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4 LETRAMENTOS E MULTILETRAMENTOS NA CONTEMPORANEIDADE

5.1 Caracterização da pesquisa

A pesquisa situada em campo interdisciplinar, contemplando as áreas de Ciências Humanas e Linguística, Letras e Artes - Educação e Línguas Estrangeiras Modernas, adota uma abordagem qualitativa de análise e visa a um estudo que permita investigar as potencialidades de aplicativos digitais em práticas pedagógicas no processo de ensino- aprendizagem de Espanhol.

Acerca da abordagem adotada, Bogdan e Biklen (1994) apresentam cinco características que, em geral, delineiam as investigações qualitativas em Educação. São elas: a) o ambiente natural consiste na fonte direta dos dados e o pesquisador em seu principal instrumento; b) os dados coletados são, sobretudo, descritivos; c) há interesse maior pelo processo do que simplesmente pelo resultado, produto; d) os dados tendem a ser analisados de forma indutiva; e) os significados atribuídos pelas pessoas para suas vidas é essencialmente relevante nesta abordagem.

A primeira característica apontada diz respeito ao contato direto estabelecido pelo pesquisador com o local de investigação. Ao buscar esclarecer as questões de pesquisa, os pesquisadores preocupam-se com o contexto em que as ações educativas ocorrem e consideram que a melhor compreensão dos problemas investigados pode dar-se quando observados no próprio ambiente onde o fenômeno estudado ocorre (LÜDKE; ANDRÉ, 1986).

É nesse sentido que a presente pesquisa realizou-se a partir de um contato estreito com o campo de observação empírica do problema investigado e com a recolha de dados em situações concretas de interações em sala de aula, assumindo “[...] que o

comportamento humano é significativamente influenciado pelo contexto em que ocorre, deslocando-se, sempre que possível, ao local de estudo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.48).

Ademais, a apresentação dos dados é consubstanciada, principalmente pela descrição, segunda característica observada pelos autores acima. Os dados obtidos por meio dos instrumentos de coleta não culminam em símbolos numéricos, visto que a palavra escrita mantém relevância nesse tipo de abordagem, favorecendo a ação de proceder ao registro dos dados e à restituição de informações.

A terceira característica focaliza a ênfase que é dada ao processo em pesquisas qualitativas, entendendo que ao longo do percurso da investigação as mudanças podem ser verificadas. O interesse concentra-se no estudo de um determinado problema e em sua manifestação nas atividades, procedimentos e interações realizados. Como quarta característica desse tipo de pesquisa tem-se ainda a recolha de peças de informação que serão inter-relacionadas, visto que “[...] as abstracções são construídas à medida que os dados particulares que foram recolhidos se vão agrupando” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.50).

Nesse tipo de abordagem, a última característica apresentada reforça a importância dos significados gerados a partir da perspectiva dos participantes. Sobre isso, Minayo, Deslandes e Gomes (2009, p. 21), apontam que a pesquisa qualitativa “[...] trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis”.

Entretanto, ao pensar o universo de significados em pesquisa, o trabalho realizado em torno do ponto de vista dos participantes deverá implicar o cuidado por parte do pesquisador, já que ele deve encontrar meios de checar as percepções daquilo que os participantes experimentam, confrontando-as com outros pesquisadores, a fim de que elas possam ser ou não confirmadas (LÜDKE; ANDRÉ, 1986).

Considerando o caráter exploratório-descritivo desta investigação, acentuamos que, no que concerne à natureza das fontes utilizadas para tratamento do objeto, envolve ainda uma pesquisa de campo, em que os aplicativos digitais selecionados para a prática pedagógica desenvolvida foram abordados no próprio ambiente escolar e a coleta dos dados foi realizada nas condições em que os fenômenos ocorreram (SEVERINO, 2007).

