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O odor corporal (OC) é libertado por várias partes do corpo (e.g., axilas, palmas das mãos e dos pés) e sob várias formas (e.g., suor, urina) (Wongchoosuk, Lutz, & Kerdcharoen, 2009).

Os odores mais usados para fins de investigação são os odores das axilas (e.g. Lenochova, Roberts, & Havlicek, 2009) e das mãos (e.g., Schoon, 2005). Em termos forenses, os odores recolhidos destas áreas são fundamentais, uma vez que são as amostras mais usadas pelas forças policiais para discriminação e correspondência com odores colhidos de elementos de prova, de suspeitos ou de vítimas (Schoon, 1996).

O odor segregado pelas glândulas existentes nas axilas não tem cheiro até as bactérias da pele gerarem compostos odoríferos. Assim, o OC contém uma mistura complexa de componentes orgânicos, alguns deles em muito baixas concentrações (Zernecle et al., 2010) e os seus efeitos têm sido estudados quanto às suas influências no comportamento de outras pessoas e quanto à possibilidade de identificar ou reconhecer outros através do odor (e.g. Olsson, Barnard, & Turri, 2006). Além disso, os OCs fornecem informações diversas e podem mesmo ser um indicador de diagnóstico de agentes não infecciosos ou de doenças infecciosas (Penn & Potts, 1998). Existem também evidências que, através do OC, as mulheres sincronizam os seus ciclos menstruais e que, quando expostas a odores axilares de homens, o seu ciclo menstrual é regulado (McClintock, 1984). De igual forma, também há estudos que mostram que os homens também conseguem detetar a ovulação nas mulheres através dos OCs (Haselton & Gildersleeve, 2011).

A quantidade e intensidade percebida dos OCs dependem tanto de fatores externos (e.g., temperatura ambiente, humidade) como de fatores internos (e.g., estado emocional, estado de saúde, dieta, idade). Assim, é possível distinguir o odor de uma pessoa calma do odor de uma pessoa assustada (e.g., Ackerl, Atzmueller, & Grammer, 2002), da mesma forma que é possível diferenciar o odor de uma pessoa doente do odor de uma pessoa saudável (e.g., Olsson et al., 2014; Shirasu, & Touhara, 2011), e o odor de uma pessoa jovem do de uma pessoa idosa (e.g., Mitro, Gordon, Olsson, & Lundström, 2012). Inconscientemente, também é possível detetar o medo através dos OCs (Ackerl et al.,

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Segundo Pause (2012), a comunicação química através dos OCs constitui um meio de comunicação ancestral, uma vez que os odores corporais transportam informações relevantes para a sobrevivência dos indivíduos. Os humanos detêm a capacidade de extrair informações de outros indivíduos, como por exemplo, a idade (Mitro et al., 2012), o género (Penn & Potts, 1998), o estado hormonal (Doty, Ford, Preti & Higgins, 1975), o estado de saúde (Penn & Potts, 1998), e o estado emocional (e.g., Ackerl et al., 2002). Conseguem, de forma semelhante, reconhecer familiares, evitando a consanguinidade e promovendo a evolução e viabilidade da descendência (Lenochova e Havlicek, 2008) e discriminar o seu próprio odor, assim como OCs de amigos (e.g., Olsson, Barnard e Turri, 2006).

A distintividade do odor é determinada pelas diferenças na qualidade e na quantidade da composição das substâncias que o compõem. Estas substâncias – que são encontradas no sangue, no suor, nas glândulas sudoríparas (écrinas e apócrinas, ver Tabela 2), no cabelo e na genitália externa – são geneticamente condicionadas pelo complexo major de histocompatibilidade (MHC) (e.g., Penn et al., 2007; Schaefer, Young, & Restrepo, 2001; Schaefer, Yamazaki, Osada, Restrepo, & Beauchamp, 2002; Wedekind, Seebeck, Bettens, & Paepke, 2006).

Tabela 2. Diferenciação entre as glândulas écrinas e as glândulas apócrinas.

Tipo de glândulas Especificações

Glândulas écrinas Localizadas em todo o corpo; Produzem suor sem cheiro;

O suor é libertado para a superfície do corpo. Glândulas apócrinas Produzem suor “gordo” dentro da glândula;

Localizadas perto dos folículos pilosos;

O suor é empurrado para a superfície especialmente quando o indivíduo se sente ansioso ou stressado.

As glândulas écrinas têm como função a regulação da temperatura corporal. Se a temperatura do corpo for elevada, aumenta a produção de suor. O suor produzido por estas glândulas é constituído por água e alguns sais minerais e, por essa razão, não têm nenhum cheiro específico. Já as as glândulas apócrinas estão presentes em algumas regiões

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específicas do corpo (axilas, área genital, couro cabeludo e ao redor dos mamilos). Inicialmente produzem suor sem odor, no entanto, devido à ação de bactérias presentes na pele, graças aos ácidos alifáticos desenvolvem um odor forte e desagradável (bromidrose), particularmente quando o odor se concentra na região das axilas. Os ácidos gordos alifáticos são encontrados no suor, sebo e epiderme. Além dos fatores genéticos, que determinam as características das glândulas apócrinas, há também outras condições que podem contribuir para o mau cheiro corporal, como a alimentação, a obesidade, a má higiene pessoal, o excesso de suor, a ingestão excessiva de álcool ou de alguns alimentos como a cebola, o alho e a pimenta (Sabino, 2013).

Sendo determinado geneticamente (Eggert et al., 1998), o OC é um elemento individual único, semelhante a uma impressão digital, e é usado também como identificador biométrico (e.g., Adeoye, 2010; Wongchoosuk et al., 2009; Rodriguez-Lujan, Bailador, Sanchez-Avila, Herrero, & Vidal-de-Miguel, 2013).

Para exemplificar esta individualidade distinta do odor, é possível recorrer a uma analogia com a face humana. A face de uma pessoa pode sofrer várias alterações, de acordo com fatores externos (e.g., a cor da pele pode variar com o calor, o frio, a maquilhagem) e fatores internos (e.g., diferentes expressões faciais que refletem emoções como o medo, a raiva, a alegria, a dor, entre outras). A face também muda com a idade e, no entanto, é sempre a mesma, diferente de todas as outras. O mesmo acontece com os OCs. Todas as espécies e todos os conspecíficos possuem um odor distinto, não se encontrando dois seres com o mesmo cheiro, incluindo possivelmente gémeos idênticos (e.g., Pinc, Bartoš, Reslová, & Kotrba, 2011; Kalmus, 1955; Kuhn & Natsch, 2008;

Roberts et al., 2005).

Existe uma tendência para nos aproximarmos e reconhecermos o que nos é familiar, mas o inverso também acontece. Estudos de neuroimagem têm demonstrado que estímulos que possam representar perigo são processados de forma especializada pelo cérebro e é o que acontece com OCs de pessoas estranhas (e.g., Lundström & Olsson, 2010; Pause, 2012). Isto ocorre porque há uma maior envolvência de recursos atencionais, à semelhança do que acontece para outros estímulos ecologicamente salientes, como estímulos de medo (e.g., Soares, Esteves, & Flykt, 2009).

Uma vez que os OCs modelam a nossa interação e funcionam como alerta para potenciais ameaças, representando um estímulo ecologicamente relevante, são processados

59 pelas mesmas redes neuronais envolvidas no processamento de potenciais ameaças, ao contrário do que acontece com outros odores (Lundström, Boyle, Zatorre, & Jones- Gotman, 2008; Lundström & Olsson, 2010; Pause, 2012). Por essa razão, a sua aplicação em contexto forense pode revelar-se pertinente.

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