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Capítulo 2 – Doença de Parkinson

2.4 Características da voz do idoso

Tendo em vista que as alterações vocais, freqüentemente, acompanham o processo de envelhecimento e a DP (BAKER et al., 1998), e que esta doença normalmente manifesta-se na terceira idade, achamos prudente relatar um pouco acerca das possíveis alterações vocais encontradas na senescência.

O envelhecimento é considerado uma etapa natural do desenvolvimento humano, cujas manifestações orgânicas e/ ou funcionais geralmente vêm acompanhadas de perturbações fisiológicas e biológicas (GIACHETI; DUARTE, 1997; SOYAMA et al., 2005). É universal, comum a todos os seres vivos em idade avançada e progressivo. No entanto, não podemos deixar de considerar que, no processo de envelhecimento do organismo humano, existem condições naturais e patológicas (GIACHETI; DUARTE, 1997). Tendo em vista que a DP manifesta-se tipicamente na terceira idade, realizaremos um estudo comparativo visando

observar que tipo de alteração prosódica seria característica da DP e o que seria decorrente do processo natural de envelhecimento.

Têm sido relatadas, na literatura, alterações vocais características do processo natural de envelhecimento, tais como, modificação da F0 (abaixamento no sexo feminino e elevação no sexo masculino), valores elevados de perturbação de freqüência e de intensidade e diminuição da velocidade de fala (BOONE; MACFARLANE, 1994; DUARTE; TEREZA; JACOB, 2000), além de capacidade vital reduzida, extensão de freqüência e intensidade reduzidas, menor uniformidade no traçado dos formantes e voz instável, com aumento do grau de nasalidade (BEHLAU, 1999), presença de tremor vocal (BEHLAU, 1999; DUARTE; TEREZA; JACOB, 2000), aumento do nível de ruído à emissão, tempo máximo de fonação reduzido (DUARTE; TEREZA; JACOB, 2000), assim como observado em pacientes com DP. Entretanto, vale ressaltar que as mudanças decorrentes do processo natural de envelhecimento apresentam variação intersujeitos (HIRANO; KURITA; NAKASHIMA, 1983; GIACHET; DUARTE, 1997) e nem sempre os idosos percebem o envelhecimento vocal (POLIDO; MARTINS; HANAYAMA, 2005). Vale destacar, ainda, a presença de alterações estruturais decorrentes do processo de envelhecimento, tais como, calcificação gradual das cartilagens laríngeas, adelgaçamento e edema da mucosa e processo de atrofia da musculatura intrínseca da laringe (BEHLAU; PONTES, 1995; BIASE; CERVANTES; ABRAHÃO, 1998).

Feijó; Estrela; Scalco (1998) avaliaram o comportamento vocal de 42 indivíduos idosos, com idade igual ou superior a 65 anos (idade média de 77,67 anos para indivíduos do sexo masculino e 71,02 para indivíduos do sexo feminino), sendo 24 do sexo feminino e 18 do sexo masculino. A partir de uma avaliação perceptivo-auditiva e quantitativa da voz destes indivíduos, foram obtidos os seguintes resultados: a queixa vocal mais referida foi fadiga

vocal; o padrão articulatório mais freqüentemente encontrado foi normal para indivíduos do sexo feminino e impreciso para indivíduos do sexo masculino; predominaram a ressonância laringo-faríngea, os ataques vocais isocrônicos, a qualidade vocal rouca e uma diminuição da resistência vocal em ambos os sexos. Foi observada, ainda, altura melódica baixa nas mulheres e normal e alta nos homens; tempos máximos de fonação e fluxo aéreo expiratório máximo reduzidos e aumento da intensidade vocal média (provavelmente em decorrência da presbiacusia, a qual leva a uma tendência a aumentar a intensidade vocal, a fim de compensar a perda auditiva e fornecer um retorno da sua própria voz). Os autores ressaltaram a necessidade do estabelecimento de padrões normativos para indivíduos idosos, uma vez que foram observadas diferenças significativas destes em relação aos dados de normalidade para indivíduos adultos.

