o comércio mais resguardado e proveitoso. A prosperidade nacional será alcançada, de acordo com Cairu, quando cada pessoa aplicar seus fundos da maneira mais adequada. Contudo, há de se respeitar simultaneamente as leis e a propriedade (LISBOA, 1808, p. 162 – 210 passim).

O ano de 1810 foi demasiado produtivo para Visconde de Cairu. Foram cinco livros publicados pelo autor, nos quais discorreu sobre o livre comércio. A esse respeito, Silva Lisboa tornou-se profundo conhecedor.

Os saques aos navios naquela época eram práticas constantes e a obra Reflexões

sobre o comércio de seguros (1810) figura-se num modesto tratado de seguros. Dado

o panorama internacional, no qual os riscos do comércio internacional eram numerosos, seguros consistiam num poderoso mecanismo de proteção aos negócios. A referida atividade refletia como sendo um operativo instrumento para promover a franqueza do comércio, segundo Cairu.

Seja a promover o bem do Estado, fomentando o aumento do comércio, mediante a divulgação de ideias substanciosas sobre o negócio dos Seguros, e publicadas quando se trata de estabelecer este negócio; seja a estimular a curiosidade dos comerciantes mais suscetíveis de doutrina, mostrando-lhes quão geral e singelamente a matemática resolve os principais problemas

relativos aos mesmos Seguros; sobre cujo estabelecimento no Brasil cumpre vencer (LISBOA, 1810d, p. 3).

Refutação das declamações contra o comércio inglês trata-se de outra obra escrita

em 1810. Na obra composta por duas partes, Silva Lisboa validava as negociações com a Inglaterra. De acordo com o brasileiro, a nação inglesa possuía na época a política comercial mais liberal no mundo e competia ao Brasil a necessidade de comercializar com aquele país.

Da nossa parte é necessário confessar que temos no Brasil experimentado os mais assinalados benefícios no comércio dos ingleses, pois a ele devemos mantença do geral trabalho, o aumento da Renda Pública e a maior parte da exportação dos gêneros aliás sujeitos ao interdito do comércio e dos grandes mercados da Europa (LISBOA, 1810e, p. 8).

Razões dos lavradores do Vice-Reinado de Buenos Aires para a franqueza do comércio com os ingleses contra a representação de alguns comerciantes e resolução do governo, publicada em 1810, discorre sobre a abertura dos portos argentinos aos

produtos ingleses no ano de 1809, processo semelhante ao que ocorreu no Brasil durante o ano anterior.

Os produtos ingleses, argumenta o brasileiro, foram inseridos de maneira ilícita em Buenos Aires prejudicando os comerciantes locais. Dessa forma,

O livre comércio com os ingleses é o único meio que resta à Espanha para reparar as suas quebras e prevenir a inteira ruína do seu comércio; pois, valendo-se das Embarcações Inglesas pode sustentar um giro, que hoje está cortado por falta de marinha mercante, que não tem (LISBOA, 1810c, p. 26).

A obra Observações sobre a franqueza de indústria e estabelecimento de fábricas no

Brasil (1810) disserta sobre a questão da indústria. São abordadas, no referido livro,

as mais viáveis possibilidades de incentivo às atividades industriais no Brasil.

Segundo Cairu, as opiniões sobre a promoção industrial no Brasil eram, por vezes, contraditórias. O brasileiro, contudo, se mostra bastante hesitante no que diz respeito à instalação das manufaturas no país, pois julgava tal conduta precipitada e não era adequado rivalizar com outros países que já se encontravam em estado de adiantamento em relação aos índices populacionais e estabelecimentos manufatureiros (LISBOA, 1810a, p. 3).

De acordo com Cairu, o Brasil deveria investir nas fábricas, tendo como base a agricultura, navegação e comércio. As indústrias refinadas não deveriam ser incentivadas, pois o país não teria condições de concorrer com as nações europeias.

Consideremos que ainda estamos, por assim dizer, com o machado e enxada na mão lutando com desertos e matos. Colhamos por ora os produtos espontâneos que a Natureza nos oferece. Ela é a nossa gratuita ou barata manufatureira, e prepara a maior parte das obras e riqueza que precisamos (LISBOA, 1810a, p. 12).

Essa obra esclarece que o Brasil naquela época contava com população escrava abundante, se comparada à livre. De acordo com Cairu, neste livro, para a difusão gradativa industrial, seria necessário o desenvolvimento da população. Em conformidade com o autor, ainda que não houvesse no país manufaturas refinadas como nas nações europeias, por outro lado, haviam indústrias convenientes às circunstâncias nacionais e produtivas.

Por isso pode ter muita indústria e riqueza sem ter as artes e manufaturas superiores, que são naturais na Europa; e enquanto tiver muitas e férteis terras, nenhum emprego pode ser tão lucrativo como o da agricultura, mineração, comércio interior e exterior, e artes mais imediata e proximamente associadas aos exercícios respectivos (LISBOA, 1810a, p. 19).

Para que haja sucesso no estabelecimento das manufaturas, de acordo com Silva Lisboa, é necessário que se tenha a franqueza do funcionamento das indústrias bem como descartar os favores e privilégios extraordinários. Os monopólios, dessa forma, deveriam ser eliminados (LISBOA, 1810a, p. 25 – 27).

