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Na observação inicial de MF, assinalámos níveis de implicação baixos e uma postura neutra, não existindo sinais claros que indicassem propriamente tristeza ou prazer. Apesar de não demonstrar sinais claros de mal-estar, revelava tensão sempre que o seu espaço era invadido, por exemplo, por outras crianças que não conhecia tão bem ou por pessoas que estivessem mascaradas. Também foram várias as situações em que se percebia a ansiedade ou receio por não se sentir capaz na concretização de determinadas atividades, sobretudo de expressão plástica. Neste tipo de atividades, muito frequente no contexto pré-escolar, os seus níveis de implicação eram, por conseguinte, baixos.

Sabendo que a criança tinha frequentado no ano letivo anterior outro jardim de infância, tornou-se importante conhecer um pouco melhor a razão da mudança para o atual jardim de infância e alguns outros aspetos da história de vida daquela criança. Como tal, entendemos ser importante a realização de uma entrevista à mãe (Cf. Anexo 1) que nos ajudasse a conhecer um pouco da sua vida familiar e temperamento, como é a MF em casa, as relações que tem com os familiares e como foi a passagem pelo antigo jardim de infância.

Assim, a partir da entrevista realizada coligimos a seguinte informação:

MF é uma criança de 4 anos, residente em Aveiro, que vive com a família (pais e duas irmãs mais velhas). Ambos os pais estão empregados e, devido às profissões que exercem, não têm horários fixos, existindo dias que saem cedo de casa e outros em que chegam mais tarde. Dada esta situação, a MF permanece no jardim de infância desde a sua abertura até ao fecho, frequentando o horário de prolongamento. Foi descrito um bom relacionamento com os pais e irmãs, que nos tempos livres procuram realizar atividades e brincadeiras conjuntas. O relacionamento positivo estende-se à restante família, com exceção de uns primos de MF. Na relação com estes primos, verificam-se lutas e conflitos recorrentes. Porém, a mãe referiu que após a entrada no atual jardim de infância, estes comportamentos têm vindo a desaparecer.

Apesar de, durante a gestação, a mãe da MF ter necessitado de repouso total e o parto ter sido por cesariana (opção da mãe), a mãe não estabelece qualquer relação entre estas ocorrências e as dificuldades identificadas na criança.

Para a mãe, a principal preocupação é a agressividade da filha, sublinhando o facto de as suas primeiras palavras terem sido “Não”, “Não sei” e “Não consigo”.

Sobre a adaptação ao novo jardim de infância e as razões da mudança, a mãe referiu que a MF frequentou o jardim de infância anterior desde os 3 meses até aos 3 anos, adaptando-se bem, sendo, inclusive, a líder da sala. Esta liderança era considerada perturbadora e, frequentemente, era colocada no canto da sala sozinha. A par desta atitude dos adultos de exclusão da MF das atividades, de uma certa rejeição e de pouca estimulação, era passada informação à mãe de que a filha era problemática. Contudo, estas informações transmitidas à mãe não coincidiam com os relatórios do pediatra.

Neste contexto adverso, a mãe da MF decidiu, apesar de alguns receios, mudar a criança de jardim de infância. A MF conheceu, então, uma nova realidade, que lhe exigiu um esforço de adaptação a um novo contexto, a outras pessoas, novos colegas e a uma nova educadora. A mãe diz sentir melhorias na filha e considera que no novo jardim de infância, até ao momento, se está a fazer um bom trabalho.

Para além da entrevista, utilizando as várias fichas de natureza individual

apresentadas no SAC, procurámos aprofundar o nosso conhecimento e compreensão em

torno desta criança.

Neste sentido, e no âmbito da nossa avaliação diagnóstica, ficou patente que a MF manifestava claros sinais de baixa autoestima, insegurança e desconforto, sobretudo em situações de exposição em grande grupo. Quando inserida num grupo mais pequeno tornava-se mais colaborante, menos inibida. Em situações em que estava implícito a manifestação de sentimentos e/ou ideias, linguagem expressiva, denotou-se na MF alguma ansiedade ou mesmo receio em participar por se sentir menos capaz que os outros, optando muitas vezes por não participar e adotando uma postura passiva. Esta dificuldade em expressar sentimentos/ideias e postura passiva associava-se a níveis de implicação baixos e evidenciava o seu frágil sentido de valor pessoal e autoconfiança, em contexto de grupo. Evitava experimentar novas atividades e ficava hesitante quando as atividades envolviam o toque do corpo, recusando-se a participar em algumas atividades de grupo. Frequentemente, adotava atitudes agressivas com os colegas quando estes lhe tocavam, empurrando-os ou beliscando-os. Relativamente ao sentido de responsabilidade e

assertividade, a MF não parecia compreender as consequências dos seus comportamentos e, por sua iniciativa, não pedia desculpa. Contudo, quando tinha alguma dificuldade em executar uma atividade pedia ajuda a um adulto. Distraía-se facilmente quando não se sentia capaz de fazer algo e quando não tinha o acompanhamento de um adulto. A falta de empenho e motivação estava presente em muitas atividades do dia-a-dia e, no início de algumas atividades, a MF necessitava sempre de mais orientação e apoio por parte de um adulto, solicitando esta ajuda e querendo que o adulto estivesse perto dela a dar indicações. Preferia sempre atividades que envolviam alguma destreza motora, bem como puzzles e brincar ao “faz-de-conta”, inibindo-se perante atividades de expressão verbal.

No que toca à linguagem, a MF apresenta ainda um vocabulário pobre, dificuldade de articulação nas palavras, bem como alguma gaguez quando se dirigia ao adulto, tendo muito presente no seu vocabulário as expressões “não sei”, “não sei fazer” e “não consigo”.

De uma forma geral, a MF era uma criança que se sentia desconfortável e insegura em grupo, preferindo ouvir a intervir.

Neste quadro, trabalhar com vista a promover a autoestima da criança e o seu bem- estar, investindo na promoção do seu sentido de segurança e autoconfiança associado ao sentimento de competência e crescente sentido de valor pessoal, afigurou-se como o nosso principal objetivo.

Neste processo, foi para nós claro que não podíamos descurar a atenção a todas as crianças, procurando compatibilizar a intervenção individual com a intervenção dirigida a todo o grupo (abordagem inclusiva), assumindo que propostas de qualidade para todo o grupo beneficiavam igualmente a MF e vice-versa.