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Em 1950 é o período de maior fervor da capoeira, possuía praticantes de dife-

rentes camadas da sociedade e passou a ser utilizada em músicas, teatro, danças,

artes plásticas, etc.

Neste período, quando se faz referência à capoeira, esta é imedia- tamente associada à Bahia, que passa a ser considerada o seu ber- ço. Além disso, neste momento, esta manifestação não é mais vista como marca do atraso e da barbárie, mas sim como símbolo da cul- tura baiana e brasileira. É a partir dos anos 1950 que o berimbau passa a ser usado como um símbolo de identidade da cultura baiana, em especial o berimbau pintado, obra do Mestre Waldemar (TEIXEI- RA, 2007, p.42).

Nesta época destacam-se o Mestre Waldemar da Liberdade ao qual já nos re-

ferimos anteriormente e Mestre Traíra. Surgem no final dos anos 40 e por toda a dé-

cada de 50, realizavam suas rodas domingueiras, no bairro da Liberdade e no Cha-

me-Chame (TEIXEIRA, 2007).

Neste momento as rodas, academias das periferias como a de Walde-

mar e de Traíra, entre outras, estavam em declínio enquanto a de Mestre

Pastinha e Mestre Bimba ainda estavam crescendo na década de 1960. Mas

esse desenvolvimento não perdurou por muito tempo, entre 1960 e 1970 al-

guns acontecimentos influenciaram a capoeira na Bahia. Um deles segundo

Teixeira (2007, p.43) foi “o início do processo de esportivização da capoeira,

homologado em 1972 pelo Conselho Nacional de Desportos (CND), que sub-

meteu a prática da capoeira às regras do pugilismo”. Aqui se inicia a tentativa

de unificação da capoeira (Angola e Regional), realizações de campeonatos

nacionais, veem o capoeira como um atleta esquecendo-se de todos os sabe-

res e ritos tradicionais. Outro marco foi o inicio da “folclorização da cultura ne-

gra na Bahia”, associado ao turismo (TEIXEIRA, 2007, p.43).

A descaracterização da Capoeira Angola começou com a formação de grupos folclóricos, quando o capoeirista deixou os terreiros e pas- sou a exibir-se em palcos teatrais. Nesses grupos, o único objetivo é agradar aos turistas [...]. Outro fator que contribui para a descaracte- rização da angola foi a adesão de praticantes de outras lutas na prá- tica da capoeira e vice-versa, passando, desta forma, a acrescentar novos movimentos, totalmente estranhos à Capoeira Angola, tornan- do-a uma espécie de vale-tudo (MESTRE BOLA SETE, 2001, p. 186).

Ainda na década de 60 e 70 surgem dois mestres que se enquadram e ajus-

tam a capoeira “às novas exigências do folclore, estilizando as manifestações, trans-

formando o jogo/ritual em show”, Mestre Canjiquinha e Mestre Caiçara, de acordo

com Teixeira (2007, p.44). Nessa perspectiva de espetáculo a capoeira dava muito

mais rentabilidade do que o ensinar em academias, assim afetou o funcionamento

das mesmas e a formação de novos capoeiras.

A capoeira utilizada como espetáculo, em apresentações para turista ver tinha

grande influência da Ginástica de Solo e de Acrobacias, nesse momento começa-se

a fazer jogos ensaiados, rápidos, com piruetas e com muitas firulas. Se observarmos

os mestres antigos jogando vamos ver como eram bons com um jogo simples, sem

mega acrobacias, que mais parece circo do que capoeira.

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A Divulgação da Capoeira para os demais estados e para o mundo também

se deu por meio de filmes como, por exemplo, o Pagador de Promessas de 1962,

escrito por Anselmo Duarte baseado na peça teatral de Dias Gomes, além do filme o

Livro de Jorge Amado Capitães da Areia de 1937.

Essa expansão da capoeira fez com que vários mestres fossem para diferen-

tes estados brasileiros para mostrar a capoeira da Bahia. Na década de 1950 o Rio

de Janeiro recebeu muitos capoeiras e o principal foi Arthur Emídio, vindo de Itabuna

região do cacau na Bahia (TEIXEIRA, 2007).

