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Características da Aprendizagem de Palavras em Crianças

2 Fundamentação Teórica

2.1 Contribuições da Psicolinguística

2.1.2 Características da Aprendizagem de Palavras em Crianças

A aprendizagem de palavras é uma parte importante da aquisição de linguagem natural. Ela pode ser estudada, até certo ponto, de maneira independente da aquisição de outros elementos da linguagem, como por exemplo, das estruturas gramaticais.

Mas antes de tratar da aprendizagem do significado das palavras é preciso entender o que está sendo de fato aprendido. Na visão tradicional, que surge com Aristóteles, o significado de uma palavra é o que determina sua referência. Uma palavra como “cão”, tem uma extensão (as entidades as quais a palavra se refere - cães) e uma intenção (o que as entidades compartilham - o que todos os cães têm em comum). O significado se identifica com a intenção. Uma visão amplamente aceita (Bloom,2002) define significado como uma representação mental das características que permite julgar quais objetos do mundo são, por exemplo, cães. Outras visões incluem a ideia de que significados são modelos mentais (protótipos) ou conjuntos de exemplares. Estas visões compartilham da ideia de que saber o significado de X, envolve diferenciar as coisas que são X das coisas que não são X. Não é necessário que todas as pessoas compartilhem completamente das mesmas definições, mas deve haver coincidências suficientes entre seus modelos mentais para que ambos sejam capazes de compartilhar significados por intermédio de palavras.

No entanto, muitas palavras não encaixam tão bem nesta definição. Não se pode dizer que uma criança saberá o significado da palavra “ouro” apenas quando ela souber diferenciar ouro de outros metais. Outro problema de relacionar a aprendizagem de palavras com referência e

categorização é que isso funciona bem para substantivos como “cão” e nomes próprios como “Moisés”, podendo se estender para alguns verbos e advérbios. Mas não funciona bem para palavras como determinantes, preposições e verbos auxiliares. Estas palavras tem seu significado determinado pelo papel que desempenham ao modular o significado de outras e, portanto, o seu aprendizado pode ser tratado de maneira distinta.

A aprendizagem de palavras ocorre durante toda a vida, mas diversos eventos relevantes ocorrem em crianças com idades entre um e seis anos. Crianças começam a produzir palavras por volta dos 12 meses e em torno dos quatro anos já dominam praticamente tudo que virão a saber sobre fonologia, sintaxe e morfologia da sua língua materna. Crianças de seis anos já conhecem aproximadamente 10.000 palavras (Bloom,2002, p.13). E diplomados do ensino médio americano sabem o significado de aproximadamente 45.000 palavras de dicionário. Ao incluir nomes próprios e expressões idiomáticas este número sobe para algo entre 60.000 e 80.000 palavras (Bloom,2002, p.6).

Cada uma dessas faixas etárias exibe traços diferentes da aprendizagem, e por isso são o foco de estudos distintos. Crianças pré-linguísticas são alvo de estudos porque ainda não possuem as capacidades necessárias para falar, crianças de um ano são interessantes porque são novatas no aprendizado das palavras, crianças mais velhas e adultos são interessantes porque já são especialistas, e crianças na pré-escola estão em um meio termo entre essas duas últimas categorias (Bloom,2002, p.35).

Tomando como base um aprendizado de 60.000 palavras até os 17 anos, há uma impres- sionante taxa de aprendizagem média de 10 palavras aprendidas por dia, o que equivale ao aprendizado de uma palavra a cada 96 minutos, descontando 8 horas de sono. Sabe-se, no entanto, que essa taxa não é constante, no início do aprendizado poucas palavras são aprendidas por semana, porém a taxa aumenta gradualmente atingindo seu pico em algum momento após os 10 anos de idade, e desacelera antes dos 17 anos (Bloom,2002, p.45).

Além disso, alguns tipos de palavras são aprendidos com mais facilidade do que outras. Por exemplo, dentre cores, formas e texturas, as palavras relativas a formas são as mais fáceis de aprender, palavras relativas a texturas são as mais difíceis e relativas a cores apresentam um nível de dificuldade intermediário (Heibeck e Markman,1987). Verbos, tais como (tais como, andar) são mais difíceis de aprender do que substantivos (tais como, cão) (Tomasello e Kruger,1992). Substantivos abstratos (e.g., pensamento) são mais difíceis de aprender do que substantivos concretos (e.g, bola) (Bloom,2002, p.90). Instâncias individuais (e.g., Garfield) ou mais específicas (e.g., gato) são mais fáceis de aprender do que categorias ou tipos (e.g., animal) (Xu e Carey,1996). Pronomes são as primeiras palavras deíticas que as crianças aprendem. Pronomes como “este” ou “aquele” frequentemente são encontrados dentre as primeiras palavras aprendidas (Nelson,1973).

Experimentos sugerem ainda que crianças tendem a associar palavras desconhecidas com objetos para os quais elas não sabem o nome (Kagan, 1981), fenômeno este chamado de “Contraste léxico”. Além disso, quando uma nova palavra é utilizada para referenciar um objeto com nome já conhecido, as crianças tendem a associar essa palavra a partes do objeto (Markman e Wachtel,1988) ou a suas propriedades. Isto é descrito pelos autores como, exclusão mútua, ou uma tendência a preferir um mapeamento um para um.Bloom(2002) exemplifica, considerando o experimento deMarkman e Wachtel(1988). São entregues para crianças uma banana (objeto com nome conhecido) e um batedor de ovos (objeto com nome desconhecido). Então se pede: “Mostre-me o Fendle” (uma palavra inexistente). Nesta situação as crianças tendem a mostra o

batedor. Elas podem estar raciocinando, implicitamente, da seguinte forma:

Exemplo

1. Eu sei que uma banana é chamada de “banana”.

2. Se ele quisesse se referir a banana, ela teria me pedido para apontar a banana. 3. Mas ele não o fez, ele usou uma palavra estranha, “Fendle”.

4. Então, ele tem a intenção de se referir a algo que não seja a banana. 5. Um candidato plausível é o batedor.

6. “Fendle” deve se referir ao batedor.

Este comportamento não se aplica apenas a associação de palavras, mas para o aprendizado de sistemas de comunicação em geral. Porém, não se aplica a qualquer tipo de tarefa associativa, pois embora as crianças evitem associar mais de uma palavra a um objeto, elas associam facilmente diversas propriedades a objetos (e.g., bananas são amarelas, doces, arredondadas, curvadas) (Bloom,2002, p.68).

Em fim, a aprendizagem de palavras está condicionada aos seguintes fatores: (1) acesso às palavras - crianças aprendem apenas palavras as quais são expostas; (2) acesso aos conceitos - crianças precisam ter capturado o conceito antes de fazer a associação e (3) acesso ao ma-

peamento - palavras e conceitos devem ser apresentados em uma situação que torne possível identificar o mapeamento.

2.1.3

Aprendizagem Associativa, por Reforço e as Dificuldades na Mode-