A proteção governamental, segundo o brasileiro, era de fundamental importância, pois cabia ao governo proteger as leis e indústrias bem como agir de forma imparcial. Necessário também que a ação governamental não interferisse nas escolhas de cada um, pois o livre arbítrio conduziria aos interesses de todos (LISBOA, 1810a, p. 40).

Também escrito em 1810, Observações sobre a prosperidade do Estado pelos liberais

princípios da nova legislação do Brasil, nessa obra, para Cairu, a suspensão do

sistema mercantil e a proclamação de uma legislação econômica de princípios liberais só viriam tornar melhor a vida dos habitantes que residissem aqui. Há uma discussão sobre os princípios da ciência econômica liberal de modo a considerar que o Brasil estava em real conjuntura para acolher tais preceitos.

Pelo interdito no comércio da Europa os gêneros coloniais perderam muito o seu direto e maior mercado, mas a franqueza do comércio no Brasil, lutando- se aliás com tantas diversidades, tem sustentado a nossa agricultura, ainda nos ramos que teriam de sofrer mais pelo estado perturbado das relações naturais entre o Antigo e o Novo Mundo. As terras não têm descido de valor: a notória alta de preço dos braços necessários à lavoura, é evidente sintoma da demanda do trabalho, e consequentemente do racionável proveito no

emprego dos fundos. Já vários artigos novos começam a ser objetos de

exportação. Os comerciantes nacionais, a vista, e com estímulo das atividades dos comerciantes estrangeiros vão deixando a velha rotina, e tirando-se do torpor e letargo, em que a tibieza e acanhamento do anterior Sistema Colonial os tinha paralisado e adormecido (LISBOA, 1810b, p. 20).

Nos livros vistos até aqui, percebe-se que todos tratam da reafirmação para com a política econômica de D. João VI. Porém, a partir de 1812 até 1819, observa-se que Cairu priorizou obras de cunho político.

A primeira delas é Extrato das grandes obras políticas e econômicas do grande

Edmund Burke (1812). Como já visto no primeiro capítulo, Silva Lisboa revelou-se um

grande simpatizante do parlamentar inglês. Assim como o europeu, Cairu via com receio os acontecimentos revolucionários da França uma vez que prezava as tradições.

De acordo com o brasileiro, a tão almejada liberdade para os franceses faria com que houvesse o despertar de paixões animalescas, bem como desmoronamento da ordem instaurada. Por outro lado, o exemplo inglês deveria ser seguido, pois segundo Cairu, a nação anglo-saxônica representava de fato o sustentáculo racional. De acordo com Silva Lisboa, Burke simboliza um expoente nos escritos políticos, pois defende as ideias liberais juntamente com uma regência paternal. A mencionada obra conta com a tradução de textos de Burke, almejando o afastamento dos temidos ideais franceses tirânicos e anárquicos das terras brasileiras. Relevante informar que o europeu, assim como Cairu, não era contra as reformas propriamente ditas, mas, sim, opositor das revoluções.

Execrar revoluções não é defender desgovernos, nem excluir boas leis. Ainda os melhores Soberanos e Administradores são obrigados a conformarem-se às opiniões das diversas ordens do Estado. Quando o remédio é pior que o mal, até as boas reformas são inúteis, ou nocivas. As revoluções são como terremotos: tudo arruínam, e nada reparam (LISBOA, 1822a, p. 6)

Conforme Cairu, o clássico europeu era o exemplo a ser seguido, pois deveria se reestruturar as instituições, porém de forma organizada e não com rupturas bruscas.

Outro livro escrito na época em que Silva Lisboa se dedicou às obras políticas foi

Memória da vida pública de Lord Wellington (1815). O irlandês Arthur Wellesley (1769

– 1852), 1º Duque de Wellington, consagrou-se como um célebre general britânico que suplantou Napoleão Bonaparte na Batalha de Waterloo em campanha de Gebhard Leberecht von Blücher.

A obra aludida trata-se de uma biografia dedicada a Lord Wellington a fim de glorifica- lo, pois, segundo Cairu, a feliz atuação do europeu naquele confronto, rendeu a vitória contra o militar francês. Era necessário, então, conhecer a história do general e estadista britânico que tão bem havia desempenhado a condição de comandante do exército de Portugal (LISBOA, 1815b, p. 1).

Como se sabe, Cairu era um franco admirador da Inglaterra. Na citada obra, o brasileiro expõe, referente ao livre comércio, como mais vantajoso o exemplo inglês. Para ele, a antiguidade e a constância desse sistema proporcionaram aos ingleses sobrepujar-se frente às demais nações (LISBOA, 1815b, p. 85).

Os livros lançados entre 1812 e 1819 serviram para reafirmar o período joanino como descrito no trecho a seguir

Persuado-me que nenhum compatriota, experimentando os bens da paz poderá, nem por pensamento desconhecer o incomparável mérito do fiel Defensor da Monarquia, cuja eleição para este Posto foi de Providência mais eficaz ao Bem Comum. Tanto mais, que sobrexcedeu em livrança de desgraça, e em final felicidade a todos os Estados que tem vindo em diversas épocas, nas crises do Estado, em auxílio da Nação, e ora enche de seu Nome todos os países e corações, que se comprazem de ver a alegria do mundo