Quanto aos seus objetivos, trata-se de uma pesquisa de cunho exploratório, uma vez que buscou “[...] levantar informações sobre um determinado objeto, delimitando assim um campo de trabalho, mapeando as condições de manifestação desse objeto”

(SEVERINO, 2007, p.123). Ademais, é de tipo descritivo, pois visou descrever as características de um grupo ou fenômeno, com uso de técnicas padronizadas para a coleta de dados, centrando-se ainda em uma atuação prática em pesquisa social (GIL, 2008).

Buscando uma consonância entre a base de sustentação teórica e os procedimentos de pesquisa adotados, e considerando que a escolha de uma metodologia surge do embate de teorias com a prática experimentada pelo próprio pesquisador em suas mediações e vivências com o pesquisado (GATTI, 1999), pensamos, inicialmente, na possibilidade de que esta pudesse se tratar de uma pesquisa-ação, na qual, segundo Thiollent (2011), a situação social investigada é concebida em estreita relação com uma ação, cujos pesquisadores e pessoas implicadas na resolução do problema atuam cooperativamente ou de modo participativo.

Em nosso caso, entretanto, apesar de entendermos que esta investigação requer e produz saberes a partir das relações estabelecidas entre a pesquisa e a atividade educativa; de propormos a produção de atividades apoiadas nos aplicativos digitais sugeridos, investigar seus usos por meio da avaliação dos discentes envolvidos na atividade proposta pela pesquisadora-docente; e vincularmos a reflexão e autorreflexão dos envolvidos nesta pesquisa em torno da prática realizada, percebemos que algumas condições básicas para o desenvolvimento de um estudo do tipo pesquisa-ação em educação não seriam satisfeitas.

Na concepção de Ghedin e Franco (2008), entender uma pesquisa em que se avalia um procedimento adotado como uma pesquisa-ação, bem como nas investigações em que se avalia uma transformação ou um processo de implementação, costuma ser um dos equívocos cometidos ao se pensar a pesquisa na e sobre a ação. Embora uma pesquisa com esse objetivo mantenha sua relevância, não deve ser entendida como tal, visto que sua característica dinâmica de se transformar e se ajustar progressivamente mantém-se ausente. Nesse caso, a presente pesquisa foi pautada, sobretudo, na avaliação dos alunos participantes acerca das mudanças observadas nas experiências que fazem uso do material impresso e em associação às atividades com suporte nos aplicativos digitais.

Em complemento, Ghedin e Franco (2008) ressaltam a importância de um processo que não tenha duração predefinida, que disponha de longo tempo para seu pleno desenvolvimento e tenha como elemento chave a imprevisibilidade,de modo que possa satisfazer as condições básicas de uma pesquisa-ação. Acerca desse aspecto, não dispusemos de longo tempo para o acompanhamento dos ajustes das mudanças implementadas.

Considerando o afastamento da pesquisadora de suas atividades docentes para participação no Mestrado, a pesquisa não foi realizada com uma de suas próprias turmas, mas com uma turma de uma professora de espanhol do IFMA - Campus São Luís/Monte Castelo. Por essa razão, organizamo-nos em torno do espaço/tempo que a professora responsável nos destinou para o trabalho com o tema selecionado, a partir do plano de ensino da disciplina apresentado pela docente, respeitando a carga horária das aulas que fariam parte da pesquisa e preocupando-nos em não interferir em outras atividades do planejamento da professora.

Por outro lado, como realizamos a pesquisa na instituição de trabalho da pesquisadora-docente, ainda que em outro campus, caso fizéssemos a escolha pela pesquisa-ação recairíamos em mais um dos equívocos indicados pelos autores anteriormente mencionados: a investigação do próprio local e função de trabalho do pesquisador. Esse tipo de investigação caracteriza-se pela intercomunicação entre os atores implicados na situação social, em que todos exercem papel ativo na dinâmica coletiva do processo investigativo (THIOLLENT, 2011). Entretanto, a hierarquia de papéis profissionais do local de trabalho tende a demandar ações estratégicas e dificilmente ações comunicativas (GHEDIN; FRANCO, 2008).

Assim, não deixando de estar atentos aos aspectos teóricos e práticos que envolveram esta pesquisa e não deixando de entender que esta poderá oferecer apoio ao trabalho educativo enquanto método de avaliação das experiências realizadas, optamos pelo estudo de caso enquanto procedimento metodológico.