Baker et al. (1998), por sua vez, compararam as amplitudes absoluta e relativa eletromiográficas (EMG) do músculo laríngeo tireoaritenóideo (TA) e realizaram medidas do nível de pressão sonora (NPS) entre quatro indivíduos jovens (média de idade de 27,7 anos), quatro idosos (média de idade de 73,5 anos) e cinco com DPI (média de idade de 71 anos), a fim de verificar como a fisiologia muscular laríngea é afetada pelos processos de envelhecimento e da DP e como mudanças na atividade da musculatura laríngea resultam em alterações características da voz. A importância da investigação desta musculatura se deve ao fato de esta estar envolvida no controle de variáveis que estão afetadas na hipofonia (tais como, adução das pregas vocais e força). Os achados evidenciaram: amplitude absoluta da contração do músculo TA significativamente maior para os jovens, menor para os indivíduos com DP e intermediária para os idosos; amplitude relativa da contração do músculo TA maior para os jovens, menor para os idosos e intermediária para os indivíduos com DP; e NPS equiparável entre os idosos e indivíduos com DP e menores que os valores encontrados para

os jovens. A partir de tais achados, os autores puderam concluir que os níveis reduzidos de atividade do músculo TA podem contribuir para as alterações vocais características (hipofonia) que freqüentemente acompanham a DP e o processo natural de envelhecimento.

Miranda (2001) realizou um estudo comparativo entre os aspectos prosódicos da fala do idoso do sexo feminino e do jovem, procurando verificar os principais aspectos da entonação de enunciados declarativos, interrogativos e de questões alternativas. A autora obteve os seguintes achados:

- é uma característica marcante em enunciados produzidos por idosos, a exploração de F0 mais baixas;

- a amplitude do movimento melódico descendente em enunciados declarativos foi maior em enunciados produzidos por idosos;

- já nas questões alternativas, caracterizadas por um movimento ascendente da curva de F0 no primeiro grupo tonal e por um movimento descendente no segundo grupo tonal, as inclinações iniciais ascendentes foram maiores em enunciados produzidos por adultos jovens, e as descendentes foram maiores em enunciados produzidos por idosos;

- em todos os enunciados, a F0 máxima foi maior para falantes jovens e a F0 mínima foi menor para falantes idosos;

- a tessitura média é maior em enunciados produzidos por idosos (exceto em questões alternativas), provavelmente devido ao fato de a descida melódica no final do enunciado ser significativamente maior para estes indivíduos;

- a média da F0 usual em enunciados declarativos, interrogativos e alternativos foi significativamente maior para falantes jovens;

- foi observada maior ocorrência e duração de pausas nas questões alternativas, nos enunciados produzidos por idosos;

- os enunciados emitidos por idosos foram mais longos, em função da maior duração dos segmentos (inclusive da tônica proeminente) e maior freqüência de pausas, assim como normalmente observamos para indivíduos parkinsonianos.

Como pudemos observar na literatura referida, de forma geral, tanto os indivíduos idosos quanto os indivíduos com DP apresentam uma fala caracterizada por intensidade vocal reduzida, articulação imprecisa, menor variação de F0 e de intensidade, qualidade vocal alterada, diminuição da velocidade de fala e uma tendência ao emprego de F0 mais baixa. Pereira; Cardoso (2000) chamaram atenção para o fato de que, geralmente, os idosos apresentam características que dificultam a realização do diagnóstico em fases iniciais da DP, sendo que muitas características são observadas tanto na senescência quanto no paciente com DP, tais como: diminuição da flexibilidade da coluna vertebral e dos membros; marcha arrastada, com passos curtos; voz fraca e monótona. O presente estudo irá investigar até que ponto as alterações características observadas na fala dos parkinsonianos são decorrentes do processo natural de envelhecimento e até que ponto são provocadas pela DP. Nossa hipótese é de que a expressão oral seja pior em indivíduos com DP, o que melhoraria com a administração da levodopa e do tratamento fonoaudiológico.