Segundo Teixeira (2007), a capoeira realizada por Arthur Emídio, não se rela-

cionava com a de Mestre Pastinha nem a de Mestre Bimba, consistindo em movi-

mentações velozes e eficazes marcialmente, além disso, manteve os instrumentos e

fazia apresentações folclóricas. Sua academia se localizava na Zona Norte do Rio

de Janeiro, Mestre Arthur Emídio foi mestre de Leopoldina, Celso do Engenho da

Rainha, Paulo Gomes, Djalma Bandeira e Vilma importantes mestre cariocas.

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Já na Zona Sul outra organização começava a surgir, por quatro capoeiristas,

dois com experiência da capoeira do Mestre Sinhozinho (Gato e Gil Velho) e dois

que acabara de voltar da Bahia (Rafael e Paulo Flores), após treinar alguns meses

com Mestre Bimba, isso em 1964 e “em 1966, Mestre Bimba esteve no Rio para rea-

lizar o show folclórico Vem Camará e visitou os jovens, que haviam se auto intitulado

Grupo Senzala” (TEIXEIRA, 2007, p.45).

O Grupo Senzala misturou os ensinamentos de Mestre Bimba com os movi-

mentos e instrumentos da Capoeira Angola e também possuem influências das artes

marciais principalmente o Karatê, não se definindo em nenhuma nem Angola nem

Regional, é importante esclarecer que visavam a esportivização da capoeira.

Além desses, Carlos Sena, também aluno de Mestre Bimba cria uma nova

forma de praticar capoeira a partir dos ensinamentos recebidos. De acordo com Mat-

thias RohrigAssunção (2005) apud Teixeira et al (2007, p.46),

O que distinguia Sena era sua crítica à estagnação do folclorismo cultural das exibições de capoeira e seu esforço para esportivizar a capoeira. Ele criou um elaborado sistema de regulamentações for- mais que supostamente regrariam treinos e rodas. Sena, entre ou- tros, proclamou ter inventado o sistema de cordas e sistematicamen- te utilizava uma saudação para capoeira: “Salve”. As regras inventa- das por ele agradaram as forças armadas e simpatizantes do regime militar. Ele também contribuiu para as Regras Técnicas da Capoeira adotadas pela Confederação Brasileira de Boxe, em 1972. Durante os anos 1960, Sena foi frequentemente considerado representante de um novo estilo, diferente da capoeira angola e regional, usual- mente chamado de capoeira Estilizada ou Senavox.

A Senavox iniciou bem, mas não perdurou por muito tempo,

Quanto à polêmica em relação à criação do sistema de cordas, o cer- to é que seu uso foi institucionalizado em 1972, apoiado pelo nacio- nalismo militar. A Confederação Brasileira de Boxe determinou que a capoeira, assim como acontecia com as artes marciais orientais, de- veria graduar seus alunos, mas ao contrário das faixas, utilizaria “cordéis” com as cores da bandeira brasileira: branco, verde, amarelo e azul (TEXEIRA, 2007, p.46-47).

A partir dos anos de 1970 esse sistema de cordas predominou, disseminando

essa nova forma de praticar capoeira pelo Brasil e no mundo. Além do Grupo Senza-

la outros grupos na mesma perspectiva apareceram no Rio de Janeiro como Abadá

Capoeira e Capoeira Brasil. Na capital de São Paulo desde 1960 outros mestres

baianos começaram a ensinar capoeira como: Suassuna, Brasília, Joel, Gilvan, Pau-

lo Limão, Silvestre, Ananias e durante os anos 1970, Airton Onça e Acordeon. Em

1974 criaram a Federação Paulista de Capoeira, na qual defendia regulamentações

esportivas criadas para a capoeira. Os principais grupos que surgiram em São Paulo

foram Cordão de Ouro e Cativeiro (TEIXEIRA, 2007).

A capoeira se espalhou com mais facilidade no Nordeste brasileiro e com es-

sa expansão é levada também para o Sul do Brasil, no Paraná, não se sabe ao certo

quem foi o primeiro a chegar. A capoeira no Rio Grande do Sul teve como “um dos

pioneiros no final da década de 1970 para 1980 o Mestre Cal (Henry Xavier), depois

foi o Mestre Índio (Manoel Olimpio de Souza) que era baiano, após o Mestre Monsu-

eto (Ananílson de Souza” (DORNELLES e GOELLNER, 2011).

