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4. RESULTADOS

4.1 Caracterização dos sujeitos e entrevistas

Ao todo 18 pacientes foram convidados a participar das entrevistas. Desse quantitativo, houve duas recusas. Acreditamos que elas ocorreram devido ao fato dos pacientes estarem na fase avançada do tratamento e com efeitos colaterais exacerbados da RT e QT. Eles demonstraram irritabilidade no momento do primeiro contato e manifestaram o desejo por realizar a última consulta médica para descansarem do ambiente hospitalar.

Todos os entrevistados apresentaram CEC localizado nas estruturas nasofaringe, orofaringe, cavidade oral e laringe, o que caracteriza semelhanças em relação à abordagem terapêutica adotada, assim como o curso da doença. Três pacientes com falas significativas foram excluídos a posteriori por apresentarem tipos de CCP diferente dos da maioria dos sujeitos entrevistados (CBC infiltrado – um tipo de câncer de pele ou CEC de parótida) e, consequentemente, desfechos que poderiam levar a viés. Após processo de validação junto aos pares do LPCQ, optamos pela exclusão desses participantes. Assim, foram excluídos E3, E4 e E16 e a amostra final foi composta por 13 participantes.

Quadro 1 – Caracterização dos participantes, diagnóstico e tratamento

Sujeitos Idade Sexo Diagnóstico Estágio Tratamentos Tabagismo

durante a RT

Outros procedimentos

E1 57 M CEC orofaringe IV RT + QT Sim Não se aplica

E2 43 M CEC orofaringe IV RT + QT Não Não se aplica

E5 44 F CEC base de

língua IV RT + QT Não Não se aplica

E6 75 M CEC laringe III RT + QT Não Sonda

nasoenteral

E7 68 M CEC base de

língua IV RT + QT Sim Não se aplica

E8 51 M CEC orofaringe IV RT + QT Sim Não se aplica

E9 71 M CEC nasofaringe II RT + QT Não Não se aplica

E10 60 M CEC orofaringe III RT + QT Não Não se aplica

E11 56 M CEC orofaringe III RT + QT Não Não se aplica

E12 55 M CEC laringe IV RT + QT Sim Sonda

nasoenteral

E13 48 M CEC trigono

retomolar IV

Cirurgia + RT

+ QT Sim Traqueostomia

E14 52 M CEC orofaringe IV RT + QT Sim Traqueostomia

E15 57 M CEC orofaringe III RT + QT Sim Traqueostomia

Os participantes realizaram tratamentos combinados (radioterapia, quimioterapia e/ou cirurgia), inclusive aqueles com doença em estágio menos avançado. Por essa razão, em diversos momentos, os conteúdos relatados fizeram referência à experiência do tratamento como um todo. No entanto, procuramos explorar em profundidade os aspectos exclusivos da radioterapia, os quais foram analisados em uma única categoria.

As entrevistas ocorreram em diversos momentos da RT, porém sempre a partir da décima aplicação. Não incluímos na amostra os pacientes em tratamento paliativo que, geralmente, realizam menos sessões com dose hipofracioanda para alívio de sintomas. Foram entrevistados apenas aqueles com proposta de RT curativa para CCP.

Uma paciente é do gênero feminino. Apesar de não estar em nosso recorte estudar questões específicas de gênero, consideramos importante explorar tais aspectos em nossa análise. Compreendemos que a “voz” da mulher doente por CCP uma minoria na amostra que é representativa de uma singularidade não menos importante que os relatos da maioria do gênero masculino.

Tabela 1 – informações biodemográficas

Variáveis Valores unitários

Total de participantes Sexo M F Estado Civil Casado/União estável Solteiro/Divorciado Idade ≥50 <50 Estágio do CCP III e IV I e II Trabalho Em atividade Parou de trabalhar Aplicações de RT Entre 10 e 19 Entre 20 e 29 Entre 30 e 38 Tabagismo durante a RT Sim Não Etilismo durante da RT Sim Não 13 12 1 9 4 10 3 12 1 1 12 4 7 2 7 6 0 13

Conforme a Tabela1, compuseram a mostra final 12 homens e 1 mulher (n=13) com idades entre 42 e 75 anos, em sua maioria com diagnóstico de CEC em estágio avançado (III e IV), com baixa escolaridade, mais da metade em uso de tabaco durante a RT, ainda que com menor frequência. Além desses aspectos, outros procedimentos como o uso de sondas e ostomias foram apontados no Quadro 1, pois produziram nexo de sentido durante a análise dos resultados.

Percebemos, como já constatado na literatura, que a maior parte dos pacientes desenvolveu o CCP associado ao hábito tabaquial. Mesmo aqueles que pararam de fumar durante o tratamento, relataram o uso contínuo do cigarro por mais de 10 anos, sendo que alguns fizeram uso por mais de 40 anos consecutivos.

A maioria dos pacientes era casado e seus acompanhantes do gênero feminino. Há também a predominância da doença em estágio avançado no momento do diagnóstico, o que corrobora com levantamento epidemiológico, os comportamentos e os fatores relacionados ao diagnóstico tardio do CCP, abordados na introdução teórica.

Os participantes relacionam a capacidade de realizar atividades ocupacionais à melhor ou pior condição de saúde. Para muitos, ter saúde é poder trabalhar. Logo, a maioria deles se percebeu sem saúde não apenas por ter CCP, mas por estar incapacitado de trabalhar em razão dos efeitos colaterais e sequelas do tratamento ou ainda pela rotina diária para realizar a RT.

Outro ponto de destaque na Tabela 1 é a continuidade do uso de tabaco ao longo do tratamento. Mesmo diante dos efeitos colaterais limitantes, esse aspecto merece especial atenção por revelar a psicofisiologia da dependência química. Diante da profundidade e intensidade desse tipo de dependência, deparamo-nos com o seu difícil manejo clínico no ambiente hospitalar em pacientes oncológicos com CCP, pois envolvem intervenções conjuntas e intersetoriais de amplo espectro que auxiliem na substituição do hábito danoso por outro não prejudicial à saúde, conforme estudos sobre a dinâmica da adicção. Esse tema será relevante em trechos importantes da análise.

As entrevistas gravadas em áudio foram transcritas em formato de texto e analisadas integralmente. Trabalhamos com 11h31mim14s de gravação, a duração das entrevistas foi de 16mim (mínima) e 1h20mim (máxima), resultando em média 40 mim para cada entrevista. O corpus transcrito resultou um material vasto composto por 178 páginas.