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TANCREDO NEVES

3.2 PROGRAMA FOME ZERO

3.2.1 CARACTERIZAÇÃO GERAL DO PROGRAMA FOME ZERO

O Programa Fome Zero foi lançado em outubro de 2001 pelo Instituto Cidadania – Fundação Djalma Guimarães, tendo como um dos responsáveis o atual Presidente da República, Exmo. Sr. Luiz Inácio Lula da Silva, como uma forma de suprir uma lacuna na agenda política social do País.

As propostas contidas no projeto tiveram como base “as iniciativas do Projeto dos Trabalhadores em 1991, corroborada pela Ação de Cidadania Contra a Fome e a Miséria e Pela Vida (1992 – 1993)”. Este último, um movimento liderado pelo

sociólogo Herbert de Souza, concretizou, de forma ampla, a mobilização popular em prol das questões levantadas acima.

Inicialmente foi lançado como Projeto, resultado do trabalho de um grupo de profissionais integrantes de ONGs, institutos de pesquisas, sindicatos, organizações populares, movimentos sociais e especialistas ligados à questão de segurança alimentar de todo o país.

Concluído, o Projeto foi apresentado ao público para ser discutido, avaliado, aperfeiçoado e complementado, pois, em alguns aspectos, encontrava-se incompleto, como é o caso da parte operacional e dos mecanismos de mobilização.

O Projeto Fome Zero partiu da premissa de que “a alimentação de qualidade é um direito inalienável de todo cidadão, sendo dever do Estado criar as condições para que a população brasileira possa efetivamente usufruir dele.” O público-alvo foi definido em 9,3 milhões de famílias, ou 44 milhões de indivíduos, abaixo da linha de pobreza, isso é, ganhando menos que US$ 1,00 por dia, segundo a classificação do Banco Mundial. De acordo com os dados apresentados na Tabela 1 e na Figura 1, a região Nordeste, especificamente o semi-árido, foi um dos focos privilegiados. Como premissa, adotou-se a solidariedade para com os indivíduos que se encontram excluídos socialmente e sem acesso às condições alimentares mínimas.

Tabela 1 – Famílias Carentes por Regiões Administrativas – %

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2004.

Figura 1 – Famílias Atendidas pelo Programa Bolsa Família – por Região

Fonte: Programa Fome Zero, 2001.

O projeto identificava, como objetivos, a construção de uma política nacional participativa de segurança alimentar e de combate à fome no país, o que até então não existia, assegurando o direito à alimentação de qualidade diariamente, e em quantidade suficiente para a nutrição e manutenção dos indivíduos.

O projeto previu a garantia da segurança alimentar como uma conjugação de aspectos econômicos, sociais e de uma mudança profunda na estrutura política, além do trabalho concomitante das políticas estruturais e das políticas emergenciais ou compensatórias, sem, no entanto, subordinar uma à outra.

Para o bom entendimento das políticas estruturantes e emergenciais, é necessário conhecer o que o Projeto apresentava como “Segurança Alimentar”. O termo surgiu após a 1a Guerra Mundial, quando populações inteiras ficaram à mercê da fome e, portanto, sujeitas à dominação de outras nações. A alimentação passou, então, a ser encarada como uma questão estratégica e ligou-se, imediatamente, a fome “à sua capacidade de produção agrícola”. Essa noção perdurou até a década de 1970, fortalecendo as políticas de armazenamento estratégico, estoques e acordos internacionais sobre produtos agrícolas.

Esse conceito caiu por terra ainda na década de 1970, quando a produção de alimentos recuperou-se e os preços começaram a baixar, mas as mazelas da fome e da desnutrição continuavam em seus diferentes níveis e aspectos.

Começou, assim, a percepção de que a Segurança Alimentar estava ligada ao acesso das populações excluídas aos alimentos, e não somente à produção, apesar desta última ser uma das causas da fome e da insegurança alimentar, além de guerras, bloqueios econômicos e catástrofes naturais.

Em uma percepção mais ampla, as questões relacionadas à

“qualidade dos alimentos (nutricional, biológica ou química) e sua sanidade (não contaminação biológica ou química) entram nas preocupações e debates mundiais, a partir da década de 1980” (Projeto Fome Zero, 2001).

Especificamente no Brasil, o conceito de Segurança só apareceu em meados da década de 1980, sob influência dos trabalhos da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação – FAO, a qual já vinha trabalhando com esse conceito há mais de uma década. Dentre outras propostas, a FAO apresentou a construção de um Conselho Nacional de Segurança Alimentar, ligado à Presidência da República, com vistas a garantir a produção agrícola e o acesso ao alimento.

Na 1a Conferência Nacional de Alimentação e Nutrição, em 1986, seguida da 1a Conferência Nacional de Segurança Alimentar, em 1994, se consolidam as noções de “incapacidade do acesso aos alimentos por parte significativa da população brasileira” e, principalmente, definem-se as principais causas da fome: a pobreza e o desemprego (Projeto Fome Zero, 2001).

Nesse momento, o conceito de segurança alimentar estava construído, debatido e disseminado. Chegava-se à certeza de que só a “retomada do crescimento econômico, com maior eqüidade, com regulação de preços, além da descentralização e a diferenciação regional das políticas públicas” (Projeto Fome Zero, 2001) é que se poderia garantir às populações vulneráveis uma alimentação de qualidade, em quantidade e com permanência.

Surgiu, então, o Programa Fome Zero, abrangendo os diagnósticos e as propostas debatidas nas conferências de segurança alimentar. Dentre elas, a necessidade de articulação entre poder público e sociedade civil, respeitando seus papéis, a noção de soberania alimentar, a preservação de a cultura alimentar de cada povo, a sustentabilidade do sistema alimentar e, principalmente, o fato de que a alimentação é um direito humano primordial.

Segurança Alimentar e Nutricional é a garantia do direito de todos ao acesso a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente e de modo permanente, com base em práticas alimentares saudáveis e sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais e nem o sistema alimentar futuro, devendo se realizar em bases sustentáveis. Todo país deve ser soberano para assegurar sua segurança alimentar, respeitando as características culturais de cada povo, manifestadas no ato de se alimentar. É responsabilidade dos Estados Nacionais assegurarem este direito e devem fazê-lo em obrigatória articulação com a sociedade civil, cada parte cumprindo suas atribuições específicas (Projeto Fome Zero, 2001).

Dividem-se, então, as políticas em emergenciais, estruturantes e locais. A primeira refere-se às ações de atendimento imediato às famílias que não têm acesso ao alimento de qualidade, na quantidade e regularidade necessárias; a segunda, às ações voltadas às causas mais complexas da fome e da pobreza; e a terceira se

configura em ações que “podem ser efetivadas pelas prefeituras e pela sociedade civil, em qualquer região e através de iniciativas próprias para essa finalidade.” (Projeto Fome Zero, 2001).

Após essa breve descrição do surgimento do Programa Fome Zero, seus objetivos e premissas, segue um relato de como se efetivou o Programa na Bahia, com o objetivo de caracterizarmos suas ações e podermos utilizá-las como um elemento de análise inserido nos indicadores identificados no capítulo 5.