• Nenhum resultado encontrado

O capital fi nanceiro e a renda da terra

No documento OLIVEIRA; GENNARI (páginas 150-153)

9. A Escola Marxista: Karl Marx

9.5 O capital fi nanceiro e a renda da terra

Para Marx, “o dinheiro efetua movimentos puramente técnicos no pro- cesso de circulação do capital industrial. [...] Esses movimentos – ao se tornarem função autônoma de um capital particular que os executa – trans-

formam esse capital em capital fi nanceiro”.15 Parte do capital tem de existir

constantemente como tesouro, como capital-dinheiro potencial: reserva à espera de aplicação.

O capital comercial pode ser representado por D – M – D; já o capital fi nanceiro, por D – D – M – M’ – D’– D’, sendo o primeiro (D) representante do capital fi nanceiro que precede à acumulação e o último (D’), o retorno da remuneração do capital fi nanceiro na forma de juros. Na verdade, os juros, para Marx, representam uma parte da mais-valia.

Segundo Marx, a fórmula D – D’ representando forma específi ca do ca- pital fi nanceiro não faz sentido, na medida em que os juros, como parte da mais-valia produzida, dependem da esfera da produção ou da produção do excedente econômico.

13 MARX, Karl. O capital, livro I, p. 731. 14 Id., p. 732.

O dinheiro “é a expressão autônoma de certa forma de valor. [...] Por isso, além do valor de uso que possui como dinheiro, passa a ter outro valor de uso,

isto é, o de funcionar como capital”.16

O dinheiro funciona agora como capital ou como mercadoria-capital. A mer- cadoria-capital é uma das duas mercadorias diferentes, que possuem atributos especiais. A primeira mercadoria especial é a mercadoria força-de-trabalho. Seu atributo especial é que o seu consumo é a própria produção de valor. O capital- mercadoria também possui uma especifi cidade que o diferencia das demais: a mercadoria-capital, na forma de capital fi nanceiro, ao ser consumido o seu valor- de-uso, ou seja, quando é utilizado como capital, não tem sua substância de valor consumida, ou seja, o principal da dívida continua existindo como obrigação de débito a ser quitado com o credor – como também, e principalmente, garante ao prestamista o retorno do juro que lhe é devido.

Na verdade, o capitalista fi nanceiro empresta o dinheiro não como dinhei- ro, mas como capital. Se o prestatário não desembolsa o dinheiro como capital, o problema é todo dele. O valor de uso do capital é a característica de produzir mais-valia, o lucro médio, ao mesmo tempo conservando a magnitude primi- tiva do valor.

Na teoria de Marx, o juro (assim como o lucro e a renda da terra) é parte da mais-valia produzida socialmente pela classe trabalhadora em seu conjunto. O juro é a parte do lucro que o prestatário realizou. Desse modo, o lucro não se duplica.

[...] a parte do lucro que cabe ao prestamista chama-se juro. [...] O que se paga é o juro e não o preço da mercadoria. Se chamamos o juro de preço do capital-dinheiro, teremos forma irracional do preço, em contradição completa com o conceito de preço da mercadoria. [...] Dizer que o juro é o preço do capital é fazer afi rmação a

priori irracional.17

O juro é sempre juro relacionado a tempo, portanto sua magnitude depende do tempo de rotação do capital. Sendo o juro “apenas parte do lucro, a qual, se- gundo a hipótese estabelecida, o capitalista industrial deve pagar ao fi nanceiro,

então o próprio lucro se patenteia como o limite máximo do juro”.18 Já o limite

mínimo depende da oferta e da demanda por dinheiro. Desse modo, o lucro industrial é igual ao lucro menos os juros.

16 MAR, KARL. O capital, livro III, p. 363. 17 Id., p. 408-9.

Na sociedade capitalista, a simples propriedade do capital dá o direito ao seu proprietário de receber, no mínimo, a taxa de juro vigente. Há muito isso se tornou censo comum. Entretanto, ao observarmos as explicações de Marx so- bre o capital fi nanceiro ou capital fi ctício, notamos que há certa complexidade na questão. O fato de se saber que o capital dá direito ao rendimento de pelo menos a taxa de juro produz a forma do capital produtor de juros e transfor- ma a capitalização em algo de fundamental importância na sociedade em que vivemos. A idéia de capitalização sugere que “a forma do capital produtor de juros faz com que toda renda monetária determinada e regular apareça como

juro de um capital, derive ela ou não de um capital”.19

Isso signifi ca dizer, como na sugestão de Marx, que, supondo a taxa de juro a 5%, se o valor nominal de um lote de ações for 100 reais, os proprietários dos títu- los esperam receber pelo menos a taxa de juro, ou seja, 5 reais. Se o negócio, porém, rendeu 10% em vez de 5%, o valor de mercado dos títulos elevar-se-ia a 200 reais, pois, capitalizadas a 5%, as ações representam agora um capital fi ctício de 200 reais. As ações valem agora no mercado 200 reais. Assim, para Marx, o valor dos títu- los é sempre determinado pelo rendimento capitalizado. Outro aspecto relevante sobre o assunto é que o preço dos títulos varia na razão inversa da taxa de juro. É importante considerar, neste momento de nossos estudos da teoria de Marx, que as ações e os títulos são apenas direitos sobre a mais-valia futura e, portanto, há um componente especulativo intrínseco à acumulação de capital.

Quanto ao capital fi nanceiro, cabe uma última consideração importante. Para Marx, o capital fi nanceiro possui movimentos autônomos, e essa auto- nomia só aumentou ao longo dos séculos XIX e XX. Marx ressalta ainda que o fato de o dinheiro, que é a forma geral do valor, possuir movimentos autô- nomos não signifi ca em absoluto que o capital fi nanceiro possa ser autônomo em relação à real fonte da produção do valor e do excedente: a produção de mercadoria. Marx dedicará três capítulos de O capital, 30, 31 e 32 do terceiro livro, para esclarecer que

[...] a magnitude da mais-valia convertida em dinheiro depende da magnitude da mais-valia contida no fi o. E o dinheiro em que se converteu passa a ser apenas o modo de existência em valor dessa mais-valia, e como tal se torna elemento do capital de empréstimo.20

19 MARX, Karl. O capital, livro III, p. 534. 20 Id., p. 579.

No documento OLIVEIRA; GENNARI (páginas 150-153)

Documentos relacionados