Estudo de caso em UD
CAPACITAR OU POSSIBILITAR
A terceira fase do modelo de parceria é o capacitar ou possibilitar, que “…é construir uma ação conjunta no desenvolvimento de competências para agir e decidir…” (Gomes, 2013, p. 101).
Ao longo das sessões em hospital de dia procurámos a construção de processo de parceria com a Sra. M. através da negociação, fundamentada na informação, na reflexão conjunta, da partilha da responsabilidade e poder, no sentido de transformar as suas capacidades potenciais em reais, a fim de poder assumir o cuidado de si (Gomes, 2013).
A intervenção inicialmente incidiu no ensino sobre a autoavaliação da dor através da escala de dor (a Sra. escolheu a escala numérica, como referimos anteriormente), e sobre acessibilidade telefónica e presencial à UD, quando tivesse dúvidas ou necessitasse. Foi-lhe entregue o guia de acolhimento da UD. Após a consulta médica, foi reforçado o ensino sobre o regime medicamentoso e terapêutica de resgate (objetivos e efeitos secundários), potenciado com a entrega do guia terapêutico.
Nos dias seguintes, foi reforçada a informação sobre o EMAF, objetivos e o funcionamento desta intervenção não farmacológica. Preocupámo-nos em validar a informação dada sobre o regime terapêutico, visto que anteriormente detetámos através do Mini Mental State Examination, alteração da atenção, cálculo, e da evocação na Sra. M. Quando verificávamos, a correta gestão terapêutica, por
exemplo, dávamos o reforço positivo, que é dos elementos para ajudar a capacitar a pessoa idosa para o cuidado de si (Gomes, 2013). Foi necessário reforçar o ensino sobre o autocontrolo da dor crónica e a terapêutica de resgate em novembro 2015, visto a Sra. M. ter apresentado períodos de dor irruptiva e não a ter utilizado. Disse- nos que nem sequer tinha comprado o analgésico de resgate, porque a sua dor estava controlada. Na consulta médica de janeiro 2016, constatou-se que a dor estava controlada EN=3, conquanto tenha referido um agravamento da dor por ter suspendido o tapentadol, porque segundo referiu “era muito caro”. Na consulta médica, foram validados preços dos medicamentos com a Sra. M., que referiu não ter dificuldade em adquirir os medicamentos analgésicos, desde que o tapentadol fosse prescrito com o respetivo despacho19 relativo à compartição (o que parece não ter
acontecido, no receituário anterior).
Procurou-se promover a reflexão da Sra. M. sobre as suas dificuldades e ganhos em relação à gestão da dor crónica, para melhor compreender a singularidade do seu percurso de assumir o controlo do cuidado de si.
Neste processo de capacitação também aprendemos com a pessoa idosa a tomar consciência de (nosso) si e da nossa vulnerabilidade como enfermeira (Gomes, 2013). Apresentamos algumas das aprendizagens nesta área na reflexão final.
No processo de parceria a capacitação para assegurar o cuidado de si, no que diz respeito ao controlo da dor crónica, exige um compromisso mútuo entre a Sra. M. e a enfermeira para conseguirem atingir aos objetivos acordados. Encontrámos assim a interligação no processo de parceria com a pessoa idosa com a 4ª fase: Comprometer-se; que em relação à Sra. M, apresentamos de seguida.
COMPROMETER-SE
Na construção do processo de parceria com a pessoa idosa, de acordo com o modelo de parceria, existe uma quarta fase que se designa por comprometer-se, e que se define pelo “…desenvolvimento de esforços conjuntos no sentido de procurar
19 Despacho n.º 10280/2008, de 11 de março (DR, 2.ª série, n.º 69, de 8 de abril de 2008).
Comparticipação - medicamentos opióides, dor crónica não oncológica. Determina que os medicamentos destinados ao tratamento da dor crónica não oncológica moderada a forte são comparticipados pelo escalão A (95 %).
atingir os objetivos definidos, para assumir ou assegurar o controlo ou a progressão do projeto de vida e saúde da pessoa idosa, …” (Gomes, 2013, p. 103).
As ações desenvolvidas nesta fase do processo de parceria, procuram promover uma transição progressiva da capacidade potencial da Sra. M. para a capacidade real, a fim de poder continuar com a sua trajetória de vida (Gomes, 2013).
O plano de cuidados ajuda a tornar visível o esforço conjunto entre a enfermeira e a Sra. M, traçar objetivos de forma a promover o cuidado de si. Para aprofundamento da nossa aprendizagem, na promoção da autonomia e independência da pessoa idosa, apresentamos de forma esquemática nas tabelas que se seguem, alguns dos problemas, resultados esperados, intervenções de enfermagem e os compromissos assumidos, pela Sra. e pela enfermeira.