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Em Santa Catarina mais especificadamente em Florianópolis os registros a-

pontam que o primeiro a chegar foi Mestre Pop em 1977. E no final de 2004 chega à

cidade a Escola de Capoeira Irmãos da Beira Mar de Angola (ECIBA) a qual será

retratada mais adiante.

Essa movimentação dos anos 60, 70 fez surgiu um novo “estilo” de capoeira a

qual alguns chamam de Capoeira Contemporânea com modificações nos princípios

filosóficos, na movimentação, no ritual, na essência do capoeira, transformando a

capoeira sem preservar os ensinamentos dos antepassados. Como diria Mestre Pa-

tinho-MA podemos “Inserir o Novo no Velho, Sem Molestar Raízes”. Uma pequena

frase que simplifica o que não ocorreu.

Nesse movimento de mistura dos fundamentos da Capoeira Angola e da Ca-

poeira Regional surge à capoeira Moderna e com esse modelo surge uma Mercanti-

lização, cujos grandes grupos, corporações e associações visam ganhar dinheiro,

começa-se uma disputa de mercado, criam-se rótulos que antigamente eram distinti-

vos simbólicos de mandinga e força, mas hoje são apenas rótulos ou marcas influen-

tes da publicidade e do marketing.

Segundo Mestre Curió “onde corre muito dinheiro não há sincerida- de, que é o dinheiro que fala mais alto e a cultura deixa de ser con- servada justamente por isso, é o comercio, eles estão comercializan- do, eles não estão preocupados em dar continuidade naquilo que é nosso, no que os nossos antecipados deixaram (DEPOIMENTO

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Entrevistas realizadas com Mestre Churrasco em 2011, para a construção do trabalho de conclu- são do curso de licenciatura em educação física de Ederson Alberto Teixeira Dornelles, intitulado Monsueto, Alves e Churrasco: a reconstrução da história dos primeiros mestres de capoeira em solo gaúcho.

MESTRE CURIÓ, DOCUMENTÁRIO PASTINHA UMA VIDA PELA CAPOEIRA, 1998).

Acabando na criação de uma atmosfera de guerra com rodas violentas e a-

gressivas e hoje cada vez mais é comum ver na roda agarrões e chaves de braço, o

asfixiante para autodefesa de Mestre Bimba virou soco na cara. Castro Junior (2004,

p.153) diz “o Mestre João Pequeno comenta que antigamente a capoeira era mais

perigosa e menos violenta, hoje, a capoeira é mais violenta e menos perigosa [...]

Antigamente o capoeirista guardava o golpe para cobrar depois”.

A capoeira como luta sempre foi uma arte perigosa, as rodas antigas eram

nas periferias e a malandragem sempre circulou pelas rodas, mas a violência não

era explicita, pelo contrário. O bom malandro era respeitado e os bons capoeiras já

não se tocavam em público, apenas se marcavam, mostrando suas destrezas.

Os depoimentos dos antigos mestres evidenciam um código de ética da capoeira, “ética da malandragem”, qual consiste na preservação da ritualidade, dotada de regras próprias e que são transmitidas de geração para geração e a revitalização da mandinga, da malícia co- mo elemento fundamental da capoeira (VIEIRA, 1995 apud CASTRO JUNIOR, 2004, p. 153-154).

Mas enquanto agente tiver esse pensamento de mostrar que é bom só batendo e machucando as pessoas, a capoeira nunca vai chegar no seu lugar determinado que ela tem que estar como era no passa- do. Tinhas as perversidades? Tinha, mas dentro da malandragem, dentro da técnica, dentro da realidade da coisa, que pra mostrar que é bom, não precisa se bater em ninguém (DEPOIMENTO DE MES- TRE CURIÓ, DVD).

4 A CAPOEIRA ANGOLA E A ESCOLA ECIBA - MODIFICAÇÕES E AVAN-

ÇOS

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