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2. AS VISUALIZAÇÕES NO ENSINO DE CIÊNCIAS

2.4 Capacidades de visualização e metavisualização

Ainda na Química, encontramos estudos (GILBERT, 2007b; JUSTI; GILBERT; FERREIRA, 2009) que discutem a necessidade de desenvolver nos alunos capacidades metavisuais ou de metavisualização “ser fluente em visualização” (JUSTI; GILBERT; FERREIRA, 2009, p. 285). Para estes autores a capacidade de um aluno poder adquirir,

34 monitorar, integrar, estender conhecimento através de representações visuais externas e internas, chama-se metavisualização. Ser metavisual envolve a demonstração de cinco capacidades (JUSTI; GILBERT; FERREIRA, 2009):

1. Conhecimento das convenções associadas a cada representação para todos os modos de representação (verbal, visual, matemático, gestual, etc.), do seu alcance e das suas limitações;

2. Mentalmente conseguir transitar entre modos de representação e entre níveis de representação em que um dado modelo pode ser apresentado;

3. Conseguir construir uma representação num modo apropriado para um determinado propósito;

4. Conseguir utilizar uma visualização para prever o comportamento de algo numa determinada situação;

5. Conseguir resolver novos problemas construindo analogias com visualizações já usadas (por exemplo, usar o modelo do sistema solar como analogia ao modelo de Bohr).

Em relação ao ponto dois, outros autores (BARNEA, 2000, FERK et al., 2003) discutem a necessidade de desenvolver nos alunos capacidades ou habilidades de visualização. Para Barnea (2000), os professores devem certificar-se de que os alunos possuem as seguintes capacidades ou habilidades de visualização:

a) visualização espacial; b) orientação espacial;

c) relações espaciais, que lhes permitam descodificarem corretamente o conjunto de informações contidas nas visualizações.

Segundo este autor, a visualização espacial será a capacidade de entender objetos 3D a partir de representações 2D e vice-versa; a orientação espacial relaciona-se com a capacidade de imaginar como será a representação 3D de um objeto que sofreu uma rotação; e as relações espaciais serão a capacidade de imaginar os efeitos das operações de reflexão e de inversão sobre a representação de um objeto.

A opinião dos pesquisadores acerca do desenvolvimento destas habilidades espaciais não é muito consensual (FERK et al., 2003). Segundo este estudo, existem pesquisadores que

35 sugerem que estas habilidades não podem ser ensinadas nem desenvolvidas, serão capacidades inatas. No entanto, para outros autores (GILBERT, 2007b; TUCKEY; SELVARATNAM, 1993) estas habilidades podem ser desenvolvidas com aulas cuidadosamente planejadas recorrendo a modelos, estereodiagramas, etc. Em relação ao desenvolvimento destas capacidades de visualização, especificamente, na área da Química, Tuckey e Selvaratnam (1993) identificaram três abordagens, usando respectivamente:

• Estereodiagramas, que consistem num par de desenhos ou fotos, um deles mostrando aquilo que iria aparecer no olho direito, e outro que iria aparecer no olho esquerdo. Ao juntar estas duas fotos ou desenhos num aparelho específico, cria-se a ilusão de uma imagem 3D;

• Ensinar dicas, todos os diagramas contêm dicas (pistas) específicas para, por exemplo, indicar a distorção dos ângulos de ligação, mostrar a sobreposição de entidades, etc.;

• Ensinar sistematicamente a rotação e a reflexão através do uso de uma série de diagramas.

Ainda, noutro trabalho, Gilbert (2007b) destaca que o desenvolvimento destas capacidades passaria por alterações nos currículos escolares de modo a introduzir disciplinas/atividades específicas para desenvolver estas capacidades desde a infância, a uma boa prática geral no uso de representações quer por professores, quer por autores de livros. Para Hearnshaw (1994 apud GILBERT, 2007b), estas boas práticas envolveriam:

1) Começar qualquer sequência de representações com a forma geométrica mais simples possível;

2) Usar a maior amplitude possível de modos de representação, introduzindo-os deliberadamente, sistematicamente e com persistência, levando os alunos a relacionarem o seu conhecimento aos códigos de representação;

3) Maximizar a importância das formas, topos, sombras e modelos presentes em qualquer representação. Isto levará os alunos a distinguir a estrutura da representação;

4) Usar vários graus de iluminação para diferentes secções da representação. Isto deve ajudar os alunos a percepcionarem melhor os contrastes;

5) Fazer uso de efeitos da cor, brilho e usar vermelhos, azuis e verdes. Mais uma vez pretende-se maximizar contrastes.

