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2 UMA REVISÃO SOBRE A INTERAÇÃO ENTRE TRANSPORTE MARÍTIMO E

2.2 O PAPEL DAS GRANDES ROTAS DE NAVEGAÇÃO

2.2.4 Canal do Panamá

A terceira e última rota primária que será revisada neste trabalho é também o objeto central de análise dos capítulos seguintes. Nesta subseção serão abordados, tal como feito nas subseções anteriores, aspectos históricos que ressaltam a importância do Canal do Panamá no comércio internacional. Nesse sentido, urge abordar a influência exercida pelo canal no comércio intercostal dos Estados Unidos e vice-versa. A partir disso, será feita uma breve revisão histórica da relação desse país com a construção e consolidação do Canal do Panamá como uma das mais importantes rotas do comércio mundial. Vale ressaltar, no entanto, que a relação histórica política, militar e comercial entre esses dois países não é o objeto principal de estudo desta pesquisa, porém sua contextualização é necessária para o melhor entendimento da importância do Canal do Panamá e de sua expansão para a economia mundial.

O projeto de construção de um canal entre os oceanos Atlântico e Pacífico na América Central permeou entre os governos europeus desde o final do século XVIII. Entre 1879 e 1899, sob a iniciativa da Companhia Universal do Canal Interoceânico (Compagnie Universelle du Canal Interoceanique) do governo francês foram iniciados os projetos do renomado Ferdinand Lesseps e, posteriormente do francês Adolphe Godin de Lépinay, o qual teve aprovado o projeto para a construção de um canal com sistema de eclusas em 1884. Devido a problemas financeiros da Companhia que conduzia o projeto, foi criada em 1894 a Compagnie Nouvelle como um último esforço do governo francês de concluir a obra. Após mais essa tentativa haver fracassado em função de dificuldades técnicas para construção de um canal ao nível do mar, o projeto e a construção do Canal do Panamá passaram para as mãos do governo norte-americano em 1904 (LLÁCER, 2005).

O plano de fundo do envolvimento dos Estados Unidos na construção desse corredor logístico na América Central remonta ao período de 1850, quando a localização geográfica estratégica do Panamá rendeu ao país a construção de uma ferrovia que servia como rota

principal para o transporte de ouro entre o oeste e leste dos Estados Unidos durante a “corrida do ouro” da Califórnia (MUÑOZ; RIVERA, 2010). A tomada de responsabilidade pela construção do canal por parte dos Estados Unidos também está ligada à participação norte- americana no processo da independência panamenha da Colômbia, que ocorreu em novembro de 1903 (LLÁCER, 2005). Neste mesmo ano, os Estados Unidos e o novo Estado do Panamá assinaram o acordo Hay-Bunau-Varilla, em que aqueles garantiam a independência deste, e assegurava-se a concessão de uma faixa de 16 quilômetros do canal com total soberania aos norte-americanos, mediante compensação de 10 milhões de dólares na época ao Panamá (RODRIGUE; NOTTEBOOM, 2013).

Assim, a construção do Canal, finalizada pelo governo norte-americano em 1914, refletia os interesses dessa potência na localidade caribenha do ponto de vista militar e comercial. Afim de atender a tais interesses dos Estados Unidos, criou-se da Zona do Canal do Panamá (PCZ) onde diversas instalações norte-americanas, como bases aéreas e fortes, foram construídas. Foi apenas em 1974, após pressão popular panamenha para a renegociação com os Estados Unidos sobre o controle do Canal, que o Tratado Torrijos-Carter foi assinado, garantindo a transferência desse ativo para o Panamá – contanto que o governo panamenho assegurasse a neutralidade do canal – no ano de 1999 (MUÑOZ; RIVERA, 2010). A Figura 6, a seguir ilustra a relação entre os Estados Unidos e o Canal do Panamá ao longo dos séculos XIX e XX.

Figura 6 - Linha do tempo da relação Canal do Panamá – Estados Unidos

Fonte: Llácer (2005), Muñoz e Rivera (2010), Rodrigue e Notteboom (2013). Elaboração própria

O Canal do Panamá é composto por três elementos principais, quais sejam os acessos ao oceano Atlântico - Gatun (1914) e Agua Clara (2016) –, o Lago Gatun e os acessos ao oceano Pacífico – Pedro Miguel e Miraflores (1914) e Cocoli (2016). Por suas eclusas passam, aproximadamente, 12 mil navios por ano e 205 milhões de toneladas (PANAMA CANAL AUTHORITY, 2017b), o que corresponde a cerca de 5% do comércio mundial e 12% do comércio marítimo dos Estados Unidos (RODRIGUE; NOTTEBOOM, 2013). A Figura 7, a seguir, mostra os principais componentes que constituem o Canal do Panamá.

Figura 7 - Componentes do Canal do Panamá

Fonte: Google Earth. Elaboração própria

Além da importância geoestratégica nos períodos de maior tensão militar para os Estados Unidos, o Canal do Panamá tem grande relevância no comércio entre as costas Leste e Oeste norte-americanas, atuando também como uma alternativa ao Canal de Suez para o fluxo comercial entre a Costa Leste dos EUA e o continente asiático (DEANDREIS, 2016). A Figura 8 mostra as principais regiões conectadas através do Canal do Panamá.

Figura 8 - Principais regiões conectadas pelo Canal do Panamá

Fonte: Panama Canal Authority (2017c), Deandreis (2016). Elaboração própria

Entre os fluxos que compõem a movimentação do Canal do Panamá, grande parte está relacionada ao comércio norte-americano. No caminho Pacífico-Atlântico, destacam-se o comércio entre Ásia e Costa Leste dos Estados Unidos (CL EUA), Costa Oeste (CO) da América do Sul e CL EUA, CO América do Sul e Europa, CO EUA e Europa e CO América do Sul e CL América do Sul. Já entre os fluxos comerciais no sentido Atlântico-Pacífico, os mais relevantes são entre a CL EUA e Ásia, CL EUA e CO América do Sul, CL EUA e CO América Central, CL América do Sul e CO América do Sul, Europa CO América do Sul e Europa CO EUA (PANAMA CANAL AUTHORITY, 2017c).

Não obstante, a construção do Canal do Panamá é considerada um marco no comércio internacional por ter proporcionado, também, a abertura de novas rotas entre países e regiões do mundo que tradicionalmente não conseguiam competir em nível de preços devido às grandes distâncias entre si. Ainda que construído, em 1914, por motivos principalmente militares norte-americanos, o Canal do Panamá tem atuado como importante um facilitador do comércio entre as nações desde então, induzindo-as a maior competitividade e crescimento

econômico (SABONGE, 2014).