O estudo de caso é um método de pesquisa utilizado em diferentes situações e campos de interesse para a construção do conhecimento acerca de fenômenos individuais, grupais, organizacionais, administrativos ou sócio-políticos. No que tange ao seu escopo, esse método busca investigar, empiricamente, um fenômeno contemporâneo, denominado “caso”, numa análise situada em profundidade e atrelada ao seu contexto real, visto que as condições contextuais mantêm intrínseca relação com o caso investigado (YIN, 2015; ANDRÉ, 2013).

Especialmente no que toca às características da metodologia em foco, podemos ressaltar ainda a convergência entre as múltiplas fontes de evidências na triangulação dos dados obtidos; e o estabelecimento dos pressupostos teóricos que norteiam o processo de coleta e análise (YIN, 2015).

Além de caracterizar-se como um estudo holístico e empírico, a interpretação em contexto é outra característica inerente a esse tipo de pesquisa, uma vez que, segundo

André (2013), as representações do pesquisador não são a única forma de apreensão da realidade. Espera-se, portanto, que o retrato produzido na investigação possa dar condições para que o leitor efetive suas interpretações, reiterando, ou não, as representações do pesquisador por meio de associações e dissociações.

Cabe enfatizar que, uma das preocupações no delineamento de uma pesquisa do tipo estudo de caso, consiste em compreender o conceito de generalização. Nesse sentido, o estudo de caso não traz indicativos da análise de uma parte representativa do todo, como em uma amostragem clássica, mas possui interesse próprio e específico, cujo foco é a expansão de teorias e não a inferência de probabilidades (YIN, 2015).

Outro aspecto que recai entre as preocupações para o delineamento desse tipo de pesquisa é o fator temporal. Para Yin (2015), esse aspecto relaciona-se ao modo como os estudos de caso eram realizados no passado, visto que a necessidade de levar um longo tempo para o desenvolvimento de um estudo de caso passa pelo tópico a ser estudado, o que não implica, necessariamente, um estudo válido e de alta qualidade. Segundo o autor, a concepção de permanência por longo período em campo confunde o estudo de caso com métodos voltados à coleta de dados, como a etnografia ou a observação participante.

Especialmente na Educação, André (2013) aponta que estudos de caso podem ser importantes instrumentos para investigar fenômenos educacionais em seu contexto próprio, quando o pesquisador poderá descrever, observar, analisar e interpretar os comportamentos, linguagens, representações e sentidos construídos a partir do contato direto com o local em que esses fenômenos ocorrem. O método permite ainda a reconstrução de processos que configuram a vivência cotidiana da escola.

Em nossa pesquisa, o fenômeno educacional investigado centrou-se na avaliação dos alunos sobre a integração de aplicativos digitais às atividades desenvolvidas nas aulas de espanhol como língua estrangeira. O foco era identificar como são concebidas por esses discentes as práticas realizadas que agregam o material impresso e o digital, bem como as implicações, positivas e/ou negativas, que emergem ao longo da experiência.

Desse modo, nosso estudo tem início com as questões que nos inquietaram, descritas no primeiro capítulo deste trabalho; passa pelo estabelecimento de nossos objetivos; pela revisão bibliográfica acerca dos letramentos/multiletramentos, das tecnologias digitais na educação e do ensino de língua estrangeira; percorre a produção do site e das atividades a serem desenvolvidas e aplicadas com os alunos; encaminha-se para a definição e produção dos instrumentos de pesquisa; e, posteriormente, para a etapa que

passamos a situar na seção que segue, de explicitação da coleta e formas de tratamento dos dados.

Nesse sentido, buscando tornar claros os procedimentos adotados no desenvolvimento deste estudo de caso, apresentamos nas seções 5.2 e 5.3 o percurso que orientou a condução desta pesquisa na etapa da coleta de dados, considerando as orientações de Freitas, Jabbour (2011) e Yin (2015).