Problemas Identificados Resultados esperados Intervenções de enfermagem Compromissos estabelecidos em parceria
Dor nos membros inferiores, relacionada com polineuropatia diabética e gestão terapêutica ineficaz manifestado por:
» Intensidade dor EN=8 (momento) e EN=10 (Pico)
*Impacto da dor (IRD): Atividade geral 5/10; Disposição 8/10; Capacidade de andar a pé 5/10; Trabalho normal 5/10; Relação com as outras pessoas 3/10; Sono 0/10; Prazer de viver 10/10.
Que a Sra. M. apresente dor controlada
- Avaliação da dor da Sra. M. em todos as consulta enfermagem
- Validação do regime terapêutico
- Identificação dos motivos de não adesão terapêutica, se necessário
- Reforço do ensino sobre a terapêutica resgate
- Realização de tratamentos de EMAF - Incentivo da importância da atividade física
- Incentivo ao adequado controle da glicémia capilar
- Reforço positivo nos progressos da Sra. M.
-Identificação,
encaminhamento/informação ao médico para um adequado controlo da dor, se necessário
- A Sra. M. identificar as situações de dor não controlada e autoavaliar a dor
- Cumprir o regime medicamentoso de base
- Gerir a terapêutica resgate em episódios de dor irruptiva - Assiduidade aos tratamentos de EMAF - Realizar períodos de marcha
-Gerir a sua glicémia capilar e respetiva terapêutica, de acordo com indicação médica
- Triagem e assegurar uma transmissão ao médico de problemas que exigem a intervenção médica (por ex. alteração terapêutica)
Problemas Identificados Resultados esperados Intervenções de enfermagem Compromissos estabelecidos em parceria Risco de queda relacionado com
tonturas, e fraqueza muscular nos membros inferiores, manifestada por médio risco de queda (escala de Morse).
- Que a Sra. M. não apresente quedas.
-Ensino sobre a manutenção de um ambiente seguro em casa:
*Iluminação adequada em casa *Não deixar fios soltos pelo chão *Retirar/evitar tapetes soltos no chão - Incentivo a marcha, com apoio ou ajuda técnica, se mantiver sintomas
- Incentivo ao uso de calçado adequado para que se desloque confortavelmente e em segurança
- Avaliação periódica da marcha e o risco de queda
- Avaliação sobre os efeitos secundários da medicação, suscetíveis de interferir na marcha, e comunicar ao médico para ajuste terapêutico
- A Sra. M. comprometeu-se a adotar algumas das medidas para um ambiente seguro em casa
Risco de infeção relacionado com diabetes e contato diário com gatos (em casa, e na rua),
manifestado por lesões cutâneas membros inferiores
- Prevenir infeções
-Prevenir situações suscetíveis de provocar lesões cutâneas
- Ensino sobre os riscos de infeção, potenciados pela existência da diabetes - Incentivar a Sra. M. a adotar comportamentos preventivos de lesões, em relação aos gatos
-Ensino sobre vigilância de sinais inflamatórios e cuidados a ter em caso de existirem lesões
-Despiste e vigilância de lesões cutâneas
- Adotar comportamentos preventivos de lesões - A enfermeira reforçar a prevenção e vigiar a ocorrências de lesões cutâneas
Problemas Identificados Resultados esperados Intervenções de enfermagem Compromissos estabelecidos em parceria Alteração do humor, relacionado com
depressão ligeira (Escala de Depressão Geriátrica de Yesavage)
- Identificar os recursos internos (familiares) e externos (comunidade) disponíveis
- Prevenir o isolamento social
- Facilitar a expressão de emoções e dificuldades
- Elogio dos esforços na socialização - Promoção da esperança na manutenção da sua autonomia e independência
-Incentivo á manutenção do acompanhamento psicológico - Ensino sobre a gestão terapêutica prescrita (antidepressivo, analgésico).
-Disponibilidade da enfermeira para a escuta ativa
- Manter atividades de distração e de socialização - Manter as consultas de psicologia agendadas - Não interromper medicação sem indicação médica
Risco de não adesão terapêutica relacionada com efeitos secundários, polimedicação, dificuldades
económicas e depressão ligeira.
- Que a Sra. M. tome a terapêutica de forma adequada
- Que o Sra. M. contate a unidade dor em caso de dúvidas sobre a terapêutica, ou efeitos secundários da medicação
- Vigilância e despiste de sinais e sintomas de possíveis interações medicamentosas - Vigilância de alterações provocadas uma inadequada adesão terapêutica
-Validação nos contactos pessoais ou telefónicos com a Sra. M. do cumprimento da terapêutica
- Identificação dos motivos para o não cumprimento
- Ensino sobre regime terapêutico à Sra. M.
- Providenciar atempadamente os medicamentos (pedir as receitas, comprar os medicamentos) - Solicitar esclarecimentos à equipa unidade dor sempre que existirem dúvidas sobre a terapêutica
- A enfermeira assegura a validação da gestão terapêutica em todos os contatos
ASSUMIR O CONTROLO DO CUIDADO DE SI PRÓPRIO OU ASSEGURAR