36 Em relação à terceira capacidade referida por Justi, Gilbert e Ferreira (2009) - Conseguir construir uma representação num modo apropriado para um determinado propósito – outro autor discute este assunto de uma forma detalhada. Em Kozma e Russell (2007a), é nos apresentado um estudo sobre a necessidade de desenvolvermos uma série de competências representacionais nos nossos alunos. Este termo está relacionado com um conjunto de capacidades e práticas que são necessárias para uma pessoa construir e usar uma variedade de representações ou visualizações externas, para pensar, comunicar-se com os seus pares, etc. Estes autores admitem que a aquisição destas competências segue uma trajetória de desenvolvimento, não em sintonia com a progressão Piagetiana, mas de acordo com as noções socioculturais para o desenvolvimento de Vygotsky, em que as interações com os recursos materiais e sociais do ambiente levarão ao desenvolvimento pessoal. Estes autores apresentam cinco níveis de competência representacional que descreveremos muito sumariamente:

• Nível 1: Representação como descrição (o indivíduo produz representações baseadas apenas nas características físicas);

• Nível 2: Primeiras habilidades simbólicas (o indivíduo produz representações baseadas nas características físicas, mas já introduz alguns elementos simbólicos, como por ex. setas);

• Nível 3: Uso sintático de representações formais (o indivíduo produz representações baseadas quer nas características físicas observáveis, quer em não observáveis, entidades ou processos subjacentes);

• Nível 4: Uso semântico de representações formais (o indivíduo produz representações usando sistema formal de símbolos representando quer as características físicas observáveis, quer as não observáveis, entidades ou processos subjacentes);

• Nível 5: Uso refletido e retórico de representações (o indivíduo produz uma ou mais representações para explicar as relações entre as características físicas e as entidades ou processos subjacentes).

Para Kozma e Russell (2007a), a modelagem molecular, as simulações e as animações são ferramentas que podem dar suporte aos objetivos tradicionais da aprendizagem conceitual em Química e aos novos objetivos relacionados com práticas investigativas sobre “ tornar os estudantes químicos”.

37 Ainda, na área da educação, encontramos referências (FERK et al., 2003) que apontam para a necessidade de desenvolver a literacia visual, a “quinta literacia”, complementando a literacia básica, a literacia digital, a literacia tecnológica e a literacia de informação (ROBLYER; BENNETT, 2001). Segundo Christopherson (1997), uma pessoa literada visualmente tem as seguintes competências:

• Interpretar, compreender e apreciar o significado das mensagens visuais;

• Comunicar mais eficazmente através da aplicação dos princípios e conceitos básicos do design visual;

• Produzir mensagens visuais usando o computador e outras tecnologias;

• Usar o pensamento visual para encontrar soluções para os problemas.

O uso de visualizações no ensino de Química promoverá o desenvolvimento desta “quinta literacia”. Apesar de algumas evidências empíricas de que o uso de visualizações no ensino de Química contribuirá para um desenvolvimento conceitual em Química que dificilmente seria atingido sem o uso destes recursos, ainda são poucos os estudos nesta área. Kozma e Russell (2007b), por exemplo, apresentam um estudo usando cinco projetos multimídia de visualização com diferentes abordagens onde apresentam uma reflexão sobre o uso destes recursos. Eles concluíram que os cinco projetos aumentaram a aprendizagem de conceitos químicos e o desenvolvimento de habilidades científicas de investigação. No entanto, os autores deixam algumas recomendações para o uso de atividades instrucionais (educacionais) baseadas em visualização, das quais destacamos:

• Não há estudos cuidadosamente planejados que nos possam dizer quando é melhor usar animações ou imagens estáticas, ou se os modelos moleculares dinâmicos são melhores que os modelos de bola e bastão;

• Não há dados acerca da precisão como estes meios devem ser usados em conjunto e quando é melhor fazer isso;

• Nesta fase, todos os aspectos práticos são deixados ao julgamento dos professores e dos designers educacionais.

Estes estudos têm causado impacto na comunidade de ensino de Química, onde a necessidade e a proliferação de ferramentas visuais associadas ao uso de tecnologias é muito

38 elevada, como já referido. Professores e educadores, nos seus respectivos contextos, estabelecem uma série de objetivos de aprendizagem para os seus alunos, que podem ou não ser atingidos por estes. Numa tentativa de serem bem sucedidos, estes professores e educadores recorrem então, cada vez mais, ao uso de ferramentas de visualização.