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O grupo Aú Capoeira, criado no município de Florianópolis, teve como fundador e responsável Lourival Fernando Alves Leite, mais conhecido como mestre Pop. E aqui se faz necessário um esclarecimento: atualmente, o mestre Pop não se vincula a nenhum grupo de capoeira e quem dá continuidade a esse trabalho é mestre Júnior, filho mais velho do mestre Pop, que atualmente reside em Hong Kong, no Japão.

O grupo Aú Capoeira não foi o único grupo fundado por mestre Pop durante a sua trajetória na capital catarinense, porém foi por intermédio desse grupo que tive as primeiras referências do trabalho do mestre em Santa Catarina. Criado em 1996 e encerrado em 2003, Aú Capoeira foi retomado em 2006 com o nome de Escola Transdisciplinar Aú Capoeira. O último momento, após 2006, objetivou englobar a capoeira em todos seus aspectos, em um ambiente aberto às trocas e ao diálogo, sendo o último vínculo específico do mestre Pop com o trabalho organizado, porém de uma perspectiva de escola.

Ao longo de sua trajetória, mestre Pop recebeu várias influências e vivenciou as experiências da capoeira em todas as suas vertentes. A partir dessa complexidade da capoeira, chegou aos estudos da transdisciplinaridade. Hoje dá suas aulas de capoeira e divide suas ideias e experiências no Espaço de Convivência Transcultural Aruandê, localizado no Sul da Ilha de Santa Catarina. A seguir, apresento uma breve visão da história do mestre Pop e alguns momentos que considero relevantes, pois nos permitem relacionar alguns de seus aspectos com esta pesquisa. Para tanto, baseio-me no livro de Paola Vicenzi Franco, Unidade na diversidade:

mestre Pop e a construção de um novo olhar para a capoeira.

Como já mencionei, mestre Pop é natural de Campo Grande e foi o pioneiro no ensino da capoeira em Florianópolis e um dos pioneiros do Sul do Brasil. A história de mestre Pop, na Ilha de Santa Catarina, tem início no ano de 1977, quando chegou à cidade em busca de novas experiências. Na ocasião, ele ainda não era o mestre Pop, mas o jovem Fernando, artesão, hippie e capoeirista que havia iniciado na capoeira, em 1973, com mestre Gato de Sinhá e depois com mestre Fernandinho, ainda em Campo Grande. Período breve, mas intenso de aprendizado que fez com que Fernando, ao buscar experiências em outros lugares, tivesse levado consigo a capoeira.

Algum tempo depois de chegar a Florianópolis, mestre Pop recebeu um convite para dar aulas no Educandário 25 de Novembro – instituição do Estado que abrigava menores na cidade. Nesse período de mais de 40 anos e antes do grupo Aú Capoeira, o mestre Pop fundou a Academia Berimbau de Ouro em 1979 e, em 1994, o grupo Nação que viria a ser um dos maiores grupos do Sul do país e pioneiro na adoção dos moldes da Capoeira Contemporânea. Muitos dos seus alunos, que passaram por esses grupos, são hoje mestres de capoeira. Na sequência, dois episódios são pertinentes às questões dessa pesquisa.

Narrado por Franco (2017), um momento importante da trajetória de Pop ilustra minha afirmação de que na capoeira os mestres são reconhecidos pelos seus pares. Em 1978, enquanto participava de um evento em Porto Alegre, ele foi apresentado aos demais capoeiristas e mestres presentes como “mestre Pop de Florianópolis”, apesar de ter esclarecido na chegada que não era mestre, mas um aluno que dava aulas. Como havia sido pego de surpresa, no seu retorno a Florianópolis tratou de escrever uma carta esclarecendo a situação para o mestre Touro, com quem havia feito um jogo mais duro. Dias depois, chegou a resposta. E Touro disse: “tu és

mestre, sim, rapaz, usa a corda verde e branca e luta pra honrar!”(FRANCO, 2017, p. 112). O mestre Touro justificou sua colocação devido à capoeira que Pop jogava e ao trabalho que desenvolvia com seus alunos, os quais também estiveram presentes no evento. A corda verde e branca era a primeira graduação de mestria de um total de quatro, de acordo com as regras Técnicas da Capoeira adotadas pela Confederação Brasileira de Boxe, em 1972. Mesmo não tendo passado pelas trocas de graduações que já se adotavam na época, Pop foi legitimado pelos outros mestres como apto a assumir a posição de mestre iniciado.

Outra curiosidade vem da época da Academia Berimbau de Ouro, quando Pop muda o nome para Centro Catarinense de Capoeira Regional Berimbau de Ouro, influenciado pela atitude do mestre Sergipe, de Curitiba, que acrescentou Regional ao nome do seu grupo. Segundo nos relata Franco (2017), nem Pop nem Sergipe eram adeptos da capoeira Regional. Sergipe teria justificado a adoção intencional do nome Regional, tendo em vista que a Capoeira Angola, no Paraná, não estava sendo atrativa em razão da crescente influência das artes marciais e da ideia de que a Angola não era uma luta. Nesse episódio, é interessante notar o caráter de recriação e reinvenção das práticas de capoeira, a partir de adequações que possibilitam acomodá-las às necessidades do momento e do local.

Em decorrência de vivências e práticas, da vasta experiência e do arsenal de conhecimento acumulado tanto pela criação dos vários grupos quanto pelo contato com diferentes mestres e vertentes (estilos) de capoeira, advém a motivação de mestre Pop para estudar a transdisciplinaridade. A partir do olhar transdisciplinar de mestre Pop e das reflexões

que objetivam superar os antagonismos em prol de uma sociedade com maior respeito e aceitação, surge o Espaço de Convivência Transcultural Aruandê, local de trocas da capoeira e de outras culturas, voltado ao desenvolvimento humano.

A seguir, duas fotografias (figuras 4 e 5) tiradas no dia 13 de dezembro de 2019, durante a roda de fim de ano no Espaço de Convivência Transcultural Aruandê, da qual tive a oportunidade de participar em companhia do mestre Pop e seus convidados. Além da presença do mestre Serpente e de outros mestres da região, também ali estavam ex-alunos do mestre Pop que se tornaram mestres.

Figura 4 - fotografia roda de fim de ano – Espaço de Convivência Transcultural Aruandê

Figura 5 - fotografia dos participantes da roda de fim de ano

Fonte: acervo próprio

Na sequência, um breve relato da experiência nas entrevistas que pautam as análises do próximo capítulo e da sua relevância para o êxito desta pesquisa.